Revista
BRASIL-EUROPA
Correspondência Euro-Brasileira©
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Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira 141/18 (2013:1)
Prof. Dr. A.A.Bispo, Universidade de Colonia
Dr. H. Hülskath e Comissão especializada
Organização de estudos de processos culturais em relações internacionais (reg. 1968)
- Academia Brasil-Europa -
e institutos integrados
© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2013 by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501
Doc. N°2964
Quem bebe água da Carioca sempre volta...
O fascínio de alemães pela natureza do Rio de Janeiro vista dos altos
nas impressões de viajante alemão à época da Revolta da Armada
Chile-Alemanha-Brasil. Aproximações à história cultural de relações comerciais e da diplomacia
O livro Weltreisen de Ernst Hengstenberg (1903) oferecido a Ernst von Treskow (1844-1915) IV
Alemanha-Brasil
Diálogos de Berlin-Charlottenburg pelos 30 anos do simpósio euro-brasileiro de renovação dos estudos da emigração alemã ás Américas
no ano da Cumbre Unión Europea-CELAC 2013
Essa simpatia e esse interesse manifestam-se sob vários aspectos e puderam ser constatados em várias ocasiões e criam pressupostos favoráveis a cooperações. Analisar as suas razões, se resultados de interesses pragmáticos ou antes pré-condição para o surgimento e desenvolvimento desses interesses surge como tarefa de significado em vários sentidos, uma vez que se tratam de nações de formação histórica e de idiomas diversos, uma pertencente geoculturalmente ao universo cultural centro-europeu de língua alemã, outro à latinidade e ao mundo mediterrâneo-atlântico do extremo Ocidente europeu.
Essa simpatia e esse interesse não podem ser explicados apenas pela existencia de profundos laços fundamentados na história da imigração e na colonização, em particular de Estados do sul do Brasil.
Como tematizado na sessão do Rio de Janeiro do Colóquio Internacional de Estudos Interculturais de 2004, pode-se até mesmo observar uma certa reserva por parte de jovens alemães relativamente a temas referentes a situações culturais resultantes da imigração.
Fato explicável pelos diferentes pressupostos, constatam-se diferenças quanto à visão e à interpretação de desenvolvimentos históricos e mesmo da atualidade por parte de teuto-brasileiros ou de brasileiros de famílias de ascendência alemã nascidos, formados e socializados no Brasil e aqueles alemães que ganham fascínio pelo Brasil após visitas para fins profissionais, de turismo, assessoria de políticos e empresários ou algum curso de português em universidades populares alemãs, casamento com brasileiros, visitas a cursos de capoeira, a sessões de umbanda ou participação em escolas de samba. Os primeiros estão inseridos em complexos processos de integração e identificação de décadas, com todas as suas transformações e impulsos de auto-afirmação e diferenciação, os segundos não. Para estes, a existência de regiões e contextos culturais marcados pela imigração alemã do passado não constitui em geral motivo de especial interesse.
Essa situação pode passar a ser focalizada sob novas perspectivas através de uma renovação teórica dos estudos culturais, dirigindo-se a atenção a processos e suas interações sob as novas condições criadas pela integração européia.
O Rio de Janeiro nas Weltreisen de Ernst Hengstenberg
Entre as descrições do Rio de Janeiro que mais exemplificam o fascínio de alemães não-residentes pelo Brasil pela sua natureza encontra-se uma não ou pouco conhecida no Brasil e já esquecida na Alemanha: aquela do livro Weltreisen de Ernst Hengstenberg.( http://revista.brasil-europa.eu/141/Chile-Alemanha-Brasil-Ernst-Hengstenberg.html)
Esse autor, que realizou muitas viagens através do mundo e cujos relatos apresentou em sociedades de Geografia, publicou nesse livro, em 1903, observações e experiências suas na América do Sul e na Rússia. Surgem assim, numa mesma obra, capítulos dedicados ao Chile, ao Paraguai, ao Brasil e a regiões orientais do Império russo.
Essa obra, compreensivelmente, foi particularmente considerada em círculos teuto-russos na Alemanha e no Brasil, em particular naqueles vinculados aos nomes de Tatiana Kipmann e Martin Braunwieser, mentores da academia de renovação cultural e artística fundada em 1919 em Salzburg e que teve o seu prosseguimento em São Paulo. (http://www.academia.brasil-europa.eu/portugues-historico-abe.htm)
A viagem de Hengstenberg no Brasil em 1893 desenvolveu-se a partir do sul, passando pelo Rio Grande do Sul, por Santa Catarina, Paraná, São Paulo e Rio de Janeiro.
Fontana de Trevi e a fonte de Carioca na profecia do retorno de viajantes
Apesar de expressar a sua grande admiração por regiões e cidades de colonização alemã, em particular por Joinville, a sua fascinação pelo país foi causada pela paisagem do Rio de Janeiro. Assim, a sua descrição da chegada à então capital do Brasil e à temporada que ali passou pertence às mais entusiásticas da literatura de viagens. Hengstenberg relembra da antiga comparação da paisagem do Rio de Janeiro com aquela do golfo de Nápoles e, corrigindo uma expressão referente à beleza de Nápoles, diz que é ao Rio de Janeiro que vale a afirmação que, após vê-lo, nada mais pode suplantá-lo em belezas no mundo.
Também afirma que muito mais vale para o Rio de Janeiro aquilo que a tradição afirmava para a Fontana de Trevi de Roma, segundo a qual aquele que bebesse de sua água sempre voltaria. Para o Rio de Janeiro, a tradição da água da fonte da Carioca segundo a interpretação de Hengstenberg não apenas dizia que aquele que dela bebesse retornaria, como também esqueceria da sua própria terra.
O Rio de Janeiro, pela sua paisagem ficava assim, como sugerido por Hengstenberg, indelevelmente marcado na memória do alemão que o visita, tendo a sua recordação ainda mais intensificada na memória ao longe, criando assim impulsos que levam a novas visitas e a empreendimentos que o levam a querer sentir-se a ela pertencentes, quase que esquecendo a sua terra.
"É de se surpreender nessa terra encantada que o mais produtivo lírico do Brasil, Gonçalves Dias, num de seus Cantigos líricos impregnado de infinita saudades canta "Minha terra tem palmeiras"? Sim, quem viu Rio de Janeiro, na paisagem verdadeiramente encantada em que a cidade se expande, fascinado até as suas mais íntimas fibras, pode dizer, ainda com mais direito do que de Nápoles: "Vedi Rio de Janeiro e poi muori". O que se afirma de Roma com a Fontana di Trevi é, no Rio de Janeiro, a fonte da Carioca: "Quem bebe água da Carioca sempre retorna e esquece a sua terra." (op.cit. 156 ss.)
A visão do Rio visto das serras e morros
Se em geral as descrições entusiásticas da paisagem do Rio de Janeiro em relatos de viagens alemães baseiam-se na entrada de navio no seu porto, seguindo-se então em geral expressões de decepção pela própria cidade, o texto de Hengstenberg distingue-se pelo fato de ter-se aproximado da cidade de trem, vindo de São Paulo. A sua primeira impressão de encanto é assim aquela da paisagem que se apresentou a partir da descida da serra, ou seja, da terra ao mar. Diferentemente da espetacularidade que todos os viajantes descrevem da entrada do porto, em Hengstenberg a beleza da paisagem é revelada como um ato de descortinar, de levantamento de véus de vapores em meio à vegetação da serra.
Ao longo do leito do Paraíba, em toda a sua largura atravancado com ilhas e bancos de areia, o que obriga aos navios a cruzamentos constantes, a ferrovia atravessa numerosas plantações de café à Barra do Piraí, para então descer a íngrime serra. Entre enormes blocos de pedra ou em gargantas escuras, que deixam ouvir o rumor dos riachos que correm, desce-se e logo desenrola-se aos olhos encantados o mar de casas que se levanta do véu perfumado de azul dourado da maravilhosa barra de mar do Rio de Janeiro, um verdadeiro paraíso de beleza paisagistica. Todo o panorama tropical que se extende ao longe é coberto com um céu azul irradiante; o brilho dourado do sol irradia sobre a baía de Niterói.
O leitor é preparado por Hengstenberg a perceber a beleza do Rio de Janeiro sob o pano de fundo de suas impressões anteriores do interior, do Vale do Paraíba, de São Paulo - cidade na qual esteve apenas muito rapidamente - e de outras regiões que percorreu. Essa descida ao Rio de Janeiro corresponde a uma anterior, àquela descrita de forma também entusiástica da estrada de ferro de Curitiba a Paranaguá. Nos dois casos é o descortino da paisagem a partir do panorama que se abre de altos de serras que transmite a magnificência da natureza brasileira ao leitor. Embora tendo viajado de navio de Paranaguá a Santos, não prosseguiu a sua viagem diretamente ao Rio de Janeiro, subindo antes a serra a São Paulo e, dali, após breve estadia, seguindo ao Rio de Janeiro de trem.
Diferindo assim de outros viajantes, a visão do Rio de Janeiro de Hengstenberg é primeiramente aquela da montanha ao mar, não do mar à montanha. O panorama da entrada no Rio de Janeiro pelo porto é apenas decantado a seguir. A particularidade da descrição de Hengstenberg reside no fato de descrevê-la ao cair da tarde e à noite, salientando o céu estrelado sôbre a paisagem, o piscar de vagalumes e a silhueta de coqueiros e árvores sob a luz da lua. O seu relato surge assim como um documento de um dos aspectos que predominou na imagem do Rio de Janeiro em fins do século XIX e início do XX: o de cidade-luz.
O fascínio da entrada no porto do Rio de Janeiro em noite de lua cheia
Apesar de salientar a vista dos altos, das serras e dos morros da paisagem do Rio de Janeiro, o ponto alto da descrição entusiástica de Ernst Hengstenberg é, como de outros autores, a da entrada no seu porto. O cenário é pintado ao cair da noite, transmitindo o escrito o surgir das estrêlas, que lhe parecem duplamente maiores do que as contempladas no céu da Alemanha, salientando o encanto dos milhares de vagalumes que iluminavam o ar. Essa sua visão da paisagem carioca a partir do mar, porém, dá logo lugar de novo àquela dos altos, agora de Santa Teresa.
Estando hospedado como muitos outros estrangeiros no Hotel Internacional ali situado, é como outros europeus da época anterior ao saneamento do Rio marcado na sua percepção da cidade pelo bairro de Santa Teresa. A sua atenção é daí dirigida aos bairros de Laranjeiras e Botafogo, descrevendo neste último o acento nobilitador que conferiam as altas palmeiras às residências que ali se levantavam.
"Entre as mais belas entradas em portos no mundo conta-se a do Rio de Janeiro em noite de lua cheia. Após passar-se entre as pequenas ilhas Raza e Redonda, vê-se ao fundo o belo Corcovado que se levanta majestosamente e alcança-se o estreito canal de entrada fortificado com potentes baterias e flanqueado pelo cume rochoso do Pão de Açúcar. Um mundo totalmente novo, um encanto da natureza que dificilmente pode ser expresso em palavras abre-se a nossos olhos maravilhados. A baía, muito ampla, é cercada por montanhas repletas de exuberante flora. Duplamente maiores do que as da terra natal parecem ser as estrelas que, como diamantes, ornamentam o manto de brilhos do céu noturno. Surgem milhões de vagalumes com luzes tão intensas como estrêlas e que logo desaparecem no seu brilho pirotécnico. O firmamento torna-se cada vez mais iluminado. Reconhecemos com clareza as grandes copas e os cachos de côcos dos esbeltos coqueiros. De numerosos maços à base das coroas desenvolvem-se os cachos ouro-amarelos dos novos côcos.
Aos altos da cidade localiza-se Santa Teresa, e mais adiante, a 300 metros de altura, o Hotel Internacional, livre de febres, onde sopra um ar mais puro do que na estreita e elegante via comercial Rua do Ouvidor. Viajando-se de bonde elétrico ao mencionado hotel e passeando-se pelo magnífico caminho do Aqueduto, e descendo-se então pelo vale ameno das Laranjeiras, chega-se por fim ao Botafogo, a residência da aristocracia fluminense, (...) cujas vilas rodeadas de palmeiras conferem uma aparência nobre a esse bairro." (loc. cit.)
O marco emblemático do Rio em época anterior ao Cristo Redentor: o Jardim Botânico
O ponto alto da descrição entusiástica de Ernst Hengstenberg diz respeito ao Jardim Botânico do Rio de Janeiro.
"O mundialmente famoso Jardim Botanico recebe o encantado visitante logo de entrada com uma alamenda imponente de palmeiras reais. Um dos maiores ornamentos do Jardim são os densos e magníficos grupos de bambús gigantes, Dendrocalamus giganteus; uma só canudo - sim, canudo, pois os bambús pertencem às hervas - chega a atingir as dimensões de um homem e 30 metros de altura.
As folhas verde-escuras das laranjeiras, com as suas frutas douradas, dracenas, bananas, seringueiras, balsaminas, eucalíptos, plantas trepadeiras que se emaranham e trepam de todas as clareiras, o maravilhoso florescimentos da rainha da noite fazem-nos crer que nos encontramos num jardim encantado. Colibris que brilham como metal rodeiam flores suculentas e quase que imóveis no vôo, parando no ar, absorvem o mel doce dos cálices profundamente coloridos das flores com a sua comprida língua, que mais parece um fio. As folhas suculentas da mangueira, o leque fino das avencas, o candelabro de flores das agaves são rodeados pelas mais lindas borboletas, cuja magnificência colorida e brilho iriscente de suas asas resultam do precioso pó de suas escamas. Nos ramos das árvores vemos em grande quantidade orquídeas de formas singulares, que luzem maravilhosamente, de tão alto preço entre nós." (loc.cit.)
Apreciação das qualidades de convívio social de brasileiros por Hengstenberg
Em diferentes momentos de seu texto, Ernst Hengstenberg expressa suas impressões da cultura das regiões e dos círculos sociais visitados. O seu texto, se lido atentamente, oferece assim subsídios para o estudo de diferenças culturais na sociedade brasileira. Se atesta para as cidades de antiga colonização do litoral de Santa Catarina, Paraná e São Paulo uma estagnação letárgica que contrastava com a dinâmica empreendedora das regiões de colonização alemã, repetindo assim comuns críticas relativas aos luso-brasileiros, as suas observações relativas à vida social e cultural de círculos mais privilegiados do Rio de Janeiro e Petrópolis acentuam uma superficialidade subjacente a formas de distinção no convívio social.
Repete, assim, também aqui apreciações conhecidas de outros viajantes alemães. Deles difere, porém, ao salientar a compaixão para com doentes e pobres como a maior das virtudes dos brasileiros. No seu conservativismo, Ernst Hengstenberg admirava sobretudo o espírito de submissão que reinava entre filhos e pais nas famílias brasileiras.
"Assim que se conversa superficialmente com brasileiro na sua não-melodiosa língua, pode-se tratar muito bem com êle, que é sempre cortês. Êle demonstra ter muito senso para a conversação leve, não gosta, porém, de se aprofundar num tema, e formação intelectual é vista aqui como uma espécie de esporte. Muito se gostaria ter este luxo, que é muito considerado, desde que não exija muito sacrificio. O que chama a atenção é a grande tolerância que se observa no tratamento das crianças; apesar disso, o seu comportamento para com os pais é bastante exemplar, ainda não impregnada por ideias modernas de falta de submissão. A maior virtude do brasileiro reside na sua grande compaixão para com doentes e pobres." (loc.cit.)
Impressões de Petrópolis: Baden Baden tropical e elos com o Chile
A parte do texto de Ernst Hengstenberg que se refere a Petrópolis segue à descrição dos dias conturbados da Revolta da Armada, quando bondes eram obrigados a trafegar com luzes apagadas nas linhas que contornavam o mar e, com os temores gerais, todos aqueles que podiam abandonavam a cidade em direção a Petrópolis.
Como viajante que já no Chile vivia em meios diplomáticos e comerciais alemães, Ernst Hengstenberg demonstra no seu texto estar bem familiarizado com os meios sociais de Petrópolis. O seu relato documenta que, assim como em Viña del Mar, também em Petrópolis ao lado de diplomatas e grandes comerciantes, também ali circulavam representantes de interesses de firmas de armas alemãs.
Se tensões entre diplomatas de formação aristocrática e conselheiros militares que influenciavam assuntos de govêrno marcaram a época no Chile e na Argentina, também no Brasil constata-se a partir do texto de Hengstenberg a presença de representante da Krupp junto ao govêrno republicano militar. Essa menção de Hengstenberg completa assim o quadro que oferece do Brasil de 1893: a mudança do nome da capital de Santa Catarina para Florianópolis, a Revolução Federalista que alcançaria Curitiba pouco depois de sua partida e a Revolta da Armada no Rio de Janeiro.
O nome que menciona como representante da Krupp em Petrópolis e que teria ali pessoalmente conhecido é o de Albert Schinzinger. Esse aquisidor de negócios armamentícios, com a ajuda de Emil Körner Henze (1846-1920), principal motor da influência de interesses alemães e meios teuto-chilenos nos acontecimentos políticos do Chile e da prussianização do exército chileno, alcançara substanciosas vendas de canhões da firma alemã ao país sulamericano.
Schinzinger, nascido em Freiburg, coronel de Artilharia, formado na escola de guerra de Metz e na de artilharia de Berlim, fora contratado pela firma Krupp em 1889, desenvolvendo as suas atividades nos meios políticos dos países visitados com particular tato sob condições secretas e de manutenção de silêncio. (Donald J. Stoker, Jr., Jonathan A. Grant (eds.), Girding for battle: the arms trade in a global perspectiva, 1815-1940, Westport: Greenwood 2003). A breve menção de Hengstenberg, segundo a qual estaria familiarizado com Schinzinger já à época de sua presença em Petrópolis, em 1893, quebra esse silêncio relativo ao comércio de armas entre o representante da Krupp e os meios militares republicanos brasileiros.
Esses surpreendentes elos relacionados com o silencioso comércio de armas entre o Chile, a Argentina e o Brasil são salientados pelo próprio Ernst Hengstenberg ao transmitir ao leitor um episódio anedótico ocorrido numa recepção por êle oferecida a oficiais de navios de guerra alemães na sua residência em Viña del Mar.
"Os diplomatas estrangeiros e cônsules, assim como os chefes das grandes casas comerciais moram na sua maioria naquela graciosa localidade e que pode ser comparada a um encantador cesto de flores. Pode-se chamar Petrópolis de um Baden Baden tropical. O ar é ali ainda mais ameno do que na Floresta Negra. Nos trens, cada uma das senhorias possui o seu lugar determinado, como numa mesa reservada; e para diminuir a monotonia da viagem quotidiana, alguns dos passageiros jogam dominó ou xadrez.
Na minha recordação surge uma breve ocorrência que mostra como o mundo é na verdade pequeno. No ano de 1894, ofereci, na minha residência em Viña del mar, uma festa aos comandantes e oficiais dos navios alemães de guerra Alexandrine, Arkona e Marie. Um de meus convidados era o Duque Friedrich Wilhelm von Mecklenburg, que mais tarde de forma tão triste perdeu a sua jovem vida. No sala de refeições havia um telefone de brinquedo, que era uma garrafa de licor. Fazendo como se falasse pelo telefone, chamei a sua Alteza, dizendo que alguém da Sociedade Alemã de Valparaíso queria com êle falar. Ao surpreender-me em ouvir a resposta: 'Nesse logro não caio', pois até então todos tinham-se deixado enganar, recebi o seguinte esclarecimento: 'Já conheci isso no ano passado através de Schinzinger, o representante da Krupp em Petrópolis.' Ainda mais surpreendeu-se o duque com a minha resposta: 'Fui eu que a êle dei de presente!' O leitor deve pensar na enorme distância que separa os dois locais mencionados, um na costa oriental, outro na costa ocidental da América do Sul. (pág. 162)
Uma das poucas opiniões de natureza política explícitas na obra de Hengstenberg diz respeito ao papel que a Marinha alemã deveria exercer na salvaguarda de interesses de alemães vivendo na América do Sul. Com base nas suas observações em diferentes países, garantia que a grande maioria dos alemães que viviam no ultramar estaria disposta a pagar um imposto para a manutenção de uma poderosa frota que defendesse os seus interesses. Hengstennerg manifestava assim o Desideratum de que o Reichstag deveria pedir ao Chanceler um projeto de lei que introduzisse esse imposto para os alemães no Exterior. (op.cit. 40-41)
Ciclo de estudos sob a direção de
Antonio Alexandre Bispo
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Indicação bibliográfica para citações e referências:
Bispo, A.A. "Quem bebe água da Carioca sempre volta...O fascínio de alemães pela natureza do Rio de Janeiro vista dos altos nas impressões de viajante alemão à época da Revolta da Armada. Chile-Alemanha-Brasil. Aproximações à história cultural de relações comerciais e da diplomacia. O livro Weltreisen de Ernst Hengstenberg (1903) oferecido a Ernst von Treskow (1844-1915) IV". Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 141/18 (2013:1). http://revista.brasil-europa.eu/141/Fascinio-teuto-pelo-Rio-de-Janeiro.html