Henri/Henry Ketten e Henri/Henry Oswald

ed. A.A.Bispo

Revista

BRASIL-EUROPA 159/4

Correspondência Euro-Brasileira©

 

_________________________________________________________________________________________________________________________________


Índice da edição     Índice geral     Portal Brasil-Europa     Academia     Contato     Convite     Impressum     Editor     Estatística     Atualidades

_________________________________________________________________________________________________________________________________

N° 159/4 (2016:1)






O húngaro Henri/Henry Ketten (1848-1883) e Henri/Henry Oswald (1852-1931)
sob o signo de Hans von Bülow (1830-1894)

em contextos internacionais do virtuosismo pianístico do século XIX
- Paris como referencial -


                                                                         

200 anos de  Antoine François Marmontel (2016-1816)

Estudos na Austrália (2009), Wiesbaden (2013) e no Museu de Instrumentos Musicais de Budapest (2013)

 
Museu de Instrumentos, Budapest. Foto A.A.Bispo 2013

A passagem dos 150 anos de Florença como capital do Reino da Itália em 2015 foi marcada por comemorações nas quais a música desempenhou importante papel. Essa data pareceu ser oportuna para recapitular-se alguns aspectos dos trabalhos referentes a essa cidade desenvolvidos no âmbito do programa euro-brasileiro desde meados da década de 70 do século XX. (Veja)

A reconsideração de Florença no âmbito dos estudos referenciados pelo Brasil torna-se necessária sob diversos aspectos. Constata-se uma intensificação de atividades culturais de brasileiros residentes em cidades do Norte da Itália, de ítalo-brasileiros no Brasil e da consideração de referências a Florença em publicações, em particular naquelas dedicadas a músicos e compositores brasileiros que ali se formaram e atuaram.

Há a necessidade, porém, de análises mais aprofundadas de contextos de processos histórico-culturais de uma época de fundamentais transformações políticas do Norte da Itália, em particular da Toscana, não só para um melhor conhecimento do passado a serviço da memória e identidade ítalo-brasileira, mas sim também para mais adequadas considerações do ambiente cultural e sobretudo da vida musical na cidade nas suas relações com o Brasil na época em que se tornou capital da Itália como país unificado.

Interpretar esses anos de tão cruciais transformações político-culturais apenas da perspectiva de situações políticas posteriormente estabelecidas, ou mesmo do ideário da Itália como estado nacional, de suas relações com o Exterior e da participação do Brasil em eventos italianos de projeção internacional de fins do século XIX e início do XX traz em si o risco de interpretações anacrônicas de fatos e desenvolvimentos.

Museu de Instrumentos, Budapest. Foto A.A.Bispo 2013

Elos da Toscana com a esfera de língua alemã do Império dos Habsburgs

Os 150 anos de Florença como capital do Reino da Itália traz à memória que a cidade fora capital do Grão-Ducado da Toscana, antes de sua integração no criado estado nacional do em 1861.

Remontando à época da prosperidade a urbe da república florentina em fins da Idade Média e à ascensão dos Medici à suserania, a região fora elevada a Grão-Ducado em 1530, inserindo-se, como integrante no Sacro Império Romano-Germânico, na esfera de influência  e poder os Habsburgs e nas rêdes sociais e culturais mais amplas da Áustria.

Significativamente, com a morte do último Medici, em 1738, a soberania do Grão-Ducado passou a membros da casa Habsburgo-Lotríngia. 

A época marcada pelo Esclarecimento de fins do seculo XVIII encontrara um fim temporário à época bonapartista; o Grão-Ducado da Toscana, porém, voltara a existir com a Restauração, em 1814. No contexto geral dos estados restaurados segundo a antiga ordem, a Toscana distinguiu-se de vários outros pela sua política antes moderada, liberal, ainda que conservadora.

Sob essas condições, Florença tornou-se importante centro intelectual e artístico, oferecendo condições para que ali também atuassem forças políticas que, similarmente a outras regiões da Europa marcadas pelas revoluções de 1848, levaram a reações e a desenvolvimentos mais restritivos. Em Florença, essa transformação política correspondeu a uma acentuada presença militar austríaca no Grão-Ducado e a uma orientação política em sintonia com aquela do jovem Imperador Francisco José I(1830-1916) e de um forte poder centralizado em Viena.

É nesse contexto político-cultural e seus complexos desenvolvimentos que se compreende e que devem ser analisados os estreitos vínculos de Florença com a esfera cultural e artística do mundo de língua alemã, assim como a atuação, na capital toscana, de artistas e intelectuais alemães e austríacos.

A mudança política ocorrida em 1861, precedida pela derrota austriaca na Guerra da Sardenha, em 1859, e  selada com a elevação de Florença a capital do novo Reino da Itália sob a casa de Savoia, em 1865, epresentou uma crucial transformação geo-política e de inserção histórico-cultural, passando Florença  politicamente da esfera de língua e cultura alemã do Império dos Habsburgos àquela  Sardenha-Piemonte.

Círculos marcados pela cultura austríaco-alemã e mesmo suíço-alemã que anteriormente tinham pertencido à esfera dominante passaram antes a representar uma situação passada na realidade estabelecida por aqueles que, a seus olhos, surgiam como usurpadores e "novos ricos".

Mesmo que tivessem pertencido a correntes liberais, esclarecidas e progressistas no passado, mesmo representando tendências do pensamento e das artes mais avançadas dos grandes centros da Europa Central e da França, mesmo continuando a representar em muitos casos uma elite intelectual e artístico-intelectual, esses círculos marcados pela cultura austríaco-alemã e alemã-suíça passaram a pertencer a uma constelação política passada, marcada porém por uma consciência de nobilidade, de cultivo aristocrático de vida e personalidade, assim como de erudição.

Torna-se, assim, muito difícil reconhecer diferenças de posicionamentos e inserções político-culturais segundo criterios de conservativismo ou progressismo na vida cultural de Florença dessa época. Pode-se, porém registrar a continuidade, sob outro signo da situação política, de rêdes de contatos sociais, intelectuais e artísticos relacionados com a esfera de língua alemã em contexto político do novo reino nacional e que apenas gradativamente passou a determinar também de forma decisiva meios culturais de orientação nacional do reino marcado por liberalismo econômico.

Compreende-se, também, as relações culturais complexas de Florença com a cultura francesa, uma vez que as armadas austríacas que lutaram contra aquelas de Sardenha-Piemonte em 1859, e que terminaram com a derrota e com a abdicação do Grão-Duque a favor de seu filho Ferdinando IV, contaram com o auxílio do Império francês de Napoleão III (1808-1873). Passando a integrar a Sardenha, em 1860, e ao reino unido da Itália em 1861, Florença foi sua capital de 1865 até a tomada de Roma, em 1870.


Relações com a esfera austríaco-alemã na música e Paris - Henri Ketten

A consideração da vida artística e, em especial musical das décadas de 60 e 70 permite reconhecer a continuidade em Florença de uma esfera social e cultural orientada segundo personalidades e correntes estéticas e de pensamento do mundo e língua alemã e sua referenciação segundo Paris. Nesses círculos seguiu-se de perto os desenvolvimentos mais recentes do do virtuosismo de Franz Liszt (1811-1886) e do universo wagneriano.

Nesse contexto, merece uma particular consideração o pianista Hans von Bülow ((1830-1894') (Veja), grande discipulo e admirador de R. Wagner (1813-1883), casado com a filha de Liszt, que o abandonaria para ligar-se a Wagner.

Jessie Laussot (Taylor) (1829-1905), colega de formação e amiga de vida de von Bülow, que também experimentara o fascínio amoroso de Wagner, estabelecida em Florença, foi a principal ponte com o mundo wagneriano, impulsionando o florentino G. Buonamici a estudar em Munique. (Veja)

Não apenas a fascinação por Wagner, mas também e sobretudo desenvolvimentos do pensamento alemão que levaram a uma redescoberta do passado clássico, explica que esse interesse em antigos mestres em Florença, que se tornou o principal centro de cultivo de Beethoven na Itália, não foi resultado primordial do historismo italiano do reino unificado sob o signo do Risorgimento, mas antes uma continuidade de esfera geo-política na vida musical e extensão de desenvolvimentos alemães, também marcados pelo historismo, porém em outra contextualização cultural.

Os elos dessa esfera de orientação austríaco-alemã com a França, compreensível na constelação política anterior à Guerra Franco-Prussiana de 1870/1, manifestam-se na vida e nas atividades do pianista Henri Ketten.

A vida e obra deste pianista e compositor, hoje caído no esquecimento, surgem como das mais significativas para estudos histórico-musicais de orientação teórico-cultural do século XIX. Elas exemplificam a abrangência de rêdes sociais e artísticas que ultrapassavam fronteiras nacionais e mesmo continentais e que, sob o aspecto do seu ancoramento político-cultural, referenciavam-se com círculos culturais de orientação austríaco-alemã-francesa de Florença.

A extensão transcontinental dessa esfera da vida musical exemplificada pela história de vida desse pianista foi possibilitada pelas novas possibilidades de transportes marítimos, que permitiram que virtuoses europeus visitassem e se apresentassem no continente americano e em outras regiões do globo colonizadas pelas potências européias.

Histórico dos estudos respectivos

Henri Ketten foi considerado na segunda metade da década de 70 em encontros que prepararam a publicação da obra dedicada à América Latina no século XIX, com a participação, entre outros, de Francisco Curt Lange (1903-1997) e Samuel Claro-Valdés (1934-1994). (Veja) Nessa época, considerou-se que  os elos de Henri Ketten com o Brasil justificam-se sobretudo pelo fato de ser sempre mencionado como um dos professores de Henrique Osvald, nascido no Brasil, formado em Florença e que representa vulto de primeira grandeza na história da música do país.

Henri Ketten foi um dos muitos pianistas e compositores considerados nas séries semestrais do curso de História da Música no Encontro de Culturas realizadas a partir de 1997 no Instituto de Musicologia da Universidade de Colonia em cooperação com o I.S.M.P.S. e.V..

Procurou-se, com esses cursos, contribuir à superação da delimitação européia da área de Musicologia Histórica, assim como à adequada consideração da perspectiva histórica da área de Etnomusicologia em correspondência aos objetivos do programa de estudos euro-brasileiros iniciado na Alemanha em 1974/75 e que se distinguia pelo intento de direcionamento da atenção a processos.

A consideração mais pormenorizada de Henri Ketten sob uma perspectiva global deu-se porém no âmbito da série de cursos mencionada, sendo retomada, em 2003, no seminário "História da Música em Contextos Globais", com particular consideração do século XIX, realizado no Seminário Musicológico da Universidade de Bonn.


Ketten: do meio austríaco-alemão da Hungria à Prússia e a Paris

Henri Ketten nasceu na cidade húngara de Baja, no sul do país, então pertencente à Dupla Monarquia Austro-Húngara, região com substancial porcentagem de colonos alemães e de população judaica. Henri Ketten foi um dos mais famosos meninos-prodígio do século XIX, mantendo durante toda a sua curta vida a aura que o marcou quando criança.

Não se sabe qual a razão que levou os seus pais a sairem da sua terra natal quando ainda tinha apenas seis meses. Mesmo assim, Ketten manteve ou recuperou posteriormente a consciência de ter a Hungria como terra natal. O seu pai, músico, introduziu-o no piano quando contava apenas cinco anos de idade, promovendo-o a partir daí como menino prodígio.

Em Posen, cidade polonesa então pertencente à Prússia, com predomínio de língua e cultura alemãs, passou os seus primeiros anos de infância. Desde esses anos, demonstrou grande aptidão musical, louvado não só por sua técnica, como também pela inspiração que revelava nas suas concepções e interpretações musicais.

É significativo que já com apenas seis anos apresentara-se como pianista em trio de L. v. Beethoven em trios, e, seis meses mais tarde, como solista de concerto para piano e orquestra de Johann Nepomuk Hummel (1778-1837).

O seu principal mentor foi Hans von Bülow (1830-1894) que, ao ouví-lo em Posen, empenhou-se com uma carta de recomendação para que estudasse com Fr. Liszt (1811-1886). Este, porém, estranhou tal sugestão devido à pouca idade do menino. Ketten viveu, assim, dez meses com von Bülow, o que marcou a sua formação.

Passou a seguir a Paris, onde continuou com a sua formação musical e se integrou, passando a utilizar-se do nome francês de Henri Ketten. Foi admitido com apenas oito anos no Conservatório de Paris, o que representou uma exceção às normas de admissão que estipulavam uma idade mínima de dez anos. No Conservatório, estudou com Antoine François Marmontel (1816-1898), um professor que também marcou a formação de brasileiros; paralelamente, estudou composição com J. F. Halevy (1799-1862).

Henri Ketten projetou-se como executante de obras de Beethoven, apresentando, no seu primeiro concerto na Salle Herz, com apenas 10 anos, o concerto n° 5 do compositor. Como resultado dos seus estudos de composição e contraponto no Conservatório, passou a compor, regendo, com apenas 11 anos, uma cantata sacra de sua autoria de título Jephthah.

Apesar desta sua identificação com Paris, não foi considerado como sendo representante de uma escola francesa.

Em 1859, apresentou-se em concerto no Hanoversquare Rooms e, em 1860, perante a rainha no Osborne House.

Concerto como menino-prodígio em Wiesbaden (1859) - a "Nizza alemã"


Trazendo já o renome de sua formação em Paris, a projeção do menino-prodígio Henri Ketten como pianista e compositor na Alemanha iniciou-se com a sua apresentação na série de concertos de verão em Wiesbaden, cidade balneária de águas termais.

Nas estações balneárias da região do Taunus, das quais se salientavam Wiesbaden e Bad Homburg, frequentadas sobretudo por franceses e russos, cultivava-se uma atmosfera "do sul" no verão das paisagens iluminadas do Reno.

Wiesbaden, devido às suas características naturais e arquitetônicas, assim como à diversidade de sua vida musical na época de veraneio, era considerada como a Nizza de Nassau ou a Nizza renana.

Era uma das principais estações de repouso e tratamento de aristocratas e intelectuais da Europa, admirada pela beleza de seus parques a ponto de ser chamada de "jardim do Paraíso terreno", de Eldorado daqueles que para ali vinham à procura de cura, divertimento, sensações e conhecimentos de novas tendências artísticas

A vida musical orientava-se sobretudo por aquela da Ópera italiana de Paris.

Os programas dos concertos do balneário denotam uma preponderância de obras de compositores italianos de sucesso na capital francesa ou de representativa de uma vida operística marcada por sensações à procura de sucesso público e econômico.

Como reconhecido ja na época, estâncias de águas desempenhavam um papel significativo na vida musical européia: elas concentravam nas estações uma esfera de vida humana que permitia revelações e conclusões de tendências internacionais. Essas cidades eram procuradas para tratamento apenas por uma pequena minoria; a maioria dos visitantes para ali se dirigia sobretudo para fins de divertimento e à procura de sensações e jogos. Para aumentar os atrativos, a direção das festividades traziam artistas que enfeitavam a vida cultural e social tal como flores.

"Die grösseren Bäder spielen in der Geschichte der Gegenwart eine Rolle; sie concentriren während der so genannten Saison ein artiges und nach vielen Seiten hin höchst interessantes, zu Studien anregendes und über Studien Aufschluss gebendes Stückchen Menschenleben, ein Stückchen Welt im engeren, dafür aber auch desto übersichtlicheren Rahmen. Die da Heilung und Gesundheit Suchenden und ernstlich Erstrebenden bilden ein gar kleines Häuflein, und alljährlich desertiren von ihnen viele in das bei Weitem grössere bunte Lager. Vergnügen, Zerstreuung, Aufregung und Erregung, das ist die Parole der Mehrzahl der Bade- oder richtiger der Spielgäste. Da nun Sing- und andere Vögel, Lockvögel u. s. w. nicht ausreichend sein würden, den Hain der Wonne und Lust zu bevölkern, so verabsäumt es die Leitung der Festlichkeiten nicht, Künstler und Künstlerinnen herbei zu ziehen, um Gold und Lorbern, wenigstens aber Blumen in ihren Schooss zu schütten, den theilweise wieder zu leeren ihnen von Mittags 11 bis Abends 11 Uhr frei gegeben ist. (Niederrheinische Musik-Zeitung, Volume 7, 29 de Outubro de 1859)


Entre as maiores produções de 1859 salientaram-se as apresentações de obras de F. Flotow (1812-1883), de D.-F.-E. Auber (1782-1871) e de Halevy, o professor de Ketten, ouvindo-se trechos do "Elixir de Amor" de G. Donizetti (1797-1848). Entre os autores caídos hoje em esquecimento então representados nos programas, salienta-se Luigi Venzano (1814-1878), presente com uma valsa de sua composição. Apresentou-se também um ballet cômico, "Das schlecht bewachte Mädchen", do mestre-de-ballet local (Opfermann), com membros da sua família.

Outros pontos do programa foram trechos do "Barbeiro de Sevilha" de G. Rossini (1792-1868), da Norma de V. Bellini (1801-1835), um canto popular suiço de Nina Eschborn, esposa do compositor Joseph Eschborn (1800-1881) e uma valsa de F. Ricci (1809-1877) ou L. Ricci (1805-1859), assim como do Rigoletto e La Traviata, esta levantando questões morais devido a seu sujeito.

G. Verdi (1813-1901) foi visto como autor de uma música desenfreada, decadente, sensual, que seria uma ofensa à estética e desmoralizava a arte. A crítica até mesmo propunha uma rejeição oficial da música de Verdi na cidade e região de Nassau. Seria uma vergonha que uma cantora alemã interpretasse tais obras. Ao contrário, porém, surgia como louvável que cantassem música de R. Wagner (1813-1883), como o Lohengrin.

Principal vulto da vida operística local era Karl Formes, cantor e ator, conhecido pela sua diversidade quanto a repertórios, distinguindo-se na opera bufa, contratado pelo Ducado de Nassau.

Embora já tivessem sido realizados vários concertos, anunciou-se, em meados de agosto, um grande concerto do menino de onze anos que já era apresentado como famoso pianista e compositor: Henri Ketten. Este apresentou-se juntamente com uma cantora da vida operística italiana de Paris (Cambardi) e de um violoncelista (Seligmann). Henri Ketten tocou um Nocturno de sua composição, a "Grande Fantasia sobre a Sonâmbula" de Sigismund Thalberg (1812-1871) e, com acompanhamento de orquestra, o Capriccio Op. 22 de F. Mendelssohn-Barholdy (1809-1847).

A crítica reconheceu os altos méritos do talentoso menino, criticando porém a sua promoção sensacionalista pelo próprio pai em cartazes e programas.

Also : Herbei, herbei! „Entzückung dringt durch alle Sinne, Gewahr' ich diesen Dämmerschein: Dies ist das Zauberreich der Minne, In den Cursaal drangen wir jetzt ein!" (Tannhäuser.) Da hatten wir von Mitte August an, nachdem schon ein ganzes halbes Dutzend oder mehr Concerte Statt ge-

Funden hatte, ein „grosses Concert", gegeben von dem auf dem Programm sich berühmt nennenden eilfjährigen Pianisten und Componisten (?) Henri Ketten, unter Mitwirkung von Mad. Cambardi, Sängerin der italiänischen Opernwirthschaft zu Paris, und Herrn Seligmann, des Violoncellisten.


Herr Seligmann spielte ein Morceau de Concert sur la Juive und ein Rondo du Concerto de Violoncelle, dedie au Hot de llollandc, und „violoncellte" auch noch „Die schönsten Augen" als deStigeüi. Der eilfjährige Pianist-Componist spielte ein von ihm componirtes Nocturne, Thalberg's Grande Fantaime sur la Sonnambule und mit Orchester-Begleitung Mendelssohns Capriccio, Op. 22.


Die Leistungen des talentvollen Knaben sind ausserordentlich; allein wenn der eigene Vater sein Kind öffentlich auf Placaten und Programmen berühmt und es einen Componisten, dazu noch einen „berühmten", nennt, so verdient das Kind Bedauern und einen Vormund.(Niederrheinische Musik-Zeitung, Volume 7, 29 de outubro de 1859)


É significativo que Henri Ketten tenha apresentado uma grande fantasia sobre tema da "Sonâmbula" de Bellini de Sigismund Thalberg. Oferecendo uma fantasia de ópera italiana no brilho de sua reelaboração por Thalberg, Ketten vinha de encontro às preferências do público orientado segundo aquele de determinada esfera social parisiense, designada pelo crítico como sendo controlada pela "economia" ou pelo "mercado da ópera" italiana.

A carreira internacional de Henri Ketten: da Europa à ópera italiana na Turquia

A partir dos seus 12 anos, Henri Ketten desenvolveu as suas aptidões de forma auto-didata, dedicando-se ao estudo das obras dos grandes mestres, especializando-se em improvisar e criar em diferentes estilos. Foi, assim, um jovem que se tornou muito cedo ciente da sua individualidade, disposto a criar uma "escola" pessoal tanto de execução como de ensino. Situou-se assim no campo de tensões ambivalente entre uma prática musical sensacionalista, de procura de efeitos brilhantes e de sucesso público, e aquela da seriedade baseada no estudo erudito de obras e estilos do passado na tradição de H. von Bülow.

Ja em 1861 foi o seu nome mencionado na Revue des Deux Mondes, publicação também lida no Brasil.

"(,...) deux concerts qu’il a donnés, l’un dans les salons de Mme Érard, l’autre au Théâtre-Italien. Son exécution est fine, élégante, pétulante même ; il rend surtout avec beaucoup d’éclat l’admirable sonate en la bémol de Weber. Un morceau de la composition de M. Perelli, un scherzo pastoral pour piano et orchestre, révèle du talent et ajoute au mérite incontestable du virtuose, qui est fort répandu dans le monde officiel. MM. Wienawski, Polonais, Lubeck, Hollandais d’origine, dont l’exécution vigoureuse s’assouplit beaucoup, Bernard Rie, de Prague, Stanzieri, jeune artiste napolitain, qui inspire le plus grand intérêt, Henri Ketten, enfant bien doué qu’on pousse trop vite à la composition, Hans Seeling, Vincent Adler, Hongrois, Mlle. Joséphine Martin, Sabatier Blot, Darjou, Caroline Remaury, sont des pianistes de talens divers qui tous ont donné un ou plusieurs concerts. (....) (Revue des Deux Mondes 33/1861, 745).


Ketten ganhou renome internacional após viagens de concertos realizados nos Países Baixos, em 1862 e 1865 e, sobretudo com os seus recitais durante a Exposição Universal de Paris de 1867.

Visitou a Áustria, a Rússia e a Suíça, sendo um período que merece ser acentuado na sua carreira um período de três anos como regente da ópera italiana em Constantinopla, na Turquia, uma atividade particularmente bem dotada pecuniariamente.

Com isso, Ketten adquire especial significado para o estudo da música na vida cosmopolita turca do passado, assim como da ocidentalização do Império Osmano, em particular dos elos entre a Itália e a Turquia no século XIX, uma época que havia sido marcada pela atuação de Giuseppe Donizetti (1788-1856), irmão do internacionalmente renomado compositor operístico. (Veja)

Com o incêndio da casa em que morava, Ketten perdeu todas as suas economias, resolvendo então retornar à Hungria, seu país natal. Passou a percorrer o interior do país, tendo que vencer muitos obstáculos na realização de apresentações em localidades afastadas. Criou-se, assim, uma espécie de mito Henri Ketten, daquele que tinha saído da sua terra natal na infancia, percorrido o mundo, mas que jamais esquecera a sua pátria, a ela retornando. Idealizada no Exterior, em países longínquos, levou-o a uma retorno, sendo este acompanhado por dificuldades e decepções: a terra natal era outra daquela imaginada pelo artista celebrado em círculos cultos de vários países e o artista já não correspondia, em modos de vida e atitudes, a seus conterrâneos. Essa história de vida de Ketten não deixa de apresentar paralelos com aquela de H. Oswald.

Atuações na Itália e em outros países da Europa e da África do Norte

Por motivos de saúde, H. Ketten transferiu-se para a Itália, em 1870, o que explica ter podido o jovem pianista Henrique Oswald conhecê-lo. Nesses anos, realizou concertos em Milão e em outras cidades da Península, compondo Marinaresca, uma cena lírica produzida para o Teatro Carlo Felice de Genova, em 1872. Visitou países do Mediterrâneo, sendo recebido por circulos de influência no Egito.

Após apresentar-se de novo na França, na Áustria, na Hungria e em cidades do Leste, voltou à Itália e, em 1875, retornou a Paris. A seguir, em 1876/77, esteve em Londres, onde apresentou-se quase que diariamente em vesperais durante seis semanas.

Com a companhia Carlotta Patti (1835-1889): América e Austrália/Nova Zelândia.

O mais significativo para o estudo histórico-musical em contextos globais foi a extensão da carreira de Ketten ao continente americano em 1879 e, a seguir, à Austrália e Nova Zelândia. Essa ampliação de sua esfera de atividades foi possibilitada pelo fato de passar a pertencer como pianista à companhia de Carlotta Patti, dirigida por C.A. Chizzola.

Entre as personalidades de Florença que merecem ser consideradas em relações com o Brasil salientam-se as filhas dos cantores Salvatore Patti e Caterina Barili, em particular Carlotta Patti. Lembradas no Brasil foi até hoje apenas Adelina Patti (1843-1919), mas mereceriam ser consideradas também Amelia Patti, cantora, e Carlo Patti, regente e violinista.

Carlotta Pati fora aluna de piano de Henri Herz (1803-1888 ), dedicando-se a seguir ao canto lírico. Por motivo de defeito físico que a impedia da ação de palco, foi obrigada a renunciar à carreira de cantora de concertos. Apresentou-se pela primeira vez em 1861, em concerto da Academy of Music em New York, realizando a seguir uma tournée pelos Estados Unidos.

Apresentou-se na Inglaterra, na França e na Áustria, retornando em 1869 à América. Da sua presença na América Latina, salientaram-se concertos em Valparaíso em 1871, quando, na Ópera francesa, angariou fundos para a Guerra Franco-Prussiana. Em 1879, casou-se com o celista belga Ernest de Munck (18151915), então atuante na orquestra da Corte do Grão-Duque Carl Alexander von Sachsen-Weimar-Eisenach (1818-1901).

Com a dissolução a companhia original na Califórnia, Ketten permaneceu em San Francisco, alcançando renome com a sua prodigiosa técnica e capacidade de interpretação de obras de diferentes escolas e épocas, assim como pelas suas improvisações e extraordinária memória.

Henri Ketten na Australia e Nova Zelândia

As tournées pela Austrália e Nova Zelândia do pianista que surge relacionado com H. Oswald puderam ser consideradas em estudos desenvolvidos em diferentes cidades desses países,em particular em Sydney e Melbourne, em 2009.


As noticias de jornais como o Star, o The Sydney Morning Herald, The Sydney Mail and New South Wales Advertiser e o The Telegraph de Brisbane documentam o extraordinario interesse despertado pelo pianista em 1880, sua técnica, capacidade de memória e improvisação segundo diferentes estilos. (Veja)

São justamente esses comentários que oferecem subsídios para a biografia do músico hoje esquecido, fornecendo dados que não se encontram em outras fontes. São esses jornais que testemunham também o impacto causado pelsa sua morte prematura.

Henri Ketten publicou mais de uma centena de composições, salientando-se poemas sinfônicos, as obras, assim como várias obras para piano e para orquestra e piano solo (e. o. Pays Lointaine; L'Aurore; L'amour mouillé; La babouche; Ballade russe Op. 75; Berceuse; Caprice styrien, Op. 107; Caprice-valse, Op. 93; La castagnette, Op. 94; Chasse aux papillons, Op. 10; La destinée; L'idéal; Gavotte de Martini; J'en veux faire le chemin; Le postillon; Sarabande; Valse champêtre). Por fim, passou a dedicar-se a uma ópera de tema indiano de nome Les Apsaras, com libreto de A. de Lauzieres, projetado para ser apresentado na Opera de Paris, com o qual o compositor correspondia aos interesses do exotismo da época.

Súmula de trabalhos da A.B.E.e do I.S.M.P.S. sob a direção de
Antonio Alexandre Bispo, Universidade de Colonia


Indicação bibliográfica para citações e referências:
Bispo, A.A.(Ed.).“O húngaro Henri/Henry Ketten (1848-1883) e Henri/Henry Oswald (1852-1931)
sob o signo de Hans von Bülow (1830-1894) em contextos internacionais do virtuosismo pianístico do século XIX- Paris como referencial“
. Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 159/4 (2016:01). http://revista.brasil-europa.eu/159/Ketten_e_Oswald.html


Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2016 by ISMPS e.V.
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501


Academia Brasil-Europa
Organização de Estudos de Processos Culturais em Relações Internacionais (ND 1968)
Instituto de Estudos da Cultura Musical do Espaço de Língua Portuguesa (ISMPS 1985)
reconhecido de utilidade pública na República Federal da Alemanha

Editor: Professor Dr. A.A. Bispo, Universität zu Köln
Direção gerencial: Dr. H. Hülskath, Akademisches Lehrkrankenhaus Bergisch-Gladbach
Corpo administrativo: V. Dreyer, P. Dreyer, M. Hafner, K. Jetz, Th. Nebois, L. Müller, N. Carvalho, S. Hahne
Corpo consultivo - presidências: Prof. DDr. J. de Andrade (Brasil), Dr. A. Borges (Portugal)




 






Museu de Instrumentos Musicais de Budapest, 2013. Fotos A.A.Bispo©Arquivo A.B.E.