Revista

BRASIL-EUROPA

Correspondência Euro-Brasileira©

 

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Sinagoga Portuguesa de Amsterdam. Foto A.A.Bispo 2012©

Sinagoga Portuguesa de Amsterdam. Foto A.A.Bispo 2012©

Sinagoga Portuguesa de Amsterdam. Foto A.A.Bispo 2012©

Sinagoga Portuguesa de Amsterdam. Foto A.A.Bispo 2012©

Sinagoga Portuguesa de Amsterdam. Foto A.A.Bispo 2012©

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Sinagoga Portuguesa de Amsterdam. Foto A.A.Bispo 2012©

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Sinagoga Portuguesa de Amsterdam. Foto A.A.Bispo 2012©

Sinagoga Portuguesa de Amsterdam. Foto A.A.Bispo 2012©

Fotos A.A.Bispo
Sinagoga portuguesa, Amsterdam (2012)
©Arquivo A.B.E

 

Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira 140/7 (2012:6)
Prof. Dr. A.A.Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e Conselho Científico
da
Organização de estudos de processos culturais e estudos culturais nas relações internacionais (reg. 1968)
- Academia Brasil-Europa de Ciência da Cultura e da Ciência -

e institutos integrados

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2012 by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501

Doc. N°2945





A sinagoga portuguesa de Amsterdam como monumento da liberdade de de-conversão
O papel de imagens: o modêlo do Templo de Salomão
do rabino português Jacob Judah Leon (1602-1675)

 

O principal foco de atenção dos estudos desenvolvidos nos Países Baixos em 2012 foi a Sinagoga portuguesa de Amsterdam. Conhecida como Esnoga ((אסנוגה), foi agora revisitada após a grande restauração por que passou na década de noventa e por ocasião das comemorações dos seus 325 anos no ano 2000, quando então foi relembrada a sua consagração, ocorrida no dia 2 de agosto de 1675.


Sinagoga Portuguesa de Amsterdam. Foto A.A.Bispo 2012©

Depois das destruições da Segunda Guerra, a Esnoga foi primeiramente restaurada entre 1953 e 1957. Após as renovações mais recentes, a entrada do complexo dá-se pela Casa de Mendes Coutinho, nome que lembra vulto da resistência no período nazista, quando a sinagoga foi fechada. A obra fundamental para o estudo da sinagoga é The Esnoga (...), de J. C.E.Belinfante e outros (Amsterdam: D‘Arts 1991).


Não se trata, assim, apenas de edifício histórico que dá testemunho da época já remota de um século de florescimento econômico, social e cultural dos Países Baixos, então potência comercial atuante em todo o globo e que teve um de seus pontos altos na presença holandesa no Nordeste do Brasil, mas sim de processos históricos de muitos séculos, interrompidos tragicamente com as deportações e o holocausto no século XX.


Sinagoga Portuguesa de Amsterdam. Foto A.A.Bispo 2012©
Monumento artístico-arquitetônico do mundo lusófono. Mobiliário de jacarandá do Brasil


A Esnoga, uma das construções mais significativas de Amsterdam, não é apenas monumento do patrimônio cultural dos Países Baixos (Rijksmonument), mas também edifício de relevância para a História da Arquitetura no seu todo, podendo ser considerada, em particular, como um dos maiores monumentos arquitetônicos do mundo lusófono.


De dimensões quase que catedralícias, a sinagoga assume particular interesse para estudos estilístico-culturais comparativos com a arquitetura de igrejas católicas e evangélicas. O seu arquiteto, Elias Bauman, mantinha contato estreito com círculos judaicos, entre êles das famílias Cardoso e Osório.


Sob o ponto de vista de análises arquitetônicas de orientação cultural, o edifício apresenta particular significado por testemunhar interações de concepções clássicas - orientadas segundo a tradição greco-romana - e a simbólica de fundamentação bíblica, em particular do Templo de Salomão, sobretudo através de referências numerológicas.


A sinagoga impressiona pelo seu magnífico interior, marcado pela grandiosidade do seu espaço livre, centralizado, pela magestade de suas colunas de pedra, das galerias laterais superiores destinadas às mulheres e por valioso mobiliário de jacarandá do Brasil, presenteado por Mozes Curiel.


Sinagoga Portuguesa de Amsterdam. Foto A.A.Bispo 2012©

Para além do seu significado para a História das Artes e da Arquitetura, a sinagoga salienta-se pelo histórico-cultural como símbolo da sobrevivência e da recuperação cultural dos judeus expulsos da Península Ibérica.


Sinagoga Portuguesa de Amsterdam. Foto A.A.Bispo 2012©

Marco da recuperação de cultura oprimida e reconstrução cultural sefardita


A Esnoga é a principal expressão da consciência cultural e religiosa readquirida pela comunidade sefardita de Amsterdam em período marcado pela prosperidade resultante de elos comerciais com muitas regiões do globo, dos quais o Brasil havia constituído importante momento, constituindo o centro de uma comunidade que ultrapassava fronteiras e oceanos.


Para todo o mundo da diáspora judaica de língua ou ascendência portuguesa, a Esnoga de Amsterdam representou centro e eixo.


Essa posição focal da sinagoga portuguesa de Amsterdam na rêde transcontinental foi baseada no comércio mas, ao mesmo tempo, resultado e meio de processos de reedificação de um universo cultural abalado e submerso pelas perseguições e pelas coagidas conversões ao Cristianismo na Península ibérica.


A sinagoga surge como um testemunho de re-conversão, de resgate de memória e de reconstrução cultural de ex-"cristãos novos", assumindo, assim, um significado singular para a História das Religiões por documentar complexos processos de interações religiosas, missionações e de-missionações, conversões e re-conversões.


Modêlo de sinagogas sefarditas no mundo


O papel simbólico da sinagoga portuguesa de Amsterdam no contexto global da cultura judaica lusófona ou de ascendência ibérica evidencia-se pelo fato de ter-se tornado modêlo para várias outras dos sefarditas na Europa e fora dela.


Uma orientação segundo a Esnoga de Amsterdam tem sido constatada em várias sinagogas edificadas após algumas décadas da sua consagração, demonstrando a difusão do modêlo e marcando a arquitetura religiosa sefardita do século XVIII, entre elas em Livorno, cuja sinagoga foi construída ao redor de 1700, em Londres, cuja mais antiga sinagoga sefardita, a de Bevis Marks, data de 1701.


No continente americano, o modêlo de Amsterdam orientou a construção da sinagoga de Willemstad em Curação, de 1732, monumento da cultura judaico-portuguesa nas Antilhas, aquela de Paramaribo, no Suriname, de 1737, e da mais antiga sinagoga sefardita dos Estados Unidos, a de Newport, em Rhode Island, de 1759.


Lembrando-se que o desenvolvimento das comunidades judaico-lusófonas no Suriname, com as suas extensões ao Caribe e aos Estados Unidos foi impulsionado pela emigração de judeus do Nordeste do Brasil holandês após a sua retomada pelos portugueses, vêm à consciência do pesquisador os elos interno-americanos na rêde geral da cultura sefardita orientada segundo o modêlo de Amsterdam.


Se na História da Arquitetura de orientação teórico-cultural tem-se salientado a função do modêlo da Basílica de São Pedro no movimento católico restaurador e historicista do século XIX, com as suas implicações políticas que também se fizeram sentir nos países americanos (Veja e.o. http://www.revista.brasil-europa.eu/128/Ultramontanismo-e-arquitetura.html), não se pode esquecer que a sinagoga portuguesa de Amsterdam também serviu de modêlo a construções muito posteriores àquelas do século de sua ereção, como documenta a sinagoga Shearith Israel em New York, de 1897.


Não se trata, assim, em todas essas construções, apenas de cópias ou emulações em contextos estranhos de um edifício europeu. O reconhecimento do seu significado exige que sejam consideradas nas suas inserções em processos culturais amplos, estreitamente relacionados com restaurações, recuperações, reconstruções, com reatamentos de elos históricos e com a questão do modêlo e do modelar. Nesses intentos reedificadores, a consideração de fontes e os estudos de textos surge como de fundamental importância, e, com êles, o da erudição e do ensino.


A sinagoga portuguesa de Amsterdam adquire também sob este aspecto de cultura de fontes, de erudição e de ensino extraordinário significado por abrigar no seu complexo a Biblioteca Ets Haim, a mais antiga biblioteca judaica ainda em funcionamento do mundo. (Veja http://revista.brasil-europa.eu/140/Biblioteca-sefardita.html)


Trata-se, assim, quanto à Esnoga, de um monumento arquitetônico que é ao mesmo tempo um monumento da história do ensino e da educação, relações que apenas podem ser compreendidas e estudadas a partir de uma perspectiva que focaliza os processos culturais por que passaram os sefarditas fugidos da Península Ibérica e que se reorganizaram, reconstruiram a sua cultura nos Países Baixos.


O modêlo dos modêlos: o Templo de Salomão na teoria da arquitetura ibérica


A construção da sinagoga da comunidade judaico lusófona de Amsterdam foi necessariamente fundamentada quanto às suas concepções. Para isso, tornou-se necessário tanto considerar as obras contemporâneas de arquitetura que se referiam a dados do Velho Testamento como a própria tradição judaica de interpretação das fontes bíblicas.


O projeto da sinagoga portuguesa de Amsterdam inseriu-se numa amplo contexto de interesses que despertava o Templo de Jerusalém, o primeiro de pedra, modêlo ditado diretamente por Deus.


Tendo sido o Templo destruído várias vezes, por último no ano 70 D.C., o conhecimento desse paradigma do edifício sacro apenas podia partir do estudo de fontes velho-testamentárias, a saber dos dados transmitidos no Livro I dos Reis, do II das Crônicas e no livro do profeta Ezequiel (Ez 40-44), aqui em visão de um edifício de complexas estruturas em grande areal, regidas por princípios numérico-geométricos.


Esses dados bíblicos passaram a ser estudados com renovada intensidade no século XVI, destacando-se aqui eruditos que, na Espanha, procuravam fundamentos para uma arquitetura cristã em Estado cristão.


O bibliotecário do Escorial, Benito Arias Montano, dedicando-se a esses estudos, publicou uma obra manifestando a opinião que os dados da visão de Ezequiel seriam apenas especulativos.  Os jesuítas espanhóis Jerônimo del Prado e Juan Bautista Villalpando tomaram uma outra posição, elaborando um comentário em Ezequiel em três volumes, dedicado a Felipe II (1527-1598), desde 1580 também rei de Portugal (Ezechielem Explanationes, Roma 1596, 1604) e no qual a área do templo, seus edifícios e mobiliário são descritos.


Sinagoga Portuguesa de Amsterdam. Foto A.A.Bispo 2012©
Nessa obra, incluiu-se uma ilustração com a reconstrução do Templo. O complexo caracterizava-se por uma área quadrangular externa e, no interior, por uma ordenação em 9 espaços, dois deles reunidos para o Santíssimo e seu átrio, com série de colunas. O conjunto, simétrico, caracterizava-se por 7 áreas quadradas, com o templo propriamente dito, tendo à frente o altar. Simbolicamente, a disposição representava as 12 tribos de Israel ao redor da Arca da Aliança, de modo que o conjunto correspondia a Israel na sua compleição como povo. 


Esse interesse pelo Templo segundo dados velho-testamentários por parte de um Jesuíta na católica Espanha - em reinado tão fundamentalmente marcado pelo Catolicismo de um rei que se considerava como "novo Salomão" - não podia significar apenas um intento de reconstrução do Templo do passado judaico.


O intento de Jerónimo del Prado e Juan Bautista Villalpando pode ser apenas compreendido adequadamente a partir de concepções teológicas da época da Contra-Reforma na tradição da antiga hermenêutica e conhecida em especial de concepções e procedimentos dos Jesuítas.


A reconstrução do Templo apenas faz sentido, na visão cristã, como Tipo de espaço sagrado, do qual se levanta, em relações de tensão, o Anti-Tipo, e que representa o verdadeiro referencial. Consequentemente, o Tipo, correspondendo ao Velho, tanto bíblico como não-bíblico da Antiguidade Clássica, permitia o relacionamento dos dados relativos ao Templo com aqueles da teoria arquitetônica da Antiguidade greco-romana, em especial daquela da obra clássica de Vetrúvio.


Sem a consideração desse sistema de concepções não se pode justificar harmonizações de dados do Antigo Testamento com aquelas da tradição clássica, assim como dos estudos bíblicos da visão de Ezequial na perspectiva teológico-católica com o Humanismo.


Com base nesse sistema tornou-se possível relacionar concepções relativas a proporções musicais na arquitetura e imagens antropométricas, assim como ordens clássicas de colunas e capitéis com ordenações provindas Deus, emprestando-lhes assim fundamentos divinos.


Somente este sistema teológico, com as suas referências ao mundo natural, pode justificar as referências a elementos da matéria e a planetas na reconstrução do Templo de Villalpando.


A reconstrução ilustrada do Templo tinha aqui um sentido educativo, servindo à exegese bíblica. Seria a partir dessas relações entre o Templo e o referencial anti-tipico do Cristianismo é que se deveria analisar mais diferenciadamente as similaridades entre as reconstruções jesuíticas e o Palácio do El Escorial, construído na mesma época.



O rabino português Jacob Judah Leon (1602-1675) e o modêlo do Templo de Salomão


Uma personalidade que exemplifica a interação do arquitetônico com o educativo no processo de resgate cultural judaico e de formação da comunidade sefárdico-portuguesa de Amsterdam é a do "marrão" Jacob Judah Leon (Jacob Jehuda Leon).



Nascido nas proximidades de Coimbra, filho de Abraham de Leão e de Felipa de Fonseca, veio para Amsterdam fugido com a sua família por Sevilha e pela França em 1605. Em Amsterdam, estudou com o poeta e erudito Isaac Uziel, nascido em Fez (+1622). Tornou-se rabino e mestre-escola, atuando em várias comunidades. Após ter estado em Hamburgo em 1628/29, atuou em Amsterdam, entre 1635 a 1639 e, a partir de 1640, em Middelburg, na província Zeeland.


Jacob Judah Leon colaborou com o teólogo e erudito hebraísta Adam Boreel (1603-1667), com o qual conviveu em Middelburg. Boreel foi ordenado pela Igreja Reformada Holandesa, da qual porém se afastou e que entrou na história cultural como um dos fundadores do Colégio de Amsterdam, ao qual aproximou-se, entre outros, Baruch Spinoza (Veja http://revista.brasil-europa.eu/140/Bento-de-Espinosa.html).


Mesmo que em princípio esses estudiosos holandeses e ingleses se interessassem pela cultura judaica ainda no intuito de procura de caminhos adequados à conversão de judeus ao Cristianismo, fundamentaram um amplo interesse pelos estudos judaicos e pela procura em reconciliar dados das Escrituras com conhecimentos científicos.


Nesse sentido, para considerar a tradição de pensamento judaico, Boreel chegou a aprender português e espanhol com Jacob Judah Leon. Importante fase da história das interações culturais entre o Judaísmo e o Cristianismo e da história do pensamento religioso nos Países Baixos processou-se, assim, em português.


Essas tendências à erudição levaram à tradução do Novo Testamento para o hebraico, com o objetivo de dá-lo a conhecer aos judeus e auxiliar na conversão, mas também a do Mischna para o latim e para o espanhol, aqui em versão vocalizada para uma melhor compreensão. Para a publicação do Mischna em latim, realizada apenas em 1698, foram utilizadas ilustrações de Jacob Judah Leon, ou por êle colecionadas, colocadas à disposição pelo seu filho.


Nesses círculos liderados por Adam Boreel e por Jacob Judah Leon onde cultivava-se um projeto de ereção de um colégio para estudos judaicos, a reconstrução do Templo de Salomão surgiu como importante tarefa.


Se Villalpando havia realizado uma reconstrução do templo em desenho, nos Países Baixos foi tentado a sua reconstrução tridimensional em madeira. Financiado por Boreel, Jacob Judah Leon deu início à feitura do modêlo, sendo os trabalhos acompanhados de perto por Boreel, pelo pregador Willem Apollonius e por Willem Goeree.



A principal fonte para o modêlo foi a obra de Juan Bautista Villalpando, completada com os conhecimentos da literatura judaica possibilitados por Jacob Judah Leon, em particular dos dados contidos no Mischna e no Talmud. O modêlo, de madeira, demonstrava o templo e edifícios circunvizinhos da área, assim como o da montanha fortificada sobre a qual o templo se elevava.


Acompanhando o modêlo, Jacob Judah Leon publicou uma descrição do Templo em 1642, em várias línguas, dedicando-a aos eruditos da província de Zeeland e a cidade de Middelburg. O desenhista Pieter Willemsz, perito em representações em perspectiva, preparou as gravuras, sendo estas vendidas separadamente à obra. (De templo Hierosolymitano, libri IV, Helmstedt, 1665)


Na década de 40 do século XVII, quando Jacob Judah Leon atuava como professor na escola da comunidade sefardita de Amsterdam, o modêlo, apresentado na sua casa, tornou-se uma das atrações da cidade, sendo visitado também por cristãos e estrangeiros. A êle acrescentou-se, em 1646, um modêlo da Tenda, assim como réplicas de objetos do Templo. Jacob Judah Leon passou a escrever também obras em espanhol sobre a tenda, a Arca da Aliança e os Querubins.


Como autor, cumpre mencionar que, em 1671, Leon publicou uma tradução de salmos (Qodesh hilulim: Las alabanças de santidad, traducion de los Psalmos de David, por la misma phrasis y palabras del Hebrayco Amsterdam: 5431 [1671]. Ao lado do texto hebraico, Leon oferece uma tradição em espanhol, assim como uma parafrase em prosa. O livro é dedicado a Isaak Senior Teixeira, banqueiro e agente da rainha Christina da Suécia em Hamburgo, cidade que abrigava importante comunidade sefarda. A Leon são atribuidas obras de cunho crítico relativamente ao Cristianismo, sobretudo o Colloquium middelburgense, um diálogo entre um rabino e um cristão, em latim. Obras críticas do Cristianismo serviam, na época, ao fortalecimento da de-conversão de conversos judeus.


O modêlo do Templo de Jacob Judah Leon alcançou o seu maior significado na Inglaterra. Em 1645 publicou-se uma tradução em inglês de escritos de Leon, dedicada ao rio Charles II (1630-1685). Após a morte de sua esposa, ocorrida em Londres, em 1675, o modêlo do Templo passou à família De Castro, aparentados de Jacob Judah Leon. Estes realizaram uma nova edição da tradução inglêsa de seus escritos. O nome desse rabino e mestre-escola ficou tão marcado pelo seus estudos do Templo de Salomão e pelo seu modêlo que passou até mesmo a ser assim cognominado pelos seus sucessores, tornando-se sobrenome (Jacob Judah Leon Templo).


O Modêlo do Templo e a sinagoga portuguesa de Amsterdam


O modêlo artesanal do Templo de Salomão de Jacob Judah Leon pode ser visto aqui como um documento que testemunha uma fase, particularmente importante, a da representação tridimensional de uma história da reconstrução de dados e visões fundamentadas nas Escrituras.


Sem representar maquete de projeto determinado, o modêlo do Templo de Salomão teria exercido a função modêlo ideal, do geral que teria as suas individuações em edifícios determinados. Na disposição geral, com átrio, espaço central e relicário da Tora, a sinagoga corresponde em linhas gerais à do Templo.


Há, porém, um aspecto que merece particular atenção na apreciação teórico-cultural da sinagoga portuguesa de Amsterdam: a da utilização de elementos da linguagem arquitetônica da tradição clássica.


Essas referências expressam-se da forma mais evidente nos capitéis das grandes colunas de pedra e na configuração clássica da parede frontal de madeira da parte oriental, e que sugere a arquitetura de templos da Antiguidade Clássica.


Essa harmonização de elementos da tradição bíblica e da tradição greco-romana fundamentada sobretudo em Vitrúvio era conhecida da obra reconstrutiva do Templo dos jesuítas espanhóis, sendo compreendida neste contexto a partir das características de interpretação teológica que estabeleciam correspondência entre o Homem Velho do Antigo Testamento e aquele da Antiguidade não-bíblica.


A recepção da obra de Villalpando em contexto judaico levanta assim complexas questões de coerência. Os judeus portugueses, utilizando-se na sua sinagoga elementos que a referenciam a antigos templos, colocam-se assim ao lado de povos não-israelitas da Antiguidade.


Teriam êles aqui internalizado de tal forma perspectivas cristãs da visão do mundo e da história que não teriam percebido os problemas daqui decorrentes? Ou denotam essa valorização da antiga cultura greco-romana a um direcionamento humanístico no próprio Judaísmo português correspondente à relevância da filosofia e da cultura helênica em pensadores judaicos do passado?


Grupo de estudos sob a direção de
Antonio Alexandre Bispo




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Indicação bibliográfica para citações e referências:

Bispo, A.A."A sinagoga portuguesa de Amsterdam como monumento da liberdade de de-conversão
O papel de imagens: o modêlo do Templo de Salomão do rabino português Jacob Judah Leon (1602-1675)
". Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 140/7 (2012:6). http://revista.brasil-europa.eu/140/Sinagoga-de-Amsterdam.html



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