Revista

BRASIL-EUROPA

Correspondência Euro-Brasileira©

 

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Interior da ilha de S. Vicente. Fotos A.A.Bispo.
©Arquivo A.B.E







 

Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira 142/11 (2013:2)
Prof. Dr. A.A.Bispo, Universidade de Colonia
Dr. H. Hülskath (Dir. Adm.) e Conselho Científico

Organização de estudos de processos culturais em relações internacionais (reg. 1968)
- Academia Brasil-Europa  -
e institutos integrados

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2013 by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501

Doc. N° 2982





D. Rodrigo - a cidade com o nome de D. Rodrigo de Souza Coutinho (1755-1812)
De uma tentativa inter-atlântica de povoamento da ilha de S. Vicente com madeirenses e açorianos
à colonização inter-insular em centralização do comércio com a metrópole

História urbana do Porto Grande de São Vicente
nas suas inserções em contextos político-culturais globais
e em suas relações com o Brasil II

Em sequência a encontro na Embaixada da República de Cabo Verde em Berlim
Na passagem dos 25 anos do primeiro da série de eventos euro-brasileiros do I.S.M.P.S. e da A.B.E. pelos 500 anos de Descobrimentos portugueses

 
Em exposição na Torre de Belém de Mindelo dedicada aos espaços urbanos do Cabo Verde da Comissão Nacional das Comemorações dos Descobrimentos Portugueses (Veja http://revista.brasil-europa.eu/142/Mindelo-Torre-de-Belem.html), menciona-se a tentativa de povoamento sistemático da ilha de São Vicente por famílias provenientes da Madeira e dos Açores, ordenado em 1781.

Surge como plausível que o govêrno português tenha sentido a necessidade de povoar o Porto Grande devido ao risco experimentado no passado de ali aportarem corsários e navios de nações inimigas, como os holandeses à época das suas ações no Nordeste do Brasil.

A tentativa de povoamente ocorreu à época de D. Maria I (1734-1816), uma rainha que entrou na história pela sua religiosidade extremada ("a Piedosa"), clericalismo e mesmo reacionarismo anti-iluminista manifestado na demissão de Sebastião José de Carvalho e Mello, Marquês de Pombal (1699-1782), cujas medidas de coibição da excessiva influência da Igreja em assuntos do Estado em parte desativou.

Considerando essa atmosfera de reconscientização de fundamentos religiosos da ação política do período é compreensível que se tenha pensado primeiramente num povoamento da ilha de São Vicente com colonos da Madeira e dos Açores, uma vez que se criaria no Atlântico Sul mais um centro populacional marcado por profundo Catolicismo.

Essa iniciativa levaria também a uma renovação de cunho restaurador do Catolicismo no arquipélago, uma vez que a vida religiosa das ilhas, nas suas expressões e festividades derivadas de processos históricos de sua formação étnica e social teria assumido características sentidas como exteriorizantes, heterodoxas e necessitadas de uma reforma que possibilitasse correção de abusos e maior disciplina moral.

Essas razões religioso-culturais fundamentadoras de uma política à época de D. Maria I surgem como mais plausíveis do que aquela de um simples intento de se criar um Cabo Verde menos africanizado a norte.

A cidade de D. Rodrigo como empreendimento no contexto da política colonial

A essa tentativa de fixação de ilhéus madeirenses e açorianos na ilha de S. Vicente, que teria fracassado sem deixar muitos traços, seguiu-se uma outra iniciativa, melhor preparada, de povoá-la com camponeses do próprio arquipélago.

A Secretaria de Estado da Marinha, sob a direção de D. Rodrigo de Souza Coutinho (1755-1812), um político português que desempenharia influente papel na política do Reino à época da sede da Corte no Brasil, onde viria a falecer.

Se a iniciativa anterior de povoamento de S. Vicente por ilhéus da Madeira e dos Açores teria levado à criação ou intensificação de uma esfera de relações humanas e comerciais entre regiões coloniais, por assim dizer um mercado interno insular atlântico, o plano apoiado por D. Rodrigo de Souza Coutinho sugere antes concepções de política colonial que defendiam um estreito vínculo econômico das colonias com a metrópole, sendo as produções coloniais diretamente com ela comercializadas, fomentando-se, ao mesmo tempo, a exportação de seus produtos às colonias.

Compreende-se, assim, que se cogitasse antes um desenvolvimento agrícola da ilha, o que explicaria o apoio concedido por D. Rodrigo de Souza Coutinho à proposta de João Carlos de Fonseca Rosado (+1815), um abastado empreendedor agrícola que atuava na ilha do Fogo em levar para a ilha de S. Vicente 20 casais e respectivos escravos, obtendo em troca o título de capitão-mor de S. Vicente e a isenção de pagamento de dízimos pelo espaço de dez anos.

Diferentemente do espírito que a iniciativa anterior sugere, tratava-se aqui de um projeto antes marcado por concepções econômicas de cunho mercantilista e de fomento do progresso comercial no âmbito das relações entre as colonias e Portugal. Que essa orientação do plano correspondia às concepções de D. Rodrigo de Souza Coutinho isso manifesta-se na própria denominação da povoação assim criada segundo o seu nome: D. Rodrigo.

Relações de um nome com o Brasil

Há dimensões amplas de uma denominação que também adquirem particular significado para o Brasil, uma vez que D. Rodrigo viveu e atuou posteriormente na Corte fixada no Rio de Janeiro.

O fracasso dessa tentativa baseada em desenvolvimento agrícola a partir de concepções político-coloniais explica-se pelas condições naturais da ilha, acometida que foi por grandes sêcas entre 1805 e 1807 e 1810 e 1813, o que levou à ruína do seu empreendedor. Esse insucesso da cidade que trazia o seu nome não poderia ter deixado de ser sentida por D. Rodrigo de Souza Coutinho, repercutindo na Côrte que se encontrava no Brasil.


Um esboço desenhado da cidade criada conservado em documento do Arquivo Histórico Ultramarino, apresentado na exposição  sobre os Espaços Urbanos do Cabo Verde, permite que se reconheça um traçado refletido de área urbana delimitada por muros, reticulada e centralizada em praça marcada por grande igreja, cujas dimensões superavam de muito aquelas das moradias. Essa desproporção no tamanho dado à igreja indica que também nessa iniciativa de fundamentação antes econômica e de fomento do progresso a vida religiosa continuou a representar o principal fator de coesão e identidade comunitária.

Os colonos vindos da ilha do Fogo, marcada na sua história por calamidades naturais, fomes e sêcas, eram culturalmente marcados por expressões religiosas seculares, remontantes ao início da colonização do arquipélago, salientando-se sobretudo aquelas do culto mariano.

Na povoação de D. Rodrigo, esse marianismo ter-se-ia manifestado sobretudo na devoção a Nossa Senhora da Luz, vindo de encontro às afinidades entre a natureza marítima do Porto Grande e a linguagem de imagens marianas e a relações com um culto sobretudo festejado no Algarves, ao qual parece remeter o  sobrenome Rosado do seu fundador (Veja http://revista.brasil-europa.eu/142/Mindelo-Igreja-Nossa-Senhora-da-Luz.html).

Ciclo de estudos sob a direção de
Antonio Alexandre Bispo


Todos os direitos relativos a texto e imagens reservados. Reproduções apenas com a autorização explícita do editor.

Indicação bibliográfica para citações e referências:
Bispo, A.A. "D.Rodrigo - a cidade com o nome D. Rodrigo de Souza Coutinho (1755-1812). De uma tentativa inter-atlântica de povoamento da ilha de S. Vicente com madeirenses e açorianos
à colonização inter-insular em centralização do comércio com a metrópole". Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 142/11 (2013:2). http://revista.brasil-europa.eu/142/Mindelo-Povoamento.html


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