Retratos em tributo a anciãos indígenas

ed. A.A.Bispo

Revista

BRASIL-EUROPA 157

Correspondência Euro-Brasileira©

 

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N° 157/12 (2015:5)



Tema em debate


A fisionomia de vultos indígenas do passado e do presente
consciência histórica e dignidade:
portraits em museus do Canadá e do Alasca

II - Retratos em tributo a anciãos indígenas no Tongass Forests Center, Ketchikan


Seguindo proposição apresentada na Sala do Índio do Museu de História Diplomática do Itamaraty (2002)
no ano comemorativo dos 450 anos do Rio de Janeiro (2015)

 
Ainda que orientada segundo a mesma convicção de que as culturas indígenas não desapareceram, mas que permanecem vivas no presente, a exposição de portraits de indígenas do Tongass Forests Center em Ketchikan, Alasca/EUA, difere daquela da Galeria Etnológica do Royal Ontario Museum em Toronto (Veja).

A atenção no museu da metrópole canadense é mais dirigida ao passado, a do centro americano do Alasca ao presente.

No caso de Toronto, a temática da vitalidade atual das culturas indígenas é tratada históricamente na lembrança de líderes de grupos indígenas da época crítica da expansão colonial de fins do século XIX, da assinatura de tratados, da transferência de povos a reservas e da implatação de escolas que levaram em parte à assimilação cultural.

Celebrados são ali chefes que lutaram ao lado das forças leais à Coroa britânica, que defenderam soberanias ao lado do domínio britânico, que resistiram à perda de características culturais e de língua de seus povos no decorrer do processo integrativo. São lembradas as fisionomias dos líderes que lutaram pela conservação de expressões e valores.

No Tongss Forests Center de Ketchikan, os olhares são dirigidos a anciãos de época recente que, guardando na memória fatos, estórias e tradições, contribuiram à revitalização cultural de grupos indígenas do Alasca na atualidade.

Tributo a anciãos que conservam a memória histórica

A exposição de pinturas de personalidades de identificação indígena dos últimos anos não tem assim primordialmente um sentido histórico celebrativo, mas sim o de um tributo aos indígenas de mais idade que permitiram a conservação e o resgate de narrativas e práticas, permitindo a sua atualização em expressões e obras de arte de gerações mais jovens da atualidade.

Os retratos históricos em antigas fotografias, sem nomes, surgem apenas como ilustrações na exposição de documentos da história de Ketchikan.


Mundo atual e cultura indígena nos seus elos ambientais no presente

O centro salienta as profundas transformações sofridas pelo Alasca desde o início do século XIX. Quando chegaram os forasteiros, foram introduzidas diferentes formas de viver na comunidade nativa. A economia passou daquela de troca à da moeda. Ao aproximar-se o século XXI, muitas das tradições relacionadas com a terra e o mar ainda são mantidas. A lei do Alasca assegura que os habitantes podem manter os seus usos e modos de vida.

Os nativos vivem no mundo atual, mas a sua rica herança cultura permanece nas obras de artistas contemporâneos.

Em galeria de retratos de vultos indígenas, o Centro presta um tributo a anciãos nativos da região que contribuiram com a sua sabedoria e seu conhecimento para o desenvolvimento criativo de expressões em conservação e promoção atualizada de tradições.

Com esse procedimento, o museu, ainda que prioritariamente dedicado à floresta, estabelece uma ponte com outros museus e centros de pesquisas de arte, cultura e história dos indígenas, entre êles o Tongass Historical Museum, o Totem Heritage Center, o Alasca State Museum em Juneau, o Sitka National Historical Park Visitor Center e o Sheldon Jackson Museum em Sitka, a Comunidade nativa de Saxman e o Totem Bight State Historic Park em Ketchikan.

Relações com o ciclo do ano natural e respeito à natureza

O centro de Ketchikan adquire especial interesse para os estudos indígenas através da exposição de meios de subsistência e de trabalho nas relações do homem com a natureza. Assim, considera-se técnicas de pesca, secamento e defumação de salmões em textos e gravuras.

Também aqui, porém,  como em outras instituições americanas, constata-se uma tendência a uso de linguagem visual de cunho ilustrativo, no caso de difusão popular de revistas em quadrinhos. Ainda que com esses meios quase que de diversão, salienta-se o significado da natureza para o indígena, lembrando-se que por centenas de séculos os Tlingit, Haida e Tsimshian viveram em harmonia com as estações do ano..

Toda a sua alimentação, vestimentas, remédios provinha da terra e do mar. Usavam apenas os recursos que necessitavam e davam preito de gratidão a toda a árvore que tinham que cortar e a todo o animal que tinham de matar.

Apesar do seu cunho de ilustração popular, os quadros da vida nativa nas suas relações com o ciclo do ano do centro de Ketchikan trazem à consciência aspectos pouco considerados dos estudos do calendário de atividades e festas e de seus sentidos transcendentes do hemisfério norte em geral.

A partir do diferente contexto representado pelo Alasca relativamente àquele da Europa, outros animais e outras práticas são consideradas, enriquecendo e mesmo abrindo novas perspectivas para os estudos imagológicos do hemisfério norte e que foram transplantados para o Brasil no decorrer da colonização e cristianização.

Vivendo com a floresta - árvore que se sacrifica para tornar-se totem

O Centro saleinta que as florestas húmidas temperadas surgem como santuários na sua quietude impávida, nos seus mistérios dominados por árvores silenciosas de grande estatura. Essa impressão da magnitude quase que sagrada da floresta favorece a compreensão de sentidos mais profundos da arte indígena nas suas relações com o meio ambiente.

Das árvores da floresta, o homem criou os seus totems e máscaras para as suas cerimônias mais importantes, delas tirando meios para a alimentação e canoas para o transporte. A todas as árvores que tinham de cortar, davam preito de gratidão.

Entre os artistas salientados, cita-se Israel Shotridge, entalhador-mestre do grupo Tlingit. Em texto deste artista, este lembra que um entalhador é o encarregado pela sua tribo para a confecção de seus totems.

São chamados para esculpir ou criar algo belo de uma árvore, algo monumental. A própria árvore dá a sua vida. Assim, quando um artista entra na floresta para selecionar uma árvore, uma que seja grande suficiente e de crescimento perfeito, canta uma canção para a árvore. Não se corta a árvore sem respeito, uma vez que tem vida.

A árvore sacrifica-se a si própria para tornar-se monumento de beleza, esculpida pelas mãos de uma pessoa que recebeu ensinamentos de outros. Assim, a elaboração de um totem é mais do que esculpir um tronco. Um indivíduo deve conhecer a sua ascendência e sua cultura, o que é passado pela sua mãe. A árvore ajuda a completar o ciclo de transmissão por linha feminina dando-se a si própria. Assim, o artista canta uma canção tribal tradicional para agradecer à árvore e aos espírito de modo que haja uma conexão espiritual positiva.

Em geral, o homem nativo especializado em cortar árvores, jejuava e orava antes de decidir cortar os cedros para a feitura de canoas e casas.

A elaboração interna da barca era tarefa quase que exclusivamente feminina. Era uma mulher que procurava uma árvore apropriada para servir de canoa. Cortava-se duas tábuas do tronco, o que permitia que a árvore sobrevivesse. Prevendo que haveria necessidade de suprimento futuro, a mulher expressava a sua gratidão e o seu respeito agradecendo à árvore pela dádiva.

Vivendo com a terra - os potlatches e a natureza

Um aspecto central das práticas sócio-culturais dos indígenas norte-americanos, os potlatches, é considerado no centro nas suas relações com o meio ambiente. Os Tlingit, Haida e Tsimshian trabalhavam duramente durante a maior parte do ano para obter alimentação suficiente durante o inverno. Nas suas casas comunitárias, preparavam cestarias, comidas e máscaras. Durante vários dias, a família extensa e os convidados dançavam, cantavam, faziam alocuções e jejuavam em estreita relação com a terra e o mar.


De ciclos de estudos da A.B.E.
sob a direção de
Antonio Alexandre Bispo

Todos os direitos reservados



Indicação bibliográfica para citações e referências:
Bispo, A.A.(Ed.).“ A fisionomia de vultos indígenas do passado e do presente. Consciência histórica e dignidade: portraits em museus do Canadá e do Alaska II - Retratos em tributo a anciãos indígenas no Tongass Forests Center, Ketchikan“. 
Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 157/12 (2015:05). http://revista.brasil-europa.eu/157/Retratos_Indigenas_Ketchikan.html


Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2015 by ISMPS e.V.
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Academia Brasil-Europa
Organização de Estudos de Processos Culturais em Relações Internacionais (ND 1968)
Instituto de Estudos da Cultura Musical do Espaço de Língua Portuguesa (ISMPS 1985)
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Editor: Professor Dr. A.A. Bispo, Universität zu Köln
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