Restauração, Clássico e Romântico
ed. A.A.Bispo

Revista

BRASIL-EUROPA 166

Correspondência Euro-Brasileira©

 

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Notre Dame de Paris. Foto A.A.Bispo 2017. Copyright

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Notre Dame de Paris. Foto A.A.Bispo 2017. Copyright


Fotos A.A.Bispo 2017©Arquivo A.B.E.

 


N° 166/8 (2017:2)



Restauração e interações do Clássico e do Romântico em relações com o Brasil
O
Te Deum pela reentrada dos Bourbons em Paris em 1814 de Sigismund von Neukomm (1778-1858)

40 anos de conferência de Olivier Messiaen (1908-1992) na catedral de Notre Dame

 
Notre Dame de Paris. Foto A.A.Bispo 2017. Copyright

A Cathédrale Notre-Dame de Paris, um dos mais valiosos bens do patrimônio arquitetônico europeu e da história religioso-cultural do Ocidente, não deixa de ser procurada por todo o visitante da capital francesa, da qual é um dos principais edifícios emblemáticos. Sob diferentes aspectos pode Notre Dame ser considerada nos estudos culturais em relações internacionais, também naqueles que se referenciam segundo o Brasil.

Não só na História da Arquitetura e das Artes a catedral de Notre Dame tem sido alvo de considerações em universidades e de visita de estudiosos na França. Notre Dame desempenhou em diversas ocasiões nas últimas décadas relevante papel no desenvolvimento do pensamento e de iniciativas referentes à música sacra, em particular também naqueles que, desde meados da década de 70 do século XX, contaram com a participação brasileira. Marco nesse desenvolvimento das reflexões sacro-musicais, estético-teológicas e de simbólico-filosóficas de luz e som foi a conferência de Olivier Messiaen (1908-1992) no dia 4 de dezembro de 1977.

Transcorrendo 40 anos dessa histórica conferência, que marcou em diferentes sentidos o pensamento e as iniciativas dos anos que a ela seguiram, revisitou-se Notre-Dame, reconsiderando-a sob o impacto de tendências políticas e político-culturais que agitam vários países do mundo, em particular também a França.

Entre os aspectos dos desenvolvimentos atuais que exigem a atenção dos estudos voltados a processos culturais destacam-se aqueles que manifestam preocupações quanto a uma ordem cultural do Ocidente cristão que estaria em risco sobretudo devido às grandes ondas imigratórias.

Os anelos de defesa ou mesmo recuperação de estados sentidos como em perigo denotam concepções e intentos de cunho restaurativo. Reflexões quanto a paralelos históricos de épocas e desenvolvimentos marcados por movimentos de retorno ou de restauração de situações passadas foram encetadas em diferentes locais de significado histórico de Paris, entre êles na antiga abadia de Saint-Dénis.

As diferentes contextualizações permitiram que se focalizassem determinados aspectos da problemática restaurativa, cuja maior expressão histórica foi aquela da Restauração após a derrota do império napoleônico.

Apesar dos paralelos e elos comuns, as reflexões em Notre Dame diferenciam-se daquelas favorecidas pela igreja que abriga a sepultura dos reis franceses em Saint-Dénis.

Notre Dame de Paris, ainda que não demolida à época da Revolução Francesa, foi transformada em „templo da razão“ no âmbito da Revolução Francesa e teve muitas de suas representações plásticas danificadas ou destruídas. Em 1793, revolucionários destruiram o mobiliário interno e retiraram objetos de metal que foram refundidos. Por algum tempo serviu como depósito de vinho.

O seu programa simbólico, entre êles aquele da galeria de 28 vultos de reis - reis de Juda como tipos de reis franceses - indicativos da legitimidade divina do poder real - foi reconstituído em grande parte no processo de restauração da catedral no século XIX e que procurou recuperar a configuração medieval da arquitetura.

Notre Dame tornou-se um símbolo por excelência da Restauração nas suas amplas dimensões político-culturais à época do Romantismo, e na qual, sob o aspecto arquitetônico, destacou-se Eugène Viollet-le-Duc (1814-1879) a partir de 1844. Em 1858, recuperaram-se as sepulturas da câmara funerária de arcebispos.

O processo restaurativo iniciou-se com a assinatura da Concordata em 1801, quando Napoleão permitiu, em 1802, o uso litúrgico da catedral. Ali teve lugar a sua coroação. Em 1805, a igreja foi elevada a Basilica minor.

A solenidade mais relevante de Notre Dame no caminho de sua restauração e do processo restaurativo nas suas dimensões políticas deu-se com a restauração dos Bourbons em 1814 sob Luís XVIII (1755-1824), o irmão de Luís XVI (1754-1793), decapitado na Revolução, e daquele que seria o seu sucessor, Carlos X (1757-1836).

Com a deposição de Napoleão pelos aliados, a monarquia foi restaurada, ainda que na forma constitucional. No âmbito da ocupação de Paris pelos aliados, o govêrno provisório, sob Talleyrand (1754-1838), ofereceu a Luís XVIII a coroa, em 17 de abril de 1814.

Um interregno deu-se com o retorno de Napoleão em 1815, a chamada soberania dos 100 dias, quando Luís XVI foi obrigado a fugir, retornando novamente ao trono após a definitiva derrota de Napoleão. Luís XVIII não teve poder de suster atos de revanche de extremos realistas contra antigos revolucionários e protestantes.

Notre Dame de Paris. Foto A.A.Bispo 2017. Copyright

Neukomm e o Te Deum em Notre Dame pela entrada de Luís XVIII

Uma das questões que vem sendo considerada relativamente a Sigismund Neukomm nos estudos euro-brasileiro diz respeito aos caminhos que o aproximaram de Talleyrand e os contextos políticos europeus em que estes se inseriram.

Sabe-se, da literatura, que Neukomm, que veio a Paris em 1810, foi apresentado a Talleyrand pela princesa de Lothringen-Vaudémont, Louise Auguste Elisabeth Marie Colette (de Montmorency-Logny) (1763-1832), esposa de Joseph Maria Ludwig, Príncipe de Lotríngia-Vaudémont (1759-1812), com quem se casara em 1778, uma união que ficou sem descendentes. Joseph Maria remontava à casa Guise, um ramo da linha francesa do Ducado da Lotríngia.

Essa referência permite a reconstrução do contexto histórico-político que explica a amizade e o apoio devotados por Talleyrand ao compositor e o papel que exerceria Neukomm nos desenvolvimentos futuros, europeus e brasileiros. A princesa Louise Auguste era filha de Louis Ernest Gabriel, Duque de Logny, que mantinha elos de amizade com Talleyrand. A princesa de Lothringen-Vaudémont apresentou o compositor assim a um amigo de seu pai e de sua família.

O esposo da princesa, Joseph Maria, fora um dos nobres franceses que emigraram da França à época da Revolução Francesa. Diferentemente de outros emigrados, que em geral se reuniram em corpos franceses no Exterior, Joseph Maria dirigiu-se a Viena, sendo integrado na armada imperial austríaca em cargo de distinção.

Na primeira guerra de coalisão, Joseph Maria atuou nos Países Baixos austrícos e participou como oficial e comandante em várias batalhas em cidades alemãs, atingindo altos graus militares. Na segunda guerra de 1799, atuou na armada austríaca na Suábia e na Suíça. Em 1800 foi comandante de um corpo austríaco que foi derrotado pelos franceses em 1800. Na terceira guerra, de 1805, comandou uma divisão de cavalaria da armada na Batalha de Caldiero. À época da apresentação de Neukomm, já era aposentado do exército austríaco.

Através de Talleyrand, Neukomm travou conhecimento com personalidades de influência na política francesa entre 1810 e 1814. Continuando a dedicar-se à composição apesar das muitas ocupações que tinha na vida social e cultural movimentada de Paris, a sua maior obra dessa época foi o Te Deum de grandes dimensões que escreveu para a entrada de Luís XVIII e que foi executado na igreja de Notre Dame.

Essa obra não pode ser suficientemente avaliada no seu significado político-cultural. Tratava-se da obra de um austríaco, cuja criação fora possibilitada por Talleyrand e que apenas pode ser explicada pelos elos com os elos com os aristocratas franceses que tinham emigrado à época da Revolução e cujo principal nome era o do príncipe da Lotríngia-Vaudémont, falecido em 1812. A obra adquiria assim um conteúdo simbólico altamente significativo para o movimento da Restauração.

Requiem em memória de Luís XVI no Congresso de Viena e ida ao Brasil

Poucos meses após essa grande e histórica execução, seguir-se-ia outro marco de fundamental importância na vida de Neukomm e na sua inserção em processos político-culturais restaurativos. Acompanhou Talleyrand ao Congresso de Viena em Viena. Ali executou-se, no dia 2 de janeiro de 1815, o seu Requiem vocal em do menor em memória de Luís XVI, decapitado nos anos da Revolução Francesa, uma realização que teve lugar com a presença de soberanos e de homens de poder e influência de toda a Europa.

Foi à luz desse evento excepcional que os fatos que se seguiram devem ser considerados e que dizem respeito mais particularmente com o Brasil. Retornando a Paris, recebeu o convite do Duque de Luxembourg para acompanhá-lo ao Rio de Janeiro. Este dirigia-se ao Brasil como emissário extraordinário de Luís XVIII.

Na capital da Corte, teve entrada nos círculos mais influentes da aristocracia, gozando de particular apreço por parte da família real. A pedido da esposa de Pedro (I), a arquiduquesa Leopoldina, compôs uma missa solene em homenagem a seu pai, Francisco I. (A.A.Bispo, „Die Missa Solemnis sub titulo Sancti Francisci von Sigismund Ritter von Neukomm (1820)". Leichlinger Musikforum 3 (1984), 21-78.

A estadia no Brasil de Neukomm entrou na história européia sobretudo como oportunidade para a realização de estudos entomólogos, salientando-se essa outra face da personalidade e da capacidade do artista e erudito austríaco. Retornando à Europa, passou novamente a gozar do apreço e do apoio de Talleyrand. Novamente pela princesa Vaudemont foi introduzido na casa do Duque de Orleans, passando a seguir ali sempre bem visto.


(...)

De ciclos de estudos sob a direção de

Antonio Alexandre Bispo


Indicação bibliográfica para citações e referências:
Bispo, A.A.  "Restauração e interações do Clássico e do Romântico em relações com o Brasil
O Te Deum pela reentrada dos Bourbons em Paris em 1814 de Sigismund von Neukomm (1778-1858)“
. Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 166/8 (2017:2). http://revista.brasil-europa.eu/166/Notre_Dame_de_Paris.html


Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2017 by ISMPS e.V.
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501


Academia Brasil-Europa
Organização de Estudos de Processos Culturais em Relações Internacionais (ND 1968)
Instituto de Estudos da Cultura Musical do Espaço de Língua Portuguesa (ISMPS 1985)
reconhecido de utilidade pública na República Federal da Alemanha

Editor: Professor Dr. A.A. Bispo, Universität zu Köln
Direção gerencial: Dr. H. Hülskath, Akademisches Lehrkrankenhaus Bergisch-Gladbach
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