De Macau a Timor-Leste: Canossianas
ed. A.A.Bispo

Revista

BRASIL-EUROPA 168

Correspondência Euro-Brasileira©

 

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Macau. Foto A.A.Bispo 1996. Copyright

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Macau 1996. Fotos A.A.Bispo ©Arquivo A.B.E.

 


Macau. Foto A.A.Bispo 1996. Copyright
N° 168/12 (2017:4)


De Macau a Timor-Leste: caminhos da Restauração no século XIX
o açoriano D. Manuel Bernardo de Souza Ennes (1814-1887), bispo do Pará e de Macau
e as Canossianas - a educação feminina compreendida como fator civilizatório

20 anos das preparatórias do simpósio internacional „Ocidente e Extremo Oriente: Cultur Musical e Espírito“ pela passagem de Macau à China
em sequência a encontro euro-brasileiro na Diocese de Macau, Instituto Inter-Universitário (Universidade de S. José)

 

Transcorridos 20 anos de encontro euro-brasileiro promovido pelo Institut für Studien der Musikkultur des portugiesischen Sprachraumes (ISMPS) na Diocese de Macau, cumpre lembrar alguns aspectos dos trabalhos que, em 1997, prepararam um simpósio internacional pela passagem de Macau à China em Portugal e que foi dedicado ao tema „Ocidente e Extremo Oriente: Cultura Musical e Espírito“.

Com base nos estudos de fontes e nos colóquios realizados no ano anterior em Macau, considerou-se, entre outros aspectos, o papel desempenhado por esse território português na China em processos da expansão do Cristianismo ocidental no Oriente nas suas diferentes fases e em relação a desenvolvimentos político-religiosos e eclesiásticos da Europa e  da Igreja em geral.

Essas reflexões deram continuidade àquelas que já há muito eram encetadas no âmbito dos estudos euro-brasileiros do Padroado Português do Oriente. (Veja)

Se esse papel de centro religioso e irradiador já tinha sido considerado sob diversos aspectos quanto aos primeiros séculos da história missionária após a chegada dos portugueses no Oriente no século XVI, insuficiente tinha sido até então a consideração do significado de Macau como centro do movimento de restauração litúrgico-musical do século XIX e seus desenvolvimentos no século XX.

Instituições e personalidades da vida religiosa e musical de Macau indicavam que essa tradição de pensamento e da prática que marcara as décadas pré-conciliares - norteadas sobretudo pelo Motu Proprio de 1903 - continuava viva sob diferentes aspectos, manifestando o seu enraizamento e a intensidade com que os ideais da reforma litúrgico-musical tinham sido ali implantados no passado.

A própria consideração de obras de personalidades da vida musical local não poderia deixar de atentar a essa permanência conservadora de ideais, normas e práticas de um processo que, considerando-se renovador no século do Histórismo, foi fundamentalmente de cunho restaurativo. Macau assume assim uma posição relevante nos estudos do movimento restaurador e suas consequências em âmbito mundial e que foi de grande significado também para o Brasil. Representa um dos grandes e problemáticos complexos no estudo de processos culturais em diversos países e suas interações.

Não só no longínquo passado dos primeiros séculos da história missionária, mas também no século XIX e XX foi Macau centro irradiador de correntes de pensamento, de repertórios e origem de desenvolvimentos nessa esfera do globo.

Realizando-se em 2017 estudos referentes ao arquipélago malaio, faz-se oportuno recapitular esse papel desempenhado por Macau relativamente a Timor-Leste, uma vez que se revela como relevante na análise de processos culturais em relações globais. A focalização dessas relações Macau-Timor contribuem também ao aprofundamento de estudos desenvolvidos neste mesmo ano em Malaca e Singapura. (Veja) O colégio das Canossianas no „bairro português“ de Malaca (Portuguese Settlement), trouxe à luz o significado da ação dessas religiosas em processos sociais, educativos e religioso-culturais no passado e no presente nessa esfera do globo. (Veja)

O contexto de origem dessa ordem em Verona na época crítica de guerras francesas no norte da Itália, ainda sob a égide da Áustria surge como ponto de partida para a compreensão de seus objetivos e de suas características próprias e, assim, dos princípios que guiaram a sua atuação em regiões extra-européias. (Veja)

Estes estudos podem ter continuidade, ser aprofundados e ampliados com a consideração das ilha de Sonda, em particular em Timor no século XIX, onde as Canossianas também desempenharam um papel decisivo na fase considerada como moderna da cristianização da região no século XIX.

Os desenvolvimentos restaurativos em Timor - promovidos a partir de Macau - podem contribuir a compreender decorrências brasileiras na mesma época dentro de contextos mais amplos.

Timor-Leste como remanescente da antiga esfera territorial de Malaca

A parte da ilha de Timor sob a administração portuguesa era a única da área do antigo bispado de Malaca ainda territorialmente existente naquele século, uma vez que no arquipélago malaio restavam apenas relitos, igrejas e comunidades marginalizadas de descendentes de portugueses dos séculos XVI e parte do XVII.

Se em Malaca e Singapura o poder do Padroado Português era apenas espiritual, no Timor valia para um território remanescente do antigo passado de soberania de Malaca na região.

Por acordo entre a Santa Sé e Portugal de 1874, essa parte portuguesa de Timor, no passado subordinada a Goa, foi incorporada à Diocese de Macau. Essa transferência, em geral apenas registrada como uma mudança administrativa, teve dimensões mais amplas e profundas, porém ainda insuficientemente estudadas.

Alguns anos mais tarde, em 1886, também as comunidades de descendentes de portugueses em Malaca e Singapura foram incorporadas a Macau. Ali, porém, tratando-se de regiões sob o domínio de outras nações, a jurisdição do bispo de Macau era apenas pessoal.

Essa situação torna compreensível a intensidade dos esforços restaurativos despendidos pela Diocese de Macau no Timor português e a primazia que deve ser concedida aos desenvolvimentos na ilha também nos estudos referentes a Malaca e Singapura.

Açores e Brasil no processo restaurativo de Timor a partir de Macau

A passagem de Timor à jurisdição de Macau deu-se concomitantemente com a nomeação do açoriano D. Manuel Bernardo de Souza Ennes (1814-1887) a bispo de Macau.

Esse prelado trazia ampla experiência adquirida no Brasil, para onde fora transferido em 1840 e onde atuara como bispo do Pará até 1845. Viveu e atuou assim numa província que iria desempenhar nas décadas seguintes um papel decisivo no movimento restaurativo no Brasil e que, por fim, levaria à crise político-religiosa entre a Igreja e o Império, este compreendido pelo Episcopado como impregnado de ideais da época do Esclarecimento.

Retornando a Portugal em 1849, D. Souza Ennes, com a experiência trazida do Brasil, realizou estudos e doutorou-se na Universidade de Coimbra em 1857, tornando-se lente em 1861. Nomeado a bispo de Macau, ali iria dar continuidade a suas atividades docentes como professor do Seminário de São José.

Com esse erudito, a história da ação de homens de alta formação teológica do Ocidente no Sudeste da Ásia entrou numa nova fase. Nos primeiros séculos, sob a ação dominicana, religiosos letrados e professores universitários deslocaram-se para a região e ali atuaram. Na tradição da ordem dos pregadores de S. Domingos, à qual pertenceram grandes vultos da história do pensamento medieval, procurou-se fomentar a cristianização de ilhas como Timor de forma fundamentada teologicamente.

Essa procura de fundamentação de procedimentos manteve-se na fase restaurativa da cultura cristã na ilha do século XIX, inserindo-se, porém, no novo contexto político-cultural e eclesiástico, assim como nas correntes do pensamento de sua época.

Compreende-se, assim, que os ideais e anelos teológicos e eclesiásticos tenham sido estreitamente relacionadas com concepções de progresso civilizatório, de desenvolvimento e avanço, tão próprias do século da evolução, o que explica também o pêso dado ao ensino e à formação. Anelos restaurativos interagiram assim de forma aparentemente paradoxal com concepções de desenvolvimento, ordem e progresso nos seus diferentes aspectos.

Dom Souza Ennes traz à consciência o singular significado dos Açores nos desenvolvimentos culturais e educativos do século XIX tanto no Brasil como no Oriente. A êle se seguirm outros açorianos de alta formação que atuaram em Macau e nas regiões de sua influência.

Tem-se, no Oriente, um desenvolvimento paralelo ao significado dos Açores para a história da Educação e do ensino musical em Portugal e no Brasil, bastando lembrar de Antonio Feliciano de Castilho (1800-1875) e do papel das tradições populares. em particular do culto ao Espírito Santo no fomento da vida cultural comunitária, também nas escolas brasileiras. (Veja) Concepções teológicas relacionadas com o Espírito Santo, em especial aquelas relacionadas com o amor caritativo, parecem ter sido assim determinantes de um espírito que levou a uma concentração de esforços à assistência de desamparados, de desabrigados, doentes, marginalizados e crianças órfãs.

Levantamento da situação em Timor pelo reitor do Seminário de Macau

Nos anos que precederam à chegada de D. Souza Ennes como bispo de Macau, o processo restaurativo foi sobretudo levado à frente pelo deão a Sé, Pe. Manuel Lourenço de Gouveia, que desempenhava a função de governador do Bispado.

O primeiro passo foi o do levantamento da situação em que se encontrava Timor português. Para isso, esse então responsável pela Diocese enviou como visitador o próprio reitor do Seminário, P. Antonio Joaquim de Medeiros (1846-1884), um sacerdote-professor que seria posteriormente bispo de Macau e personalidade de relêvo na história de Timor, Singapura e Malaca.

Todo o processo de reconstrução religiosa de Timor partido de Macau teve assim um cunho de erudição teológica, nele estando envolvidos professores de orientação conservadora e restaurativa, associadas porém com anelos compreendidos como de progresso civilizacional proprios da época.

É compreensível, assim, que autoridades e missionários tenham.se indignado com a situação que constataram em Timor, nela vendo desordens, decadência de usos e costumes, imoralidades, falta de asseio, desleixo e outros sinais de degenerência.

As capelas e igrejas pareciam por demais rústicas e indignas, o que explica os extraordinários esforços despendidos para a construção de igrejas sólidas, bem mobiliadas e ornamentadas, adequadas à dignidade e ao esplendor do culto.

Ruínas do passado missionário e tradições religiosas populares

Nesse estado visto como decadente à época da passagem de Timor à Diocese de Macau, em 1876, as autoridades eclesiásticas constataram vestígios que davam testemunho das intensas atividades desenvolvidas pelos Dominicanos no passado, da época na qual Timor esteve sujeito à administração eclesial de Goa.

Sepulturas de antigos missionários dispersas por terras de cultivo abandonadas e restos ou ruínas de construções eram apenas os testemunhos materiais desse passado que tinha sido encerrado em 1834 com a extinção das ordens em Portugal e nas colonias.

Os principais testemunhos eram aqueles imateriais que comprovavam que o povo da ilha, sem guias religiosos há pelo menos 40 anos, ainda mantinha altares preparados em capelas rústicas, realizando atos religiosos e celebrando festas.

Essa cultura religiosa de antigas raízes manifestava-se sobretudo na devoção a Nossa Senhora do Rosário, tão fomentada pela Ordem dos Pregadores de S. Domingos. Assim como na Europa, em outras regiões da Ásia, na África e no Brasil, essa devoção mariana, que servia à promoção da interiorização e à contemplação de recém-cristianizados organizados em confrarias, tinha como uma de suas principais características o terço rezado e o canto das ladaínhas.

Para além da força do culto mariano na ilha nas suas características dominicanas, a maior expressão da cultura cristã da ilha eram as cerimônias de Semana Santa, celebradas com a maior solenidade possível pelo povo, ainda que sem sacerdotes.

Entendidos hoje sob outros critérios os fatos que indignaram as autoridades eclesiásticas dessa segunda metade do século XIX, pode-se constatar que havia na ilha expressões de uma religiosidade popular que se tinha desenvolvido de forma não-dirigida através de décadas.

Esse desenvolvimento adquire relevância especial para os estudos culturais segundo tendências atuais de interesses e questionamentos relativos a processos culturais não-dirigidos ou „espontâneos“. Expressões e práticas constatadas pelos críticos da situação em Timor lembram aqueles conhecidos do Brasil.

„Havia também christãos, mas abandonados inteiramente aos costumes barbaros e gentilicos, não se notando differença alguma entre o viver d‘elles e o dos pagãos. Em fim, havia altares, mas inquinados por mil paixões abjectas; havia christãos mas paganisados; havia lugares destinados ao culto, mas profanados“. (D. Paulino de d‘Azevedo Castro, Os Bens das Missões Portuguesas na China, 2a. ed. fac-simile, Macau: Fundação Macau 1995,164)

Re-cristianização entendida como ação civilizatória

Essas constatações levaram aos religiosos à convicção de que seria necessário começar de novo a cristianização, fundando novas missões com missionários europeus considerados como modelares em costumes e modos de vida e em condições de sustentar escolas para a educação.

O intento foi assim fundamentalmente educativo, pois via-se nas escolas „os elementos mais poderosos e apropriados a garantir uma verdadeira e solida civilização.“ (loc.cit.)

Neste sentido, os missionários indígenas que ali atuavam foram transferidos para Goa e a tarefa entregue a europeus. Se no passado mais distante tanto se tinha feito esforços para a criação de um clero nativo em várias partes do globo, agora, à época do movimento restaurativo, procurava-se combater desenvolvimentos sentidos como decadentes atráves  da ação de missionários europeus. Tratou-se, assim, sob esse aspecto, de um movimento de natureza europeizante ou re-europeizadora.

O bispo D. Sousa Ennes trouxe consigo para Macau em 1876 cinco missionários formados do Real Colégio das Missões Ultramarinas para esse fim, somando-se com aqueles que tinham vindo de Macau.

A missão iniciou-se com sete missionários europeus, entre êles um chinês e um timorense sob a direção do reitor do Seminário de S. José de Macau. Em primeiro lugar, deu-se atenção à dignificação das igrejas e do culto, comprando-se imagens, quadros, paramentos, lustres e outros objetos. Adquiriu-se uma residência missionária e os religiosos foram distribuídos pelos pontos mais importantes da ilha e pelos arrabaldes de Dili. O religioso chinês ficou encarregado em catequisar os chineses e ensiná-los, o timorense tornou-se missionário ambulante. Entre as instruções que deviam seguir encontravam-se as de estudar a língua do país e dar aulas de instrução primária. Deviam enviar de três em três meses um relatório de suas atividades e de seus sucessos ao Vigário Geral.

A seguir, abriram-se colégios na capital onde, ao lado do ensino primário, passou-se a dar instrução literária, dando-se atenção à formação do caráter e à promoção da familia segundo as normas católicas.

Via-se como uma as principais causas da degradação e das desordens sociais o casamento a modo gentílico entre cristãos, assim como uniões não lícitas, sobretudo entre os régulos e suas famílias.

Para esse fim moralizador, abriram-se em 1879 dois colégios, um para a educação masculina, sob a direção dos missionários, outro para a feminina, entregue às Irmãs de Santa Magalena de Canossa, que então já estavam estabelecidas em Macau.

Canossianas: de Hongkong a Macau, de Macau a Timor

Essas religiosas tinham-se estabelecido em Hongkont em 1860 e, em 1863, em Macau. Ali atuaram na Santa Casa de Misericórdia no amparo a recém-nascidos abandonados e meninas enjeitadas, até conseguirem sustento próprio. Foram apoiadas financeiramente através de coletas. O já mencionado Pe. Medeiros recomendou-as ao bispo D. Sousa Ennes. Em 1885, esse bispo possibilitou-lhes uma casa para a Obra da Santa Infância. O estabelecimento, ao qual eram primeiramente admitidas apenas órfãs, posteriormente também filhas de famílias tanto portuguesas quanto chinesas, tornou-se um centro de educação feminina de Macau. De Macau, as Canossianas partiram para Timor, em 1878, para Singapura em 1894, para Taipa em 1895 e, a seguir, a Malaca. (Beatriz Basto da Silva, Cronologia da História de Macau III, 1860 IV-2, Macau: Direcção dos Serviços de Educação e Juventude 1995, pág. 184)

Para Timor, conseguiu-se que uma das religiosas fosse nomeada professora oficial, alcançando-se que o govêrno assumisse em parte os gastos de transportes.

Nos colégios, admitiram-se sobretudo filhos de famílias de régulos e outros líderes, retomando-se o antigo procedimento de cristianização do „alto para baixo“. As classes dirigentes tornar-se-iam modêlos e agentes de processos transformatórios da vida da comunidade.

Na festa de 15 de agosto de 1879, correspondendo ao grande significado do culto mariano no Timor português, inaugurou-se a igreja matriz de Dili, dando-se particular atenção à sua mobília e ornamentação, assim como ao esplendor do culto ali celebrado. Esse desenvolvimento foi apoiado pela Diocese e com recursos dos „Bens das Missões Portuguesass na China“, assim como com sacerdotes de Macau, de Goa ou vindos diretamente da metrópole.

O Instituto Canossiano de Macau enviava religiosas para substituir aquelas que faleciam, e o govêrno local auxiliava os missionários na construção de igrejas, casas e escolas, além de facilitar as comunicações. Portugal auxiliava com honorários e cobrindo viagens de ida e regresso.

O papel da música na educação feminina e no processo restaurativo

As Canossianas passaram a ampliar a sua área de ação, abrindo escolas em bairros mais afastados. Entre elas, salientou-se a de Manatuto, uma escola que chegou a ter mais de 180 alunas. Nela, a música desempenhou papel significativo.

„Quando por alli passámos em 1905 ficámos deveras maravilhado ao vêr a igreja, que não é pequena, repleta de fieis, apresentando-se todos com a gravidade, o respeito e devoção proprios de gente civilizada, as mulheres vestindo com a decencia e compostura que tão bem quadram á mulher christã (...)“ „...as raparigas...cantando com lindas e bem educadas vozes, bellos canticos appropriados ao lugar e aos mysterios que se celebravam!“ (op.cit. 170).

O papel do canto na formação feminina promovida pelas Canossianas foi apenas uma das expressões da atenção particular concedida à música no processo de reconstrução re-cristianizadora promovido pelas autoridades eclesiásticas e pelos missionários em Timor-Leste

Um dos religiosos que mais se destacaram no fomento da música foi o Pe. Sebastião Maria Aparício da Silva, responsável pela missão de Soibaba. Ali criou um coro com o qual dedicava-se ao cultivo de um repertório adequado aos intentos restaurativos e que, na Europa, orientava-se segundo a polifonia vocal do século XVI. Também a música para órgão passou a ser fomentada a serviço da solenização das celebrações.

Soibaba tornou-se assim um dos principais centros musicais de Timor, criando-se ali uma tradição de canto coral que levaria no século XX a que o seu orfeão fosse reconhecido como um dos mais importantes de Timor. (Veja)

Assim como no Brasil e em outras regiões, a música para banda desempenhou importante papel no ensino masculino e na vida festiva comunitária. Como para a sua formação tornava-se necessário o aprendizado de instrumentos, passou-se a ensiná-los nas escolas.

„Cultivavam com esmero a musica. Quando alli foi de visita o actual Bispo de Macau, ficou maravilhado ao ouvil-os cantar na igreja musicas classicas, sendo um d‘elles o organista; e n‘uma academia em sua honra, em que recitaram discursos, poesias e executaram canticos varios, era o acto abrilhantado por uma banda instrumental por elles composta, em que se houveram com muita correcção.“ (op,cit. 182)

Canossianas nos últimos anos da monarquia em Portugal e queda

O desenvolvimento iniciado na década de 70, apesar de dificuldades, intensificou-se até o início do século XX e nele as Canossianas desempenharam papel relevante. Intensamente envolvidas em atividades de ensino em expansão, chegaram a construir uma casa de campo para a recuperação de forças das religiosas. Essa casa foi levantada em área destinada à promoção agrícola e pastoril, atividades que, ao lado das artes e ofícios, também foram promovidas com o sentido do desenvolvimento material e do progresso social e econômico da colonia.

Um grande centro canossiano devia surgir em Manatuto, onde o govêrno possibilitou a construção de uma ampla casa para escola e residência das religiosas. Estas, porém, não puderam tomar posse do edifício devido à revolução de 1910 em Portugal.

Muitas das propriedades da missão passaram então ao governo após a proclamação da República, sendo as Canossianas levadas a abandoná-las. Uma vez expulsas, não mais voltaram, sobretudo também por não terem pessoal suficiente, uma vez de se encontrarem sobrecarregadas com as suas casas de Macau, Singapura e Malaca.

Os desenvolvimentos nessa esfera do mundo português foram assim diferente daqueles ocorridos no Brasil à mesma época. Aqui, foi justamente o regime republicano que favoreceu a revitalização de conventos, a atuação de missionários europeus e as atividades de ordens religiosas.



Indicação bibliográfica para citações e referências:
Bispo, A.A.(Ed.). „ De Macau a Timor-Leste: caminhos da Restauração no século XIX: o açoriano D. Manuel Bernardo de Souza Ennes (1814-1887), bispo do Pará e de Macau e as Canossianas - a educação feminina compreendida como fator civilizatório“
. Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 168/12 (2017:4).http://revista.brasil-europa.eu/168/Canossianas_em_Timor.html


Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2017 by ISMPS e.V.
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