Folclore português em Malaca e Brasil

ed. A.A.Bispo

Revista

BRASIL-EUROPA 167

Correspondência Euro-Brasileira©

 

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Malaca. Fotos A.A.Bispo 2017©Arquivo A.B.E.

 


A.A.Bispo
N° 167/11 (2017:3)


Folclore português no Portuguese Settlement
e o estudo de tradições malaio-portuguesas em paralelos com o Brasil
As festas juninas (June festival) de Malaca à luz dos estudos imagológicos

Pelos 30 anos anos de encontro sobre folclore português e tradições brasileiras
na Missão Portuguesa de Colonia em cooperação com o ISMPS

 

A crise em que se encontra a Europa no presente, e que tem implicações globais, é estreitamente relacionada com imigrações. Com isso, exige particular atenção de estudos que se voltam a processos culturais.

Movimentos que revelam preocupações quanto aos riscos decorrentes para o Ocidente da vinda de migrantes de outros contextos culturais defendem posições que procuram afirmar a própria identidade nacional. Esse identitarismo procura fundamentar-se na descendência, na etnia, na história, na cultura cristã a partir de bases na Antiguidade bíblica e greco-romana, no Humanismo e no Esclarecimento, assim como nas tradições. Tornar-se minoria no próprio país é o grande temor.

Ouvem-se vozes que defendem uma retomada de concepções „povísticas“ da década de 1930, livrando-as das conotações negativas trazidas pelas suas consequências no passado.

Retomada da discussão teórica relativa a áreas da pesquisa cultural

Tem-se, assim, uma situação que diz respeito sob muitos aspectos à discussão relativa à pesquisa cultural do próprio contexto do observador, da problemática teórica do Folclore e Etnografia, da „Volkskunde“, áreas que são já há décadas alvo de esforços de renovação, terminológica, de perspectiva e métodos, justamente pelo fato de terem sido instrumentalizadas para fins político-ideológicos no passado nacionalista de regimes autoritários.

Uma das preocupações de pesquisadores empenhados na condução de estudos sob critérios científicos foi, já na década de 1960, a da distinção entre fatos culturais transmitidos pela tradição ou desenvolvimentos de forma „espontânea“, não dirigida, e aqueles do „folclore aplicado“, ou seja, aquele resultante do emprêgo „dirigido“ de expressões tradicionais no ensino escolar, pela Igreja, pela mídia, para fins de representação, propaganda, turismo, criações artísticas, shows ou outros.

Para o pesquisador, colocava-se já nos anos de 1960 a questão de distinção, o de reconhecer o que era ou o que não era resultado de ações dirigidas. Esse discernimento, porém, exigia do pesquisador conhecimentos de intentos, iniciativas, métodos e objetivos no uso de expressões tradicionais no passado e no presente que levaram e levam a representações de cunho folclórico ou folclorístico.

Os problemas que aqui surgiam foram um dos fatores do questionamento de orientações segundo esferas categorizadas da cultura e do reconhecimento da necessidade de uma focalização e análises de processos. Intentos neste sentido levaram em 1968 à fundação da organização que desde então tem atuado em diferentes contextos e países, promovido encontros, simpósios e ciclos de estudos.

O emprêgo de elementos de danças, música, trajes e outros elementos de tradições populares não representou apenas um procedimento instrumentalizador de cunho ideológico fomentado por regimes autoritários do século XX, de direita ou de esquerda.

Já no século XIX, no contexto de transformações sociais e culturais causadas entre outros fatores pelo desenvolvimento de cidades, de meios de transporte e de secularização, surgiram em diferentes países e regiões intuitos de recuperação de antigas expressões tradicionais e que levaram à criação de grupos de trajes regionais, de danças e de música.

Esses grupos - que significativamente dão particular atenção a trajes - passaram a ser característicos de países e regiões, passando a desempenhar importante função identificatória e de representação nas colonias de imigrantes europeus que se dirigiram a regiões extra-européias.

O emprêgo de elementos de tradições a serviço de determinados fins, porém, é ainda mais antigo, pois representou um procedimento de missionários, em particular de jesuítas nos séculos XVI e XVII. O pesquisador necessita, assim, na observação de expressões culturais, poder discernir resultados desses e de outros procedimentos empregados no passado, considerando as suas interações.

Prosseguimento de reflexões brasileiras entre imigrantes na Europa

Uma das preocupações que desde 1974 marcaram os estudos de processos culturais desencadeados pelos portugueses à época das Descobertas disse respeito à transmissão às regiões extra-européias de expressões tradicionais que continuaram a ser praticadas por marujos, soldados e colonos e ofereceram, posteriormente, elementos que foram utilizados pelos jesuítas na ação missionária.

As atenções dirigiram-se a antigos processos de reinterpretação de expressões culturais, de representações simbólicas, da linguagem de imagens e de sentidos remontantes ao processo de cristianização da Antiguidade tardia e início da Idade Média.

Os estudos passaram a ser voltados ao reconhecimento e reconstrução de um sistema de visão do mundo e do homem de remotas origens e que, em si, possui características estruturais e mecanismos que possibilitam atualizações em diferentes contextos. A pesquisa de processos culturais, para além de ser baseada como até então sobretudo em procedimentos empíricos e históricos, passou a ter características sistemáticas.

Folclore nas Missões Católicas Portuguesas da Imigração

Malaca, Foto A.A.Bispo 2017. Copyright
No decorrer das reflexões e estudos euro-brasileiros realizou-se, entre outros eventos, um simpósio que, em 1989, reuniu pesquisadores brasileiros e portugueses em Colonia, centro de uma grande comunidade de imigrantes portugueses na Alemanha e sede de uma Missão Católica Portuguesa, então dirigida pelo Pe. Dr. Armindo Borges, vice-presidente do ISMPS (Veja). 
Tendo já nos Açores há décadas defendido o significado de expressões lúdicas da tradição católica na ação comunitária, (Veja) A. Borges organizava grandes festivais de folclore em estádios, reunindo extraordinário número de imigrantes e grupos de trajes e danças regionais portuguesas da Alemanha, dos Países Baixos, do Luxemburgo e da França.

O confronto entre as formas de festejos, folguedos, danças e cortejos considerados pelos pesquisadores brasileiros e as apresentações dos ranchos e grupos de trajes e danças regionais portuguesas trouxe à consciência diferenças e paradoxias.

Os imigrantes portugueses não conheciam expressões lúdicas, cortejos e danças dramáticas registradas e estudadas Brasil, remontantes a práticas documentadas na Europa da Idade Média, e por sua vez os brasileiros reconheciam nas apresentações de grupos portugueses apenas expressões conhecidas de portugueses da imigração mais recente, de fins do século XIX e primeiras décadas do XX, em particular de festas de „colonias“ existentes nas grandes cidades.

O Brasil possuia assim um patrimônio cultural inserido em muito mais antiga tradição e de fundamentos mais profundos, capaz de sensibilizar os portugueses na imigração na percepção de processos em que estavam integrados e que eram caracterizados pelo uso e refuncionalização de elementos de expressões tradicionais, destacados de contextos originais.

Esse uso estava, no caso, a evidente serviço a fins comunitários, de agregação e coesão de imigrantes dispersos pela Europa, de manutenção de sentimentos com a terra de origem, facilitando assim a sua assistência pela Missão Portuguesa. Era uma folclorização que vinha de encontro a  anelos de diferenciação no processo de integração de estrangeiros e que leva, em geral, a atitudes conservadoras e tradicionalistas: no Exterior, os estrangeiros tornam-se em geral mais patrióticos do que na terra natal, mais „papistas do que o Papa“.

Ciclo de estudos do ISMPS em Macau e Hong Kong em 1996/97

No estudo de processos culturais das comunidades da imigração portuguesa e brasileira no âmbito do ISMPS nas diferentes regiões do globo, essa problemática foi também discutida em 1996/1997 no Instituto Inter-Universitário da Diocese de Macau por motivo da passagem do território (assim como o de Hong Kong) à China.

Nessa época de transição, quando já muitos portugueses tinham abandonado os antigos territórios, impunha-se obter uma visão geral do patrimônio cultural e das expressões tradicionais ainda ou até há pouco cultivadas. Nesse contexto, o bispo de Macau salientou o papel das missões portuguesas, responsáveis pelo fomento de expressões culturais a serviço de comunidades e de conservação de sentimentos de identidade portuguesa mesmo em contextos já não mais oficialmente sob a égide de Portugal.

Após 20 anos: retomada de reflexões no Portuguese Settlement de Malaca


O contexto mais significativo para esses estudos e reflexões é o dos malaio-portugueses do Portuguese Settlement de Malaca. Aqui tem-se um assentamento criado nos anos de 1930 pela Missão Portuguesa e que agregou pescadores remotamente descendentes de portugueses dispersos pelo litoral.

Os resultados dos processos desencadeados são surpreendentes na sua intensidade e características, singulares a ponto de causar estranheza. A celebração de Portugal e o ufanismo patriótico de moradores que apenas muito remotamente possuem raízes portuguesas e nunca estiveram em Portugal é manifestado e fomentado por grupos com trajes regionais portugueses, com danças folclóricas e apresentações de cantores acompanhados por guitarras.

A essas expressões somam-se imagens vistas como emblemáticas para a cultura portuguesa, tais como caravelas, armas nacionais ou a figura da sereia.

As referências aos séculos da conquista e da governança portuguesa em Malaca estabelecem complexas relações com as representações de trajes, de danças e música, fazendo-as que estas, por assim dizer a-históricas, „essencialmente portuguesas“, sejam inconscientemente projetadas no século XVI ou início do XVII.

O pesquisador que conhece folguedos, danças e cortejos tradicionais documentadamente remontantes à Idade Média e introduzidos no Brasil, reconhece que essas expressões lúdicas do Portuguese Settlement são resultados de iniciativas posteriores, seja do século XIX, seja do XX. Devem ser consideradas a serviço dos intuitos da Missão Portuguesa e correspondentes a concepções político-culturais dos anos de 1930, modificadas mas mantidas sob as novas orientações pastorais pós-conciliares.


Folclorismo e tradições de remotas origens em processos culturais

A primeira questão que se coloca ao pesquisador é a da existência ou não de tradições culturais entre os malaio-portugueses que de fato remontam a épocas anteriores da ação de agregação comunitária e de ensino do século XX.

A música tem desempenhado nesse sentido um papel importante e que abre perspectivas para estudos mais amplos.

Graciete Nogueira Batalha recolheu canções dos habitantes, salientando a intensidade do canto infantil. Registra ter ouvido de uma criança de 10 anos a expressão de que se tratavam de cantigas de senhoras velhas. As crianças cantavam „com desembaraço e notável afinação, repetindo as vezes necessárias para que pudesse anotar a pronúncia. (Malaca - o Chão de Padre e seus moradores ‚portugueses‘, 2a. ed., Macau: Imprensa Oficial, 1986,17)

Os moradores do assentamento, em particular os jovens, tinham até recente passado renome como cantadores que se acompanhavam com viola. A pesquisadora, que já constatara essa antiga tradição de violeiros cantadores anteriormente,.salientou que essa prática estava desaparecendo, também devido a emigração de membros de famílias de músicos, entre elas a dos irmãos Santa Maria. A pesquisa dessa antiga tradição precisaria ter continuidade em locais para onde emigraram, em particular em círculos malaio-portugueses na Austrália.

Procurando levantar canções transmitidas pela tradição oral no Settlement, a pesquisadora distinguiu entre canções antigas, cujas origens são em geral desconhecidas e músicas folclóricas portuguesas conhecidas da atualidade, ainda que com versos em „papiá cristão“.

Muitas dessas canções já tinham ultrapassado os limites do Settlement, podendo ser ouvidas em bares da cidade, mesmo em contexto não-cristão. Entre as mais antigas, a mais difundida era Gingli nona, também conhecida em Macau, e que pareceria ser originária do Ceilão/Sri Lanka). Entre as segundas, encontrava-se Passarinho berdi, cantada com música de conhecido Bailinho da Madeira, uma canção também difundida no Brasil

As festas de Santa Cruz ou festas de Maio em Malaca e no Brasil

Para estudos de expressões culturais do arquipélago malaio em paralelos com aquelas conhecidas do Brasil, a consideração do ciclo do ano festivo religioso oferece-se como fundamental ponto de partida.

Sabe-se, de documentos do passado português na Índia, que grupos de folguedos e danças, em particular daqueles representativos de combates até hoje existentes no Brasil participavam de cortejos e procissões.

Os estreitos elos com Goa permitem supor que também em Malaca essas expressões do populário medieval tenham sido cultivadas, sobretudo pela importância ali dada às solenidades religiosas, como testemunhadas pelo bispo de Macau D. João Paulino d‘Azevedo e Castro (1852-1918) (Os Bens das Missões Portuguezas na China, 2a. ed.Macau, 1995: Fundação Macau, 154). (Veja) Essa  expressões de regozijo e que demonstravam a auto-consciência dos católicos, teriam sido enfraquecidas sob os holandeses, porém recuperadas sob a administração inglesa.

O mesmo prelado menciona a intensidade da veneração à Santa Cruz entre os malaio-portugueses. A aldeia e capela de Santa Cruz, próxima de Hilir e, portanto, na região onde nasceria o Settlement, estava situada fora da cidade, em meio da mata.

„(...) é centro de muita devoção aonde convergem os christãos não só de Malaca, mas d‘outros paizes ao redor, e até os gentios, especialmente por occasião ds festas de Santa Cruz.“. (op. cit. 154)

Assim como no Brasil, portanto, onde as festas de Santa Cruz apresentam evidências da ação missionária junto a indígenas, como salientado no I Simpósio Internacional „Música Sacra e Cultura Brasileira“, em 1981 (Veja), as festas de Santa Cruz ou festas de Maio em Malaca eram aquelas que tinham maior concorrência de „gentios“.

Essa festa, tendo como motivo o achamento da cruz por Santa Helena celebrado no dia 3 de maio, transportou para as regiões extra-européias as festividades do mês de maio ou da primavera européia.

Nas palavras de D. João Paulino d‘Azevedo e Castro, essa festa, que seria muito popular entre os cristãos do Oriente, explicar-se-ia pela veneração da cruz, sinal sempre levantado pelos portugueses a estabelecer-se em país distante, um marco da conquista espiritual, assim como os padrões o eram para da conquista temporal.

„Para quem chega da Europa é grato encontrar a cada passo o augusto Symbolo da Redempção, erguido em sitio onde attrahe as vistas dos transeuntes e convida as almas a pensar no que elle representa. Essas cruzes são outros tantos padrões que recordam as conquistas da fé realizadas pelos nossos missionarios, como as fortalezas desmanteladas e em ruinas, aqui e alem, ainda hoje attestam as heroicas façanhas dos nossos esforçados conquistadores!“ (ibidem)

O entrudo/carnaval em Malaca e o antigo entrudo no Brasil

Entre as principais datas festivas do ano que possibilitam estudos comparativos de expressões tradicionais e suas transformações em Malaca e no Brasil encontram-se aquelas das principais datas do calendário catóilico, ou seja, o Natal, a Semana Santa e a Páscoa.

Há indícios de adaptações de práticas cristãs de origem ocidental ao meio. Assim, o antigo costume de crianças percorrerem as casas cantando e pedindo dádivas nos dias que antecedem a festa de 6 de janeiro - e em recorrência simbólica aos magos do Oriente - parece ter sido adaptado ao Ano Novo Chinês no assim-chmado Serani Teng Teng. Cedo pela manhã, crianças malaio-portuguesas do assentamento formam grupos de duas ou três e, com triângulo, berimbau ou tamborim procuram casas chinesas dos bairros vizinhos de Ujong Pasir e Tanquerah durante o Ano Novo Chinês, coletando ofertas.

O carnaval, porém, indica a sobrevivência maior de práticas que já pertencem ao passado no Brasil. Chamado ainda de intrudu e assim em antiga tradição conhecida em Portugal e no Brasil como entrudo, caracteriza-se por molhações com água de folgazões e transeuntes, prática similar àquelas brasileiras do passado e que foram objeto de críticas no século XIX.

As festas juninas em Malaca em paralelos com as do Brasil

As principais festas populares dos malaio-portugueses são as festas juninas de Santo Antonio, São João e São Pedro e, em particular, no Portuguese Settlement, dessas duas últimas.

O culto a Santo Antonio, o santo português, foi, como na Índia (Veja), compreensivelmente também intenso no arquipélago malaio. A difusão do culto explica-se sobretudo pelo fato de ser considerado como santo „militar“ e, assim, venerado em cidades marcadas pela presença de soldados e oficiais.

Nos primeiros anos de Singapura, com a vinda de cristãos de Malaca e desenvolvimento da comunidade local, Santo Antonio foi o santo escolhido para a designação de colégio no qual se formaram gerações. Em 1886, a escola que se chamava de St. Anna School em Singapura, criada em 1879, passou a chamar-se de St. Anthony‘s School. Dela originou-se, em 1893, a St. Anthony‘s Boys School e a St. Anthony‘s Girls School  Muitas práticas relacionadas com a veneração de Santo Antonio foram introduzidas no arquipélago, entre elas as do Pão dos Pobres de Santo Antonio, podendo-se estudar o significado da caridade aos pobres na região com as concepções relacionadas com o amor do culto ao santo português.

A importância da festa de São Pedro entre os malaio-portugueses de Malaca explica-se sobretudo pelo fato de serem estes sobretudo pescadores. A igreja matriz de São Pedro, a principal de Malaca, foi de antiga construção, restaurada em 1819. Com grande área fronteiriça, ali foram instalados os missionários. A sua reforma e embelezamento foi um dos grandes esforços do clero. Compreende-se, assim, que a festa de São Pedro seja intensamente festejada até hoje no Portuguese Settlement, quando então se realiza a benção dos barcos dos pescadores.

Nenhuma dessas festas supera porém em importância e afluência à de São João (Festa Senjuang), até hoje a principal do Portuguese Settlement. Significativamente, este foi designado, quando de sua instalação, St. John‘s village.

A vila de São João, como o seu nome indica, tornou-se conhecida pelas festas juninas, ponto alto da vida cultural da comunidade. Essas festas, designadas hoje como June festival, passaram a caracterizar a comunidade, tornando-se também uma atração de Malaca, concentrando grande número e visitantes devido às apresentações de música e dança portuguesa e outras tradições rurais e marítimas.

É nesse período de festas de noites juninas, em particular em fins de semana, que a cultura musical e as tradições de danças portuguesas se encontram mais vivas,

As danças regionais portuguesas, porém, ranchos, trajes típicos e determinados gêneros musicais, se revelam a ação de missionários e concepções político-culturais de etnografia e do folclore da época da fundação do assentamento, se não podem ser consideradas como sobrevivências culturais do século XVI e início do XVII, revelam fundamentais concepções do edifício cultural.

A linguagem visual dessas expressões festivas pode ser estudada mais aprofundadamente em recorrência a conhecimentos adquiridos nas últimas décadas relativos ao edifício cultural de antiga proveniência e que, cristianizado, atravessou os séculos na linguagem visual de práticas festivas católicas.

Como analisado em diferentes contextos e sob diversos aspectos, esse sistema é imbuído de concepções antropológicas intrínsecas, estreitamente relacionadas com a música, e possui mecanismos que permitem atualizações em diferentes situações de tempo e espaço.

Em encontros com teólogos foram em diferentes ocasiões consideradas as possibilidades de entendimento de sentidos dessas concepções. Muito genericamente, pode-se dizer que elas partiram da concepção de João Batista como o Precursor, como o maior homem da antiga Humanidade, a humanidade carnal, o que torna compreensível as referências ao homem que trabalha na terra, ao rural, ao campôneo e ao provinciano expressas nos ranchos com as suas representações do homem do campo e do trabalho.

Tratando-se porém de uma visão cristã, a partir do homem espiritual, a representação é distanciada, bem humorada e lúdica.

As imagens de uma cultura regional campônea portuguesa correspondem, na tradição brasileira, àquelas dos caipiras das festas de São João. Singular é, porém, que justamente essas representações surjam como emblemáticas de Portugal e inspiradoras de sentimentos fervorosos de patriotismo aos malaio-portugueses.

Fundamental, porém, é o estudo das bases filosófico-naturais de antiga proveniência desse edifício de imagens transplantado tanto para o arquipélago malaio como para o Brasil. Como os estudos que vem sendo desenvolvidos no âmbito dos trabalhos euro-brasileiros, tanto São João como São Pedro relacionam-se com o elemento fogo em diferentes elos com os meses do ano ou signos do Zodíaco, enquanto Santo Antonio com o ar/água. O estudo de processos sob o aspecto sistemático refere-se assim à dinâmica dos elementos no decorrer do ano do hemisfério norte na situação do mês de junho, época relacionada com o elemento ar de fim de primavera, que na sua transparência permite a passagem da luz.

De ciclo de estudos da A.B.E. sob
a direção de

Antonio Alexandre Bispo


Indicação bibliográfica para citações e referências:
Bispo, A.A. .“ Folclore português no Portuguese Settlement e o estudo de tradições malaio-portuguesas em paralelos com o Brasil.As festas juninas (June festival) de Malaca à luz dos estudos imagológicos.
Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 167/11(2017:3). http://revista.brasil-europa.eu/167/Folclore_portugues_em_Malaca.html


Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira

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ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501


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