Revista

BRASIL-EUROPA

Correspondência Euro-Brasileira©

 

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Fotos do texto de Reinhold Ortmann

Fotos do texto de Reinhold Ortmann




 

Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira 141/2 (2013:1)
Prof. Dr. A.A.Bispo, Universidade de Colonia
Dr. H. Hülskath e Comissão especializada

Organização de estudos de processos culturais em relações internacionais (reg. 1968)
- Academia Brasil-Europa -
e institutos integrados


© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2013 by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501

Doc. N° 2954





Há 100 anos - A viagem da Marinha de Guerra do Império Alemão ao Atlântico e Pacífico
como marco final de uma era de uma era
em anos de simpatia pelo militarismo alemão do Marechal Hermes da Fonseca (1855-1923)

Alemanha-Brasil
Diálogos de Berlin-Charlottenburg pelos 30 anos do simpósio euro-brasileiro de renovação dos estudos da emigração alemã ás Américas
no ano da
Cumbre Unión Europea-CELAC 2013

 

Estando no ano de 2013 elos entre a Alemanha e o Brasil no centro das atenções de estudos culturais euro-brasileiros, cumpre considerar a própria história de celebrações comemorativas desses laços. (http://revista.brasil-europa.eu/141/Brasil-Alemanha-2013.html)

As comemorações atuais não apenas se inserem em contexto político-cultural do presente, podendo ser analisadas a partir de desenvolvimentos e iniciativas das últimas décadas, de objetivos, interesses e motivos de determinadas instituições e grupos, como também em panorama histórico mais amplo e no qual atos comemorativos constituiram marcos.

As comemorações das relações Alemanha/Brasil e Brasil/Alemanha de 2013 - justificadas em primeiro lugar pela passagem dos 30 anos do primeiro simpósio internacional para a renovaçnao dos estudos da emigração alemã às Américas - não são as primeiras e, como as anteriores, devem constituir elas próprias alvo de estudos e análises de rêdes nelas implicadas.

Sob uma perspectiva dirigida a processos, as comemorações assumem significado não tanto pelos seus programas, projetos, exposições e concertos, ou seja, como sujeitos e agentes, mas sim como objetos que merecem ser analisados nos seus pressupostos, motivos, finalidades explícitas e implícitas, assim como nas suas inserções político-culturais e em grupos.

Recepção de divisão de naves de guerra alemãs como encerramento da época guilhermina

Uma atenção especial merece nesse sentido atos que celebraram os laços entre a Alemanha e o Brasil realizados no Rio de Janeiro e em Santos poucos meses antes da eclosão da Primeira Guerra Mundial.

Essas manifestações de amizade, simpatia e cooperação entre ambos os países de então foram as últimas da época guilhermina, sendo seguidas, com a cisão determinada pela Guerra, por muitos anos marcados por um esfriamento de relações, com sérias implicações, tanto para os alemães e seus descendentes no Brasil como para as relações entre a Alemanha e o Brasil no seu todo. Essas manifestações por parte da colonia alemã na capital do Brasil explica-se em parte pela proteção que os alemães no Exterior viam na Marinha alemã.

Consideradas à distância de um século, os atos festivos que cairam no início do ano em que a Guerra eclodiu surgem com conotações simbólicas, marcando o ápice de um desenvolvimento de décadas marcado pelo crescimento e pela prosperidade das colonias alemãs no sul do Brasil e pelo poder econômico, cultural e prestígio social de círculos alemães nas grandes cidades, em particular no Rio de Janeiro.

Relembrá-los significa considerar o fecho de uma época passada e submersa da história das relações, aquela determinada do lado alemão por um Império inserido em complexos processos político-culturais de unificação do século XIX, imbuído de espírito imperial fundamentado na vitória na Guerra Franco-Prussiana de 1870/1871, de consciência de seu poderio e grandeza justificada pelo extraordinário florescimento técnico, científico e cultural .

O Império alemão que visitou e que foi recebido pelo Brasil nos últimos meses de paz de 1914 encontrava-se, apesar de tensões internas, no apogeu de um longo período de engrandecimento, múltiplos progressos, sucessos coloniais e fortalecimento militar, em particular naval. É particularmente significativo, assim, que os atos festivos de então ocorressem sob signo da Marinha, o grande cuidado e motivo de orgulho da época de Guilherme II°. O Brasil recebeu a visita da Alemanha em 1914 através daquilo que mais representava a sua potência, a sua força naval. (http://www.revista.brasil-europa.eu/122/Doorn.html)

Os acontecimentos bélicos que se desencadearam após alguns meses dessa visita ofuscaram o brilho dos atos, tornaram-nos até mesmo desagradavelmente sensíveis, levando a um silenciamento que explica terem sido esquecidos nos estudos histórico-culturais referentes a relações internacionais.

Na Alemanha, porém, essa recepção festiva de 1914 no Brasil permaneceu ainda viva por alguns anos, mantendo-se na memória como lembrança de uma época promissora que se tornava cada vez mais afastada com o decorrer trágico da Guerra.

Reinhold Ortmann (1859-1929) sôbre a recepçnao no "mais belo porto do mundo" (1916)

Fotos do texto de Reinhold Ortmann
Essa situação pode ser constatada em matéria publicada em 1916 numa das edições de série então altamente divulgada da "Biblioteca do Passatempo e do Saber". (Reinhold Ortmann, "Der schönste Hafen der Welt", Bibliothek der Unterhaltung und des Wissens 13, Stuttgart, Berlin, Leipzig, Wien 1916, 120-132)

O autor desse texto, Reinhold Ortmann, nascido em Berlim, era um escritor, autor de novelas, romances e livros históricos de divulgação popular, de renome pela passagem do século. Entre êles, (Kommödianten, Mannheim: Bensheimer 1893; Ein Geständnis, Berlin: Albert von Goldschmidt, 1899; Das Recht auf Freiheit, Berlin: Carl Duncker, 1900; Der Schlangenring - In Sicherheit - die rechte Hand, Berlin: A. Goldschmidt 1909; ). Publicou, em 1912, um de seus mais conhecidos livros, uma biografia romanceada sôbre Catarina II (Katharina II als Großfürstin und Kaiserin von Rußland. Denkwürdigkeiten der Gräfin Korowin, geb. Denissow, Berlin: Weichert 1912).

Esquecido, Reinhold Ortmann foi recentemente relembrado através de uma reedição (Fünfzig Jahre eines deutschen Theater-Direktors. Erinnerungen, Skizzen und Biographien aus der Geschichte des Hamburger Thalia-Theaters, Hamburg: von Richter 1881; Nabu Press 2010;


Se o título desse texto - "O mais belo porto do mundo" - revela a nostalgia da impressão deixada pelo Rio de Janeiro em participantes da visita alemã ao Brasil, o escopo do autor manifesta-se na questão que levanta e que encerra o artigo: "Quando é que haverá novamente uma tal recepção amiga a navios de guerra alemães no porto mais belo do mundo?" (op.cit. 132)

A viagem atlântico-pacífica das naves Straßburg, Kaiser e König Albert

O Brasil foi visitado por uma esquadra em "Detachierte Division" formada pelas naves de combate SMS Kaiser, grande nave porta-bandeira, e a sua nave irmã SMS König Albert, assim como pelo pequeno cruzador Straßburg.

O navio SMS Kaiser era a nave-modêlo de uma série de cinco grandes navios de combate da Marinha Alemã. Fora construído para substituir o navio blindado costeiro SMS Hildebrand nos estaleiros imperiais de Kiel, sendo lançado ao mar em 1911 e iniciado o seu serviço no dia 1 de agosto de 1912. Na Primeira Guerra, desempenharia importante papel como parte de frotas de alto mar, participando da batalha Skagerrak de 1916, da tomada das ilhas bálticas em 1917, e em Helgoland. Em 1919, seria afundado para evitar que fosse tomado pelos vencedores da Guerra.

O Straßburg, um pequeno cruzador, foi incorporado em dezembro de 1912 às naves de esclarecimento da Marinha de Guerra como substituto do SMS Berlin. Em 1913, antes de vir ao Brasil, tomou parte da divisão do Mediterrâneo.

A participação do Straßburg na viagem ao Atlântico Sul e ao Pacífico distinguiu-se daquela das outras naves por ter delas se separado em Santos na viagem de retorno, seguindo para a Estação Americana no Caribe, região então marcada por agitações na República Dominicana. Retornou de Saint Thomas em julho de 1914, ancorando em Horta nos Açores, de onde, já após a mobilização na Alemanha a 1 de agosto, retornou a Wilhelmshaven.

Finalidades da viagem dos navios de guerra alemães ao Atlântico Sul e ao Pacífico

A viagem da Divisão tinha oficialmente uma finalidade técnica, a de testar a resistência de turbinas sob ação contínua no Atlântico. Em situação de Guerra, esse teste teria sido mais difícil de ser realizado devido à necessidade de abastecimento no seu trajeto. Nesse sentido, o empreendimento decorreu com grande sucesso, pois foram percorridas mais de 20.000 milhas marítimas entre o 9 de dezembro de 1913 e o 17 de junho de 1914.

Havia também outros objetivos, talvez até mesmo os principais, entre êles o de formação de oficiais da marinha e o estabelecimento ou a intensificação de contatos com colonias alemãs na África e com círculos alemães nos países sul-americanos. Também tinha certamente o intuito de representação e demonstração de potência, uma vez que a esquadra incluia dois dos mais modernos navios de alto mar do Império alemão.

O principal nome relacionado com a viagem da divisão alemã ao Brasil é o do Admiral Hubert von Rebeur Paschwitz (1863-1933). Como Diretor da Academia da Marinha, era responsável pela formação de oficiais da Marinha Alemã e foi nessa função que dirigiu a viagem ao Atlântico Sul e Pacífico.

Via a realização de viagens como como altamente vantajosa para a Marinha e para formação de oficiais, mesmo que as mesmas não tivessem imediata função militar. Empenhou-se nesse sentido junto a Guilherme II°, enviando-lhe regularmente relatos dos portos visitados e das impressões ganhas nos diferentes países. Na Primeira Guerra, atuou como comandante da divisão do Mediterrâneo a partir de 1917 e das frotas osmânica e búlgara.

O Kaiser era comandado por Adolf Lebrecht von Trotha (1868-1940), oficial que exerceu altas posições de comando a frota de alto-mar durante a Primeira Guerra e em períodos posteriores, também da época nacionalsocialista. Ainda em 1934, escreveu um livro sobre "a unidade da germanidade e o oceano" (Die Einheit des Deutschtums und das Weltmeer, Leipzig: Armanen 1934).

"Unidade da germanidade": colonias na África e círculos alemães no Brasil, Argentina e Chile

A rota da Divisão naval previa a descida da costa ocidental da África. Pensava-se inicialmente chegar até à Cidade do Cabo, projeto logo abandonado devido a tensões políticas.

Saindo da Alemanha, os navios passaram pelas Ilhas Canárias e por Serra Leoa, atingindo Lomé, no Togo alemão, no dia 29 de dezembro. Partindo dali no dia 31 de dezembro, as naves chegaram no dia 2 de janeiro à região então também alemã dos Camarões, com escalas em Victoria e Duala. Ali encontraram-se com as naves da Estação da África Ocidental, as canhoneiras SMS Panther e SMS Eber.

Partindo no dia 15 de janeiro, atingiram Swakopmund no dia 21 e Lüderitzbucht no dia 22 de janeiro, portos da África Alemã do Sudoeste (Namíbia). Saindo de Lüderitzbucht, a esquadra atravessou o Atlântico passando por Santa Helena no dia 2 de fevereiro. Alcançou o Rio de Janeiro no dia 15 de fevereiro, onde permaneceu até o dia 25 de fevereiro.

Do Brasil, as naves seguiram para o Mar del Plata. Ali permaneceram o SMS Kaiser e SMS König Albert, dirigindo-se apenas o cruzador Straßburg para Buenos Aires. Por motivo do adoecimento do seu comandante, Hubert von Rebeur Paschwitz, o comando geral foi assumido temporariamente por Adolf von Trotha. Este dirigiu o SMS Kaiser e o SMS König Albert a Montevideo, onde prestou uma visita ao presidente do Uruguai. Chegando de Buenos Aires o cruzador Straßburg, Rebeur Pasteur assumiu novamente o comando da Diivisão. As naves prosseguiram a viagem ao Estreito de Magalhães, dobrando o continente pelo sul e subindo pela costa chilena até Valparaíso, onde permaneceram de 2 a 11 de abril.

Retornando, as naves pararam em diversos portos, entre êles Bahia Blanca, onde estiveram de 25 a 28 de abril, atingindo por fim Santos. No porto paulista, a esquadra manteve-se por vários dias, de 7 a 12 de maio, ali procedendo-se então à modificação de planos que levou à separação do Straßburg, enviado à República Dominicana. Novamente no Rio de Janeiro, as naves Kaiser e König Albert abandonaram a capital brasileira no dia 16 de maio, dirigindo-se às ilhas do Cabo Verde e à Madeira. Após passar por Vigo, chegaram à Alemanha no dia 17 de junho.

Correção da imagem negativa do Rio de Janeiro e o plano da nova capital no Planalto

O texto de Reinhold Ortmann inicia considerando que o Rio de Janeiro não gozava na Europa de um bom renome, por diversas razões. A principal delas residia nas suas condições climáticas e sanitárias, o que fazia que uma estadia mais prolongada no Rio se tornasse desagradável e riscante. Desde que a febre marela fora trazida das Índias Ocidentais em 1849, nunca havia sido possível ser exterminada; além da febre, a população padecia também com outras doenças graves, entre elas a malária, a elefantiasis e a lepra. Assim, era compreensível que o antigo plano de transferência da capital para o planalto de Goiás, mais saudável, fosse sempre discutido, aproximando-se então a sua realização com a decisão de abrir-se um concurso público pela Câmara.

Também a insegurança da situação política podia ser sentida de forma desconfortante. Mas, por outro lado, devia-se fazer a justiça de registrar que não se tinham concretizado as péssimas profecias daqueles que, por conhecimento da história e das forças internas do Estado e do povo do Brasil, desconfiavam do seu futuro. Na época podia-se constatar desenvolvimentos satisfatórios em vários sentidos.


Significado do Centenário da Abertura dos Portos de 1908

A seguir, o autor salienta o significado das comemorações do Centenário da Abertura dos Portos de 1908. A exposição nacional então realizada ofereceu um panorama surpreendente do crescimento da força produtiva do país. Já acalentava-se então o projeto de convidar-se todas as nações do globo para uma exposição mundial no Rio de Janeiro por ocasião do centenário da Independência em 1922. A livre navegação possibilitada pela abertura dos portos preparara a independência e possibilitara o progresso no século XIX e esse desenvolvimento devia ser refletido no conjunto das comemorações de centenários no século XX. Para os alemães, nada poderia ser mais simpático do que o tema do livre trânsito, da abertura de portos, do livre comércio e da queda de barreiras protecionistas.

Ainda que deixando entrever no seu texto uma falta de simpatia pelo regime republicano que substituira a monarquia brasileira e levara ao exílio de Pedro II°, internacionalmente acatado, R. Ortmann reconhece que se poderiam constatar progressos no Brasil. Desde 1889 o país tinha sido governado "com sorte cambiável de acordo com uma constituição republicana, naturalmente adaptada às necessidades e aos costumes sul-americanos", onde a dignidade presidencial constituia o sonho mais ardentemente acalentado de todo político ambicioso.Quase que como um símbolo, o ex-palácio imperial da Boa Vista, com o seu magnífico parque em São Cristóvão tinha sido agora transformado em museu.

Entre os sinais de progresso, Ortmann salientou o aumento da rêde ferroviária, ainda que lento. Dos 14,5 quilômentros da primeira ferrovia de 1854, o Brasil possuia já 23.000 quilômetros. Havia, porém, ainda uma série de Estados sem estradas de ferro, como Piauí, Sergipe, Goiás e Mato Grosso.

Militarismo guilhermino e simpatia pela Alemanha sob Hermes da Fonseca (1855-1923)

Ortmann menciona que sob a presidência do Marechal Hermes da Fonseca (1910-1914), renovador do exército brasileiro, registrava-se uma gratificante corrente de simpatia para com a Alemanha. A razão dessa simpatia residia nas viagens do presidente à Europa. Em 1908, havia assistido a manobras militares a convite de Guilherme II°.

O texto de Ortmann sugere, nesse sentido, uma repercussão das impressões do militarismo alemão no presidente brasileiro e que ficaram associados com a imagem e as atividades do sobrinho do proclamador da República. Ortmann salienta, porém, que, com a eclosão da Guerra e a propaganda inimiga, a simpatia pela Alemanha dera lugar a grande antipatia, e somente vitórias alemãs poderiam fazer com que a situação se modificasse.

Impressões do Rio de Janeiro à época da visita dos navios de guerra alemães

Descrevendo a cidade aos leitores alemães, Ortmann menciona que o Rio, formado pelo centro velho, pela cidade norte e pelos bairros periféricos, não possuia em geral edificações significativas. As casas, muitas em granito, não apresentavam ornamentos, eram pequenas e insignificantes, e mesmo as igrejas, com poucas exceções, ficavam em beleza arquitetônica muito atrás daquelas de outras cidades americanas.

Toda a vida comercial decorria na cidade velha. Ali encontravam-se a alfândega com as docas, a bolsa e o correio central. Todas as firmas comerciais mais importantes tinham as suas casas e escritórios no centro. O palácio da cidade do Império abrigava agora o serviço de telégrafos e o ministério da instrução.

Na cidade nova, arquitetonicamente pouco interessante, localizavam-se o palácio do Senado, a Câmara Municipal, o Museu Nacional, o Teatro Municipal e a Estação.

Entre os grandes melhoramentos da cidade, o autor salientou o término dos trabalhos de canalização, a boa qualidade de água e a ampla rêde de linhas de bondes, o que possibilitava um tráfego confortável até os mais distantes bairros. Também os bombeiros e a polícia correspondiam às necessidades elementares.

Não a cidade é bela, mas sim o porto do Rio de Janeiro é o mais belo do mundo

Diferentemente da descrição sóbria da cidade do Rio de Janeiro, Ortmann não mede palavras para exaltar as qualidades e a beleza do seu porto. Essa diferença na apreciação do Rio de Janeiro é significativa, pois indica a percepção dos muitos estrangeiros que chegam pelo mar e que, após extasiarem-se com a entrada, decepcionam-se com a cidade,

"A beleza e o orgulho do Rio é porém o seu porto, que, de fato, sem exagêro, pode ser designado como o mais belo do mundo. Uma entrada de 1600 metros de largura passa entre o Pão de Açúcar, de 387 metros de altura, cuja forma característica mostra-se claramente nas fotografias, e o Pico de 228 metros de altura, levando à Baía do Rio de Janeiro, emoldurada magnificamente, rica em ilhas, cujo panorama permanece inesquecível a todo o viajante. Ela oferece aos navios que ali ancoram um refúgio absolutamente seguro, pois ali não entram os temporais do oceano atlântico, e os ventos do noroeste, os Terraes altos, que podem alcancar perigosa intensidade, são muito raros. O tráfego marítimo nesse maravilhoso porto é cassim também muito considerável e aumenta cada vez mais. A entrada e a saída de veículos supera de muito os outros locais portuários brasileiros e atinge mais recentemente mais do que 1400 navios por ano.

Uma influência muito favorável no desenvolvimento da navegação exercem as contínuas melhorias das instalações portuárias, para as quais o Estado dispende grandes quantias na consciência certa da sua importância. No ano de 1910 inauguraram-se as novas instalações do cais. No fim desse ano tinha um comprimento total de 2976 metros, e a sua ampliação teve prosseguimento desde então. Para satisfazer uma necessidade intensamente vivida, o Lloyd Brazileiro, a maior sociedade de navegaçnao brasileira, encomendou a uma firma norteamericana nos últimos anos de construir uma grandiosa oficina de reparação de navios.

O Rio de Janeiro como porto de guerra e as suas instalações de defesa

No caso de um texto referente a um empreendimento da marinha de guerra, compreende-se que a sua atenção se dirige prioritariamente às condições de segurança oferecidas pelo porto, unindo-se aqui o belo ao bom nas suas qualidades.

Como o Rio de Janeiro é ao mesmo tempo o porto de guerra mais importante dos Estados Unidos do Brasil, êle também tem instalações de defesa. A entrada é protegida lateralmente à altura do Pão de Açúcar pelos fortes São João e Theodosio, e no Pico pelo forte Santa Cruz. Um outro forte encontra-se numa pequena ilha rochosa próxima da entrada, e a ilha Villegaignon também apresenta fortes instalações de defesa. Uma ou mais baterias encontram-se na Ilha das Enchadas e na Ilha das Cobras, situada imediatamente à frente do Rio. Aqui encontra-se também o grande arsenal marítimo com docas e depósitos. O quartel da alfândega levanta-se na vizinha ilhazinha Fiscal. A maior das ilhas dispersas na Baía é a Ilha do Governador.

A frota de guerra dos Estados Unidos do Brasil era até o ano de 1907 bastante insatisfatório. Contava-se em 1906 73 veículos com 449 canhões, entre êles 11 navios blindados com 176 canhões; mas tratava-se na sua maioria de navios velhos, que não satisfaziam necessidades de guerra da atualidade. Tendo em vista a grande fronteira marítima e a posição sem defesa, sentiu-se a necessidade de suprir essa insuficiência das forças marítimas através da construção de navios de guerra que correspondemàs exigências de momento.

Recepção das naves de guerra alemãs e comemorações

Em várias fotografias que ilustram o texto registram-se de diferentes ângulos as naves alemãs na baía, emolduradas pela paisagem.

Ortmann salienta - sem entrar porem em pormenores - as festividades realizadas pela comunidade alemã do Rio de Janeiro nos dias de permanência das naves no porto do Rio. Nele entrando, foram recebidas por barcaças fretadas pelos círculos alemães, que levaram as principais personalidades da comunidade ao SMS Kaiser, onde foram recebidas com manifestações de entusiasmo.


Significativo é o fato de Ortmann salientar o bom recebimento das naves de guerra pelas autoridades do govêrno de Hermes da Fonseca. Os oficiais e os marinheiros alemães foram recebidos pelos brasileiros não apenas de forma cordial em espírito de hospitalidade, mas sim também com expressões de camaradagem pelos militares brasileiros. O próprio Presidente visitou as naves, informando-se dos novos desenvolvimentos técnicos da Marinha de Guerra alemã. Na partida, a esquadra foi honrosamente acompanhada pelo navio que representava o maior orgulho da Marinha brasileira, o Minas Gerais.

Dias festivos para os muitos moradores alemães do Rio de Janeiro foi a visita de uma frota alemã constituída pelos navios de guerra Kaiser, König Albert e Straßburg, que foi recebida com cordial hospitalidade pelas instâncias governamentais brasileiras e que trataram com a marinha no melhor espírito de camaradagem. Os alemães mais prominentes não deixaram de dirigir-se em barcaças ao navio porta-bandeira Kaiser; houve uma recepção entusiástica e todo o tipo de atos festivos, até que a frota, acompanhada em formação de honra pelo novo Dreadnoughts "Minas Gerais" deixou de novo o magnífico porto do Rio de Janeiro.

Ciclo de estudos sob a direção de
Antonio Alexandre Bispo


Todos os direitos reservados. Reproduções apenas com a autorização explícita do editor.

Indicação bibliográfica para citações e referências:
Bispo, A.A. "Há 100 anos: a viagem da Marinha de Guerra do Império Alemão ao Atlântico e Pacífico
como marco final de uma era em anos de simpatia pelo militarismo alemão do Marechal Hermes da Fonseca (1855-1923)". Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 141/2 (2013:1). http://revista.brasil-europa.eu/141/Brasil-Alemanha-1913.html