L‘Ethnologie va vous surprende!
ed. A.A.Bispo

Revista

BRASIL-EUROPA 166

Correspondência Euro-Brasileira©

 

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Paris. Foto A.A.Bispo 2017. Copyright



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Paris. Foto A.A.Bispo 2017. Copyright

Fotos A.A.Bispo 2017©Arquivo A.B.E.

 


N° 166/13 (2017:2)



„L‘Ethnologie va vous surprende“
tentativas de renovação de uma área em tempos de mundialização
Ambivalências e paradoxias:
o plädoyer pelo etnopluralismo dos
identitaires que combatem o multiculturalismo

Musée du quai Branly Jacques Chirac

 

„L‘Ethnologie va vous surprendre“ é título de uma série de eventos que vem se realizando anualmente no Musée du Quai Branly Jacques Chirac em Paris. Esse museu, inaugurado em 2006, é subvencionado em parte pelo Ministério da Pesquisa, em parte pelo da Cultura. O departamento de pesquisa e de ensino do museu encontra-se sob a direção de Frédéric Keck.

Anunciado como „dois dias para explorar o século XXI“, a sua terceira edição no corrente ano, nos dias 11 e 12 de março, incluiu conferências, debates, projeções, leituras especiais e outros eventos destinados a oferecer ao público as múltiplas faces da Etnologia contemporânea. A segunda edição, em 2015, contou com a presença de 20.500 visitantes.

Sob o título „Têtes chercheuses“, apresentam-se resultados de pesquisas de campo. Também em outras iniciativas, nas quais antropólogos comentam obras, surge a pesquisa de forma personalizada. O público tem oportunidade de conhecer especialistas e seus trabalhos nos Ateliers Les Experts quai Branly. Extratos de filmes de pesquisas de campo são apresentados, com ou sem comentários. Entre outros, o antropólogo Roberte Hamayon apresentou trabalhos por êle realizados sobre o xamanismo na Mongólia e na Sibéria.

Entre as novidades das jornadas de 2017, salientou-se a particular atenção à Etnomusicologia na forma de etno-concertos orientados por especialistas com base nas coleções do museu. Audições sonoras marcaram também as „Voyages en terre indigène“.

Inovativa é a apresentação de objetos de pesquisa e de escritos etnológicos por meios teatrais: a obra teatral Les Âmes Offensées de Mach Makeleff e Philippe Geslin, apresentada no teatro Claude Lévi-Strauss, apresentou de forma inovativa reflexões e estudos do etnólogo Philippe Geslin.

A ampliação do campo de estudos de etnólogos às sociedades ocidentais evidenciou-se na questão levantada por Vinciane Despret sobre o como os mortos atuam nos hábitos no Ocidente. A ampliação da área no tratamento de questões globais da atualidade foi demonstrada em palestras como a de Marc Abèlès sobre uma „dimensão mágica do luxo“.

A contemporaneidade dos eventos manifestaram-se também nos Ateliers edit-a-thon, realizados com a Wikipedia e que focalizaram o enriquecimento do saber comum nas ciências humanas e sociais.

A „L‘Ethnologie va vous surprendre!“ no seu significado para o Brasil

A especial atenção que merece a „L‘Ethnologie va vous surprendre!“ nos estudos de processos culturais relacionados com o Brasil decorre dos elos particularmente intensivos que sempre existiram entre instituições etnológicas e antropológico-culturais francesas e brasileiras.

Em áreas como as do estudo de tradições populares, da etnografia e do folclore, o desenvolvimento histórico do pensamento, dos interesses, questionamentos e métodos inserem-se em grande parte naquele ocorrido na França desde o século XIX.

A recepção da literatura especializada em francês, mais intensa do que a de publicações em outros idiomas, foi uma das razões desses elos particularmente intensos. Vários pesquisadores e eruditos franceses atuaram no Brasil, influenciaram de forma significativa não só os estudos universitários, instituições e pensaores do país, como ganharam renome internacional com estudos sobre assuntos brasileiros, o que teve repercussão internacional e em instituições na própria França.

Vários foram os pesquisadores brasileiros que se especializaram na França e desempenharam papel significativo em rêdes de contatos e de cooperações recíprocas.

Em particular o Musée de l‘Homme em Paris foi durante décadas instituição considerada como modelar e principal endereço de pesquisadores culturais brasileiros na capital francesa. Torna-se assim necessário acompanhar com particular atenção as atividades recentes e as tendências nessas áreas de estudos em Paris à luz do desenvolvimento dos estudos euro-brasileiros das últimas décadas.

Paris. Foto A.A.Bispo 2017. Copyright

O evento „L‘Ethnologie va vous surprendre“ ofereceu aqui uma oportunidade favorável neste sentido, uma vez que se apresenta como sendo voltado a questões do presente, salientando o siginificado atual que cabe à Etnologia e que seria inesperado ou mesmo surpreedente.

O evento tem objetivos de informação, de revelação e esclarecimento. Esses intentos, porém, fundamentam-se e implicam em concepções teóricas e de sentidos da própria área designada como Etnologia, que não é em si questionada, o que exige reflexões com base no desenvolvimento do pensamento das últimas décadas e da problemática político-cultural da atualidade.

O Musée du quai Branly na história institucional da pesquisa cultural

O Musée du quai Branly - Jacques Chirac, inaugurado em 2006, reuniu coleções provenientes de uma dupla tradição: aquelas do Musée de l‘Homme e aquelas do Musée national des Arts d‘Afrique et d‘Océanie.

Com um acervo de 370 000 objetos e grande acervo iconográfico e bibliográfico, é uma das maiores instituições européias dedicadas ao estudo, à preservação e à promoção das artes e das civilizações extra-européias.

É significativo que o evento e o museu que o promove procurem situar-se em desenvolvimento histórico institucional e da pesquisa, apresentando-se assim como   a sua expressão mais recente.

Esse desenvolvimento teria tido, como fase inicial, aquela da passagem das coleções do museu do Louvre ao museu de etnografia do Trocadero. As coleções apresentadas, principalmente as americanas, situaram-se gradativamente no âmbito de projetos de museus específicos no âmbito do museu do Louvre, denominados de Musée Dauphin, Musée de Marine e, por fim, Musée ethnographique.

Essas coleções foram enriquecidas com objetos coletados por marinheiros e cientistas que realizaram viagens pelo mundo. Um momento decisivo deu-se com a Exposition universelle de Paris, em 1878, o que motivou a criação do museu e etnografia do Trocadéro. Ao lado do Louvre, dedicado às artes, de natureza histórico-artística, o museu do Trocadéro passou a ter a tarefa da história dos usos e costumes sem distinção de épocas.


Interesse pela cultura africana na França e Colonialismo do século XIX

As coleções africanas que constituem importante parte dos acervos culturais e razão principal do interesse francês pela cultura africana do século XX - o que não deixou de exercer influência determinante nos estudos brasileiros - foram possibilitadas em grande parte pelo colonialismo da França intensificado na segunda metade do século XIX.

Essa contextualização histórica do vir a ser histórico das coleções africanas da atualidade revelam a inserção da pesquisa e dos estudos específicos em processos abrangentes em relações internacionais, como vem sendo acentuados nas últimas décadas no âmbito dos estudos euro-brasileiros.

Essas coleções africanas obtidas no decorrer dos empreendimentos da época colonialista enriqueceram não só o museu de etnografia do Trocadéro como muitos museus de cidades francesas, museus regionais mantidos em geral por associações de estudiosos.

Em complexo desenvolvimento que variou em intensidade no decorrer das décadas, estabeleceram-se intercâmbios e cooperações entre museus nacionais e regionais, assim como com outros museus etnográficos de outros países.

Para o enriquecimento de coleções e para o desenvolvimento de contatos, as exposições mundiais, as feiras e as exposições colonias foram de importância, pois ofereceram impulsos recíprocos. Criou-se uma exposição permanente de colonias em Paris, o que deu origem ao Musée des Colonies no âmbito da Exposição Colonial de 1931.



Interesse francês pelas artes: do Musée des Colonies ao des Arts d‘Afrique

Em 1937, criou-se a instituição que desde então tornou-se centro referencial dos estudos específicos, o Musée de l‘Homme substituindo o antigo museu de etnografia do Trocadéro. Procurando-se fundamentar a instituição sobre bases científicas, o museu passou também a enriquecer as suas coleções através de expedições com o objetivo de inventariar as culturas materiais mundiais.

Correspondendo às transformações na política colonial francesa, o Musée des Colonies transformou-se em 1935 no Musée de la France d‘Outre-mer. Uma tendência da época, incentivada pela atuação de artistas contemporâneos, foi o da valoração estética de objetos, uma atenção ao sentido artístico do patrimônio extra-europeu que determinou tendências que se tornariam características das preocupações francesas, a da concepção estética no sentido de estética das artes no tratamento de objetos culturais dos povos, lembrando-se aqui do papel impulsionador exercido por André Malraux (1901-1976).

Essa visão acentuadamente artístico-cultural evidenciou-se na transformação do Musée des Colonies em Musée des Arts africains et océaniens, em 1961, redesignado, em 1990, em Musée national des Arts d‘Afrique et d‘Océanie.


Preocupações atuais: renovação da Etnologia em era de mundialização

Como explicitamente manifestado pelo museu, o objeto das jornadas é o de mostrar a renovação da etnologia, esclarecendo o modo com que ela trata questões de mundialização, dirigindo a atenção a mudanças de práticas culturais.

O museu compreende sob o conceito de Etnologia a „parte social e cultural“ da Antropologia, área da ciência dedicada ao estudo do ser humano sob todos os seus aspectos. A Etnologia estuda as sociedades através das linguas, costumes, organização política, religiosa e econômica.

Segundo o museu, a Etnologia seria „prima“ da sociologia. Os etnólogos apoiam-se tanto na pesquisa de campo como em fontes de arquivos históricos e arqueológicos.

Faz-se questão de lembrar que, no início do século XX, a Etnologia foi, em geral, definida como uma área voltada a salvar as sociedades em vias de desaparecimento. Hoje, porém, pós décadas, compreendeu-se que as sociedades se transformam, mesmo em era mundializada. Também sob essas condições globalizadoras produz-se diversidade cultural.

Consideração das concepções francesas à luz dos estudos euro-brasileiros

Questões de natureza antropológica vem sendo tratadas com especial atenção e determinado até mesmo o debate das últimas décadas na tradição científica em que se insere a Academia Brasil-Europa (ABE).

Essas questões dizem respeito não apenas ao objeto da pesquisa e dos estudos, mas também à própria acepção da área científica em si.

A compreensão do termo Antropologia Cultural apresenta diferenças e mesmo imprecisões e incoerências em definições de vários autores de acordo com diferentes correntes, rêdes e culturas de saber.

O debate no âmbito dos estudos culturais no Brasil nos anos de 1960 foi marcado pela recepção e pela discussão de conceituações e procedimentos de diferentes proveniências. Empregado sobretudo no âmbito das Ciências Sociais, foi de importância em círculos voltados à Pesquisa do Folclore. Esta, compreendida como área de estudos científicos, era marcada por preocupações múltiplas de renovação de perspectivas, de objetivos e com a própria definição. Embora sem então abandonar o termo folk na determinação do objeto da pesquisa, alguns pesquisadores aproximaram-se a questionamentos da Sociologia.

A compreensão do objetivo da Antropologia Cultural como sendo o do estudo empírico de problemas do homem do presente nas suas relações com a cultura, manifestou em vários trabalhos de pesquisa.

Por outro lado, não apenas impulsos teóricos franceses marcaram o desenvolvimento do pensamento no Brasil. A atenção ao quotidiano em estudos do "folclore do dia-a-dia" correspondeu a interesses e concepções similares da social anthropology da Grã-Bretanha ou da cultural anthropology norte-americana.

As dificuldades e imprecisões de redefinições do objeto da pesquisa sem o abandono do pressuposto da existência de uma esfera categorizada como folk ou de cultura espontânea ou informal foram importantes fatores que levaram à convicção da necessidade de superação de orientações disciplinares marcadas por categorizações do objeto a favor de um direcionamento da atenção a processos e processualidades.

A análise de expressões culturais tradicionais - danças, folguedos, cortejos, dramatizações e outras - até então estudadas na área do Folclore focalizadas-passou a ser dirigida a suas inserções em processos.

A atenção dirigida à dinâmica de adaptações e transformações levou a intentos de análise e revelação de estruturas de uma ordenação interna e de sentidos inerentes à linguagem de sinais, pré-condição para a compreensão de mecanismos de atualizações de expressões do edifício cultural em diferentes contextos e circunstâncias.

Esses intentos de análise de sentidos de sinais, signos e símbolos da linguagem perceptível pelos sentidos corresponderam a preocupações que então marcavam os estudos de Comunicação Visual da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo.

Essa aproximação levou ao reconhecimento de concepções do homem intrínsecas às práticas transmitidas pela tradição, inerentes ao complexo de sentidos indicados pelos sinais aparentes.

Tratou-se, assim, de uma questão de leitura de sentidos das representações como textos que não deviam ser lidos superficialmente de forma literal. Para que essa leitura não fosse arbitrária, confundindo projeções e interpretações do pesquisador com sentidos indicados pelos sinais, impunham-se cotejos de representações em diferentes contextos e estudos interdisciplinares de fundamentos.

Essa compreensão de Antropologia Cultural, ou seja, de estudos de concepções intrínsecas de natureza antropológica em manifestações culturais diferenciava-se de outras acepções, em particular daquela das Ciências Sociais como a do homem nas suas relações com a cultura.

Ela podia, porém, com elas interagir no sentido de um estudo do homem nas suas relações com atualizações contextualizadas de um edifício cultural no qual concepções do homem seriam constitutivas.

A pesquisa de fundamentos sob diferentes perspectivas disciplinares para a justificação e explicação desses sentidos antropológicos inerentes às representações avançou decisivamente com a consideração de aportes da Musicologia Comparada e Etnomusicologia no âmbito do Centro de Pesquisas em Musicologia (1968), em particular de obras de Alain Daniélou (1907-1994). (Veja)

A introdução da Etnomusicologia nos estudos superiores em São Paulo trouxe à discussão novos acentos quanto a problemas teóricos. Por alguns foi compreendida como nova denominação da pesquisa de folclore musical, o que equivalia a uma redenominação dessa área de estudos como sendo de Etnologia.

Nesse sentido, correspondia a iniciativas na Alemanha de rebatismo da Volkskunde em Etnologia Européia. Essa compreensão trazia retrocessos teóricos em diferentes sentidos, já pelo fato de restringir o campo de estudos através do critério étnico sugerido pela denominação e por sugerir implicitamente numa divisão entre o europeu e não-europeu no Brasil.

No sentido mais apropriado do termo, a nova área transportou para o Brasil uma discussão altamente problemática sob diversos aspectos e que permanentemente marca as reflexões teóricas na área, em particular de pesquisadores iniciantes, pouco informados e por demais conscientes do seu próprio significado: o de que a Etnomusicologia substituiria indiferenciadamente a antiga Musicologia Comparada.

Como então discutido, a aproximação que caracteriza muitos estudos de musicólogos comparativos é antes de natureza sistemática. Correspondentemente, muitos desses trabalhos foram considerados na área de Estruturação, ainda que esta fosse conduzida em estreita cooperação com a Etnomusicologia.

Para muitos, a introduzida Etnomusicologia podia ser compreendida em recepção a determinadas correntes norte-americanas como Antropologia da Música. Essa acepção, porém, surgia como indiferenciada e inconsistente, não sendo apropriada sobretudo para estudos dirigidos à análise de concepções antropológicas intrínsecas a representações visuais, ou seja a uma antropologia que merece realmente a designação de cultural  (e não biológica) e que apresenta antes relações um concepções de uma antropologia simbólica em antigas tradições e escritos de remotas origens, também bíblicos.

A aproximação sistemática surge como fundamental para estudos de atualizações de um sistema de concepções e imagens em diferentes contextos e que seriam objeto de estudos conduzidos a partir de conceito relacionado com etnias e com o étnico. Como nas antigas concepções antropológico-simbólicas no exemplo das escrituras, concepções do homem precedem àquelas de etnias e povos.

O programa de estudos euro-brasileiros na Europa a partir de 1974

Na Alemanha, a discussão em andamento no Brasil teve prosseguimento a partir de 1974 sob o signo de desenvolvimentos teóricos e institucionais similares e também altamente questionáveis de aproximações à Sociologia ou à Etnologia. Assim, como no Brasil, constatava-se a redenominação de áreas e institutos.

O Instituto de Volkskunde em Tübingen já se redenominara de Instituto de Ciência da Cultura Empírica, seguindo antes correntes de pensamento sociológico. O instituto de Volkskunde em Frankfurt am Main, que se redenominara nesse mesmo ano como Instituto de Antropologia Cultural e Etnologia Européia, a orientação parecia aproximar-se da discussão na área da Etnologia (Völkerkunde).

Essa tendência na Etnologia pôde ser considerada mais pormenorizadamente nos trabalhos desenvolvidos no Instituto de Völkerkunde da Universidade de Colonia, onde pôde-se constatar uma recepção acentuada da Cultural Anthropology britânica. Em seminários dirigidos pela sua diretora, a Profa. Dra. Ula Johansen, vários aspectos da Antropologia Cultural nessa corrente foram discutidos, em particular aqueles relacionados com rêdes culturais e com os cultural studies.

Também em correpondência aos desenvolvimentos no Brasil, a Etnomusicologia na Alemanha esforçava-se por orientar-se por representantes da área nos Estados Unidos na convicção de que se tratava de uma mudança paradigmática atualizadora de uma supostamente ultrapassada Musicologia Comparada. .

Com a criação do Instituto de Estudos Hinológicos e Etnomusicológicos da organização pontifícia de música sacra em Colonia/Maria Laach, em 1977, os problemas conceituais e de orientação da pesquisa se agravaram. Etnomusicólogos marcados pela convicção de representarem uma fase atual, avançada em relação àquela da antiga Musicologia Comparada, ainda que representando instituto que trazia essa denominação em Berlim, não estavam em condições de compreender o questionamento e o significado de análise de concepções do homem intrínsecas a representações transmitidas pela tradição de um repertório imagológico de visão do mundo de antigas origens.

O desconhecimento absoluto do patrimônio cultural ibérico-latinoamericano por parte de etnomusicólogos que assumiram posições influentes em Berlim levaram a uma discussão e a conflitos que se prolongaram e se acenturam nas décadas que se seguiram.

O entendimento desses sentidos antropológicos inerentes a sistemas de sinais em representações de tradições do ciclo de festas religiosas em países de formação missionária católica era porém fundamental para a consideração coerente e crítica de relações entre essas concepções na própria cultura e aquelas de escritos teológicos do passado, remontantes a séculos de interações Antiguidade/Cristianismo e intentos de fundamentação teológico-cultural da discussão eclesial da atualidade.

Essa problemática de concepções antropológicas subjacentes em expressões culturais foi tematizada em simpósios internacionais das Comissões Européias em Bruxelas entre 1983 e 1985, em encontros no Centro de Antropologia Fundamental em Royaumont em 19841985, em seminários no Istituto Pontifício di Musica Sacra e no âmbito do projeto Music in life of man do Conselho Internacional de Música/UNESCO.

A necessidade sempre vigente de superação de aproximações inadequadas teoricamente no estudo de representações do ciclo de ano festivo transplantado para o Brasil no período colonial foi discutida com folclorólogos brasileiros na Universidade do Rio de Janeiro por ocasião do Congresso de Musicologia pelos 500 anos do Descobrimento da América, dando-se início assim a um projeto de estudos com pesquisadores da Associação Brasileira de Folclore.

Sociedade de Antropologia da Música e seminário em Bonn

Para esse fim e para o tratamento de questões relativas a interações de sistemas culturais no estudo de culturas indígenas e suas transformações no âmbito de projeto iniciado em 1992 com o apoio do Ministério das Relações Exteriores da Alemanha, fundou-se, em 1993, uma sociedade internacional de Antropologia da Música, com sedes no Brasil e na Alemanha.

Essa sociedade representou uma retomada de sociedade brasileira de Etnomusicologia criada no âmbito da área de estudos na Faculdade de Música e Educação Artística do Instituto Musical de São Paulo 20 anos antes. Seguiram-se estudos e encontros músico-antropológicos em vários Estados do Brasil Central e do Amazonas. Os trabalhos então desenvolvidos, alguns deles com a participação de indígenas com cursos superiores, forneceram bases para as discussões que tiveram lugar na Universidade de Bonn em 2002/2003.

Uma particular menção dos trabalhos que se seguiram merece o seminário músico-antropológico realizado na Universidade de Bonn. A linha de desenvolvimento da pesquisa remontante ao Brasil interagiu aqui com a tradição de pesquisa de um dos professores do instituto, o musicólogo Martin Vogel. Os seus estudos, publicados na série Orpheus dedicada a questões fundamentais da música pela Sociedade de Fomento da Musicologia Sistemática, foram discutidos, apontando-se diferenças.

De ciclos de estudos sob a direção de
Antonio Alexandre Bispo


Indicação bibliográfica para citações e referências:
Bispo, A.A.  "„L‘Ethnologie va vous surprende“ - tentativas de renovação de uma área em tempos de mundialização. Ambivalências e paradoxias: o plädoyer pelo etnopluralismo dos identitaires que combatem o multiculturalismo“. Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 166/13 (2017:2). http://revista.brasil-europa.eu/166/Musee_du_quai_Branly.html


Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2017 by ISMPS e.V.
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501


Academia Brasil-Europa
Organização de Estudos de Processos Culturais em Relações Internacionais (ND 1968)
Instituto de Estudos da Cultura Musical do Espaço de Língua Portuguesa (ISMPS 1985)
reconhecido de utilidade pública na República Federal da Alemanha

Editor: Professor Dr. A.A. Bispo, Universität zu Köln
Direção gerencial: Dr. H. Hülskath, Akademisches Lehrkrankenhaus Bergisch-Gladbach
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