Revista
BRASIL-EUROPA
Correspondência Euro-Brasileira©
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Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira 141/19 (2013:1)
Prof. Dr. A.A.Bispo, Universidade de Colonia
Dr. H. Hülskath e Comissão especializada
Organização de estudos de processos culturais em relações internacionais (reg. 1968)
- Academia Brasil-Europa -
e institutos integrados
© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2013 by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501
Doc. N°2971
De heróis e mártires, lendas e tradições
Percorrendo museus e memoriais nicaraguenses
Klaus Jetz, M..A.
Muitos museus de Nicaragua contam episódios da guerra revolucionária de 1978/1979, da vida e da morte da juventude sandinista, assim como dos heróis nacionais Augusto César Sandino, Rubén Dario ou Rigoberto López Pérez. Para além disso, apresentam-nos antigas máscaras e enormes bonecos de pappmaché, protagonistas de tradições transmitidas oralmente. E alguns museus oferecem ambos, ligam a história conturbada e sofrida do país com mitos e lendas nacionais. Ao lado da veneração de heróis trata-se sempre também de folclore indígena ou de tradições da época colonial. As exposições contribuem assim à conservação e à solidificação da cultura popular nacional.
Uma visita de Managua inclui sempre uma ida à colina chamada de Loma de Tiscapa no centro da cidade velha da antiga capital nicaraguense destruída por terremotos em 1931 e 1972. Ali se encontram não apenas os restos do antigo palácio presidencial, no qual Sandino jantou com o presidente Sacasa ainda na noite de sua morte no dia 21 de fevereiro de 1934, antes de ser preso e executado por ordem de Somoza, chefe da Guarda Nacional.
Nas ainda existentes salas do porão da prisão dali próxima, mostra-se a atuação do herói nacional, a sua luta contra os ocupantes norte-americanos e os seus colaboradores nicaraguenses. Para mais, os opositores de Somoza foram ali presos sob condições desumanas e torturados até à morte. A exposição permanente "Noches de Terror" relata esse capítulo sinistro, em particular aquele da prestação de contas com os participantes e conjurados do jovem poeta Rigoberto López Pérez, que em 1956 havia baleado o fundador da dinastia Somoza Garcia em León. Aqui rememora-se, assim, aquele feito heróico que pôs fim à primeira etapa da ditadura Somoza e vingou o assassinato de Sandino.
Também outras cidades da Nicaragua dispoem de interessantes museus. A antiga e conservadora Granada, diferentemente da heróica cidade de León, foi poupada em grande parte nas lutas da Revolução sandinista. O corsário norte-americano William Walker, porém, que aqui atuou um ano inteiro como presidente do país, mandou que a cidade fosse incendiada no dia 21 de novembro de 1856, antes de desaparecer definitivamente da Nicaragua. Por todo lado encontram-se indicações nas paredes das casas a respeito da cólera destruidora dos piratas, assim como também na torre dos sinos da igreja La Merced ou na fachada do reconstruído convento San Francisco. Aqui encontra-se instalado um Museu pré-colombiano, e a história da cidade é apresentada em exposições temporárias. Não menos interessante é o pequeno mas refinado Mi Museo, que possui mais de 7.000 objetos pré-colombianos e que organiza exposições temporárias sobre a cultura funerária, os mercados ou trabalhos de cerâmica dos indígenas. Reconstruída depois de 1860 foi também a Casa de los Leones, na qual nasceu Ernesto Cardenal e na qual hoje encontra-se instalado um centro cultural internacional: a Casa de los Tres Mundos.
Na fortaleza La Pólvora na periferia ao norte da cidade, do século XVIII, antigamente depósito de armas e quartel, hoje um museu da armada, os presos de Somoza foram torturados e assassinados. Esses sacrificados são ali relembrados. Na antiga estação de Granada, ao contrário, de onde partiam no passado trens para o porto de Corinto no Pacífico, encontra-se uma especial herança do velho Somoza: o relito de um vagão dos anos 30, no qual vez por outra reuniam-se o ditador e o seu gabinete. O guarda local possui a chave e encontra-se disposto a abrir a porta ao troco de uma gorjeta e a contar algumas banalidades.
A cidade de León, que no século XIX rivalizava com Granada, terra dos liberais, possui muitos museus e memoriais da época da Revolução. O Museu da Revolução dos antigos combatentes sandinistas instalado numa dependência do Ayuntamiento conta das lutas da Frente Rigoberto López Pérez no Noroeste do país. Antigos combatentes encontram-se à disposição como guias e relatam de camaradas caídos e assassinados, bombardeamentos da cidade pela Guarda Nacional e massacres na população civil. Os visitantes são conduzidos pelo edifício de três andares, que como os objetos expostos, sofreu um tanto nos últimos anos e precisaria ser um pouco recuperado. Falta dinheiro, porém; muitas salas se encontram vazias, e os antigos combatentes, que em parte ainda sofrem com as consequências da guerra, lutam até hoje em vão para receber uma pensão.
León é a cidade das igrejas, diz-se que há no total 16 nessa segunda maior cidade da Nicaragua. Especial interesse merece a igreja barroca El Calvario, situada numa pequena colina. No seu campanário encontra-se instalado um pequeno memorial para cinco jovens sandinistas mortos pela Guardia Nacional em 1979 e que ali foram surpreendidos em ações de resistência. Uma placa indicativa admoesta: "Fui construída no século XVIII, destruída em setembro de 1978. Conserve-me, eu sou parte da sua identidade."
O museu dedica-se também, como o seu nome diz, a tradições e lendas. Nas celas e nos corredores, encontram-se expostos grandes bonecos nas paredes, que se referem a antigas estórias transmitidas oralmente. Não muito diferentes da Commedia dell'Arte, trata-se de caracteres que tiveram entrada na arte popular nicaraguense e que são elementos integrantes da tradição nacional de contos e do mundo mítico: La Llorona, la Vieja y el Viejo, el Pincho de Oro ou los Mantudos.
O mesmo também dá-se em Niquinohomo, o local de nascimento de Sandino. Aqui, a comunidade na casa do seu pai, onde cresceu como filho ilegítimo aquele que seria futuramente o herói nacional, instalou-se com apoio japonês um pequeno museu e uma biblioteca. Excetuando-se algumas fotografias e uns murais sobre a ação, a vida e a morte de Sandino, não há muito o que ver, mas os jovens do povoado têem ali uma biblioteca que é muito usada. As revistas japonesas em idioma espanhol são entretanto já velhas de dez anos e bastante esfarrapadas.
O último Somoza roubou filhos e filhas de incontáveis famílias que, quando não morreram em luta, foram torturados pela Guarda Nacional, assassinados e jogados na cratera do vulcão. Por isso, rememora-se sempre também a execução do tirano, que caiu no Paraguai em 1980, em atentado da Guerilla argentina.
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Indicação bibliográfica para citações e referências:
Jetz, Klaus. "De heróis e mártires, lendas e tradições. Museus e memoriais nicaraguenses em relances". Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 141/19 (2013:1). http://revista.brasil-europa.eu/141/Nicaragua-Museus-e-Memoriais.html