Revista

BRASIL-EUROPA

Correspondência Euro-Brasileira©

 

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Amsterdam. Foto A.A.Bispo 2012©

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Fotos A.A.Bispo. Amsterdam (2012),

©Arquivo A.B.E

 

Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira 140/9 (2012:6)
Prof. Dr. A.A.Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e Conselho Científico
da
Organização de estudos de processos culturais e estudos culturais nas relações internacionais (reg. 1968)
- Academia Brasil-Europa de Ciência da Cultura e da Ciência -

e institutos integrados

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2012 by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501

Doc. N°2947


A.B.E.


A Natureza é perfeita e divina tal como é
Liberdade, cultura de afetos e alegria na condução da vida
segundo Bento de Espinosa (1632-1677)

 
Regenbogen, Spinoza
A liberdade foi conceito condutor de estudos euro-brasileiros conduzidos em várias cidades européias em 2012. A compreensão de liberdade e o seu papel no conjunto de idéias de determinados pensadores foram estudados no seu respectivo contexto cultural e na sua época.


Os estudos não se limitaram a tratar contextualizadamente do ponto de vista histórico questões filosóficas, mas sim procuraram analisar a inserção das concepções no edifício de concepções e imagens e suas transformações, ou seja, tiveram uma orientação teórico-cultural.


As reflexões partiram do presente. De um presente que é marcado pela intensificação preocupante de correntes religiosas fundamentalistas e políticas radicais que levam a conflitos e representam um perigo para conquistas intelectuais, sociais e políticas alcançadas com grande esforço pela Humanidade. (Veja http://revista.brasil-europa.eu/140/Liberdade-em-debate.html)


Um dos filósofos particularmente considerados foi Baruch de Spinoza/Bento de Espinosa (1632-1677), pensador sefardita de ascendência portuguesa e lusófono que foi vítima da estreiteza derivada do pensamento religioso. (http://revista.brasil-europa.eu/140/Bento-de-Espinosa.html)


Foi banido da comunidade judaico-portuguesa de Amsterdam e, não aceito por cristãos, viveu de forma excepcional como renegado do Judaísmo, sem converter-se a outra religião.


A situação de Espinosa indica a complexidade de processos de transformação cultural e de identidades e como neles primordiais anelos de liberdade podem levar a novas configurações sociais e culturais marcadas por coibições de liberdade.


De uma situação inquisitória a outra situação inquisitória


Espinosa pertenceu a uma comunidade que remontava a conversos vindos sobretudo de Portugal em fuga à Inquisição e à procura de liberdade: de vida, de pensamento, de práticas religiosas e de comércio. No Estrangeiro, movidos pela necessidade de cooperação mútua de indivíduos em similar situação, de mesmo idioma e pressupostos culturais, os conversos, agora gozando de relativa liberdade, inseriram-se em complexo processo de resgate religioso-cultural, de aprendizado da própria história e tradições.


Esse processo de recuperação ou reconstrução foi ao mesmo tempo de de-conversão, sendo acompanhado pela crítica superadora do Cristianismo que havia sido imposto ou já marcado por séculos a cultura sefarda na Península Ibérica. Como pode ser registrado em outras situações de exílio, emigração ou diáspora, compreende-se que, nessa situação, comunidades assim construídas no Estrangeiro tornem-se particularmente conscientes de uma cultura que procuram resgatar, manter e fomentar, caracterizando-se por acentuado tradicionalismo, cuidado e rigidez doutrinária.


Amsterdam. Foto A.A.Bispo 2012©

Explica-se, assim, o quadro paradoxal que oferece a história de Espinosa: em comunidade cujo passado fora marcado pela Inquisição católica, foi êle alvo de um outro tipo de coibição de liberdade de cunho inquisitório, agora no próprio Judaísmo.


Em ambos os casos, esse processo inquisitório é dirigido para dentro da própria comunidade, não para aqueles que dela se encontrem fora: na Península Ibérica, o seu alvo era os "conversos", no Estrangeiro, aqueles que tinham por detrás de si uma fase de de-conversão cristã e que era, concomitantemente, de re-conversão ao Judaísmo.


Sob essa perspectiva, a situação de Espinosa, para ser compreendida de forma empática, poderia ser comparada em linhas gerais àquela de jovens que, em comunidades de imigrantes no Brasil, se sentem sufocados pela estreiteza e pelo excesso conservador e tradicionalista do meio imigratório, procurando liberdade de pensar e relacionar-se com a cultura da sociedade envolvente.



Liberdade em Espinosa a partir de concepções de estado natural


Considerando-se essa complexa situação cultural da comunidade lusófona de Amsterdam, o papel que o conceito de Liberdade desempenha no pensamento de Bento de Espinosa surge sob nova luz. Assim dirigindo a atenção, também adquire novas conotações a concepção de que o "escopo do Estado é a liberdade" inscrita no monumento a Espinosa em Amsterdam. (Veja http://revista.brasil-europa.eu/140/Bento-de-Espinosa.html)


Levanta-se a questão se essa frase é sempre bem compreendida segundo as intenções do pensador. Um observador atual, confrontado com o monumento, sem ter-se ocupado com a obra e com a situação cultural vivida por Espinosa, corre o risco de ler essa expressão segundo critérios inadequados, projetando conceitos do presente no passado.


Para um entendimento apropriado dessa expressão, deve-se considerar que Espinosa parte de uma compreensão de estado natural marcado por luta pela sobrevivência, havendo um direito natural do indivíduo em seguir os seus interesses e procurar o alcance de seus objetivos. O Estado tem, assim, o escopo de assegurar o direito do Homem derivado da natureza, ou seja, o da liberdade de procurar atingir os seus interesses por todos os meios.


Essa situação natural, porém, leva a uma luta de uns contra outros, e a única forma de contornar-se essa vida selvática é a do indivíduo agir segundo o princípio de "não fazer aos outros o que não quer que os outros a êle façam".  


O Estado tem o encargo de atuar no sentido de garantir que os seus direitos e a sua liberdade não sejam coibidas por outros e, assim, de manter a vigência da máxima de não se fazer aos outros o que não se deseja de outros padecer.


Liberdade e falta de liberdade em Espinosa a partir de concepções éticas


Coloca-se o problema, porém, se essa interpretação esgota de fato o conteúdo da frase "o escopo do Estado é a liberdade" segundo o pensamento de Bento de Espinosa.


Essa dúvida resulta em particular da leitura da quarta parte do livro de Ética, que é dedicada à questão da falta de liberdade do Homem.


A argumentação exposta essa obra parece de início não se relacionar com a interpretação anterior derivada da idéia de estado natural e de um direito natural à liberdade de sobreviver, de lutar e alcançar interesses individuais.


A coerência do edifício de pensamento de Espinosa, à qual o pensador deu tanta atenção e que se manifesta até mesmo na singular forma de exposição segundo preceitos matemáticos, indica que se deve procurar compreender a relação de suas considerações éticas e aquelas mais de perto relacionadas com o escopo do Estado em garantir a liberdade.


As suas considerações da quarte parte do livro de Ética levam a um conceito de liberdade - e de falta de liberdade - estreitamente relacionado com a capacidade do homem de controlar ou reger os seus afetos. A ausência de liberdade reside segundo êle na incapacidade do Homem em controlar ou limitar os seus afetos. O homem sujeito a afetos, ou seja, que não os dirige, é subjugado não pelas suas próprias determinações, mas por aquelas do destino, sendo obrigado a seguir o pior, embora querendo o melhor.


A atenção dirigida ao significado dado aos afetos no pensamento de Espinosa fêz com que fossem retomados nos ciclos de estudos reflexões já anteriormente desenvolvidas referentes à doutrina dos afetos, de tanto significado para o estudo do Barroco, em particular da estética musical. Sob o ponto de vista euro-brasileiro, o primeiro seminário dedicado ao tema realizou-se em 1975.



Pressupostos: na Natureza não há imperfeições ou êrros


Para que se possa compreender o sentido do termo no conjunto das idéias do próprio Espinosa, torna-se necessário partir das suas próprias considerações introdutórias. Nestas, o pensador parte dos conceitos de perfeição e de imperfeição, do bem e do mal.


Aquele que contempla uma obra e sabe qual foi a intenção e o objetivo do seu criador, sabe se o seu intento e o seu escopo foram bem realizados ou não, ou seja, se a obra foi perfeitamente executada ou se é imperfeita, se foi realizada com sucesso ou não. Não conhecendo a intenção e a finalidade do seu criador, não pode saber se a obra é perfeita ou imperfeita.

Quando o homem começou a criar idéias gerais e imagens-modêlo de casas, edifícios e torres, passou a ver aquelas como perfeitas que correspondiam a uma idéia geral, imperfeita aquelas que não correspondiam o o modêlo ideal, mesmo que correspondesse à intenção daquele que a fêz. 

Espinosa, partindo aqui de concepções conhecidas de antigos filósofos, tira porém delas conclusões de grandes consequências. Os objetos da Natureza, que não foram feitos pelo Homem, e que, portanto, não sabe das intenções e finalidades que a êles levaram, apenas podem ser designados como perfeitos ou imperfeitos segundo idéias gerais feitas pelo próprio Homem.

Se este vê na natureza algo que não corresponde à imagem ideal que possui, tende a supor que a Natureza possa ter feito êrros, o que explicaria imperfeições. Dessa forma, os homens estão acostumados a ver coisas naturais como perfeitas ou imperfeitas antes de forma preconcebida, não no sentido de um verdadeiro Conhecimento. Neste sentido, não há imperfeições na Natureza e supor que a Natureza faça erros e produza coisas imperfeitas seria uma ficção.

Correspondendo a essa conclusão de não haver êrros ou imperfeições na Natureza, esta não age de acordo com nenhum objetivo ou finalidade, que é o que faz com que se reconheça perfeição ou não numa obra humana.

A Natureza, sem finalidades, sem êrros, é divina

Espinosa chega assim à conclusão que, se a Natureza não age de acordo com um objetivo, o ser infinito que se designa como Deus corresponderia à própria Natureza. Como não existe para um objetivo determinado e não procede para um objetivo, a Natureza não tem nem começo nem princípio para a sua existência e para o seu agir.

O escopo representa para Espinosa nada mais do que o desejo humano em si, uma vez que é pondo de partida de algo. Quando se diz, por exemplo, que o morar é a finalidade de uma casa, entende-se que o homem pense no conforto de morar numa casa e que, para isso, a construiu. Assim, o morar não é o único desejo. O homem é consciente do seu fazer e do seu desejar, mas desconhece as causas que movem o seu fazer e o seu desejo.

Para o pensador, realidade e perfeição seriam o mesmo. Todos os indivíduos da Natureza são subsumidos sob um gênero que é o mais geral. Subsumidos sob essa categoria,  comparados e percebidos como tendo mais ou menos ser ou realidade, então diz-se que algo da Natureza é mais perfeito do que o outro. Dando-lhes caracterizações que incluem negatividade, como limite, fim, impotência e outros, diz-se que são imperfeitos - isso porque não correspondem a expectativas do Homem, não porque lhes falte algo ou que a Natureza tenha feito um êrro.

Perfeição e imperfeição seriam, assim, apenas formas de pensamento, conceitos criados para comparar indivíduos do mesmo tipo ou gênero.

Partindo dessas considerações, Espinosa chega a fundamentais conclusões éticas. Também o bem e o mal não designariam positivamente algo nas coisas, mas apenas formas de pensamento ou conceitos feitos pelo Homem para tecer comparações. Algo pode ser ao mesmo tempo bom ou mau, ou mesmo indiferente. Dando um exemplo, lembra que a música é boa para os melancólicos, má para aqueles que estão de luto, e, para os surdos, nem boa nem má.

Ainda que relativos, essas distinções, para Espinosa, deveriam ser mantidas. Como se deseja criar uma idéia do Homem como modêlo da natureza humana, seria conveniente conservar tais conceitos. Por isso, Espinosa compreende como bom aquilo que se aproxima do modêlo da natureza humana feito pelo Homem, e ruim o que sabemos que impede ao homem de se assemelhar ao modêlo. Da mesma forma, o Homem é por êle visto como mais perfeito ou imperfeito relativamente à proximidade ao modêlo.

Consequências para concepções relativas a afetos


Dessas considerações de Espinosa compreende-se as suas idéias relativas aos afetos. Um afeto, quando compreendido como algo imaterial, espiritual, surge como uma idéia através do qual o espírito afirma uma maior ou menor força no seu corpo. Se o espírito é tomado por um determinado afeto, ao mesmo tempo o corpo é tomado por uma emoção, através da qual aumenta ou diminui a sua capacidade de ação.

Esse impulso do corpo tem a capacidade de perdurar. Não pode ser impedido ou retirado sem uma causa corporal, através da qual o corpo e tomado por uma causa contrária e mais forte. O espírito pode ser impulsionado pela idéia de uma emoção mais forte e contrária àquela, ou seja, é movido por um afeto mais forte e contrário ao anterior, que passa a ser excluido. Assim, um afeto não pode ser sustido ou superado a não ser por um afeto contrário e mais forte.

As consequências mais amplas desta argumentação manifestam-se nas relações que Espinosa faz com aqueles anteriormente expostas do bem e do mal. Para êle, o conhecimento do que é bom ou do que é mal nada mais é do que o afeto da satisfação ou de falta de satisfação.

A qualificação de bom ou mau diz respeito àquilo que contribui ou não à preservação do ser, ou seja, o que aumenta ou diminui, fomenta ou impede a capacidade de ação do indivíduo. Ao perceber que algo dá prazer, este algo surge como bom, caso contrário, ruim. Assim, para Espinosa, o conhecimento do bem e do mal nada mais é do que a idéia do prazer ou do desprazer. Essa idéia é unida da mesma forma com o afeto como o espírito o é com o corpo. So na palavra diferencia-se a idéia do afeto com a idéia da exitação do corpo.

Afetos e imagens no pensamento de Espinosa e regras para o bem viver

Um afeto, cuja causa imagina-se estar presente é mais forte do que quando se imagina não estar próxima. A imagem é uma idéia através da qual o espírito contempla algo como presente. Um afeto é uma imagem na medida que demonstra o estado do corpo. Uma imagem é tanto mais forte quanto menos o indivíduo pense na existência atual de algo externo. Quando se diz que a imagem de algo futuro ou passado leva a um mesmo afeto como se estivesse presente, isso é verdadeiro na medida que seja imaginado,

O poder de ordenar e relacionar excitações corporais pode ser alcançado pelo indivíduo se êle não deixar-se tomar facilmente por afetos negativos.

O melhor que o indivíduo pode fazer, assim, enquanto não tenha um conhecimento perfeito dos afetos, é instituir um método correto de vida ou regras determinadas de bem-viver e implantá-los na memória. Devem ser exercitados em casos que frequentemente ocorrem na vida, de modo que a imaginação seja profundamente marcada e que os tenha sempre presentes.

Assim, o próprio Espinosa colocou a si a regra de vencer o ódio pelo amor ou pela nobilidade, não retribuindo ódios. Essa seria uma prescrição da razão que, para estar sempre presente quando precisar ser usada, deve-se refletir sobre as ofensas recebidas na vida e no fato de que o melhor caminho a ser seguido é o da atitude nobre. Assim, a idéia de ofensa une-se com a idéia da regra de vida, e o indivíduo assim agirá toda a vez que sofra uma ofensa.

O indivíduo deve refletir também sobre as vantagens que resultam desse método de bem-viver, uma vez que fomenta a amizade recíproca e a união. Esse modo correto de viver proporciona à alma a maior satisfação e como o Homem - como tudo na Natureza - age segundo uma necessidade natural, a ofensa ou o ódio são superadas rapidamente. Se a cólera resultante de uma ofensa não pode ser superada rapidamente, então, apesar da luta interna, será ultrapassada de forma mais fácil do que se o indivíduo não tivesse antes exercitado o método.

A importância das imagens ou do visualizar no pensamento de Espinosa manifesta-se também na sua opinião de que deve-se meditar sobre as forças internas da alma para vencer-se o mêdo.

Deve-se calcular com os perigos que surgem na vida, imaginá-los e refletir como podem ser evitados da melhor forma com presença de espírito e coragem.

Espinosa menciona que, na ordenação dos pensamentos e imagens sempre se deve dar atenção ao que é bom numa determinada coisa, de modo que surja o afeto do prazer e este dirija a ação.

Se alguém percebe, por exemplo, que tem sêde de fama, deve pensar no uso certo desse impulso e em que situação deve segui-lo, e com que métodos. Não deve pensar no mal-uso desse impulso, na vaidade ou na falta dos outros, o que frequentemente ocorre em situações depressivas.

Esses pensamentos fazem justamente sofrer mais os ambiciosos que duvidam poder alcançar as honras que desejam. Manifestando a sua cólera, pretendem ser vistos como sábios.

Por isso, aqueles que são mais ávidos de fama são aqueles que mais criticam a vaidade e o desejo de fama no mundo. Também os fracos de espírito, os perdedores na vida, e não apenas os ambiciosos falam continuamente dos outros. O pobre, que gostaria de ser rico, fala do mal uso do dinheiro e da falta de virtudes dos ricos, o que leva a se encolerizar, demonstrando aos outros que vê com inveja a sorte dos mais favorecidos pela fortuna. O mesmo diz respeito aos homens que não tiveram sorte no amor: pensam apenas na labilidade das mulheres, na sua falsidade e outras acusações que se fazem às mulheres.

Controle de afetos e imagens por amor à liberdade: o ser alegre

Quem, portanto, procure controlar os seus afetos e tendências somente por amor à liberdade, êle procurará tanto quanto possível conhecer as virtudes e suas causas e encher a sua alma com alegria que resulta desse verdadeiro Conhecimento.

Ele não se ocupará com a contemplação das invirtudes humanas, as quais são procuradas com avidez pelos homens e nas quais se aprazem na aparência de uma falsa liberdade. Quem aqui se aplicar com atenção e exercitar, passará em pouco tempo a orientar as suas ações segundo os mandatos das regras da razão.

Por isso, para Espinosa nada seria mais útil do que o outro indivíduo. Uma pessoa não poderia desejar nada melhor para a conservação do seu ser do que a concórdia comum, do que uma situação na qual todos os espíritos e corpos formam um só espírito e um só corpo, no qual na medida do possível cada um mantenha o seu ser e cada um procure por si o que é que é de utilidade para todos.

A consequência última desse pensar é que os homens que se governam pela razão, ou seja, homens que procuram alcançar proveito sob a direção da razão não desejam nada para si do que também não desejam também para os outros, ou seja, que sejam justos, leais e dignos.

Estes seria mandatos da razão e contrariavam aqueles que pensavam que o princípio segundo o qual cada um devia procurar o seu proveito representaria o fundamento da falta de virtude e da má índole. Para Espinosa, dar-se-ia justamente o contrário.

Implicações: "O escopo do Estado é a Liberdade", afetos e alegria

A partir dessas considerações a expressão de Espinosa segundo a qual o "escopo do Estado é a Liberdade" assume um significado mais amplo do que aquele derivado da concepção do estado natural marcado pela luta pela sobrevivência. A garantia da Liberdade pelo Estado não se limita à manutenção do direito e da segurança, possibilitando que cada indivíduo possa agir segundo os seus interesses e alcançar os seus objetivos.

As dimensões éticas da consideração de Espinosa implicam que o Estado, para atingir o seu escopo, que é a Liberdade, deve cuidar que os homens se orientem pela razão e da manutenção de boas imagens e afetos a favor da concórdia comum e da constituição de um espírito e corpo.

Consequentemente, deduz-se dessas considerações que o Estado, para alcançar o seu escopo, precisa agir no sentido de que os cidadãos não sejam impedidos em orientar-se segundo a razão e correspondentes imagens e afetos, ou seja, deve regular e controlar agentes coibidores da liberdade, entre outros, certamente, aqueles marcados por fundamentalismo religioso.


Aspectos de discussões sob a direção de
Antonio Alexandre Bispo



Todos os direitos relativos a texto e imagens reservados. Reproduções apenas com a autorização explícita do editor.

Indicação bibliográfica para citações e referências:
Bispo, A.A."A Natureza é perfeita e divina tal como é. Liberdade, cultura de afetos e alegria na na condução da vida segundo Bento de Espinosa". Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 140/9 (2012:6). http://revista.brasil-europa.eu/140/Afetos-e-liberdade.html




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