Sorocaba e Gávea no Odeion - Odisséia
ed. A.A.Bispo

Revista

BRASIL-EUROPA 170

Correspondência Euro-Brasileira©

 
Atenas. Foto A.A.Bispo 2017. Copyright

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Atenas. Fotos A.A.Bispo 2017©Arquivo A.B.E.

 


N° 170/14 (2017:6)



Sorocaba e Gávea de „Saudades do Brasil“ no
ΑΙΘΟΥΣΑ ΩΔΕΙΟΥ ΑΘΗΝΩΝ, 1928
- despedida de Martin Braunwieser (1901-1991) da Grécia -
uma Odisséia ao Brasil


Nos 125 anos de nascimento de Felix Petyrek (1892-1951)

 
Atenas. Foto A.A.Bispo 2017. Copyright

Um evento que representa um marco na histórico-musical no contexto de relações entre a Grécia, a Alemanha, a Áustria e o Brasil foi aquele realizado no saguão do Conservatório de Atenas no dia 25 de abril de 1928. Esse concerto foi o último realizado pelo casal Tatiana (Kipman) e Martin Braunwieser (1901-1991) antes de sua partida definitiva para o Brasil e marcou o encerramento das atividades de muitos anos de Martin Braunwieser como professor de flauta do Conservatório.

Nesse concerto de despedida, antes de partir para São Paulo, Braunwieser apresentou-se não só como instrumentista, mas sim também como compositor com várias das mais representativas e elaboradas de suas obras. Algumas delas foram executadas em primeira audição. O programa incluia também obras por êle revistas e adaptadas. Demonstrava assim mais uma vez a sua capacidade não só técnica como teórica e criadora.

Esse concerto foi o mais importante evento de sua vida como compositor na Europa. Deixou profundas marcas na memória de Tatiana e Martin Braunwieser e teve ressonância nos concertos realizados em Atibaia, Bragança Paulista e em São Paulo.

Significado simbólico do espaço do concerto: associações com a Antiguidade

O próprio espaço no qual se realizou teve um caráter simbólico. Não era apenas o saguão de entrada, pórtico ou loggia do conservatório onde atuara como professor e cujo desenvolvimento influenciara com o incentivo que dera para a vinda de Felix Petyrek (1892-1951). Não foi apenas um concerto de foyer. O local escolhido evocava a Odisséia de Homero e surgia como significativo para a odisséia que o casal iria empreender com a emigração para o Brasil.

O termo αἴθουσα (aíthousa) lembrava Homero, onde é mencionado como designação de um hall de entrada de um edifício contornado com colunas e levando a um pátio interno, mais aberto e iluminado do que os espaços interiores. (Od. 17,29; 18,102,466; II 6,243;20,11)

Com essas associações com a Antiguidade, esse tipo de espaço marcou edificações (neo-)clássicas na Grécia do século XIX e início do XX. Correspondia, como outros elementos remontantes à antiga arquitetura, aos anelos gregos de fundamentação histórica da nacionalidade como país independente e de formação de identidade.

Europa Central de língua alemã e Grécia no programa: Cânones de Bach

O programa oferecido procurou vir ao encontro de um público marcado pela cultura musical da Europa de língua alemã.

Não só o conservatório contava com professores de língua alemã. A intelectualidade, os eruditos, artistas, arquitetos, escritores e professores da Grécia mantinham há muito vínculos com a Áustria e a Alemanha. Esses elos eram sobretudo com a Baviera e a região austríaca de Salzburg, uma vez que o primeiro rei da Grécia fora um príncipe bávaro nascido em Salzburg, Otto I (1815-1867). (Veja)

Os compositores representados no programa demonstram desses elos musicais com a cultura austríaco-alemã do conservatório.

O programa, abrindo com a sonata em do maior de C.Ph.E. Bach e com dois cânones a duas vozes da Arte da Fuga (IV, I) de J.S.Bach dá sobretudo testemunho da ressonância, em Atenas, dos concertos „de antigos mestres“ do Mozarteum de Salzburg da época da formação de Braunwieser. (Veja)

A presença de J.S.Bach surge particularmente significativa como exemplo da ressonância do movimento de redescoberta e revalorização de Bach no cunho que obteve na instituição dirigida por Bernhard Paumgartner (1887-1971) e em cujas aulas de composição a análise de obras de Bach constituiam objeto de particular consideração.

Para o Brasil, surge como significativo o fato de Braunwieser demonstrar neste seu último concerto na Grécia a sua admiração por Bach, uma vez que viria a fundar e presidir a Sociedade Bach de São Paulo em 1935.

A apresentação de cânones da Arte da Fuga demonstra a importância que já nessa época dava ao estudo e à prática de cânones no ensino e na prática musical, o que marcaria também a sua atividade de ensino no Brasil por décadas e teria expressão em publicação de cânones por êle preparada.

A prática de cânones foi por décadas elemento central nas suas atividades como professor de Canto Orfeônico e assim de importância na formação de várias gerações de professores de música em São Paulo.

Eco do Ano Beethoven de 1927

A inclusão da Sonata em Lá Bemol Maior op. 110 de L. van Beethoven e o Estudo sem opus N° 1 em do menor op. 10 de F. Chopin não parecem refletir simplesmente um intuito de vir ao encontro das expectativas dos alunos de piano e da audiência, mas sim terem sido escolhidos também de forma refletida quanto a sentidos. 1927 tinha sido ano centenial de Beethoven pelos 100 anos de seu falecimento, sendo o compositor e sua obra considerados em palestras e concertos, também e sobretudo em Salzburg.

A evocação de Salzburg surge sobretudo nas obras vocais interpretadas pela cantora Olga Lerche, entre elas a ária da Suzana de Noces de Figaro, e Gretchen am Spinnrade, e Fr. Schubert.

A segunda parte foi sobretudo dedicada a composições de Martin Braunwieser e que marcaram o seu início, o seu meio e o seu término. Foram intercaladas com obras para canto de Max Reger (Volkslied) e Hugo Wolf (Du denkst mit einem Fächen mich zu fangen) e, por fim por duas peças das Saudades do Brasil de Darius Milhaud.

As „Saudades do Brasil“ não no sentido nostálgico, mas como ânsia

Se essa obra foi escrita pelo compositor francês antes no sentido brasileiro de lembranças nostálgicas da sua estada no Rio de Janeiro, o termo saudades, para aqueles que emigravam para o Brasil, surgia antes com as conotações do termo alemão „Sehnsucht“, ou seja antes um anelo, uma ânsia ou um desejo causado pela atração do distante, qual fascínio ou tentação de uma sereia.

Essa imagem da atração que o Brasil causava na Europa como uma terra encantada e de promissão pode ser constatada em relatos de viagens. A atração do Brasil manifesta-se mesmo em menções de compositores brasileiros que não resistiram em retornar ao país natal, como Henrique Osvald (1852-1931). (Veja).

Braunwieser apresentou os três primeiros números dos seus 6 Tableaux orientaux pour flûte et Piano compostos no ano interior, Olga Lerche interpretou os números 2 e 5 das 5 Mélodies d‘aprés les poésies de Omar Kaijam, de 1921, e, por fim, o programa foi encerrado com o II, o III e o IV movimentos da sua grande Suite pour instruments à vent, recentemente terminada no próprio ano do concerto.

É digno de menção o fato das peças do programa terem denominações em francês. Esse fato demonstra que, apesar dos estreitos vínculos do conservatório com a Europa Central de língua e cultura alemãs, o idioma francês predominava nos círculos de mais alta formação da sociedade grega.

Várias personalidades gregas da política, da diplomacia, da literatura e das artes dominavam o idioma e Paris continuava a ser a capital cultural da Europa. Esse fato, que também valia em parte para a Alemanha e a Áustria no período posterior à Segunda Guerra explica a presença de Darius Milhaud nos concertos da academia fundada em Salzburg com a participação decisiva de Braunwieser e também nos concertos de seus membros que se transferiram para Atenas.

Relatos da viagem de estudos da A.B.E. à Grécia em 2017
sob a direção de
Antonio Alexandre Bispo





Bispo, A.A. „Sorocaba e Gávea de „Saudades do Brasil“ no ΑΙΘΟΥΣΑ ΩΔΕΙΟΥ ΑΘΗΝΩΝ, 1928
- despedida de Martin Braunwieser (1901-1991) da Grécia -uma Odisséia ao Brasil“
. Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 170/14 (2017:6).http://revista.brasil-europa.eu/170/Brasil_em_Atenas.html


Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2017 by ISMPS e.V.
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501


Academia Brasil-Europa
Organização de Estudos de Processos Culturais em Relações Internacionais (ND 1968)
Instituto de Estudos da Cultura Musical do Espaço de Língua Portuguesa (ISMPS 1985)
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Editor: Professor Dr. A.A. Bispo, Universität zu Köln
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