Revista

BRASIL-EUROPA

Correspondência Euro-Brasileira©

 

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Langres. Foto A.A.Bispo©


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Langres. Foto A.A.Bispo©


Langres. Foto A.A.Bispo©



Fotos.A.A.Bispo.
©Arquivo A.B.E.

 

Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira 145/3 (2013:5)
Editor: Prof. Dr. A.A.Bispo, Universidade de Colonia
Direção administrativa: Dr. H. Hülskath

Organização de Estudos de Processos Culturais em Relações Internacionais (ND 1968)
Academia Brasil-Europa
Instituto de Estudos da Cultura Musical do Mundo de Língua Portuguesa (ISMPS 1985)

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2013 by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501

Doc. N° 3025




Aproximações ao espírito da Encyclopédie
na cidade de nascimento de Denis Diderot (1713-1784)
em tempos de globalização e renovado enciclopedismo


Visita a Langres pelos 300 anos de Denis Diderot
e pelos 40 anos da introdução da disciplina Estética
na Licenciatura em Música e Educação Artística da Faculdade de Música do Instituto Musical de São Paulo,
como início dos estudos de Estética e Filosofia da Música em cooperações internacionais referenciados pelo Brasil

 
Langres. Foto A.A.Bispo©

Pelos 300 anos de nascimento do escritor e filósofo francês Denis Diderot (1713-1784), ao lado de Jean-Baptiste d'Alembert (1717-1783) um dos principais responsávels pela Encyclopédie e grande vulto do Iluminismo, realizou-se uma visita à cidade em que nasceu e na qual recebeu a sua formação: Langres, cidade do Departamento francês Haute-Marne da região Champagne-Ardenne.

O tricentenário do pensador é celebrado na sua cidade de nascimento no âmbito do Langres Diderot 2013, um projeto de amplas dimensões e de significado cultural e educativo, com a participação de diferentes cidades e instituições, apoiado pelo Conselho Regional de Champagne-Ardenne e ORCCA, pelo Conselho Geral da Haute-Marne e Arts Vivants 52, dos Ministérios da Cultura, Comunicação e Educação, da Europa e de instituições particulares e personalidades da cultura e das artes. Um de seus eventos, de título Bienvenue Monsieur Diderot, marcou o movimento cultural que tem a sua maior expressão na criação de um museu, o único dedicado a Diderot na França, a Maison des Lumières Denis Diderot, inaugurada no seu dia de nascimento, 5 de outubro.

Em setembro de 2013, realizou-se a terceira edição dos Rencontres Philosophiques de Langres, patrocinados pelo Ministério da Educação e organizados pela municipalidade e pelo Forum Diderot-Langres, dedicado ao tema "Matéria e espírito".  Escopo último das celebrações é marcar a imagem de Langres como uma cidade da filosofia e das luzes.

Langres. Foto A.A.Bispo©

Estudos eurobrasileiros e o tricentenário de Diderot

O objetivo desse empreendimento foi o de considerar em contexto adequado os pressupostos do pensamento de Diderot e de sua obra à luz dos complexos temáticos que vêm determinando os trabalhos eurobrasileiros. Estes vêm acentuando, entre outros aspectos, a necessidade de uma reconscientização da tarefa esclarecedora que cabe aos Estudos Culturais em presente marcado por tendências obscurantistas, sobretudo de natureza religiosa. (Veja e.o. http://revista.brasil-europa.eu/140/Ciencia-e-religiao.html; http://revista.brasil-europa.eu/144/Turquia-Alemanha-Brasil.html)

A celebração de Marseille como Capital Européia da Cultura 2013 e, ao mesmo tempo, a atenção particular dirigida às relações entre a Alemanha e o Brasil em 2013 nos estudos eurobrasileiros tornam oportuna a lembrança de um pensador francês do Iluminismo que manteve estreitas relações com personalidades alemãs, influenciando sensivelmente o desenvolvimento da Filosofia e marcando a história intelectual da Alemanha.

As reflexões que vêm sendo dedicadas às relações entre o Mediterrâneo e o Atlântico motivadas pela atualidade de Marseille (http://www.revista.brasil-europa.eu/138/Estudos-e-Esclarecimento.html) puderam ser prosseguidas também em Langres, uma vez no seu planalto originam-se alguns dos mais importantes rios da França, entre êles Seine, Aube e Marne. A cidade é situada no Canal Marne-Saône, uma via que permite, através de outros canais e rios, uma ligação fluvial entre a região parisiense e o Mediterrâneo.

Ao mesmo tempo, os trabalhos tiveram a atualidade de inserir-se nas preocupações do presente quanto à tradição do pensamento esclarecido na Rússia e em outros países do Leste marcados por um recrudescimento sob muitos aspectos questionável do poder da Ortodoxia, discutidas durante recente visita efetuada a S. Petersburgo (Veja http://revista.brasil-europa.eu/143/Baltico-Brasil.html).

Lembrou-se aqui do significado de Diderot e da sua biblioteca na abertura russa ao Ocidente do século XVIII, uma vez que foi apoio de Catarina II (1729-1796) que auxiliou-o com a aquisição de sua biblioteca e com uma pensão anual. Diderot gozou de grande prestígio em S. Petersburgo Diderot, tendo visitado a Rússia em 1773.

Essa visita a Langres não foi a primeira efetuada a esta cidade e também a atenção dirigida a Diderot e à Encyclopédie não é recente nos trabalhos eurobrasileiros das últimas décadas.

Filosofia, Estética Musical, Estudos Culturais e da Educação nos estudos eurobrasileiros

Estes vêm sendo desenvolvidos à luz de uma orientação de pensamento iniciada no Brasil há 4 décadas e que relaciona a Filosofia aos Estudos Culturais e às Ciências da Educação.

A partir do direcionamento da atenção a processos - e não a esferas culturais - no sentido de renovação teórica de áreas de estudos voltadas à cultura, que levou em 1968 à fundação da entidade que hoje constitui a organização de estudos de processos culturais em relações internacionais , a introdução da Estética em cursos superiores de Licenciatura em Educação Musical e Artística da Faculdade de Música e Educação Artística do Instituto Musical de São Paulo, em 1973, desenvolveu-se de forma estreitamente vinculada à Etnomusicologia e à História da Música orientadas segundo processos culturais em contextos globais.

A repercussão na Alemanha dos trabalhos assim iniciados e orientados deu-se com a participação do editor desta revista como representante das respectivas disciplinas em seminário dedicado à Estética e Filosofia da Música levado a efeito no Instituto de Musicologia da Universidade de Colonia, em 1975, Esse seminário, sob a direção de Heinrich Hüschen, incluiu trabalhos e discussões relativos a autores franceses no desenvolvimento histórico do pensamento filosófico de particular relevância para o estudo da Estética, e, entre êles, Diderot.

Do ponto de vista brasileiro, a atenção foi dirigida mais especificamente a Jean Jacques Rousseau (1712-1778), considerando-se, porém, os seus estreitos elos pessoais e de pensamento com Diderot.

As muitas obras de Diderot que consideram questões musicais foram então discutidas (Mémoires sur différens sujets de mathématique, 1748; Lettre sur les aveugles, 1749; Lettre sur les sourds et les muets, 1751; Arrêt rendu à l'opéra, 1753 e.o.). Principal foco de debates foi a concepção da imitação da natureza, dos sentimentos, afetos e paixões, em particular no acompanhamento da ária e no recitativo segundo o princípio da declamação.

Momentos relevantes no desenvolvimento dos trabalhos eurobrasileiros voltados à Estética e à Filosofia com  particular atenção à Educação Musical/Pedagogia Comparada deram-se na Semana França-Alemanha realizada pelas cidades geminadas de Leichlingen e Marly-Le-Roy, em 1983.

A atenção concentrou-se nesse evento sobretudo nas relações de Denis Diderot e J. Ph. Rameau (1683-1764), cujo jubileu então se celebrava, primeiramente positiva, posteriormente conflitante a partir da assim-chamada disputa dos bufonistas, discutindo-se textos (Les Trois chapitrês ou la Nuit du mardi-gras ou mercredi des cendres, 1753; Le Neveu de Rameau, ca. 1761; Leçons de clavecin et principes d'harmonie, par M. Bemetzrieder, 1771, e.o.).

Para além de estudos relativos à recepção do pensamento de Diderot no Brasil, tratou-se sobretudo da questão do primordial papel a ser concedido ao idioma italiano pelo filósofo. Considerado como mais adequado à expressão das paixões do que o francês, foi discutida em forma comparada sob a perspectiva da questão do italiano e do português na ópera e no canto em geral, em Portugal e no Brasil.

A consideração de Diderot e outros pensadores franceses, assim como da Encyclopédie em ciclos universitários voltados à música no Encontro de Culturas e, em particular, no projeto dedicado às culturas indígenas iniciado e dirigido pelo editor desta revista a partir de 1992 (A.A.Bispo, "Die Musikkulturen der Indianer Brasiliens: Stand und Aufgaben der Forschung IV - Zur Geschichte der Forschung", Musices Aptatio 2000/2001, Roma/Colonia 2002, 9- 419) levou à realização de seminários nas universidades de Bonn e Colonia sôbre Filosofia Intercultural, Teoria das Artes, Estética e Ética, Estética e Imigração (Veja e. o.http://www.revista.brasil-europa.eu/096/Tema096.htm).

Marco de importância nesse desenvolvimento foi o primeiro colóquio internacional realizado em iniciativa da AB.E. à Estética e Filosofia nas suas relações com os Estudos Culturais em contextos globais e, em particular, a correntes do pensamento francês (2005). (Veja http://www.brasil-europa.eu/Anais/Anais_Coloquios.html )

Langres. Foto A.A.Bispo©

Langres como cidade de nascimento e formação de Diderot

Situada nos altos de uma montanha, a situação topográfica de Langres explica o significado do local na Antiguidade como sede de fortificação (Andemantunum). Tomada pelos galios, colaborou com César e foi romanizada.

Essa época antiga da história de Langres, lembrada em edificações, entre elas sobretudo a Porta da Vitória, assim como nos fundos conservados no Musée d'art et d'histoire, ficou marcada pelas tentativas de resistência do povo local, pela narrativa da fuga e do esconderijo do seu chefe em gruta na região da fonte do rio Marne e pela sua execução em Roma.

Nessa tradição residiriam os fundamentos de uma auto-consciência local de resistência à ocupação e opressão romana que possivelmente explicam um espírito refratário à sujeição à Igreja romana que se manifesta na vida e no pensamento de Diderot.

O processo de cristianização da cidade iniciou-se já no século III, e já no século IV tornou-se Langres sede episcopal, sendo um dos seus primeiros bispo S. Didier. Ainda que o bispado tenha sido transferido para Dijon já no século V, retornou a Langres no século IX. O poder político dos bispos intensificou-se no decorrer da Idade Média, que adquiriram até mesmo permissão real para o cunho de moedas, fundamentando um aumento da importância de Langres e o seu florescimento. Os bispos de Langres passaram a pertencer aos Pares da França, recebendo o título de Duques. Esse poder político episcopal correspondeu ao significativo papel desempenhado por Langres no fomento de abadias que procuravam a reforma ou restauração da vida monástica, alguns deles situados na área, entre êles de Clairvaux, Morimond e Molesme.

Os estreitos elos de Langres com o reino da França solidificaram-se em fins do século XIII. Devido à sua posição geográfica e topográfica, nos limites com a Burgúndia, a Lotríngia e ao Franche-Comté, a cidade experimentou uma revivência de seu papel de cidade fortificada.

Culto a mártir da Capadócia em Langres


Ao redor de 750 - assim como em 814 e em 1204 - foram trazidas para Langres as relíquias de S. Mammés, mártir de Capadócia (ca. 275), santo que tornou-se padroeiro da igreja catedral. Também neste sentido evidencia-se a atualidade de Langres, considerando-se a atual atenção ao interesse pela Capadócia e pela história religioso-cultural que remonta à Ásia Menor (http://revista.brasil-europa.eu/144/Turquia-Alemanha-Brasil.html)

O maior monumento de Langres é a catedral St-Mammès, construída entre 1150 e 1196. Manifestando na sua linguagem arquitetônica a passagem de uma cultura românica como encontrada na Burgúndia ao Gótico na sua fase inicial, pode-se ler no seu interior uma repercussão estilística da intensificação de elos político-culturais com o reino da França.

Assim como em Nancy, também Langres experimentou um período de florescimento econômico e desenvolvimento arquitetônico e cultural à época da Renascença.


Jesuítas e Oratorianos na vida religiosa, cultural e no ensino em Langres

Para o período subsequente, a atenção deve ser dirigida à presença dos jesuítas. O colégio da Companhia, na principal rua da cidade, representa hoje um dos principais monumentos históricos e arquitetônicos de Langres, indica a intensidade com que a militância da Sociedade de Jesus instituiu-se na cidade.


Essa influência da Sociedade de Jesus procedeu-se como em outras regiões do mundo sobretudo através do ensino.

Foi no colégio dos jesuítas, que após o período revolucionário passou a ter o seu nome, que Diderot adquiriu a sua formação. Chamados em 1621, os religiosos estabeleceram o seu colégio ca. de trinta anos mais tarde, criando uma instituição que podia acolher até 200 jovens de famílias da cidade e região.

Vítima de um incêndio em 1746, o edifício foi reconstruído, sendo o seu término não presenciado pelos religiosos, uma vez que foram expulsos do reino em 1762.  A capela do colégio demonstra o Barroco que ali se implantou.

Um edifício localizado há pouca distância do colégio traz à consciência a necessidade de uma consideração mais aprofundada da história de movimentos religiosos na França para a compreensão do contexto em que decorreu a formação infanto-juvenil de Diderot e que pode explicar a sua distância relativamente ao predomínio eclesiástico no pensamento: a capela dos Oratorianos, desativada na Revolução e que hoje é utilizada como teatro.


Construída em 1616, essa capela remonta à ação da congregação dos Oratorianos na direção do seminário e na formação dos sacerdotes da Diocese a convite de um de seus bispos.

Como sede de um Oratório de Jesus, Langres desempenhou significativo papel no movimento de restauração do estado sacerdotal na França do século XVII. Esse movimento, remontante a Pierre de Bérulle (1575-1629) e ao fomento da adoração do Santíssimo Sacramento e marcado pela concentração do pensamento no sacrifício e na Eucaristia, encontrou no seu sucessor, Charles de Condren (1588-1641), um promotor ativo da fundação de seminários, sendo difundido, entre outros, por Johannes Eudes (1601-1680) e Jean-Jacques Olier (1608-1657). (Veja e.o. http://www.revista.brasil-europa.eu/128/Cor-no-Gotico.html; http://www.revista.brasil-europa.eu/128/Ultramontanismo-e-arquitetura.html)

Tensões entre correntes recatolizadoras e procura de saber esclarecido

Uma especial atenção merece o campo de tensões religiosas na própria família de Diderot. Se o seu tio por parte da mãe era capitular da catedral Saint-Mammès, o seu pai era jansenista, um movimento de oposição católica crítico relativamente a posições dos jesuítas, do poder papal e de ordens que atuavam independentemente dos bispos ou de ordens medicantes, considerado como herético desde 1642 e, por fim, proibido. Essa corrente crítica teria preparado a suspensão da Companhia e mesmo, de forma complexa e nem de todo coerente, a influência iluminista no Catolicismo.

Também relacionados com a religião foram os conflitos do filósofo com os seus irmãos, um dos quais tornou-se sacerdote e capitular de Langres, e uma irmã religiosa da Ordem das Ursulinas. Os seus pais desejavam que também Denis Diderot seguisse a vida sacerdotal, tendo êle recebido as ordens menores em 1726 e a tonsura pelo bispo de Langres.

O quadro assim esboçado do contexto em que a primeira formação de Diderot em Langres se desenvolveu demonstra complexas tensões interno-católicas da vida local da época que podem elucidar o caminho do seu pensamento.

Previsto para a vida religiosa e aluno de seminário, o jovem Denis Diderot conheceu um ambiente intelectual extremamente conservador, de fervor piedoso e restaurador, preocupado com a formação de uma nova geração de religiosos segundo princípios disciplinadores em crítica a um clero visto como por demais secularizado, a uma santificação e moralização de sacerdotes em orientação espiritual ao culto, como fomentada pelos Oratorianos.

Entre tendências místicas de tradicionalismo extremado e erudição jesuítica

Essa orientação espiritual e mesmo um ambiente de vida marcado por estreiteza de visões, tradicionalismo e bigoteria contrastavam com aqueles que vivenciou no colégio dos Jesuítas. Aqui teria sido marcado antes por tendências a ampla erudição em época na qual vários religiosos da Sociedade de Jesus se destacaram com obras dedicadas a sínteses e sistematizações de conhecimentos, a um edifício de saber que levava em consideração a antiga cultura, tradições de diferentes povos e mesmo resultados de estudos científico-naturais.

Como demonstra a obra dedicada aos indígenas americanos do pai da Etnologia ou melhor, da Comparatística Cultural de Povos do Jesuíta francês Joseph-François Lafitau (1681-1746) (Veja http://www.revista.brasil-europa.eu/128/Imagem-do-indio.html), esses esforços de reconhecimento ou de construção de edifícios abrangentes de conhecimentos dos Jesuítas exigia uma constante atenção de seus autores em manter a perspectiva histórica cristã e não ferir princípios teológicos sob o risco de condenação pela própria ordem, pela Igreja em geral e pela censura.

Edifícios de saber integralizante dos jesuítas e o anelo esclarecedor do enciclopedismo

Apesar dessa formação marcada pela tendência da erudição jesuítica à abrangência por assim "enciclopédica" mas a serviço de fins religiosos, a tradição jansenista paterna sugere uma relação ambivalente ou crítica relativamente aos jesuítas.

A força dos censores sentiu o livre-pensador já na sua obra Pensées philosophiques, condenada a ser queimada, e a sua Lettre sur les aveugles (1749) levou Diderot por meses à prisão.

O monumental projeto da Enciclopédia, levado a efeito juntamente com o matemático d'Alembert a partir de 1745, diferenciou-se na sua orientação teórica de outras obras de cunho abrangente que se mantinham subordinadas a perspectivações histórico-cristãs e fundamentações teológicas.

Nesse intento, a Enciclopédia representou um extraordinário esforço de coleta e apresentação abrangente e relacionada de conhecimentos, assim como de interpretação do saber de natureza secular, o que explica as pressões e repressões sofridas pelo seu iniciador e as dificuldades encontradas pelo empreendimento.

As reflexões em Langres trouxeram à consciência singulares paralelos do contexto de formação de Diderot e o caminho que tomou com a Encyclopédie e a atualidade, salientando o significado de análises históricas da época das Luzes para o aguçamento da sensibilidade para problemas do presente.

As últimas décadas foram marcadas por uma crescente intensificação de movimentos restaurativos voltados ao culto e ao fervor religioso, fundamentalistas em vários sentidos, criando tensões e conflitos internos no Catolicismo e nas suas relações com o mundo intelectual e acadêmico. A intensidade dessa intensificação religiosa torna-se sensível no presente, quando um Papa jesuíta deixa perceber nos seus primeiros atos e gestos uma mudança de prioridades e de métodos de procedimento.

Ao mesmo tempo, as possibilidades abertas pelos meios eletrônicos possibilitam a difusão de conhecimentos em dimensões que nenhuma enciclopédia até então possibilitou. Esse nova fase enciclopedista da atualidade, porém, não dispensa reflexões sobre as perspectivas com que edifícios de saber são construídos e interpretados, podendo a acumulação do saber trazer riscos comparáveis àqueles das obras abrangentes de edifícios integralizantes de pensadores religiosos do passado.

Reflexões e debates filosóficos no contexto do tricentenário de Diderot podem assim trazer à consciência a necessidade de contínua manutenção da atenção às dependências e condicionamentos culturais e sobretudo religiosos daqueles que se empenham em estudos de edifícios globais de conhecimentos.

De ciclo de estudos sob a orientação de
Antonio Alexandre Bispo





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Indicação bibliográfica para citações e referências:
Bispo, A.A. "
Aproximações ao espírito da Encyclopédie na cidade de nascimento de Denis Diderot (1713-1784) em tempos de globalização e renovado enciclopedismo". Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 145/3 (2013:5). http://revista.brasil-europa.eu/145/Langres-Diderot-2013-Brasil.html