Apropriação de bens do espírito

ed. A.A.Bispo

Revista

BRASIL-EUROPA 158

Correspondência Euro-Brasileira©

 

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N° 158/8 (2015:6)





O ser atraído, possuído e a perda da liberdade de criação de imagens

a problemática imagológica da apropriação de bens do espírito:
Afrodite, terra taurina e „Pomba gira“ -
Santa Cruz!




 
Rio de Janeiro. Foto A.A.Bispo 2007


A atração do Brasil, em particular do Rio de Janeiro com a sua maravilhosa paisagem, atmosfera e vida, é uma constante referência nos relatos de estrangeiros que visitaram o país, marcando fundamentalmente a sua recepção e imagem.


A beleza arrebatadora da natureza e a sensualidade inebriante traz à mente a antiga Afrodite ou Venus: também ela, segundo o mito, surgiu irradiante das espumas do mar, tal qual as montanhas cobertas de vegetação esplendorosa levantando-se do Atlântico na Guanabara.


Se o Rio de Janeiro é o exemplo mais magnífico que justifica tal lembrança de Afrodite, ela diz respeito à toda terra descoberta pelos portugueses, extasiados que ficaram já na primeira chegada como revela a carta de Pero Vaz de Caminha (1450-1500).


Essa associação diz respeito, em dimensões ainda mais amplas, - ainda que nem sempre com os mesmos atrativos da pujante vegetação -, à toda a América o Sul: o levantar da terra do ilimitado oceano sempre foi uma experiência pessoal marcante e inesquecível de navegantes, imigrantes e viajantes após a longa viagem de travessia marítima.


Compreende-se, assim, que a imagem da terra que se levanta das águas na beleza de sua cobertura verde tenha sido não só decantada literariamente em relatos, mas imagem condutora de reflexões sobre o homem da terra e sua cultura, da sua psique e espírito e, a partir dela, do homem em geral. Sentindo no próprio íntimo a fascinação despertada pela visão da terra, aquele que chega percebe comoções que o abalam e o transformam. A interpretação do mundo que descobrem encontra correspondência com aquela de processos internos vivenciados, a Psicologia Cultural favorece e se relaciona com a auto-análise psicológica daquele que contempla participando.


Não há exemplo mais expressivo da força e do significado da imagem da terra que se levanta cheia de encantos das águas nas reflexões psicológicas e filosófico-culturais do que as „Meditações Sulamericanas“ do conde Hermann Keyserling (1880-1946).  (Graf Hermann Keyserling, Südamerikanische Meditationen, 2a. ed., Stuttgart Berlin 1933, 1a. ed. 1932, 151ss).


Nenhum outro viajante que esteve na América do Sul teceu reflexões tão profundas sobre a nova terra e descreveu de forma tão expressiva a vivência interior do ser atraído e do cair em amor pelo novo mundo descoberto, assim como as suas implicações e consequências como Keyserling.


A imagem da terra que surge em pujança de vida das águas teve nas suas reflexões e análises um prototipo: aquele da terra do relato da Criação do terceiro dia. Nele é narrado como as águas que cobriam a terra passam a correr, juntando-se nos oceanos, deixando que surja a porção sêca, coberta de vegetação e plantas que trazem semente.  Compreende-se, assim, que Keyserling tenha designado a América do Sul como „continente do terceiro dia da Criação“, fazendo desse relato da Gênese ponto de partida e principal referencial de suas meditações. (Veja)


A imagem da terra que se levanta da imensidão dos mares adquire com essa referência ao relato bíblico uma outra conotação, pois a narrativa dirige a atenção à saída das águas que a cobriam, um fluir que leva a um enxutamento, ao surgir gradativo da terra que, embora ainda húmida, revela-se na beleza do ser enxuta e coberta da vida vegetativa que cresce. O processo de enxutamento relaciona-se aqui com aquele do ascender e do crescer, do crescimento visível na vegetação, mas também de um processo interno vital, invisível, da força que vem da sementes dentro dos caules e troncos.


Para os europeus que chegam ao Brasil, a visão da terra que se enxuta das águas, coberta de vegetação que cresce, corresponde à primavera do hemisfério norte. Só a partir dessa perspectiva é que se compreende também a linguagem visual que parte de um correr das águas que cobria a terra e não da terra que se levanta das águas. No inverno que antecede à primavera, a terra é coberta de gêlo ou água fria, parada, que apenas no seu fim se degela e passa a fluir em rios caudalosos. A terra que surge como enxuta na primavera é manifestação perceptival daquela das profundezas frias e escuras invernais.


Já a época e as circunstâncias do descobrimento do Brasil indicam que os portugueses viram e vivenciaram a nova terra a partir de uma situação de imagens e da vida do hemisfério norte. Vinham preparados pela quaresma e celebravam o mistério pascoal e o período de festas que o sucedem. Não chegaram no Natal ou na festa de S. João, mas sim em época do ano que, no mundo espiritual e imagológico em que viviam, correspondia à entrada da primavera na Europa, a época em que a vegetação explode em pujança, não à estação do ano oposta na realidade externa que encontraram no Brasil. Vivendo nessa esfera do espírito, o seu céu não era aquele do Brasil, mas sim o do hemisfério norte.


Chegaram ao Brasil não no período descendente do ano do hemisfério sul, mas no ascendente do seu mundo espiritual referenciado pelo ciclo do ano natural europeu, não à época de esfriamento, mas a de aquecimento.


O grande sinal dos céus que marca nessas condições o surgimento da terra com o afastamento das águas que passam a correr é a figura do Touro no Zodíaco e, assim de Venus. Dois outros grandes sinais revelavam sentidos dessa época na leitura dos céus no mundo espiritual em que os europeus viviam e que não correspondiam àqueles do hemisfério sul à época das Descobertas, respectivamente abaixo e acima do Zodíaco: a constelação do grande rio que corre aos mares - Eridanus - e aquela nas alturas, a do Cisne, com a Cruz do Norte. A imagem do Touro surge nessa linguagem dos céus referenciada segundo o grande anti-tipo da Cruz, não daquela do Cruzeiro do Sul - de forma alguma! - mas a da Cruz do Norte, aquela que deu primeiramente o nome à nova terra: Terra de Santa Cruz ou de Vera Cruz.


Compreende-se, assim, em linhas gerais, as relações no campo de tensões tipo-antitipos entre a imagem da terra enxuta na beleza da vida vegetativa na sua pujança, aquela do Touro na potência da carne, desde a mais remota Antiguidade relacionada com Afrodite.


Alpes. Foto A.A.Bispo 2015

Esboço da problemática relacionada com Afrodite nos estudos euro-brasileiros


Desde o início do programa euro-brasileiro na Alemanha, em 1974/75, constatou-se o empenho extraordinário pelo Brasil de homens e mulheres que, tendo-o visitado e conhecido como turistas, correspondentes de jornais ou a estudo ou trabalho, haviam caído em amor para com a terra brasileira, sentindo-se a ela presos, não podendo soltar-se dos elos que a ela prendiam mesmo após anos de afastamento, desejando sempre retornar.


Como que obedecendo a um irresistível impulso interno, aqueles que visitaram o país manifestam, de retorno, esses estreitos vínculos com o país em iniciativas, projetos e eventos, em geral de difusão cultural. Sobretudo aqueles que atuam em esferas políticas e administrativas, com maiores possibilidades de influência e realizações, co-determinam de forma decisiva a presença do Brasil no Exterior.


Desde o início das interações constatou-se o papel influente desempenhado em sociedades bilaterais, círculos e realizações referentes ao Brasil por homens e mulheres que, provindos das mais diversas profissões, sem necessariamente formação específica em estudos brasileiros, latino-americanos, regionais, de etnologia, geografia cultural ou outros, empenhavam-se pelo Brasil como que com êle ligados em relações de amor.


Uma co-atuação internacional no desenvolvimento de estudos de processos culturais, como intencionada, não podia assim restringir-se a meios especializados, universitários ou da vida cultural, exigindo interações e cooperações com os aqueles que, mais do que amigos, surgiam como amantes da terra brasileira.


O convívio cooperativo com esses apaixonados pelo Brasil não deixava de revelar aspectos questionáveis, uma vez que, segundo a expressão „o amor é cego“, levava a uma pouca diferenciação na representação do Brasil no Exterior, favorecendo e mantendo estereotipos. 


Surgiu desde cedo como significativo que textos e realizações tendiam não a salientar conquistas do espírito, do engenho humano, do pensamento, das ciências, mas sim a atração exercida pelo Brasil no decantar e celebrar imagens do fascínio vivenciado, causa do amor e razão dos elos que prendem ao distante país.


Não a relatividade e a transformabilidade de imagens, não a sua análise e a construção de imagens condutoras para o futuro, mas sim a permanência, a consolidação e a celebração de estereotipos caracterizavam os empenhos e as realizações. Embora atraídos pela terra, conquistaram-na, pois continuavam a celebrar o que tinham conquistado, assumindo, porém as características daquilo que os atraiu. Estavam, assim, presos, sem liberdade para relativações, análises, questionamentos de imagens e construções de novas, de visualizações de outros desenvolvimentos, sendo todo o intento nesta direção vivenciado como uma espécie de traição.


Essa situação apresentava problemas relativos a questão de direitos de patrimônio espiritual, sendo refletida no âmbito de discussões sobre direitos autorais no sentido muito mais amplo de propriedade de espírito (geistiges Eigentum). A manutenção e a celebração de estereotipos impedia o reconhecimento da inserção de imagens em processos históricos e de criação de espírito, muitos deles identificáveis com o pensamento e a obra criadora de personalidades, apresentando-os como fenômenos não só a-temporais, como também despersonalizando-os e anonimizando-os.


Constatou-se, em muitos casos, que se tratava de complexos mecanismos apropriativos de idéias e imagens. Essa apropriação de bens de espírito levava a que estes fossem apresentados não como resultados de trabalho intelectual ou de construções de imagens do pensamento criador, mas como fatos óbvios, por assim dizer da natureza, à disposição, ou resultado da própria observação e experiência. Referências à obra criadora do espírito de personalidades da história do pensamento surgiam como perturbadoras, pois relativavam convicções de propriedade que, na realidade era posse de bens apropriados.


Essa problemática, que nos seus aspectos positivos e negativos mantém-se ainda hoje, foi um dos fatores que justificaram os estudos de recepção cultural e da imagem do Brasil na segunda metade da década de 70 e que levaram ao tratamento da questão de direitos autorais ou direitos do espírito no simpósio internacional de 1981, em São Paulo, com a participação de especialistas de organizações internacionais específicas, salientando-se aqui a presenta de especialista da Universidade de Paderborn. A esse simpósio seguiu-se o primeiro forum dedicado à imagem do Brasil no âmbito das relações Alemanha/Brasil, em 1982. (Veja)


Conotações de gênero: a imagem da mulher na atração exercida pelo Brasil


No forum de 1982, como nos trabalhos que a êle se seguiram, considerou-se que o fenômeno dos fortes vínculos com o Brasil que se revelam no extraordinário empenho de tantos homens e mulheres deveriam ser tratados nas suas conotações de gênero.


A maioria dos viajantes que publicaram relatos, assim como também escritores, poetas e músicos brasileiros associaram a paisagem da baía da Guanabarana com o feminino e que decantaramos atrativos da mulher carioca. No próprio Pão de Açúcar encontra-se uma representação plástica da Guanabara como mulher. (Veja)


Poucos foram aqueles que a relacionaram com o masculino, salientando estes então sobretudo o Rio noturno com a sua profusão de luzes, ou seja, dirigindo a atenção à obra do engenho humano, não à terra extasiante coberta de vegetação que surge das águas, como em Kasimir Edschmid. (Veja)


Esse acento dado à beleza, à atração e à fascinação feminina manifesta-se nos estereotipos que marcam a imagem do Brasil, que é representado e identificado não só como país do samba, futebol e carnaval, como também de mulheres belas e sensuais. Beleza física, sensualidade e atratividade desempenham importante papel em shows brasileiros no Exterior.


É compreensível, assim, que as preocupações por estudos de recepção cultural e de imagem do Brasil tenham incluido desde o seu início reflexões a respeito da força de fascinação e atratividade da mulher, da „garôta de Ipanema“ constantemente lembrada em colóquios de música, ou „da mulata“, mencionada até mesmo em pronunciamentos oficiais.


Essas reflexões não começaram do nada, mas foram preparadas por estudos anteriores, inserindo-se em longa tradição de pensamento, na qual as „Meditações Sulamericanas“ representam um marco. Nela, o fenômeno é refletido em dimensões maiores, extrapolando contextos em aproximações psicológico-culturais, de forças e processos no interior do homem.


A vivência de Keyserling de força que atrai, possui e prende o homem


Ponto de partida para a compreensão das elucidações de Keserling foi a sua experiência pessoal na América do Sul.


Vindo com o intento de não ensinar, mas sim aprender, o filósofo abriu-se em receptividade ao meio que desejava conhecer e que o atraía. Este abriu-se totalmente a êle, correspondendo a seu interesse, sendo por êle conquistado com as suas idéias e imagens transmitidas em conferências e em encontros. Assim o fazendo, afirma que sentiu tornar-se preso. Perdeu o poder de determinação e o controle de ocorrências, passando a ser determinado por outros e pelo que acontecia.


O que propunha ou previa não era realizado ou concretizado apenas se os outros tinham gana para fazê-lo. Não podia antever ou fazer planejamentos, pois tudo era realizado de improviso, de uma hora para outra. Planos não eram realizados sistematicamente, e se feitos, eram deixados de lado sem maiores problemas, ficando inacabados ou realizando-se algo totalmente diferente.


Era dependente assim de iniciativas e ações de outros e percebia que estas não eram guiadas por visões claras e objetivos determinados, mas que surgiam ad hoc. Tudo era feito em cima da hora, e tentativas de estabelecer previsões do que fazer, de planos ou projetos, ou mesmo de procurar corresponder ao proposto eram mal vistas, surgindo quase que uma perturbação de um decorrer natural.


Recebia visitas inesperadas, a altas horas da noite ou durante o seu trabalho, e recusá-las seria comprar inimizades. Esses visitantes vinham sem maiores razões ou objetivos, simplesmente vindo por vir, ficando por ficar, sem atentar se eram importunos ou não. Negar que entrassem e ficassem seria sentido como uma ofensa, não se sabendo porém o que queriam e por que ficavam.


Tudo era deixado para amanhã, pois não se tinha gana de fazê-lo, realizando-se então ações no último momento e de forma imprevisível e inesperada. Perdeu assim a capacidade de influenciar ou dirigir desenvolvimentos, passando a ser determinado por outros. Sentia-se como se perdesse a liberdade quanto a idéias, propostas, criação de imagens condutoras de realizações, tornando-se assim preso, algemado a situações e decorrências que não podia controlar e compreender.


Constatou logo, porém, que também os sulamericanos que o visitavam a altas horas e tudo improvisavam não agiam movidos em auto-determinação, mas também eram determinados de fora, e isso se ampliava em cadeia para toda a sociedade, sem poder-se identificar o agente inicial determinante.


Era como se uma força misteriosa tudo impregnasse e levasse tudo e todos a uma situação de queda em passividade. As ações não eram feitas por iniciativas tomadas por vontade, mas sim em dependência do se ter ou não gana.


O homem passava a ser possuído, caía em posse de uma força indefinida e misteriosa: a gana. Esta era como uma força vinda de profundezas inconscientes, sendo a sua principal característica o ter, o possuir, o que levava a um constante apossar-se. Para isso, essa esfera da vida de gana precisa conquistar o que quer através da tentação e, quando o fascinado cai na sua posse, está perdido, pois é levado às profundezas de suas trevas.


A falta de vergonha e de pêso de consciência na prática de falsidades e despistamentos


Muitas mulheres da América do Sul ofereceriam para Keyserling um exemplo expressivo da vida primária, ainda não determinada pelo espírito. A proximidade das trevas, onde a luz da consciência apenas desponta, explicaria a falta de pejo e de pêso de consciência com que se constatava a prática de falsidades, despistamentos e intrigas na América do Sul.


Não haveria em nenhuma outra parte do globo tanta indiscreção, tanta difamação do que aquela entre amigas na América do Sul. Nenhuma mulher da terra usaria de forma tão magistral todas as possibilidades da passividade e do despistamento. Nenhuma teceria tão bem armadilhas para prender homens e nenhuma usaria tão sem escrúpulos da instituição do casamento para prendê-los. (loc.cit.)


Fidelidade no casamento, porém, não significava em geral outra coisa do que preguiça ou languidez. Citando outros observadores europeus, Keyserling menciona a opinião de que as mulheres sulamericanas ou eram tartarugas ou víboras. Com isso, indiretamente e de passagem - e dando margens a má-interpretações - menciona antigas imagens do cágado e da serpente, de importância para a compreensão do edifício cultural.


Em nenhuma outra parte do mundo os sentimentos femininos mudariam tão radical e abruptamente ao menor motivo, e em nenhum outro lugar haveria tão frieza nas profundezas das maiores paixões.


Com essas palavras, Keyserling não queria negar as altas qualidades das mulheres sulamericanas, tendo apenas a intenção de salientar o pêso do que compreendia como „feminilidade de origens“, graças à qual seriam as mulheres do subcontinente tão tentadoras.


Segundo Keyserling, porém, a mulher é apenas „má“ à medida que a vida primordial é má. O que seria visto como feminino seria manifestação do modo de ser da vida primária, da terra das profundezas: uma primordial impotência, insegurança que levava ao ímpeto de querer ter e apropriar-se, ao mêdo e a mentira primordiais.


A „femme fatale“ ou a „mulher húmida“


Utilizando-se da imagem das relações entre o homem e a mulher, Keyserling trata dessa força que passava a possuir e prender na figura da mulher cuja gana pode encantar, ligar, vinculando o homem de forma absoluta e sem salvação. (op.cit. 164)


Via esse tipo de mulher representado na „femme fatale“, um tipo de mulher que tinha encontrado com grande frequência na América do Sul. Fazia diferença, porém, entre o cair em elos com essa „femme fatale“ e o cair em amor por uma mulher que representasse o todo de uma personalidade, englobando corpo e alma. Essa última era, ao contrário da „femme fatale“, musa de poetas e artistas, incentivadoras do seu espírito.


Nos elos com a „femme fatale“, que surgia como manifestação da gana, tratava-se de uma ligação diferente do amor. A ligação era a-pessoal, e aqui risidia o horror de nela cair. (op.cit. 165)


Ela se manifestaria numa indeterminação a-pessoal do amar e do odiar. Nela cair significaria ser tomado por extremos ciúmes, pois a exclusividade do querer possuir da mulher-gana exige absoluto monopólio. Ela corresponderia á „mulher húmida“ de Goethe, que atrai o homem e este cai: em parte ela o puxa, em parte êle imerge (Halb zog si ihn, Halb sank er hin). (ibidem)


Da parte do homem, este luta contra a prisão, e essa luta levaria a atrocidades e a crimes. Por parte da mulher sujeita a essa atração da gana, a situação era diferente, pois passaria a querer possuir e querer ser presa, querer sofrer, preferindo sofrer de cíúmes do que ser vazia, sendo que a sua malvadeza expressar-se-ia em instabilidade de humor e caprichos. (op.cit. 165)


Essa potência feminina da terra ligaria sem querer. A sua força de atração residiria segundo Keyserling no fato de que ela própria sofre com a sua força de tentação. Sentindo como estranha a seu eu, ela deseja ser redenta desse poder de atrair, querendo, no lugar de dominar, na realidade servir. Uma „femme fatale“ com talento intelectual equivaleria a uma Kundry do Parsifal wagneriano ou Cundrie da tradição arturiana, a feiticeira ou bruxa.


Com essa atitude de sofrer com a sua própria força de atração, ela liga o homem ainda mais, pois incentiva a sua fantasia.


Essa força insuperável de atração reside nas profundidades, para além da esfera do eros da alma, abaixo do próprio sexo, nas profundezas infernais, onde, nas suas palavras, as „serpentes transpassáveis pelas trevas se enroscam e giram em eternos círculos“ .


„Sie liegt in der Unterwelt des dritten Schöpfungstags, wo sich die fahlen finsternis-durchlässigen Schlangen mit den Basilisken-Augen in unlöslichem Zusammenhängen und Verfließen in ewigem Kreise winden. Verfallen Männer dieser Kraft, dann handelt es sich um Unterweltlicheres als bei aller Liebe und bei allem Begehren“. (op.cit. 164-165)


Se os homens caem sob essa força, são subjugados por algo mais infernal do que todo o amor e todo o desejo sexual. Trata-se de uma dependência absoluta, que o leva para baixo em escravidão. O homem é escravo. (ibidem)


O possuir como resultado de desejo de segurança - o prestígio do ter


Keyserling considera como a principal característica da mulher-gana o querer possuir, o apossar-se, o ter propriedade do possuído, que passa a considerar como sendo próprio.


O indivíduo que afirma em si a passividade e o querer possuir, afirma a sua vontade de segurança e encarna a mulher-gana.


A forma primária de procurar segurança é o de possuir. A segurança  não é procurada na defesa, mas na impossibilização de ser atacado. Isso é possibilitado pela propriedade e pelo possuir o necessário espaço de vida.


Keyserling supõe que a raíz terrena da consciência do Direito estaria no sentimento de propriedade. Isso explica a razão do prestígio do ter-se propriedade..


Prestígio teria assim aquele que tem mais do que outros.  Prestígio e a procura de riqueza no Novo Mundo não significam assim nessa corrente de pensamento libertação das raízes da existência, mas, ao contrário, proximidade às raízes, ao mundo tenebroso primordial onde despontou primeiramente a luz da consciência.


Ter propriedade significa um direito instintivamente percebido como de poder na América do Sul.


Seria a mulher, não o homem aquela que quer originalmente propriedade e segurança. Por isso, Keyserling via um cunho feminino em ideais de Estado que prometem segurança social.


Daí, segundo êle, explicar-se-ia que sistemas matriarcais teriam sido característicos daqueles de povos de propriedade. Os povos patriarcais teriam desejado apenas uso ou recursos, não propriedade. Nessas considerações, Keyserling volta a acentuar dois fatores básicos nas suas reflexões: se o mêdo primordial é o feminino, o masculino representa a fome inicial.


Keyserling considera como compreensível que espiritualidade seja considerada em geral como contrária ao desejo de possuir e, assim, espiritualização com sublimação do conceito de direito de propriedade. Essa concepção, porém precisaria ser diferenciada se tudo fosse visto sob a perspectiva da terra, uma vez que propriedade é coisa totalmente da terra. Para essa, não há nada de mal em apossar-se, pois corresponde à sua natureza.


Por outro lado, dever-se-ia compreender aqueles que por motivos espirituais são contrários ao materialismo do presente. A grande maioria dos homens faltaria a segurança elementar contra o mêdo primordial e, sem este, o fluir da vida em sentido nobre apenas é alcançável para aquele que é enraizado no espírito e não mais determinado por motivos terrenos. Nesse sentido, a pobreza surge como privilégio, tal como no Brahmanismo ou nos monges do Cristianismo.


Apropriação de idéias, obras e projetos aos quais o amado se dedica


Esses amores e os ciúmes da terra que se manifesta no terceiro dia, surgindo das águas, são entendidos no seu sentido extenso.


Valeria para a dedicação de um artista à sua obra de arte, ou para o cientista ou intelectual para a sua pesquisa ou atividade, que surgem para essa mulher-gana como uma espécie de traição. A profissão do amado apenas é aceita pelo fato de ser útil para a sua segurança. A tomada de posse de temas, de idéias, de projetos, iniciativas e visões não é feita com consciência pesada pelas mulheres-terra nas suas diversas modalidades, ganhando estas pelo contrário a convicção de que o apropriado lhes pertence. Revertem assim o processo de apropriação, vendo naquele que foi desapropriado na realidade o apropriador das suas idéias, projetos, iniciativas e visões.


Isso explicaria segundo Keyserling os ciúmes e as invejas numa humanidade marcada pela gana, como na América do Sul, na qual aquilo ao qual o amado ama é apropriado, também no sentido de idéias, planos e projetos. As obras ou empreendimentos que merecem a atenção de artistas, intelectuais e pesquisadores passam a ser vistas com ciúmes.


Esse desejo de ter, de possuir, de posse e sua manutenção seria mais decisivo do que aquele de ser tomada. Este desejo de ser conquistada dependeria do impulso de entrega física ao amado; isso levaria a querer fazer-se atrativa. O anelo de possuir, que leva ao querer apropriar-se do que ama, porém, seria mais forte e interminável.


Na explanação de Keyserling, embora esse impulso de apropriação fosse potencialmente mais acentuado em mulheres, também os homens poderiam deixar-se reger pela mulher-gana em si ou mesmo encarná-la. Tratava-se, na realidade de uma problemática do interior do ser humano.


O homem que é regido pela mulher-gana e aquele que encarna a mulher-gana


O homem que se liga á mulher-gana aceita irracionalmente as normas da gana e as assume de forma obtusa e estúpida: é „burro“.


O homem, com a sua outra forma de amar e desenvolver „melodias de vida“, sente consciência pesada perante uma mulher que ama e que vê idealizada. Não é assim inteligente, e passa a esforçar-se em satisfazer a vontade de posse da gana, trabalhando ou esforçando-se sem fim. Sendo regido pela mulher-gana, e possuindo uma outra forma de amar, o homem precisa ter uma moral dupla para criar o necessário equilíbrio. É uma pessoa assim preocupada com um balançar de impulsos: é Balança.


É, por fim, abandonado, pois a mulher-gana com o término dessa „melodia da vida“, passa a outro, em geral o seu rival ou concorrente. Uma situação de conflitos passa a ser assim uma situação de violência e guerra.


Diferente do homem que se deixa reger pela mulher-gana é o homem que a encarna. O problema torna-se aqui mais difícil, pois o homem, como ente que encarna a gana é mais rudimentar, mais primário do que a mulher nesse sentido. Torna-se como ela um ser marcado por passividade e por um grande desejo de ter e apropriar-se, não podendo realizar aquilo que quer, querendo o que não pode. Deseja, como ela, ser atraente no sentido extenso do termo, objeto de admiração, nele prevalecendo, porém, o desejo de posse.



Linguagem visual: a terra e a carne de sangue quente - o touro ou o boi


Na ordem emocional considerada por Keyserling, as suas reflexões relativas à vida original correspondem a uma situação conhecida da vida animal. Neste sentido, estabelece uma relação entre imagens de animais com a aquela da vida que surge no terceiro dia da Criação.


O serpentuoso, a reptibilidade, o sangue frio constatado por detrás das aparências de paixão na América do Sul explicariam-se enquanto próprios da esfera da vida primária de origens, nos fundamentos da terra húmida.


Na forma da aparência da terra no terceiro dia, tratar-se-ia antes do „corpo fechado“ simbolizaado por animais de sangue quente, como tratado  nas suas relações com o calor humano de relações e do sentir-se em casa em outras meditações. Há, portanto, um sentido coletivo, de grupo ou comunidade na imagem que oferece da terra húmida bela com a sua cobertura vegetal. (Veja)


Continuidade e diferenciação das reflexões nos estudos euro-brasileiros


Desde o início do programa de estudos euro-brasileiros na Europa, procurou-se compreender mais profundamente e diferenciar as colocações de Keyserling.


Como acima mencionado, reconheceu-se tratar aqui de uma questão de relevante significado, pois diz respeito à questões do mal relacionadas com estética e à ética, a direitos autorais e às relações entre pesquisadores, tematizando, na linguagem das imagens, o problema do mal procedimento científico e intelectual.


Seguindo os próprios indícios oferecidos por Keyserling, as suas reflexões foram analisadas sob o ponto de vista filosófico-natural nos seus elos com os estudos da Gênese e do ciclo do ano do hemisfério norte.


Se na correspondência com o ciclo do ano do hemisfério norte a manifestação

da terra na beleza da vegetação primaveril equivale, na ordenação do Zodíaco, a touro, os seus fundamentos na terra das profundezas a capricórnio. A força que se manifesta no crescimento da vegetação que explode em pujança na beleza primaveril é a manifestação exterior de uma terra fogosa que tem as suas bases na parte inferior e tenebrosa do ano. Trata-se de um fogo externo, material, labaredas, constatável na exterioridade daquilo que cresce.


O estudo dos escritos patrísticos relativos à Criação - em particular de Ambrósio e Agostinho - demonstrou a interpretação do dia e da noite do primeiro dia como sendo a da substância espiritual ou angelical, no caso das trevas terrenas, o demônio.


Compreende-se, assim, não só as explanações extremamente negativas de Keyserling a respeito da „mulher gana“ como também a tradição encontrada da representação de uma mulher do diabo.


Essa diaba, que não é só encontrada no Brasil mas também em vários outros países latino-americanos, levanta naturalmente questões teológicas. A frequência com que missionários encontram imagens da diaba na América Latina foi visto como inigmático e inquietante no debate inculturativo, pois a imagem convencional da força demoníaca é antes masculino - pensa-se apenas em diabo, mas não em diaba. Foi, assim, motivo de considerações em várias ocasiões em instituições teológico-culturais e de ciência das religiões.


Foi, por último, centro das atenções na sessão comemorativa dos 25 anos do Instituto de Estudos Hinológicos e Etnomusicológicos da organização pontificia de música sacra, em 2002, em Maria Laach, sendo dedicada uma exposição ao tema.


A escolha da temática para essa sessão comemorativa justificou-se pelo fato de ter sido durante décadas as relações entre vita activa e vita contemplativa - e com Maria como compleição de ambas - objeto de constantes meditações e estudos. Salienta-se, nessa diferenciação teológica, que não se fala em vida ativa e vida passiva, mas sim de vida ativa e vida contemplativa.


As diferenças entre uma vida passiva - como descrita por Keyserling - e a vita contemplativa foram consideradas repetidamente com relação à personificação da última em Maria Magdalena. Esta entregou-se à penitência, retirando-se segundo a tradição para os ermos do sul da França. A passagem à vida contemplativa na penitência surge no contexto aqui considerado como mortificação exemplar da gana.


Estudos mais aprofundados de mitologia em relações Antiguidade/Cristianismo


Paralelamente e em relações com estudos da antiga filosófico-naturais da Antiguidade e teológicos, procedeu-se desde o início do programa euro-brasileiro a estudos da antiga mitologia clássica em institutos especíalizados, museus e centros arqueológicos.


Dos muitos aspectos considerados, pode-se lembrar aqui o fato de ter sido essa divindade, como a terra que surge das águas do relato bíblico, relacionada com a beleza da vegetação de jardins, com o amor, tanto nas suas expressões mais sublimes e nas mais propriamente carnais. Afrodite/Venus não era apenas associada a imagens positivas do esplendor da beleza e do amor, mas também com sentidos negativos, o que desempenhou um papel relevante sobretudo nos edifícios da antiga Gnosis.


A linguagem visual relativa a Afrodite oferece múltiplas possibilidades de reconhecimento de relações e sentidos, tais como nas referências a imagens não só do touro, como da pomba ou do cisne, sendo a pomba também conhecida da imagologia cristã do espírito. No Antigo Testamento, surge como as pombas enviadas por Noé para verificar se as águas já tinham se abaixado e a terra surgido com a sua vegetação.


Assim, compreende-se a expressão brasileira da „pomba gira“, devendo-se aqui considerar o significado do „gira“ em português continental na sua gama de significados - o que pode ser compreendido com referência à ultrapassagem de normas convencionais referentes a comportamentos de Afrodite.


Afrodite-Ariadne, a mulher de Dionísio - o espírito nas trevas das profundezas


Os aspectos problemáticos dos fundamentos da „mulher gana“ na parte tenebrosa do mundo sub-terrâneo das explanações de Keyserling explicaram-se nos estudos mitológicos através das relações Afrodite-Ariadne. Esses estudos foram desenvolvidos em ciclos de estudos euro-brasileiros realizados sobretudo em Chipre. (Veja)


Ariadne era mulher de Dionísio, divindade cujo estudo revelou antigas relações com a terra na parte mais baixa do ano - capricórnio.


As relações de Afrodite/Venus com Hephaistos/Vulcano e Ares/Marte veem de encontro às explanações do homem que é regido pela „mulher gana“ de Keyserling e que, após terminada essa fase, é substituido por outro. Correspondem no ano natural, à sua parte descendente, respectivamente aos signos de balança e escorpião.


Helena, a amada de Paris e a guerra de Tróia


Uma particular atenção nos estudos de fundamentos de tradições culturais sempre coube à guerra de Tróia, uma vez que a sua encenação pode ser documentada em referências aos folguedos encenados designados como de Tróia, até mesmo empregados na prática missionária dos primeiros séculos da colonização.


Esses estudos relacionam-se estreitamente com aqueles referentes a Afrodite/Venus e Helena. No concurso de beleza entre as três deusas - Hera/Juno, Atena/Minerva e Afrodite/Venus - Paris não escolheu o poder prometido pela primeira, nem a sabedoria da segunda, mas sim a obtenção de Helena, a mulher mais bela entre as mortais da sua época. A escolha de Helena foi fator do desencadeamento da guerra que marcou a história da Antiguidade.


Santa Helena e a Santa Cruz soterrada sob o altar de Venus


Um dos constantes objetivos de reflexões nos estudos euro-brasileiros é compreensivelmente o do descobrimento do Brasil. Tornou-se principal centro de atenções devido também à série de rememorações de viagens de navegação e descobrimentos a partir da segunda metade da década de 80.


Um evento que tematizou de forma particularmente expressiva o ato do descobrimento nas suas relações com o edifício de visões do mundo foi o congresso internacional dedicado a fundamentos da cultura musical realizado no Rio de Janeiro em 1992 pelos 500 anos do descobrimento da América.


Nessa ocasião, considerou-se em particular a época do ano na qual deu-se o descobrimento do Brasil, a sua designação como Terra de Santa Cruz e as tradições relacionadas com a Santa Cruz, em particular as assim chamadas Danças de Santa Cruz. Lembrou-se, como acima mencionado, que os europeus que aportaram à nova terra festejavam a época pascoal, ou sejam guiavam-se na sua vida espiritual e psíquica pelo ciclo do calendário religioso nas suas relações com o mundo natural do hemisfério norte, o que explica também a atmosfera positiva que reinou no momento do descobrimento e os folguedos de alegria que o caracterizaram.


A narrativa do achamento da cruz por Santa Helena fornece aqui o caminho para estudos de sentidos teológicos e culturais mais aprofundados da Cruz do Norte na constelação do Cisne. Ela diz respeito nada menos aos primórdios do reconhecimento oficial do Cristianismo sob o imperador Constantino.


Segundo a tradição, Helena, que teria trabalhado em atividades convencionalmente consideradas como pouco nobres para mulheres da sua estirpe - em albergue ou em balcão -, encontrou, na Terra Santa, a cruz enterrada soterrada sob um altar de Afrodite/Venus que teria sido edificado no local da crucificação pelos romanos.


Em várias ocasiões dos trabalhos na área da música sacra, lembrou-se que na literatura sacra e no Gregoriano canta-se a beleza do santo madeiro. Na interpretação cristã dos céus, a constelação do cisne, à qual pertence a cruz do norte, é relacionada com Santa Helena no achamento da cruz. O cisne, por sua vez, foi interpretado como imagem daquele que, à hora da morte, canta, tal qual como o espírito canta por ver-se redento do mundo.


Em 2014, a A.B.E. retomou esses estudos em Roma, aprofundando-os perante o altar de Santa Helena sobre as relíquias da Santa Cruz na Basílica de São Pedro, a mais monumental representação plástica da santa no esplendor de sua beleza.



De ciclos de estudos da A.B.E.
sob a direção de
Antonio Alexandre Bispo



Indicação bibliográfica para citações e referências:
Bispo, A.A. (Ed.).“O ser atraído, possuído e a perda da liberdade de criação de imagens. A problemática imagológica da apropriação de bens do espírito: Afrodite, terra taurina e „Pomba gira“ - Santa Cruz!“
. Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 158/8 (2015:06). http://revista.brasil-europa.eu/158/Terra_taurina_Pomba_gira.html


Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2015 by ISMPS e.V.
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501


Academia Brasil-Europa
Organização de Estudos de Processos Culturais em Relações Internacionais (ND 1968)
Instituto de Estudos da Cultura Musical do Espaço de Língua Portuguesa (ISMPS 1985)
reconhecido de utilidade pública na República Federal da Alemanha

Editor: Professor Dr. A.A. Bispo, Universität zu Köln
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Fotos Rio de Janeiro e Baviera. A.A.Bispo, 2008 e 2015 ©Arquivo A.B.E.