A capital da Europa e a cidade luz
ed. A.A.Bispo

Revista

BRASIL-EUROPA 166

Correspondência Euro-Brasileira©

 

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Estrasburgo. Foto A.A.Bispo 2017. Copyright

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Paris. Foto A.A.Bispo 2017. Copyright

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Fotos A.A.Bispo 2017©Arquivo A.B.E.

 


N° 166/1 (2017:2)



Strasbourg & Paris
a capital da Europa e a cidade luz em tempos críticos da União Européia e de identitarismo
- estudos euro-brasileiros em atmosfera de preocupações, inquietações e questionamentos -

 
A.A.Bispo 2017
Este segundo número da Revista Brasil-Europa de 2017 oferece relatos de ciclos de estudos levados a efeito em fevereiro e março do corrente ano em Estrasburgo e em Paris.

Várias razões justificam a escolha da histórica cidade da Alsácia e da capital francesa para o tratamento de questões culturais à luz de preocupações e desenvolvimentos políticos e sociais da atualidade.

A crítica às instituições européias no presente, as correntes e os movimentos políticos que defendem uma recuperação de soberanias nacionais, o Brexit e o recrudescimento em geral do nacional, do nacionalismo e de movimentos identitários, salientam o significado de uma especial atenção a Estrasburgo como „capital da Europa“.

Sediando importantes instituições européias, em particular o Conselho da Europa, Estrasburgo distingue-se pelo significado dado aos  Direitos do Homem e, assim, de questões de amplidão global, que superam delimitações nacionais.

Estrasburgo. Foto A.A.Bispo 2017. Copyright

Estrasburgo como centro cultural, universitário e a América Latina

Como centro universitário procurado por estudantes de diferentes nações, Estrasburgo é cidade de vida cultural, artística e musical intensa. Nela vive grande número de latinoamericanos, organizados em parte em associações das quais se distingue a Maison de l‘Amérique latine.

Os desenvolvimentos político-sociais da atualidade de cunho nacionalista e sobretudo aqueles marcados por preocupações com a expansão do Islão levam a uma mudança de atitudes relativamente a estrangeiros, o que também não pode deixar de atingir os latinoamericanos.

Nos diferentes centros, dependendo da situação contextual local e das tradições das diferentes associações latinoamericanas em geral ou brasileiras, a discussão da situação atual processa-se em diferentes graus de intensidade e características.

Comparações entre as atividades associativas de diferentes cidades podem contribuir a uma visão geral fundamentada dos desenvolvimentos. A situação especial de associações em cidades marcadas por instituições européias, como é o caso
Estrasburgo. Foto A.A.Bispo 2017. Copyright
de Estrasburgo, merecem particular atenção. (Veja)

Pela sua própria situação geográfica, pela sua história e pelo seu presente, Estrasburgo adquire particular relevância entre as metrópoles européias para análises de processos culturais.

A configuração urbana da cidade demonstra interações do velho e do novo, do histórico e do contemporâneo, fazendo de Estrasburgo objeto modelar de considerações arquitetônicas e urbanísticas de orientação cultural.

A cidade, que abriga importante faculdade de Arquitetura, é marcada por vários edifícios que simbolizam essas interações entre o patrimônio histórico e soluções avançadas, e o manto de metal e vidro que cobre a fachada da sua histórica estação - uma das principais da época em que Estrasburgo pertencia ao império alemão - simboliza visualmente reconfigurações estéticas e de sentidos político-culturais.

A cidade distingue-se pela sua modelar rêde de bondes, sistema de transportes ali reintroduzido como em muitas outras cidades francesas e que garante uma coesão do sistema viário, possibilitando a integração do antigo centro com a área na qual se situam as principais instituições européias.

Apesar de suas qualidades euro-metropolitanas, questionável é porém a arquitetura e o urbanismo da área em que se situam o Parlamento e o Conselho da Europa. Nas suas dimensões e configurações parecem corroborar as críticas a
uma situação dos organismos europeus como sendo distantes da realidade, supra-dimensionados e por demais burocráticos.

Atualidade de Estrasburgo nos 500 anos da Reforma

Estrasburgo é uma das principais cidades das comemorações dos 500 anos da Reformação, uma celebração que marca a vida religiosa, intelectual e cultural não só da Europa e não só do Protestantismo no mundo.

A participação da Igreja Católica nos eventos representa um marco na aproximação ecumênica e em diálogos que tratam de questões teológicas, eclesiais, filosóficas e histórico-culturais.

A participação de representantes de outras rellgiões, de universidades e da vida política salienta as dimensões amplas da consideração desses 500 anos sob a perspectiva do processo desencadeado pela reforma religiosa.

A nona edição da „década de Lutero“, série de eventos que preparou o atual ano comemorativo, teve lugar em Estrasburgo, ocasião em que lembrou-se da razão pela qual esses 500 anos da Reformação merecem a atenção do Estado e instituições seculares da Europa, da qual Estrasburgo é capital. O processo desencadeado pelo movimento da reforma não possui apenas dimensões religiosas ou eclesiais: representou um processo de cruciais transformações políticas, sociais, intelectuais e sociais.

Nesse processo transformatório, que tem consequências no presente, inserem-se fiéis e não-fiéis, cristãos e não-cristãos. A sua análise representa assim uma exigência para estudos de processos culturais em relações internacionais, independentemente de posicionamentos confessionais.

Estabeleceu-se nessas reflexões uma ponte entre as comemorações da Reforma e a atualidade, marcada que é por graves problemas entre eles aqueles relacionados com a imigração islâmica a países europeus.

As questões que se levantam, dizendo respeito tanto a protestantes como a católicos, podem levar a reflexões que, na procura de mudanças de paradigmas necessárias para o confronto com as novas situações também abrem novos caminhos para o diálogo teológico e filosófico-cultural.

Significado dos 500 anos da Reforma para os estudos euro-brasileiros

Em ambos os sentidos tematizados o ano dos 500 anos da Reformação merece ser considerado nos estudos culturais referenciados segundo o Brasil. Esses 500 anos seguem-se após breve intervalo de
tempo àqueles do Descobrimento do país em 1500, o que traz à consciência a contemporaneidade da expansão européia no início da era moderna com a das preocupações, impulsos e esforços de renovação religiosa e eclesial.

Independentemente do fato de já no século XVI ter sido o Rio de Janeiro local de uma tentativa de colonização reformada, o Brasil insere-se no complexo processo transformatório relacionado com o movimento da Reforma e com as tensões confessionais na Europa.

A história do luteranismo no Brasil, relacionada com aquela da imigração européia, em particular da Alemanha, e a expansão de correntes e igrejas de diferentes denominações e inserções históricas no presente evidenciam a oportunidade que as comemorações do „ano Lutero“ de 2017 oferecem a estudos sob a perspectiva euro-brasileira.

Dois edifícios históricos de Estrasburgo surgem como particularmente significativos e instigantes para essas reflexões: a sua catedral de Notre Dame e a igreja de S.Tomás, considerada como
„catedral do Protestantismo“. (Veja)

A catedral de Estrasburgo e linguagem simbólica

A catedral, uma das mais valiosas obras do patrimônio arquitetônico europeu, é o monumento que mais traz à consciência o papel de excepcional relevância desempenhado pela cidade no processo reformatório, uma vez que ela própria foi transformada durante anos em igreja protestante.

A posição da Alsácia-Lotríngia entre as esferas culturais alemã e francesa determinou através dos séculos intercâmbios, transformações, alterações políticas e singularidades que diferenciaram de outras mais internas da França e mesmo de Paris. Foi assim há séculos uma cidade européia e mesmo internacional por excelência, aberta pela sua situação fronteiriça à recepção de novas tendências do pensamento, difundidas pelo desenvolvimento da imprensa, e destinada a ser abrigo daqueles que fugiam das perseguições religiosas. (Veja)

Estrasburgo e Albert Schweitzer (1875-1965) - música e ética

A igreja de S. Tomás por sua vez, dirige a atenção a vultos da história protestante, entre êles, a Albert Schweitzer, o teólogo, filósofo, organista e musicólogo. Como um dos principais representantes do movimento Bach europeu, exerceu considerável influência no Brasil através de seus elos com a Sociedade Bach de São Paulo. A memória de Albert Schweitzer surge como de particular atualidade, uma vez que foi um dos maiores vultos da ação de solidariedade humana e de uma ética de respeito à vida, também daquela referente aos animais. (Veja)

É significativo que o nome de Albert Schweitzer seja lembrado no Palais de la Musique e des Congrès, sede da Orchestre Philharmonique de Strasbourg.


Paris em época de preocupações: o Ocidente sentido como em risco

Paris dirige a atenção a outros tipos de questionamentos nas reflexões que se encetam sob o impacto dos problemas sociais e dos debates políticos da atualidade.

Paris foi alvo nos últimos anos de graves atos de terrorismo; em particular as suas áreas periféricas, marcadas por concentrações de migrantes que as fizeram conhecidas internacionalmente por suas tensões e conflitos.

Preocupações sobre os riscos desse desenvolvimento favorecem movimentos políticos que defendem e propagam mudanças da ordem estabelecida no sentido de recuperação de ordem perdida ou sentida em risco.

Apesar de todas as diferenças quanto a pesos nas conceitos e imagens na argumentação - se antes nacionalistas, étnico-raciais, de crítica ao Islão ou outros - pode-se constatar uma tendência restaurativa nas manifestações de protesto e nos anelos de mudança do presente.

Aproximações quanto a paralelos históricos: a Restauração Européia

Entre as questões que se colocam sob a perspectiva da análise de processos que ocorrem na atualidade, surge assim aquela de fenômenos restaurativos nas diferentes contextualizações, o que leva à procura de paralelos históricos.

Nesse intento, nenhuma época pode concorrer com aquela da Restauração européia após a derrota do império de Napoleão, marcada que foi pelo reestabelecimento de antigas configurações políticas e político-sociais caídos ou abalados nos seus fundamentos pela Revolução de 1789 e que levara a reordenações em grande parte da Europa sob a ação napoleônica.

Apesar da sempre presente memória celebrativa dos anelos e das conquistas revolucionárias em Paris e em outras cidades francesas, a focalização do movimento restaurativo na sua processualidade temporal traz à consciência de como os ímpetos e as medidas voltadas a uma recuperação de ordem passada, perdida ou em risco marcaram a história cultural, não só a da França.

O significado do processo restaurativo europeu para o Brasil

Muito em especial adquire o estudo diferenciado de correntes retroativas e restaurativas européias, em particular da Restauração das primeiras décadas do século XIX significado para os estudos de processos culturais relacionados com o Brasil.

Com a vinda da Côrte Portuguesa ao Rio de Janeiro e a elevação do país a Reino Unido tornou-se o Brasil sede extra-européia de uma potência européia que representava a ordem abalada pela Revolução e por Napoleão, um fato extraordinário na história política e cultural.

A consideração do processo restaurativo na Europa durante décadas e que levou ao retorno dos Bourbons na França, ao Congresso de Viena e à Europa reordenada sob a liderança da Áustria  é de fundamental significado para estudos de processos político-culturais que levaram à Independência no Brasil.

Reciprocamente, a consideração do fato extraordinário da sobrevivência de um dos mais relevantes regimes da antiga ordem fora da Europa surge como necessária para o estudo do processo restaurativo no Velho Mundo.

Há duas personalidades que merecem particular atenção nesse contexto de interações internacionais, mais particularmente de relações França-Áustria e Portugal/Brasil: Ch. M. de Talleyrand (1754-1838), um dos mais influentes vultos da diplomacia francesa e seu protegé e assessor austríaco Sigismund von Neukomm (1778-1858), compositor, homem de vasta erudição e, como o seu mentor, vulto da diplomacia interno-européia e transatlântica.

Ambos surgem sob muitos aspectos como personalidades enigmáticas, um fato que tem sido considerado sobretudo quanto a Talleyrand, aristocrata do Ancien Régime mas que manteve cargos de influência em diferentes situações políticas, também na Revolução e sob Napoleão, tornando-se por fim motor da restauração dos Bourbons.

Também a imagem de Neukomm é marcada por intrasparências e dificuldades de compreensão da sua personalidade e de suas ações, o que indica a necessidade de análises mais diferenciadas do processo político-cultural restaurativo de sua época e de suas implicações no Brasil.

A necessidade de maior distinção de tendências moderadas, mais liberais e constitucionais e os ultra-realistas de tendências absolutistas no campo de tensões e nos anelos restaurativos na França evidecia-se em Talleyrande abre caminhos para a melhor compreensão daquele que foi o compositor do Te Deum pela entrada de Luís XVIII em Paris, em 1814, a seguir da Missa de Requiem por Luís XVI no Congresso de Viena e mentor de portugueses e brasileiros no Rio de Janeiro.

Dois monumentos de extraordinário significado arquitetônico e da história política e cultural da França foram escolhidos para o aprofundamento dessas reflexões sob os impulsos de desenvolvimentos do presente: a catedral, antiga abadia de Saint-Dénis e a catedral de Notre-Dame de Paris.

A catedral de Saint-Dénis oferece-se como particularmente significativa para esses objetivos, uma vez que, como local de sepultamento de reis franceses, entre êles de Luís XVI e Luís XVIII, surge como monumento da antiga França anterior à Revolução e daquela da Restauração.

Situada hoje em zona periférica marcada pela sua grande parcela populacional de migrantes, que a fazem centro o Islão na França, Saint-Dénis impressiona pelos seus confrontos culturais, vindo de encontro às preocupações atuais quanto a um risco do Ocidente cristão pela Islamização e, consequentemente, a anelos de cunho restaurativo. (Veja)

Reflexões na catedral de Notre Dame de Paris - Restauração e romantismo

A catedral de Notre Dame de Paris, um dos mais valiosos e emblemáticos bens do patrimônio histórico-cultural francês, dirige a atenção a um outro aspecto dos estudos de anelos restaurativos: a sua dimensão romântica.

A igreja que fora secularizada como „templo da razão“ à época revolucionária, e aberta ao culto à época napoleônica, que ali coroou-se, foi o local de execução da maior obra de Neukomm composta nos seus anos na casa de Talleyrand em Paris, o mencionado Te Deum pelo retorno dos Bourbons.

A restauração da catedral, deteriorada mas não totalmente destruída, tornou-se um dos grandes projetos do Romantismo francês, pelo qual empenhou-se Victor Hugo (1802-1885), e, assim, de uma idealização do passado medieval.

Nostalgia de um passado recente perdido ou em risco relacionou-se assim com imagens de um passado distante, o que se manifestou em reconstruções de bens patrimoniais a partir de estudos históricos das artes e da arquitetura como personificado no vulto do arquiteto Eugène Viollet-le-Duc (1814-1879). (Veja)

Visões a partir de Saint Julien le Pauvre - hagiografia e música

Uma aproximação empática a essa dimensão romântica do processo restaurativo é possibilitada não tanto da própria Notre Dame, mas sim da próxima igreja de Saint Julien-le Pauvre, a mais antiga restante das construções românicas de Paris que, recôndita e modesta, marcada por sinais de ruínas, possibilita, através das árvores, uma diferente visão daquela que visitantes de Paris obtém da catedral.

Já a sua dedicação hagiográfica, marcada por lendas nas quais se interlaçam antigas tradições da linguagem simbólica, transporta o observador a uma outra esfera de reflexões, aquela dos fundamentos do próprio edifício cultural.

O fato de ter sido berço da própria universidade de Paris na Idade Média traz à consciência os elos entre imagens de remotas proveniências e o desenvolvimento da filosofia, das artes e da ciência. Saint Julien hospitaleiro, pela sua própria estória visto como protetor de migrantes, de homens que procuram abrigo, adquire particular significado no presente marcado por asilantes e fugitivos.

Como protetor de trovadores - dos cantores em viagem ou em sentido metafórico do homem a caminho que canta -, Saint Julien - le Pauvre abre perspectivas para considerações músico-culturais do sentido da pequena igreja parisiense. (Veja)

Chopin em processos culturais e tendências patrióticas do presente

Hoje do rito católico-grego, Saint Julien é utilizada também para recitais, em particular de obras de autores românticos. Sobretudo F. Chopin (1810-1849 ), músico polonês em viagens, que encontrou em Paris segunda pátria, ali alcançando seus principais êxitos e ali faleceu, é um vulto da história da música que como poucos outros exige ser considerado a partir de um desenvolvimento histórico de anelos românticos na sua processualidade temporal.

Permanecendo como poucos outros vinculado a Paris, corre o risco de ser visto a partir de uma configuração adquirida pela metrópole apenas em décadas posteriores, um problema que, reciprocamente, diz respeito também à imagem da cidade que foi a mais importante do século XIX.

Essas projeções anacrônicas contribuem à compreensão das reinterpretações e mesmo instrumentações da vida de Chopin em períodos posteriores, a considerações deslocadas historicamente de seus elos nacionais e patrióticos, um fato que teve também ressonância no Brasil de entre-guerras. Essa discussão adquire hoje renovada atualidade com o recrudescimento de movimentos que proclamam sentimentos patrióticos no presente.

Impulsos criadores no desafio à história: 40 anos do Centro Pompidou

Estudos culturais à luz de acontecimentos da atualidade em Paris não podem deixar de considerar que, em 2017, se comemoram 40 anos do Centro Nacional de Arte e Cultura de Paris, o Centro Pompidou. Essa celebração, que se extende à toda a França e mesmo ao Ultramar francês, traz à memória um complexo temático que contrasta com a focalização da atenção a processos restaurativos.

Os múltiplos eventos trazem à discussão o papel impulsionador a criações inovativas representado por uma arte que quebra continuidades, normas e convenções de ordens estabelecidas, tradições e costumes.

O próprio Centro Pompidou, na sua arquitetura high-tech no centro histórico de Paris, questionável desde a sua construção, surge como foco e modêlo dessa função de uma arte progressista.

Foi nesse sentido desafiante do Centro Pompidou que este desempenhou desde a sua inauguração papel significativo no desenvolvimento dos estudos euro-brasileiros.

Lembrou-se nesses anos dos muitos aspectos dos
elos da vida intelectual, artística e musical do Brasil posterior à Primeira Guerra Mundial com aqueles da capital francesa. Sobretudo por ocasião dos 40 anos da morte de Jean Cocteau (1889-1963) em 2004, alvo de exposição memorável no Centro Pompidou, considerou-se em seminário em universidade alemã e em colóquio internacional no Rio de Janeiro o papel do Brasil no movimento musical posterior à Primeira Guerra, em particular através do vulto de Darius Milhaud (1892-1974), o autor de „Saudades do Brasil“. (Veja)

Renovação da etnologia, mundialização, multiculturalismo e etnopluralismo

As reflexões sob o signo de acontecimentos e desenvolvimentos do presente não podem deixar de considerar tendências e perspectivas dos próprios estudos culturais na França da atualidade.

Uma das mais significativas oportunidades para tais aproximações ofereceu o evento „L‘Ethnologie va vous surprende“, levada a efeito na sua terceira edição no Musée du quai Branly Jacques Chirac. Esse museu, reunindo coleções de outras instituições, entre elas do Musée de l‘Homme, compreende-se como um marco de desenvolvimentos recentes na história dos estudos etnográficos, coloniais e antropológico-culturais na França, demonstrando uma renovação da área e o significado de culturas extra-européias no presente marcado pelo multiculturalismo.

Esse escopo do museu Jacques Chirac merece ser  acompanhado com especial atenção pelos estudos relacionados com o Brasil, uma vez que os estudos brasileiros de tradições populares, de folclore e etnografia foram sempre estreitamente vinculados com aqueles da França.

Tanto a manutenção do termo Etnologia, como referências a culturas extra-européias levantam questões teóricas e de perspectivas que necessitariam ser tratadas criticamente a partir dos debates levados a efeito nas últimas décadas. No presente, merece especial atenção a referência à mundialização e ao multiculturalismo.

Justamente a tentativa de dar novos sentidos ao termo Etnologia, mantendo-o porém, e a menção de conotações positivas de situações multiculturais  levam a discussões à luz dos desenvolvimentos atuais.

É justamente o multiculturalismo que é combatido por movimentos políticos como aquele dos „identitários“ franceses, que apregoam antes um etnopluralismo, concebido em geral não como multiplicidade de concomitância de configurações étnicas e raciais, mas culturalmente definidas.

O risco de conceituações como aquelas apresentadas no evento „L‘Ethnologie va vous surprende“ corre o risco, assim, apesar de toda a aparente progressividade, de reforçar de forma talvez inconsciente ou pouco refletida concepções há muito discutidas e questionadas. (Veja)

Problemática imigratória e Cultural Studies - sob o impacto do Brexit

As preocupações nos estudos de processos culturais atuais merecem ser antes tratadas, na problemática francesa marcada pela imigração, em particular nas zonas marginais de Paris, primordialmente a partir de outra corrente de pensamento teórico-culturais, aquele dos Cultural Studies de contextualização britânica.

Estes, porém, exigem êles próprios reformulações quanto ao objeto de estudos, dirigindo a atenção em particular a questões culturais da migração. O Brexit, o distanciamento da Grã-Bretanha da União Européia, acentua determinados aspectos a problemática teórica relacionada com o vir a ser e a contextualização britânica dos Cultural Studies.

Antonio Alexandre Bispo


Indicação bibliográfica para citações e referências:
Bispo, A.A.  "Strasbourg & Paris. A capital da Europa e a cidade luz em tempos críticos da União Européia e de identitarismo. Estudos euro-brasileiros em atmosfera de preocupações, inquietações e questionamentos“
. Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 166/1 (2017:2). http://revista.brasil-europa.eu/166/Estrasburgo_e_Paris.html


Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2017 by ISMPS e.V.
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501


Academia Brasil-Europa
Organização de Estudos de Processos Culturais em Relações Internacionais (ND 1968)
Instituto de Estudos da Cultura Musical do Espaço de Língua Portuguesa (ISMPS 1985)
reconhecido de utilidade pública na República Federal da Alemanha

Editor: Professor Dr. A.A. Bispo, Universität zu Köln
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