Lisa me vostu ben? de A. Carlos Gomes

Revista

BRASIL-EUROPA 163

Correspondência Euro-Brasileira©

 

N° 163/6 (2016:5)



O canto popular veneziano e o ressurgimento nacional italiano
A
Canzonetta veneziana Lisa me vostu ben?  de A. Carlos Gomes (1836-1896)

dedicada a Antonio Pavan (1823-1898)

no decanto do amor de Piero Foscari (1865-1923) e Elisabetta Widmann Rezzonico (1878-1953)




150 anos de Se sa minga, Rivista di 1866 de Antonio Scalvini (1835-1881) e A. Carlos Gomes

 
Entre as composições de Antonio Carlos Gomes, encontra-se uma Canzonetta Veneziana que merece maior atenção nos estudos culturais em ano que marca os 150 anos do primeiro grande sucesso do compositor brasileiro na Itália.

Essa Canzonetta tem sido considerada sobretudo sob o aspecto da canção de câmara na sua obra, essa perspectiva, porém, não surge como totalmente adequada e não revela o significado muito mais amplo que possui.

A Canzonetta, com a sua feição popular, difere na sua linguagem marcada por simplicidade de obras para canto e piano de câmara que revelam tratamento harmônico e melódico mais refinado e erudito de textos, entre outros o da condução cromática de baixos e de linhas melódicas que tanto marca a produção do aluno de Lauro Rossi (1812-1885).

Atualidade da atenção à Canzonetta Veneziana de Carlos Gomes

Os desenvolvimentos políticos e sociais da atualidade na Europa, com os seus movimentos de cunho nacional, nacionalista, identitário, populistas, nacional conservadores e nacional sociais, levantam questões de suas implicações na política cultural, científica e na pesquisa. Ainda que os meios intelectuais e acadêmicos mantenham-se em geral ainda distantes desses desenvolvimentos, possíveis sucessos políticos não deixarão de ter consequências para estruturas, programas, pêsos quanto a atenções temáticas, questionamentos e tendências do pensamento.

Uma dessas consequências residirá certamente numa maior atenção a expressões culturais, tradições, usos e costumes vistos como próprios e definidores de nações ou favoráveis ao fortalecimento de sentimentos nacionais ou identitários. Um desenvolvimento similar poe ser constatado em épocas marcadas pelo nacional e pelo nacionalismo do passado.

Sobretudo as áreas de estudos que se voltam a questões e temas referentes ao popular, ao tradicional, ao étnico ou em geral ao nacional na criação artística passam a adquirir nova relevância.

O estudo de bens transmitidos pela tradição oral, o Folclore, a Volkskunde ou a Etnografia remonta, apesar de seus antecedentes, ao século XIX, que foi o século de movimentos e da formação de estados nacionais, de independência e unificação de nações, entre elas, na Europa, da Alemanha e da Itália.

No século XX, as décadas de propaganda nacionalista de entre-guerra, em particular em regimes totalitarios, foram aquelas de revitalização, promoção de expressões de cunho nacional-popular, danças, instrumentos, cantos, de estudos etno-culturais, de criação artística com elementos do Folclore, assim como de particular intensificação e institucionalização de correspondentes áreas de estudos.

Para além da instrumentalização de bens culturais a serviço do ideário político, edifícios conceituais e de imagens, de visão do mundo e do homem determinaram interpretações de desenvolvimentos em perspectivações da história. Sugerindo continuidades, motivos, tendências do pensamento e expressões de décadas anteriores à Primeira Guerra passaram a ser interpretadas a partir de critérios e posicionamentos posteriores.

Desenvolvimento das reflexões: áreas de estudos nos seus elos políticos

Os problemas resultantes de perspectivações do nacionalismo de entre-guerras - não só para os estudos históricos como também para o Folclore, a Etnografia e para outras áreas que partem da pesquisa empírica em geral - foram reconhecidos e discutidos há 50 anos. Iniciou-se então o desenvolvimento dos estudos de processos culturais que têem o seu prosseguimento na atualidade nos trabalhos euro-brasileiros conduzidos no âmbito da A.B.E. e do I.S.M.P.S...

Tendo o seu ponto de partida no Conservatório Musical Carlos Gomes de São Paulo, então principal centro de atividades de ítalo-brasileiros, sucessor da antiga associação Benedetto Marcello, designação de renomada instituição de Veneza, as reflexões de então concentraram-se sobretudo na questão do nacional em Carlos Gomes e das visões posteriores de autores nacionalistas a respeito de traços nacionais ou do emprêgo ou não de elementos do folclore na sua obra. (Veja)

A pertinência de posicionamentos nacionalistas do período de entre-guerras e de suas extensões posteriores para uma análise adequada das concepções e da obra de Carlos Gomes no seu devido contexto epocal e nos processos em que se inseriu surgiu então como de particular relevância para a renovação dos estudos músico-culturais em geral.

Também aqui, reconheceu-se a necessidade de um direcionamento da atenção não ao erudito e ao popular, mas sim à interrelações entre as esferas culturais assim convencionalmente categorizadas a partir de suas inserções em processos político-culturais.

Com o início do programa euro-brasileiro na Alemanha, em 1974, essas reflexões tiveram continuidade no contexto mais amplo da discussão sobre a pesquisa da canção popular (Volkslied) e sua necessária renovação tanto na musicologia como na Volkskunde. A discussão dizia respeito também às relações entre a pesquisa específica no âmbito da Volksmusikforschung e a Etnomusicologia que se estabelecia a exemplo norte-americano em pretendida substituição da antiga Musicologia Comparada.

Carlos Gomes foi considerado sobretudo no projeto "Culturas Musicais da América Latina no século XIX" que, embora conduzido em departamento etnomusicológico, nascera de iniciativa histórico-musical e exigia necessariamente tratamento interdisciplinar. (Veja) As reflexões puderam ser aprofundadas em viagem de contatos, levantamento de fontes e estudos de contextos à Itália, em particular a Milão, em 1976. (Veja)

Entre outros aspectos considerados, o estudo das relações entre Carlos Gomes e a música folclórica e popular - e a sua inscrição no interesse pelas tradições populares do século XIX - pôde ganhar em profundidade a partir de uma composição conservada na biblioteca do Conservatório de Milão: Lisa me vostu ben?, designada como Canzonettta Veneziana.

"Carlos Gomes Folk-lorista" segundo Luís Heitor Correa de Azevedo

Um texto que sempre surge como ponto de partida das reflexões é aquele de título "Carlos Gomes Folk-lorista" de Luiz Heitor Correa de Azevedo, publicado no número especial da Revista Brasileira de Música dedicado ao centenário do compositor, em 1936 e publicado pelo Instituto Nacional de Música da Universidade do Rio de Janeiro (págs. 177-187).

O autor tratou no seu texto a um métoo de bandolim composto por Carlos Gomes em Milão, em 1890, e conservado na biblioteca da Sociedade Beneficiente Auxiliadora das Artes Mechanicas e Liberais, do Rio de Janeiro. Compreendido como brincadeira musical e lição, Carlos Gomes reproduz e harmoniza nesse documento motivos populares brasileiros. A importância desse procedimento é salientada por Luiz Heitor Correa de Azevedo:

"Isso é inedito; e não deixará de trazer a este numero da Revista Brasileira de Musica, que lhe é dedicado, se não uma contribuição fundamental, um prisma novo para o estudo do autor do Guarany (o que certamente não succede, dada a nenhuma importancia documental dos themas populares que o preoccuparam), pelo menos um certo pittoresco (...)." (op.cit. 179).

Citando Mario de Andrade (1893-1945), o autor concorda com a opinião de que na obra de Carlos Gomes desponta o sentimento nativo em alguns caracteres, certas originalidades rítmicas, certas rudezas de melodia e coincidências com a melodia popular. Tendo estudado as óperas nacionais escritas antes de sua partida para a Italia, em português, o autor constatou "um discreto perfume de modinha" e fórmulas melódicas "estrictamente nossas".

Diferentemente de autores posteriores, a transcrição textual de melodias populares não surge nas suas obras. Aceitando a opinião de Mário de Andrade - e assim da afirmação ideológica nacionalista -, concorda que na época de Carlos Gomes "ainda não havia, no Brasil, musica popular perfeitamente caracteristica, fundida nesse 'amálgama de tendencias ibero-africanas que hoje caracterisa a musicalidade nacional e só se torna evidente do fim do seculo XIX para cá."

Como o autor salienta, Carlos Gomes emprega antes trechos de música popular, no caso de uma canção de opereta de Arthur Azevedo (1855-1908), composta pelo compositor português Francisco de Sá Noronha (1820-1881), e que gozou de alta popularidade de décadas passadas, já então "velho". A seguir, o compositor trata de uma melodia ainda mais "velha", o "Vem cá, Bitú..." (op.cit. 181).

O tom humorístico dessa "brincadeira musical" associou-se com as insinuações crítico-jocosas de natureza política de Carlos Gomes, uma vez que as lições de bandolim terminam com o Hino Nacional de Francisco Manoel da Silva (1795-1865) que se desafina e se interrompe, dando lugar à Marselhesa e á referência ao Hino da República de Leopoldo Miguez (1850-1902). O documento indica, assim, não só a atenção de Carlos Gomes ao popular e ao "velho" popularizado em espírito lúdico,  como também, aqui em seriedade, a relações entre a música e desenvolvimentos políticos.

Tanto o método de bandolim como a sua Canzonetta Veneziana inscrevem-se na popularidade de cantos populares italianos muitas vezes ranscritos para mandolina e documentada em publicações de grande difusão em fins do século, também na Alemanha, tais como os cadernos de Celebri Canti Populari Italiani (Schmidl & Co 1900).

O interesse pelo antigo e pela tradição popular no ressurgimento nacional italiano

O interesse pela história, por lendas e cantos da tradição oral popular relacionou-se
estreitamente com os anelos nacionais em diferentes contextos do seculo XIX. Em regiões que estiveram ou estavam sob a soberania da Áustria cuja integração no reino nacional da Itália foi alvo de guerras, a valorização do passado registrada em fontes ou vivo na tradição oral representou importante fator na consciência cultural tanto de grupos populacionais de língua alemã como italiana. Significativamente, em Brixen, levantou-se uma estátua ao principal representante do
Minnegesang alemão da Idade Média, Walther von der Vogelweide. (Veja)

Do lado italiano, refletia-se que no século XII, os dialetos italianos ainda não se tinham definido em autonomia, o que seria pré-condição para a existência do canto popular. Ao lado da criação de um Dante,como  levantado em monumentos pelos italianos na vizinha Trento, não teria havido, no século XIV, lugar para um simples canto popular. (Veja)

Se a difusão de cantos populares alemães tinha sido favorecida pela descoberta da imprensa, em folhas soltas venidas por mascates, na Itália apenas produções poéticas artísticas teriam tido o privilégio de serem impressas. Não se deveria supor que não tivesse existido cantos populares, mas a forma erudita do soneto predominava. Essas visões e interpretações de desenvolvimentos podem ser constatadas em autores alemães e italianos, como em "O povo italiano no espelho de seus cantos populares" de Otto Badke (1851-1920) (Das italienische Volk im Spiegel seiner Volkslieder, Breslau 1879).

Citando Ermolao Rubieri (1818-1879) (Storia della poesia popolare italiana, Florença 1877), o autor lembrava que o canto popular, na sua simplicidade, continuava a viver de forma recôndita. Se o sentido poético do povo não deixara de ser influenciado pelas convulsões politicas e guerras, os seus cantos tratavam porém sobretudo o intransitório: a vida sentimental do homem, em particular o amor. Citando Oreste Marcoaldi (1825-1879), lembra que grande parte dos cantos populares italianos seria de cantos de amor, poucos referindo-se a guerras, à pátria, à religião ou à história. Isso representava um problema, pois dos cantos não sepodia determinar a sua origem, nem acontecimentos pátrios.

Se na Alemanha, os cantos populares ofereciam dados sobre usos e costumes do passado, seria também lá um risco vê-los como fontes históricas. O seu peso encontrava-se na fantasia livre, de modo que também na Alemanha o acento cabia ao amor. Quando Johann Gottfried Herder (1744-1803 )descobriu a riqueza do canto popular, acentou que a simplicidade e a veracidade do canto seria importante para toda a lírica, no qual foi apoiado por J. W. Goethe (1749-1832).

Apenas meio século após a obra de Herder é que surgiu um italiano que tirou o canto popular do esquecimento: Niccolò Tommaseo (1802-1874). Nascido em Sebenico, na Dalmácia, então sob a égide da Áustria, Tommaseo permaneceu na sua identificação e consciência italiano e, em especial veneziano. Assim, quando, em 1848, Veneza procurou libertar-se da Áustria para recuperar a liberdade republicana do longo e glorioso passado, Niccolo Tommaseo tornou-se adepto do govêrno provisório dessa época temporária. Tommaseo vivenciou por fim a união de Veneza ao reino da Itália, em 1866. Contribuiu ao fortalecimento da consciência italiana  dessas regiões que haviam pertencido à Áustria e assim a um ressurgimento nacional através da coleta de cantos transmitidos pela tradição oral. Muitos desses cantos ouviu-os de marinheiros nessa região tão marcada pela vida do mar. Na sua orientação nacional, não restringiu-se nas suas coiletas ao Adriático. A sua coleção de cantos toscanos foi publicada em Veneza, em 1841, ao mesmo tempo daquela de cantos corsicos e illiricos. Cantos populares venezianos foram publicados também por outros autores, tais como Domenico Giuseppe Bernoni (1828-1877), autor de Canti Popolari Veneziani (Veneza 1872).

Cantos de gondoleiros em tradição já rara à época de J.W. Goethe


Como a litografia da publicação da Canzonetta veneziana indica, a obra de Carlos Gomes necessida ser considerada sob o pano de fundo datradição dos cantos de gondoleiros da cidade da Laguna e que eram internacionalmente uma das suas principais características identificadoras.


Um dos mais significativos testemunhos do significado do canto de gondoleiros para a imagem de Veneza no Exterior reside nada menos do que em texto de W. Goethe ("Volksgesang", Die schönsten Aufsätze Goethes, ed. H. Oppel, Recklinghausen: Bitter & Co 1948, 106-109).


O escritor alemão, tratando de Veneza, inicia o seu texto lembrando que seria conhecido que os gondoleiros conheciam grandes trechos do Ariosto e do Tasso de cór, cantando-os com uma melodia própria. Essa prática já parecia estar em decadência à época de sua visita à Itália. Apenas com dificuldade pôde encontrar dois gondoleiros que cantaram um trecho do Tasso.


Nessa prática, eram sempre necessários dois cantores, que entoavam as estrofes alternadamente. O escritor conhecia a melodia pois J.J. Rousseau (1712-1778) a tinha publicado. Ela não teria na verdade um movimento melódico e seria uma espécie de meio termo entre o canto fermo e o canto figurato, aproximando-se do primeiro através de uma declamação recitatva, ao segundo através de passagens nas quais uma sílaba era retida e ornamentada.


Goethe tomou uma gôndola em noite de lua, tendo um cantor à frente e outro atrás, dirigindo-se em direção da igreja de S. Giorgio. um deu início ao canto, e, terminando uma estrofe, iniciava o outro, assim alternando. No todo, pareceu-lhe que permaneciam sempre na mesma nota, mas acentuavam uma ou outra nota de acordo com o conteúdo da estrofe, modificando também a interpretação da estrofe com a mudança do tema do poema. A interpretação tinha sido ríspida e gritada. Cantavam a modo de pessoas sem formação que dão valor à força no canto. Um cantor parecia concorrer com o outro em força dos pulmões.


O acompanhante italiano de Goethe, para atenuar a desagradável situação, lembrou que o canto soava muito diferente se fosse ouvido à distância. Por isso, ambos desceram da gôndola. Um cantor permaneceu na barca, o outro distanciou-se. Deram início ao canto, e Goethe movimentou-se entre ambos, sempre afastando-se daquele que começava a cantar.Foi assim que a prática revelou o seu valor. As palavras fortemente declamadas e mesmo gritadas atingiam os ouvidos de longe e chamavam atenção; as passagens que se seguiam, que segundo a sua natureza deviam ser cantadas mais suavemente, soavam como tons de lamento que ressoavam após um grito de sentimento ou de dor. O outro, que ouvia atentamente, começava logo assim que um terminava e respondia mais ternamente ou mais fortemente, de acordo com o texto.


Os canais serenos, os altos edifícios, o luar, as sombras, o fantasmagórico das gôndolas negras que iam e viam acentuavam a expressividade da cena, permitindo reconhecer o caráter desse canto que, para Goethe, era maravilhoso.  A canção propagava-se sobre o espelho parado das águas, tudo era tranquilo em meio a uma grande e populosa cidade, não ouvindo-se nenhum ruído de carro, de pessoas e, ao cruzar uma outra gôndola, quase que não se ouvia o remar.


À distância, o canto era um outro, totalmente desconhecido. Melodia e poesia uniam-se como dois seres, um tornava-se eco do outro e procurava ser ouvido assim como tinha ouvido. O alternar de versos chamava-se de convenção. I canto podia durar noites seguidas e os gondoleiros conversavam musicalmente sem cansa. O ouvinte que transitava entre êles participava dessa ação em que os dois cantores mantinham-se ocupados um com o outro.


O canto, à distância, soava extraordinariamente amável, porque êle atingia a sua compleição no sentimento do distante. Soava como um lamento sem tristeza, e quase que não se podia segurar as lágrimas. Tinham informado a Goethe que as mulheres das ilhas do Lido, em particular das localidades de Malamocca e Palestrina, cantavam também o Tasso nas mesmas ou similares melodias. Elas tinham o costume de sentar-se à beira-mar à noite quando os seus maridos partiam para pescar e ali cantavam até ouvirem ao longe o eco dos pescadores. Para Goethe, revelava-se aqui a beleza própria desse canto como a chamada de um solitário enviada à distância e à amplidão do espaço, à qual um outro, em sintonia, a ouvindo, dava-lhe resposta. Seria expressão de um anelo saudoso vindo do coração, próximo a todo momento de sentir a felicidade de ser satisfeito.


A dedicação da obra a Antonio Pavan (1823-1898)

Uma particular atenção merece o fato de ser a Canzonetta Veneziana dedicada a Antonio Pavan, personalidade influente da vida intelectual de Veneza da época do ressurgimento, do período anterior e posterior à recuperação de Veneza pela Itália.

A dedicação da obra, manifestando uma homenagem e amizade do Carlos Gomes a essa personalidade tão ligada a Veneza, indica estreitos elos do compositor com o meio veneziano e a intensidade com que se ocupou com anelos intelectuais, culturais e artísticos marcados pela conscientização e valorização da história da arte e das tradições venezianas à época das lutas pela recuperação do Vêneto e pela retomada do antigo significado de sua vida cultural após a sua reintegração no reino nacional da Itália.

As muitas publicações que se registram de Antonio Pavan podem oferecer uma visão geral dos assuntos com que o autor se ocupava e que não poderiam ter sido desconhecidos de Carlos Gomes. Dos primeiros anos da estadia do brasileiro em Milão destaca-se o livro Cenni storico artistici sul celebre Breviario Grimani e sul fac-simile che ne fu tratto con le tavole fotografiche in miniatura da Antonio Perini di Venezia (Stamperia dei compositori, ca. 1865), no qual Pavan tratava de um códice que, com as suas muitas miniaturas, trazia como poucos a época brilhante do passado artístico de Veneza.

Entre as publicações que a ela se seguiram (Alla pace dell'anima di Ferdinando Fraschetti, Florença 1869), destacam-se aquelas que dão continuidade a esse interesse pela História da Arte e da Estética, como a Lettera artistica(Brescia 1874), o livro L' architettura sesto-acuta in Italia : commemorazione di Aleardo Aleardi considerato come professore di estetica e di storia dell'arte (Pesaro1879); La musa dell'arte : discorso letto nella solenne distribuzione dei premi agli alunni del R. Istituto di belle arti in Venezia il 27 luglio 1884 (Venezia) e Ricordanza di Paris Bordon pittore Trevigiano (Treviso 1885)

O autor salientou-se na vida intelectual e artística de Veneza como o provam textos proferidos em associações (p.e. Terenzio Mamiani : commemorazione fatta dall'Associazione costituzionale Savoia in Treviso (Veneza 1885) e Quintino Sella : commemorazione letta all'associazione costituzionale di Venezia la sera del 19 Marzo 1886).

Particular atenção merecem criações poéticas que se referem a fatos e estórías de amor vertidos em linguagem e segundo a tradição poética popular.

Pode-se citar neste sentido o seu Alla nobile donzella Carme Spineda De Cattaneis, oggi sposa al giovane egregio Vincenzo Galliani di Livorno (Treviso, 1883);  e, sobretudo, Quando il N. H. Conte Pietro Foscari guidava sposa la N. D. Contessina Elisabetta Widmann Rezzonico augurava perpetuata alla coppia felice la dolcezza ineffabile che deriva dal perenne ricambio di pensieri e di affetti, 20 Giugno 1897 (Veneza, 1897).

Tratava-se aqui de uma historia de amor que levou ao casamento, em 1897, de duas personalidades altamente significativas do movimento nacional e nacionalista italiano: Piero Foscari (1865-1923) e a nobre Elisabetta Widmann Rezzonico (1878-1953): Piero e Lisa.

A Canzonetta veneziana de Carlos Gomes nos seus elos com a tradição popular

Já pela suas origens mais remotas, a canzonetta era próxima à tradição popular, em particular no contexto da villanella. Nessa sua aproximação à vida do homem do campo, tratava de assuntos de cunho pastoral ou de amor de pastoras.

A Canzonetta veneziana de Carlos Gomes respira ainda essa antiga tradição, tematizando o amor entre Piero e Lisa em elaboração simples de cunho popular. Em 3/4, andante, a canzonetta é introduzida por uma movimentação melódica ondulante de tendência descendente,à qual segue o canto, em Andante mosso, suave e leve com os destacados na linha melódia e no acompanhamento.





De ciclo de estudos sob a direção de
Antonio Alexandre Bispo


Indicação bibliográfica para citações e referências:
Bispo, A.A.(Ed.).“ O canto popular veneziano e o ressurgimento nacional italiano. A Canzonetta veneziana Lisa me vostu ben?  de A. Carlos Gomes (1836-1896) dedicada a Antonio Pavan (1823-1898) no decanto do amor de Piero Foscari (1865-1923) e Elisabetta Widmann Rezzonico (1878-1953)“
. Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 163/6 (2016:05). http://revista.brasil-europa.eu/163/Lisa_me_vostu_ben.html


Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2016 by ISMPS e.V.
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501


Academia Brasil-Europa
Organização de Estudos de Processos Culturais em Relações Internacionais (ND 1968)
Instituto de Estudos da Cultura Musical do Espaço de Língua Portuguesa (ISMPS 1985)
reconhecido de utilidade pública na República Federal da Alemanha

Editor: Professor Dr. A.A. Bispo, Universität zu Köln
Direção gerencial: Dr. H. Hülskath, Akademisches Lehrkrankenhaus Bergisch-Gladbach
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Veneza 2003.Fotos A.A.Bispo ©Arquivo A.B.E.

 

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