História, consciência nacional e continuidade
ed. A.A.Bispo

Revista

BRASIL-EUROPA 170

Correspondência Euro-Brasileira©

 
Atenas. Foto A.A.Bispo 2017. Copyright

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Universidade de Atenas.Fotos A.A.Bispo 2017©Arquivo A.B.E.

 


N° 170/6 (2017:6)



Konstantinos Paparrigopoulos (1815-1891) e Dom Pedro II (1825-1891)   
História e consciência nacional no processo político-cultural da Grécia no século XIX
e a sua institucionalização universitária
Dimensões da concepção de uma continuidade da Antiguidade à era moderna


Visita à Universidadade Nacional Kapodistrias no âmbito do ciclo de estudos Grécia-Alemanha-Áustria-Brasil 2017

 
Atenas. Foto A.A.Bispo 2017. Copyright

Nos estudos euro-brasileiros levados a efeito na Grécia e que se relacionaram com aqueles realizados na Alemanha em 2017 (Veja), deu-se particular atenção ao fato de Dom Pedro II ter visitado o país em 1876.

O imperador brasileiro visitou não apenas escavações arqueológicas, salientando-se as suas estadias em Troia e Micenas sob a direção de Heinrich Schliemann (1822-1890) (Veja), como instituições de Atenas em época de importância para a institucionalização universitária dos estudos históricos. (Veja)

Esse interesse do imperador brasileiro não pode ser considerado como expressão de simples procura de conhecimentos de um erudito, mas analisado e valorizado a partir de contextos político-culturais da época nas suas relações com o desenvolvimento das ciências e com a história universitária.

O interesse pelo passado mais remoto da Grécia no século XIX foi estreitamente relacionado com anseios e movimentos de independência nacional. Uma personalidade da história do pensamento e da universidade grega que merece ser considerada sob o aspecto das relações entre a Grécia e o Brasil é o de Konstantinos Paparrigopoulos.

A luta pela liberdade grega do domínio osmânico e a História

Uma aproximação à consideração da vida, do pensamento e da obra e Paparrigopoulos deve partir do fato de ter nascido em época marcada pelas lutas pela emancipação grega do domínio turco.

No contexto da guerra da independência, em 1821, o seu pai e outros membros a família fanariota foram presos e executados pelo sultão, a sua mãe e outros parentes obrigados a fugir de Constantinopla para Odessa. Com o apoio do Czar Alexander I (1801-1825), Paparrigopoulos adquiriu uma formação francesa no liceu dessa cidade portuária do Mar Negro, o que marcou o seu pensamento dirigido à liberdade.

Em 1830, transferiu-se para Nafplio/Nauplia, capital do recém-criado reino da Grécia. Ao lado da suas atividades no funcionalismo, dedicou-se à História, ainda que sem estudos formais.

Esse interesse de Paparrigopoulos explica-se pelo processo político que procurava a sua fundamentação científico-cultural numa continuidade da nação grega remontante à antiga Grécia, o que se manifestava nos intentos de estudo e glorificação desse remoto passado com correspondentes expressões na arquitetura e nas artes.

Esse desenvolvimento, dando prosseguimento a correntes filohelenísticas européias, foi fomentado à época dos estreitos elos com a Baviera, a do reinado Otto I da Grécia, príncipe bávaro (1815-1867). Foi nessa época que surgiram leis para a proteção de fundos antigos, o Serviço Arqueológico, a Sociedade Arqueológica e foram feitos os primeiros trabalhos de escavações e restaurações. A fisionomia das cidades passou a ser marcada por edifícios neo-clássicos.

A Antiguidade parecia oferecer um modêlo para a sociedade, servindo à fundamentação da existência do estado nacional e da independência do domínio osmânico que ainda vigorava em diferentes regiões. Sendo, porém, a população grega profundamente marcada pela religião ortodoxa, e assim distanciada dessas remotas eras pré-cristãs, as atenções voltaram-se em sequência também ao passado bizantino e, assim, à Idade Média. Um dos anelos condutores do ideal de união grega passou a ser o da recuperação de Constantinopla, a antiga capital do Cristianismo do Oriente.

Problemas de interpretação histórica: origens étnicas e continuidade cultural

Afastado do serviço público em 1845 por não possuir a cidadania grega, Paparrigopoulos transferiu-se para Atenas, onde atuou como professor de História no ginásio. Em 1843, publicou livro sobre a colonização de povos eslavos no Peloponeso, refutando posições que viam a origem dos gregos atuais na região balcânica e não na antiga Grécia. Para além de questões de continuidade étnica, os seus esforços foram o de estudar e salientar continuidades culturais com a remota Antiguidade.

A visão histórica oposta era aquela exposta em publicação sobre a História da Península Morea na Idade Média de Jakob Philipp Fallmerayer (1790-1861), segundo a qual os antigos gregos teriam sido exterminados. Os habitantes atuais seriam assim eslavos e albanos helenizados. Essa interpretação foi necessariamente vista como desfavorável aos anelos de recriação de um estado grego independente.

A polêmica entre filohelenistas e medievalistas no sentido de Fallmerayer favoreceu uma orientação de pensamento que procurava a fundamentação dos intuitos nacionais não em critérios raciais, mas culturais, o que lhe confere, hoje, uma singular atualidade.

A História e o ensino na formação da consciência nacional

Em 1844, Paparrigopoulos publicou um estudo sobre a subordinação de Corinto aos romanos, que via como o momento crucial do fim da antiga liberdade grega. Essa visão de desenvolvimentos históricos deveria contribuir à formação da consciência nacional das novas gerações e, para isso, já no ano seguinte, publicou um compêndio sobre elementos da história geral para o uso escolar.

Correspondendo a seus conhecimentos da literatura francesa, esse trabalhou baseou-se ou representou uma tradução comentada do manual do pedagogo francês David Lévi Alvarès (1794-1870).

A História de orientação nacional na Universidade de Atenas

Atenas. Foto A.A.Bispo 2017. Copyright
A vida universitária de Paparrigopoulos foi também marcada de forma decisiva pelas relações do novo reino grego com a Baviera, uma vez que foram estas que possibilitaram a sua carreira acadêmica.

Com recomendações de Friedrich von Thiersch (1784-1860), um dos grandes vultos do Humanismo na Baviera - o Praeceptor Bavariae - , assim como de Konstantinos Schinas (1801-1870),  embaixador grego na Baviera e primeiro reitor da Universidade de Atenas, Paparrigopoulos recebeu, em 1850, o título de Doutor „em ausência“ da Universidade de Munique.

Esse titulo possibilitou que já em 1851 fosse nomeado a professor extraordinário de História na Universidade de Atenas e, após alguns anos, a catedrático de „História de Povos Antigos“.

De acordo com a sua visão histórica, a denominação
e o escopo dessa área foram modificados em 1857, passando a cátedra a ser designada como „História da Nação Grega da Antiguidade até o Presente“. Nessa sua atuação como professor, estabeleceu universitariamente uma compreensão histórica que salienta uma linha de continuidade grega da Antiguidade à era moderna.

Essa visão de desenvolvimentos históricos que marcou a institucionalização universitária da História na Grécia teve a sua maior expressão na principal obra de Paparrigopoulos: a História da Nação Grega. Já iniciada em forma suscinta com um compêndio publicado em 1853, foi publicada em 15 livros entre 1860 e 1874. A sua versão definitiva veio à luz entre 1885 e 1888.

A quarta edição, em 1902/3, seria reelaborada por Pavlos Karolidis (1849-1930), um dos mais destacados historiadores da Grécia.

A difusão mais ampla das concepções históricas relativas à continuidade grega através dos séculos foi possibilitada sobretudo pelas atividades de Paparrigopoulos como publicista e editor e jornais. Neles publicou as aulas que proferia, além de artigos sobre temas políticos e históricos.

Entre os periódicos por êle editados, salientaram-se o Ethniki (1847) e Elin (1858-1860). Com Alexandros R. Rangabé (1809-1892), fundou o jornal Pandora (1850-1863) (Veja). Favoráveis ao govêrno - e ao reinado de Otto I (1815-1867) - esses jornais foram expressões das estreitas relações político-culturais existentes entre a Grécia e a Baviera.

História nacional grega e a política européia: o Congresso de Berlim

A concepção histórica da continuidade grega da Antiguidade à era moderna forneceu a fundamentação dos anseios libertários na sua expansão a regiões e ilhas que ainda se encontravam sob o domínio osmânico.

Em 1877, Paparrigopoulos tornou-se presidente da „Defesa nacional“, entidade que tinha como escopo apoiar os gregos em Epirus, Macedonia, Tessália e Cret na sua luta pela libertação. Com esse objetivo, realizou várias viagens pela Europa ocidental para angariar fundos e adquirir armas.

Durante a assim-chamada „Crise Oriental“, entrou em contato com diplomatas, sempre procurando fundamentar cientificamente os anelos do reino da Grécia. Para servir ao Congresso de Berlim convocado para a solução de problemas territoriais do Sudeste da Europa, Paparrigopoulos contratou o cartógrafo Heinrich Kiepert (1818-1899) para a realização de um mapa da região, trabalho pioneiro de relevância para a história da Geografia.

O processo político grego na sua fundamentação histórica e o Brasil

À época da estadia de Dom Pedro II à Grécia, em 1876, quando então visitou os sítios arqueológicos de Troia e Micenas onde desenvolvia escavações Heinrich Schliemann (1822-1890), (Veja) o país encontrava-se nessa fase marcada por esses anseios políticos de libertação de territórios que ainda se encontrava sob o domínio do Império Osmânico e, assim de consecução de uma unidade nacional que procurava fundamentar-se cientificamente.

Na sua visita a instituições acadêmicas de Atenas, o imperador brasileiro entrou em contato com personalidades das ciências, tornando-se conhecido pelos seu conhecimentos e orientação de pensamento. Voltado ao progresso das ciências, em particular tendo demonstrado o seu interesse pela história mais antiga com a visita de Troia e Micenas, Dom Pedro II confirmou, com a sua viagem, o renome que já gozava entre queles que mais se empenhavam em estudos históricos, ainda que estes estivessem a serviço de ideais políticos de construção do estado nacional grego.

Esse interesse do imperador brasileiro era do conhecimento de Paparrigopoulos que, em 1876, encontrava-se na Itália como encarregado de negócios da Grécia. Pouco antes da saída de Dom Pedro II do Brasil, Paparrigopoulous entrou em contato com o Ministro Plenipotenciário do Brasil na Itália, Conselheiro João Alves Loureiro, Barão de Javari (1812-1883), pedindo permissão para oferecer a Dom Pedro II uma obra por êle traduzida para o grego moderno e comentada.

Na sua resposta, apreciando a oferta, Dom Pedro II respondeu pedindo que o representante do Brasil transmitisse ao autor que já tinha notícia dessa obra, contando em conhecer Paparrigopoulos quando estivesse em Roma após a sua viagem à Grécia,o que, como esperava, dar-se-ia em fevereiro de 1877.

Se a obra fosse enviada para o Brasil, não poderia lê-la durante a viagem à Grécia. Seria assim melhor que a recebesse na Grécia, para onde iria antes da Itália, ou mesmo em Roma. ( Dom Pedro II e a Cultura, Rio de Janeiro: Ministério da Justiça/Arquivo Nacional 1977, Nr. 505, pág. 97)

Relatos da viagem de estudos da A.B.E. à Grécia em 2017
sob a direção de
Antonio Alexandre Bispo



Indicação bibliográfica para citações e referências:
Bispo, A.A. „Konstantinos Paparrigopoulos (1815-1891) e Pedro II (1825-1891). História e consciência nacional no processo político-cultural da Grécia no século XIX e a sua institucionalização universitária.
Dimensões da concepção de uma continuidade da Antiguidade à era moderna“
. Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 170/6(2017:6).http://revista.brasil-europa.eu/170/Konstantinos_Paparrigopoulos.html


Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2017 by ISMPS e.V.
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501


Academia Brasil-Europa
Organização de Estudos de Processos Culturais em Relações Internacionais (ND 1968)
Instituto de Estudos da Cultura Musical do Espaço de Língua Portuguesa (ISMPS 1985)
reconhecido de utilidade pública na República Federal da Alemanha

Editor: Professor Dr. A.A. Bispo, Universität zu Köln
Direção gerencial: Dr. H. Hülskath, Akademisches Lehrkrankenhaus Bergisch-Gladbach
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