Revista

BRASIL-EUROPA

Correspondência Euro-Brasileira©

 

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©Arquivo A.B.E.

 

Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira 144/15 (2013:4)
Professor Dr. A.A.Bispo, Universidade de Colonia
Direção administrativa: Dr. H. Hülskath

Organização de Estudos de Processos Culturais em Relações Internacionais (ND 1968)
- Academia Brasil-Europa  -
e institutos integrados

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2013 by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501

Doc. N° 3019




Alemães no ensino e na vida musical do Império Osmano
e a emigração de "alemães do Bósporo" ao Novo Mundo
Paul Lange (1857-1919), Hans Lange (1884-1960) e Guiomar Novaes (1895-1979)

Relações turco-européias em processos histórico-musicais globais em referenciação brasileira III


Turquia no Ano Brasil/Alemanha 2013 da A.B.E. (III)

 

A consideração privilegiada das relações entre a Alemanha e o Brasil nos estudos eurobrasileiros do corrente ano justifica-se pela passagem dos 30 anos de simpósio realizado pelos 300 anos da emigração alemã às Américas em 1983. Esse evento teve como objetivo a atualização de estudos da emigração/imigração e da colonização, assim como das relações transatlânticas e interamericanas sob as novas condições criadas pela integração européia. (Veja http://revista.brasil-europa.eu/144/Turquia-Alemanha-Brasil.html)

O simpósio inseriu-se em forum dedicado a questões educativas nas suas inserções em processos culturais e ao papel da música neles desempenhado. Compreendia-se como estando a serviço do desenvolvimento de uma Educação Musical de orientação teórica adequada às complexas situações culturais do presente em continuidade a debates levados a efeito na disciplina Etnomusicologia do curso de Licenciatura Plena em Educação Musical e Artística na Faculdade de Música do Instituto Musical de São Paulo no início da década de 70.

O relacionamento entre essas áreas - Estudos Culturais e Educação Musical - pode ser estudada no exemplo de elos histórico-musicais entre a colonia alemã no Império Osmano no período anterior à Primeira Guerra, as Américas e artistas brasileiros que atuaram nos Estados Unidos no exemplo da pianista Guiomar Novaes. (Veja http://www.revista.brasil-europa.eu/129/Brasil-EUA.html)

Retomando estudos eurobrasileiros relativos aos "alemães do Bósporo"

Em 2006, a A.B.E. promoveu, em cooperação com seminário da Universidade de Colonia dedicado ao tema Migrações e Estética, um encontro no Centro de Documentação da Migração - Arquivo de Migração (Domit). Essa entidade, fundada em 1990 por iniciativa de migrantes turcos, hoje também se dedica a questões da história social, cultural e do quotidiano de migrantes de outras origens na Alemanha, inclusive de países de língua portuguesa. (http://www.revista.brasil-europa.eu/101/Domit.htm)


Nesse encontro, salientou-se por parte da A.B.E. que os estudos de migração não podem restringir-se aos estrangeiros residentes na Alemanha e a seus descendentes, mas sim que devem ser conduzidos em estreita cooperação com estudos da emigração de alemães e de sua presença nos diferentes países.


Essa necessidade evidencia-se em particular no caso das relações teuto-turcas, uma vez que estas possuem uma história muito mais antiga do que aquela da imigração turca à Alemanha desde a segunda metade do século XX. Considerá-la significa dar profundidade diferenciadora aos estudos de processos culturais do presente.


Não se pode esquecer que a presença alemã na Turquia, que pode ser estudada desde fins da Idade Média, experimentou uma extraordinária e crescente intensificação no decorrer do século XIX.


O fato de terem sido os austríacos e alemães em grande parte internados e deportados com a derrota na Primeira Guerra - esses "alemães do Bósporo" perfazem hoje ca. de 25.000 pessoas -, não significa que a vida cultural e o papel desempenhado anteriormente pela comunidade alemã no Império Otomano possa ser desconsiderado, uma vez que criou pressupostos para desenvolvimentos posteriores.


Para além de comerciantes e artesãos, esse desenvolvimento no século XIX foi marcado pela atuação de conselheiros de missões militares alemãs que auxiliaram na reorganização das forças osmanas, engenheiros e diplomatas com as suas famílias.


Estabelecendo-se sobretudo na capital do Império, Constantinopla, esses "alemães do Bósporo" criaram a partir de meados do século XIX instituições e igrejas que, em parte, mantém-se até o presente.


Já em 1852 fundou-se o hospital alemão e, em 1868, a Oberrealschule, hoje Escola Alemã de Istambul, posteriorimente Liceu (Deutsche Schule Istanbul/Özel Istanbul Alman Lisesi/Alman Lisesi), um dos mais prestigiados estabelecimentos de ensino médio do país. Como a designação "Oberrealschule" indica, a Escola Alemã seguia o sistema escolar alemão.


O ensino da música da Escola Alemã e suas irradiações: Paul Lange (1857-1919)

A principal personalidade da vida musical alemã em Constantinopla pela passagem do século foi Paul Lange, educador e músico nascido na aldeia de Kartzow, próxima a Potsdam.

Na sua formação e atuação, relacionaram-se estreitamente Educação e prática musical, aquela fundamentada na sua tradição familiar e na sua formação de educador obtida no Seminário de Formação de Professores de Neuruppin, completada em 1879, esta nas suas aptidões e no estudo de órgão que desenvolveu no Instituto Acadêmico de Música Sacra, em Berlim.

Paul Lange obteve assim uma formação eminentemente prussiana em geral - e berlinense em particular - como educador e como músico, e é sob essa perspectiva que a sua atuação na Turquia deve ser considerada.

Um ano após a sua formação no Seminário de Formação de Professores, Paul Lange assumiu, em 1880, o cargo de professor de canto na Escola Alemã de Constantinopla. Paralelamente, desempenhou a função de organista da capela da Embaixada Imperial Alemã. Essa união de funções torna-se compreensível pela sua formação e pelo significado do canto popular em alemão - e os hinos evangélicos em alemão - para a colonia alemã e para a conservação e transmissão da cultura alemã às gerações já nascidas no país.

Com a sua sólida formação musical e empreendedorismo artístico, Paul Lange passou a criar coros nas escolas e igrejas de outras comunidades estrangeiras, e.o.. na escola grega e na armênia, assim como nos dois colégios americanos da cidade.

Com esse trabalho de formação coral, ao qual juntou-se logo o da formação de uma orquestra, criou pré-condições para o cultivo de obras de compositores alemães na comunidade, entre outras de Beethoven e Wagner. Empenhou-se, assim, na revelação de obras pouco conhecidas de grandes compositores alemães na Turquia, passando a ser o seu nome marcado por esses esforços de difusão cultural a serviço do entendimento turco-alemão e que se compreendia como renovador de repertórios da comunidade européía de Constantinopla.

Paralelamente, tornou-se professor particular de piano de famílias européias da cidade. O grande número de alunos motivou-o até mesmo a fundar um conservatório que, porém, apenas teve pouca duração.

O American College for Girls - Friedrich Schrader (1865-1922)

Uma atenção especial deve ser dada à atuação de Paul Lange como professor do American College for Girls - Robert College, uma vez que auxilia a compreensão de uma proximidade com correntes culturais americanas que pode ser vista como um pressuposto para a carreira posterior nos EUA de seu filho mais velho, Hans Lange.

Esse colégio, mais antigo do que a Escola Alemã, fundado em 1863, inseriu-se nos empreendimentos missionários norteamericanos no Exterior fomentados pelo American Board fo Commissioners for Foreign Missions. Era assim marcado por orientação congregacionalista e capaz de agregar presbiterianos, metodistas e outras correntes confessionais.

O pregador Cyrus Hamlin (1811-1900), chegado à Turquia em 1839, iniciou as suas pregações com o intuito de criar uma rêde de escolas, o que se tornou apenas possível quando estas deixaram de ter explicitamente cunho missionário, o que levou que perdesse o apoio do American Board fo Commissioners for Foreign Missions . Com o auxilío de benfeitores, pôde abrir o Robert College em Bebek.

A dimensão religiosa dessa instituição manifestava-se no fato de que os unitários, não  partindo de concepções trinitárias, encontravam-se antes próximas do Islão. Nesse sentido, explica-se a cooperação entre os americanos e os derviches da ordem Bektaschi. Em 1900, a instituição passou a admitir turcos muçulmanos - antes restringia-se a gregos, armênios e búlgaros - o que possibilitou que a instituição continuasse atuando durante a Primeira Guerra.

Entre as personalidades que atuavam nesse College destaca-se, ao lado de Paul Lange, o seu colega e amigo Dr. Friedrich Schrader, que viveu em Istambul de 1891 a 1918 e atuou no Robert College de 1891 a 1907 e, mais tarde, no Liceu armênio-francês e na Escola Alemã.

Filólogo orientalista, doutorado em indologia na Universidade Halle, escritor (Pseudônimo Ischtiraki), jornalista de orientação socialista, foi co-fundador do diário em francês e alemão de Istambul Lloyd Osmano.  Schrader criticava o pêso dado a questões militares e econômicas nas relações entre o Império Otomano e o Alemão em desconsideração da cultura e do intercâmbio cultural.

Nesse sentido, desempenhou esforços no sentido de difundir novas expressões da cultura turca na Alemanha e a da cultura alemã no Império Otomano. O espírito do Classicismo de Weimar surgia como modêlo de iniciativas nesse sentido de fomento de entendimento mútuo entre as nações.Para a comemoração dos 150 anos de Friedrich Schiller (1759-1805) Schrader chegou a organizar um grupo teatral.

Paul Lange como músico militar e mestre-capela de sultões

Recomendado pelo Imperador da Alemanha Guilherme II (1859-1941), Paul Lange passou a ocupar cargos de relêvo em círculos palacianos. Em 1898, já como Tenente-Coronel, tornou-se inspetor da Banda da Marinha. A seguir, ocupou a posição de regente em outras bandas militares.

Em 1908, foi nomeado a mestre-capela do sultão Abdul Hamid II (1842-1918) e posteriormente, dos sultões Mehmet V (1844-1918) e Mehmet VI (1861-1926). Se os cargos de liderança de músicos europeus no Palácio iniciaram com um mestre italiano - Giuseppe Donizetti (1788-1856) (Veja http://revista.brasil-europa.eu/144/Musica-na-Europeizacao-da-Turquia.html), terminaram assim com um mentor alemão.

A capitulação das potências centro-européias e da Turquia, em 1918, que levou á deportação de grande parte dos alemães de Istambul, representou o fim da sua carreira. Paul Lange pôde ali permanecer, vindo a falecer em 1919, sendo alvo de grandes homenagens por parte da Côrte. Em 1920, a sua viúva e a sua filha mais nova, Isolde, tiveram que abandonar o país.

Hans Lange (1884-1960) na Europa Central, Alemanha e Estados Unidos

O seu filho, Hans Lange, tendo o violino como o seu principal instrumento, seguiu os passos do pai como regente e desenvolveu a sua carreira sobretudo nos Estados Unidos após ter atuado em Praga e em cidades alemãs. Entre estas, salientoa-se Bielefeld, na Vestfália, cidade industrial com grande parcela populacional de estrangeiros e com passado relacionado com a Turquia e o Brasil (Veja http://revista.brasil-europa.eu/144/Von-Hattorf-na-Turquia-e-no-Brasil.html).

Em 1925, viajou para os Estados Unidos em tournée com outros músicos; com a dissolução do grupo, fixou-se no país. Passando a atuar inicialmente como violinista na New York Philharmonic Orchestra a partir de 1927, realizou em poucos anos uma extraordinária ascensão profissional, assumindo cargos de direção e de assistente de Arturo Toscanini (1867-1957), regente da orquestra de 1928 a 1936.

Em 1936, tornou-se Associate Conductor da Chicago Symphony Orchestra sob Friedrich August Stock (1872-1942), cargo que ocupou até 1943, quando passou à categoria de maestro sob Désiré Defauw (1885-1960), atividade que desenvolveu até 1946.

A sua ampla atividade musical incluiu também concertos com outras orquestras e a realização de gravações. Hans Lange surge como uma das personalidades mais dinâmicas entre os alemães atuantes nos Estados Unidos a partir da segunda metade da década de 20.

Com os seus precedentes culturais teuto-turcos e com a sua experiência em grandes centros cosmopolitas centro-europeus, em particular em Praga, também marcados pelos elos musicais com a Turquia, compreende-se que Hans Lange demonstrasse uma particular sensibilidade para o novo, o renovador e para a valorização de músicos desconhecidos e estrangeiros.

Como a crítica norte-americana de seus concertos salienta, Hans Lange procurava arejar a vida musical de concertos, renovando o repertório, tanto através da inclusão de peças pouco executadas do passado, em particular de compositores clássicos, como de composições contemporâneas e de apresentações artistas de diferentes nações.

É nesse contexto que merece uma particular atenção o concerto e sua repetição por êle realizados com a pianista Guiomar Novaes no Carnegie Hall, em fevereiro de 1934. Esse concerto não surge apenas como um dos mais importantes marcos na carreira da artista brasileira, já então vulto de projeção nos Estados Unidos, mas sim também como indicativo da orientação renovadora de Hans Lange na sua relação contrastante com a orientação antes conservadora da pianista.

Guiomar Novaes e Hans Lange no Carnegie - correspondência de Haensel & Jones

Arquivo A.B.E.
O concerto de Guiomar Novaes foi precedido por correspondência entre a Sociedade Filarmônico-Sinfônica e a pianista a respeito do repertório através de seus agentes Haensel & Jones.

Em carta de 5 de maio de 1933 enviada ao Brasil, transmite-se o conteúdo de missiva da Sociedade, na qual se pede que a pianista envie o seu repertório, anotando as suas preferências.

Nessa carta, salienta-se que os regentes da orquestra reservavam a si o direito de selecionar um dos números sugeridos para a configuração do programa.

Hans Lange reservava, assim, a si o direito de escolher entre as obras propostas por Guiomar Novaes.

Os seus agentes haviam entregue à orquestra o seu repertório antigo, sugeriam, porém, de forma sensível, que ela preparasse novas obras, ou seja, renovasse o seu programa já várias vezes apresentado.

"In sending us the contracts for your appearances on February 8th and 9th the Philharmonic-Symphony Society wrote us as follows:

'Please send us Mme. Novaes'repertoire with her notation of first, second or third choice, because our conductors reserve the right to select any number from the artist's repertoire in order to make their programs properly balanced. With each selection we would like to know also the playing time. As soon as the conductor selects the number, we will notify you immediately."

We gave them your repertoire for the past season, as per the copy inclosed herewith, as they wished to have it immediately, but we explained that we understood you were planning to prepare some new numbers and that we had written requesting you to send us a complete repertoire for the coming season with the information about your choice and the playing time.

May we accordingly please have this information by return mail?"

Após algumas semanas, no dia 8 de julho de 1933, os seus agentes novamente escreveram ao Brasil, transmitindo um memorandum da orquestra, na qual sugeria-se que ela escolhesse, das obras que enviara, ou o Concerto em ré menor de W. A. Mozart (1756-1791) ou as Noites nos Jardins de Espanha de Manuel de Falla (1876-1946). Ainda que essas obras fizessem parte há muito do repertório da pianista, pareciam mais apropriadas aos intuitos renovadores de Hans Lange como obra clássica e outra relativamente moderna, representativa de paisagem cultural exótica e de conotações orientais da recepção francesa da cultura ibérica.

Dear Mme. Novaes:

The Philharmonic-Symphony Orchestra has just sent us the following memorandum:

'It has been decided to ask Mme. Novaes to play either the Mozart D minor Concerto, or the De Falla Nuits dans les Jardins d'Espagne, for her appearances with us on February 8th and 9th. We will advise you definitely as soon as we know.'

We will communicate again with you just as soon as we hear from the Orchestra further in the matter.

Entretanto, já em 6 de setembro do mesmo ano, a pianista recebia outra carta de Haensel & Jones, na qual mencionava-se novo memorandum da orquestra, no qual manifestava-se outra decisão de Hans Lange. Este escolhera para o concerto o Momo Precoce de Heitor Villa-Lobos (1887-1959).

Essa escolha, surpreendente em função da troca anterior de correspondência, não parece poder ser justificada apenas pelas obras sugeridas pela pianista, podendo-se supor uma influência externa, talvez através do Consulado Brasileiro, relacionado que estava com os preparativos como se depreende de outras cartas dos agentes. Em todo o caso, a escolha da obra de Villa-Lobos coaduna-se muito melhor com a orientação renovadora de Hans Lange e teria correspondido muito melhor à inclusão de nomes de compositores contemporâneos americanos no programa caso tivesse sido efetivada.


"Contrary to the information we sent you in our letter of July 8th, the New York Philharmonic Orchestra has just sent us the following memorandum:

'Mir. Lange has selected the Momo Precoce, of Villa Lobos for Mme. Novaes' appearance with the Orchestra on February 8th and 9th.'

Will you please confirm this final selection to us? Also please be sure to bring the orchestration with you.

We presume that you have already written us in reply to our important letter of August 2nd in regard to programs, but if not, will you please send us all the requested information by air mail immediately?

Thanking you and with kindest regards"


Vozes da crítica relativas ao concerto de Guiomar Novaes e Hans Lange

Diferindo de todas essas cuidadosas negociações quanto à escolha de repertório, Guiomar Novaes apresentou-se como solista do concerto para piano em la menor Op. 54 de R. Schumann (1810-1856) sob a direção de Hans Lange no Carnegie Hall.

O New York Herald Tribune (Friday, na sua edição de Sexta-Feira, 9 de fevereiro, salientou o fato do concerto ter apresentado obras não-familiares clássicas, através das quais Hans Lange procurava arejar o repertório convencional. Relativamente a Guiomar Novaes, diz significativamente que esta "empregara o concerto de Schumann como seu veículo", executando a obra com o seu usual brilhantismo e charme poético, obtendo grande sucesso.

"Mr. Hans Lange, who conducted last night's Philharmonic-Symphony concert in Carnegie Hall in place of Mr. Toscanini, offered his audience one of those unfamiliar classics with which he likes to refresh the conventional repertoire. (...)The solist of the evening, Mme. Guiomar Novaes, the distinguished Brazilian pianist, employed the Schumanns concerto for her vehicle. She delivered the lovely music with her usual brilliancy and poetic charm, and provoked the enthusiastic approval of the house."

O The New York Times, na mesma data, faz observações antes negativas a respeito da execução, sugerindo ter havido preparações insuficientes. O crítico observou desentendimentos ou falta de sintonia entre Hans Lange e Guiomar Novaes, insinuações que possivelmente indiquem um desagrado do regente quanto à escolha da obra pela pianista e que pouco se insere no conjunto do programa que ofereceu.

"The Schumann concerto, with its pages of tenderness and tremulous beauty, should have provided similar pleasures. But it was not excitingly played. There were passages when Mme. Novae's technic dazzled and gave off the glint of Schumann's genius and when the orchestra ably did its share. There were other moments, however, whenn conductor and soloist did not agree on tempi or style. At these junctures it seemed that the work had not been sufficiently rehearsed." (The New York Times, Friday, February 9, 1934, 22)

Uma crítica de teor totalmente diverso é a de Henriette Weber no de mesma data no New York Evening Journal que, como outras mulheres que acompanhavam a carreira de Guiomar Novaes, acentuava entusiasticamente as suas qualidades. (http://www.revista.brasil-europa.eu/129/Papel_da_mulher_nos_EUA.html)

Os critérios para o seu julgamento altamente positivo eram outros daqueles de críticos que acentuavam os intuitos renovadores de repertório de Hans Lange. Em primeiro lugar citavam-se qualidades como expressão profunda de sentimentos e execução repleta de musicalidade em mais alto grau.

"Guiomar Novaes, the Brazilian pianist, as soloist with the Philharmonic Orchestra, managed to warm up the audience at Carnegie Hall last evening in spite of the zero weather, by her beautiful playing of the Schumann Concerto. This is not one of the showy concertos, but it is full of deep sentiment and calls for musicianly playing of the highest order. This Miss Novaes was quite ready to give, and her fine interpretation von both flowers and applause."(February 9, 1934, pág. 15)

Também a crítica em The New York Sun, ainda que positiva quanto à interpretação da pianista e da execução em conjunto, que, contrariamente ao crítico do The New York Times teria sido marcada por razoável apoio da orquestra, sugeria que a execução encantadora desse concerto por Guiomar Novaes era já conhecida, não representando, assim, novidade.

"Miss Novaes's charming reading of this concerto is known here. Last evening show was in excellent form, and with fairly good orchestral support, played the solo part with a rare and intimate understanding." (The New York Sun, February 9, 1934, 29)

Diferentemente dessas observações, Leonard Liebling, crítico do New York American, teceu comentários antes relativadores da estética interpretativa de Guiomar Novaes. Para êle, a pianista, com a sua atenção a amabilidades no fraseado, à acentuação sensível e à técnica fluente revelava uma compreensão da obra sem o necessário ardor romântico e chama poética interior.

"Miss Novaes, a legitimate favorite here, displayed her well-known facility of finger and refinements of touch, but she failed to evoke the ardor and fragrancy necessary to ideal communion with the beautiful melodies and graceful figurations of Schumann. Miss Novaes'playing sounded a somewhat cool romanticism and easy detachment. /Niceties of phrasing and sensitive accentuation there were, and also fluent technic, that partly atoned for the lack of inner poetical glow. Abundant applause rewarded the performer."(New York American 9. February 9, 1934, 15)

Percebe-se, das citadas referências, a existência de diferenças de concepções de repertório entre Hans Lange e Guiomar Novaes, o primeiro interessado sobretudo na renovação do repertório, a segunda antes em obras nas quais pudesse melhor desenvolver as suas qualidades estético-musicais interpretativas e de execução. Mesmo estas, porém, ainda que louvadas por aqueles que como Henriette Weber valorizavam sobretudo qualidades de musicalidade, não vinham de encontro a críticos que desejavam maior ardor.

Essas críticas sugerem diferenças de orientação estética entre Hans Lange e Guiomar Novaes que podem ser elucidadas considerando-se os pressupostos culturais da formação de ambas as personalidades.

O intuito renovador de repertórios de Hans Lange pode ser aqui analisado a partir do passado de seu pai na vida musical de Constantinopla, empenhado na difusão de obras de grandes compositores alemães em meio cultural totalmente diverso, em particular daquelas do Classicismo, e de sua formação em centros musicais da Europa Central estreitamente relacionados com a vida musical da Turquia. Guiomar Novaes, marcada pela sua formação pianística no Brasil e na França, surgia antes como representante de uma outra visão da atividade artística, centrada antes no cultivo da sensibilidade de concepção e interpretação.

De ciclo de estudos sob a orientação de
Antonio Alexandre Bispo



Todos os direitos relativos a texto e imagens reservados. Reproduções apenas com a autorização explícita do editor.

Indicação bibliográfica para citações e referências:
Bispo, A.A. "Alemães na vida musical do Império Osmano e a emigração de "alemães do Bósporo" ao Novo Mundo: Paul Lange (1857-1919), Hans Lange (1884-1960) e Guiomar Novaes (1895-1979)".
Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 144/15 (2013:4). http://revista.brasil-europa.eu/144/Hans-Lange-e-Guiomar-Novaes.html