Academia de Ciências - República Dominicana
ed. A.A.Bispo

Revista

BRASIL-EUROPA 171

Correspondência Euro-Brasileira©

 


ACRD. Foto A.A.Bispo 2017. Copyright ABE

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Fotos A.A.Bispo 2018©Arquivo A.B.E.

 


N° 171/2 (2018:1)



„Em defensa de la libertad de pensamiento y la verdad cientifica“

O escopo exemplar da
Academia de Ciencias de la Republica Dominicana
e a problemática das relações entre a pesquisa empírica e as fontes históricas

 

Importante momento no ciclo de estudos euro-brasileiros realizados em países do Caribe em fins de 2017 foi a visita à Academia de Ciencias de la República Dominicana, ACRD.

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Em estadias anteriores, outras das muitas instituições culturais e de pesquisa da República Dominicana tinham sido visitadas, obtendo-se conhecimentos e estabelecendo-se contatos que foram de relevância para os estudos de processos culturais em relações entre o Caribe, a América Central em geral e o Brasil das últimas décadas. Entre essas instituições, destacou-se sobretudo o Museo del Hombre Dominicano. (Veja)

A Academia de Ciencia de la República Dominicana (ACRD) permite a aproximação a uma outra esfera do amplo panorama científico-cultural dominicano. Tata-se de uma instituição de caráter científico, não-governamental, sem filiação partidária e sem fins de lucro. É assessora honorífica do Poder Executivo e do Senado da Republica.

A Academia de Ciencias de la Republica  Dominicana - exemplaridade de seu escopo

No ano em que se dava início ao programa euro-brasileiro na Alemanha, em outubro de 1974, fundava-se, em dezembro, em Santo Domingo, a Academia de Ciencias  da República Dominicana com o escopo de promover as investigações, os avanços das ciências e a inovação tecnológica, propiciando a criação de uma cultura científica no país.

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A instituição propõe-se atuar em defesa o patrimônio nacional, da institucionalidade da conservação dos recursos naturais e ambientais, assim como ao desenvolvimento ético e moral da sociedade.

Entre os seus membros fundadores, encontram-se destacados representantes de várias áreas dos conhecimentos. Pedro Troncoso Sanchez, Arnaldo Espaillat, Mario Bonetti, Idelisa Bonnelli de Calventi, Pedro Mir, Mons., Roque Adames, Arturo Joménes Sabater, Julio Cicero McKinnney, Heney Alain Liogier, Eugenio de Js. Marcano, Jose de Js. Jiménez, Basset Maguire, Rogelio Lamarche Soto, José A. Caro Álvarez, Gustavo Rathe, Hugo Mendoza, Huberto Boaert, Antonio Zaglul E., José Luis Alemán, Dinápoles Soto Bello, Maximo Avilés Blonda, Manuel Cocco Guerrero, HArry Hoetink, Eurdo Luna, José J. H. y Morel, José de Js. Alvarez Pirelló, Francisco A. Malagón, Antonio Hoepelman, Francisco Tamás, Sergio A. Bencosmi, Hector Read Barreras e Francisco Tamás.

A ACRD conta com um corpo de membros de 170 acadêmicos ativos, entre fundadores, de número e correspondentes. É dirigida por um conselho diretivo formado por nove membros titulares e oito suplentes. O organismo máximo da direção é a Assembléia Geral. Possui um Conselho Superior Cunsultivo integrado por 13 membros titulares e quatro suplentes. Conta com 12 comissões e três subcomissões: Ciências Básicas e Tecnologia, Ciencias Naturais e Meio Ambiente, Ciencias da Saúde, Economia, Assuntos Internacionais, Linguística e Literatira, Educação, Ciências Jurídica e Política, Ciências Sociais, Filosofia e Epistemologia, Ética, Novos Ingressos e Outorgamento de Honras e, como subcomissões: Saúde Mental, Linguística e Literatura. A ACRD faz parte de várias organizações internacionais, entre elas do Comité Nacional da UNESCO, da Rede Interamericana de Academias de Ciencias (IANAS), da Comunidad Cientifica del Gran Caribe (CCC) e das Academias de Ciencias del Tercer Mundo (TWAS).

A ACRD no centro histórico de Santo Domingo - Ciências Naturais e Humanas

ACRD. Foto A.A.Bispo 2017. Copyright ABE
A ACRD situa-se no núcleo colonial de Santo Domingo (Calle Las Damas 112).Nesse espaço, convidativo para reflexões e no qual se estabelece uma analogia com a antiga academia platônica, constata-se uma particular atenção dada às ciências naturais, em particular à Geologia.

Ali encontram-se quadros com os minerais da República Dominicana propiciados pelo Servicio Geológico Nacional y Sociedad Dominicana de Geología (SODOGEO) e representações plásticas do trabalho de mineração. Lembra-se, com essa exposição, que a República Dominicana tem uma as riquezas minerais, metálicas e não metálicas mais importantes da área do Caribe insular, lembrando-se aqui do âmbar e do larimar. Em outro quadro, apresenta-se uma distribuição dos solos rochosos do país.

Entre os bustos e estátuas de cientistas desse pátio interno encontram-se aqueles de Charles Darwin (1809-1882) e Albert Einstein (1879-1955). Dentre esses bustos, destaca-se o do Dr. Erik Leonar Ekman (1883-1931) ali colocado em 2014 e que lembra esse botânicoo sueco que explorou a ilhas e Cuba e a Hispaniola entre 1914 e 1931, descobrindo mais de 2000 espécies de plantas.

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A ampla sala de reuniões e conferências é ladeada por quadros, salientando-se o de Alexander von Humboldt (1769-1859). Entre êles encontram-se pinturas de seus presidentes e fotografias de membros que se integraram à ACRD desde a sua fundação.

Antropologia/Etnologia: Culturas indígenas e instrumentos populares na entrada da ACRD

No hall de entrada, que conduz a um pátio interno, encontra-se instalado um pequeno museu, no qual salienta-se uma exposição de objetos indigenas e achados arqueológicos.
ACRD. Foto A.A.Bispo 2017. Copyright ABE

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Já ali a presença de um instrumento musical lembra que também a música faz parte - como elemento da mais alta relevância do patrimônio cultural - ao escopo da ACRD. Trata-se de um tambor de madeira e couro obtido em San Pedro de Macoris, e que é comparado com instrumentos similares encontrados em grupos Senufos e em vários países da África, entre êles Mali, Burkina Faso, Costa do Marfim e Senegal.
ACRD. Foto A.A.Bispo 2017. Copyright ABE
A problemática teórico-científica - fontes históricas e estudos culturais empíricos

As relações entre os estudos históricos baseados em fontes documentais e a pesquisa empírica a partir sobretudo da observação no presente constituem uma preocupação básica dos estudos culturais e vem sendo consideradas nos seus diversos aspectos há décadas.

Foi justamente o reconhecimento dos problemas delas resultantes que levou já em meados da década de 1960 em São Paulo à consciência de uma orientação da atenção a processos, superando-se aproximações voltadas a categorizações do objeto e tornando transpassáveis pré-concebidas esferas culturais tais como aquelas do erudito, do folclórico e do popular.

Essa tomada de consciência deu-se sobretudo nos estudos da história da música e do folclore. Constatou-se que historiadores da música, ao tratar de épocas mais remotas ou pouco documentadas, partiam de interpretações de tradições por parte de folcloristas. Estes, por sua vez, embora partindo do observado no presente, faziam preceder os seus textos com considerações históricas, delas tirando pressupostos para interpretações. Ocorria assim uma interferência mútua em afirmações a partir de hipóteses pouco fundamentadas e que adquiriam um sentido de elucidações óbvias e indiscutáveis.

Colocações pouco fundamentadas de origens e desenvolvimentos, em grande parte derivadas de conjecturas e mesmo de posições ideológicas, expostas em geral de forma suscinta e apodítica como introdução e moldura geral de pesquisas baseadas em princípio na observação empírica passavam a ser usadas nos estudos mais propriamente históricos.

Interpretações que deviam ser antes hipóteses de trabalho e como tal aptas a revisões, tornavam-se postulados não-questionados, a posições e visões consideradas como evidentes. Em vários casos chegava-se a situações enigmáticas, a impasses e discordâncias que, por sua vez, exigiam novas tentativas explicativas.

Percebia-se nessa problemática o risco de deturpações e mesmo falsificações, com todas as suas graves consequências para o alcance de conhecimentos e para o esclarecimento.

Discustiu-se, na época, o papel desempenhado por visões nacionalistas nos estudos culturais dos anos de 1920 e 1930 nessa situação teórica, uma problemática que surge hoje de particular atualidade devido ao recrudescimento de tendências nacionalistas, identitárias e povísticas no presente. (Veja) Também na República Dominicana constata-se o papel de posicionamentos e perspectivas de cunho nacionalista na esfera das ciências e da cultura.

Significativo parece ser, neste sentido, o fato de encontrar-se, pátio interno da ACRD uma estátua do General Dom Juan Pablo Duarte (1813-1876), celebrado como „pai da pátria“ e fundador da República Dominicana como „nación libre y soberana, gracias a su gran amor, espiritu de sacrificio y concepto del deber por y para su pueblo“.

Reflexões a partir de „La Pasión Danzaria“ de Dario Tejeda e textos relacionados

Assim como no Brasil, constatou-se que também na Republica Dominicana - e em outros países do Caribe - posições e convicções nacionalistas podem interferir na liberdade de pensamento e na procura de „la verdad cientifica“ a que se propõe com justa razão a instituição e que a torna exemplar.

Essas posições e convicçcões, tais como aquelas de identidade cultural e nacional, são elas próprias resultados de processos históricos e representativas de determinadas situações epocais, e como tal aptas a análises como objeto de estudos de processos culturais. Elas, porém, tornam-se ponto de partida para a visão de decorrências passadas, a posicionamentos em perspectivações de desenvolvimentos a partir do presente, ou seja, de projeção anacrônica de situações posteriores de processos a fatos e decorrências anteriores.

Essa problemática tem a sua maior evidência no âmbito dos estudos culturais que, do presente, levam a conclusões referentes ao passado em complexas relações entre hipóteses, interpretações e reconstruções. Em geral conduzidas pela vivência e observação empírica no presente, conduz a leituras inadequadas de fontes históricas.

No caso da República Dominicana, essa problemática evidencia-se numa das mais celebradas obras relativas a um bem cultural considerado como emblemático da identidade nacional e de alto significado para a auto-imagem e representação do país: o merengue.

É significativo que a ACRD tenha não só publicado uma obra premiada em concurso de musicologia da Casa das Américas de Cuba, como também a celebrado e valorizado com a publicação de livro com textos, comentários e avaliações. Trata-se da obra La Pasión Danzaria: Música y baile en el Caribe a través del merengue y la bachata de Darío Tejeda, publicada em Santo Domingo pela ACRD, em 2002 (ISBN: 99934-0-267-2).

Os textos que a celebram e valorizam foram também editados pela ACRD no ano seguinte (La pasión danzaria de Darío Tejeda, Santo Domingo: ACRD, 2003, ISBN: 99934-959-0-5).

A „paixão dançária“ da designação da obra tornou-se expressão vista como determinante da identidade cultural e nacional do país - e mesmo da esfera do Caribe em geral.

Essa designação é elucidada pelo autor com referência a expressão em obra do século XVIII do dominicano Pe. Jean-Baptista Labat OPO (1663-1738).

Toma-se, assim, a partir de observações e constatações do presente, tanto relativas a gêneros musicais e de dança, assim como do entusiasmo pelo dançar, uma posição que procura fundamentar-se em fonte histórica. Esta, porém, não é considerada adequadamente na sua inscrição em processos históricos a serem analisados na sua decorrência temporal, ou seja, de „trás para a frente“.

Esse procedimento atualiza no contexto dominicano uma problemática histórico-científica discutida há muito na musicologia européia e que foi de particular significativo para os estudos músico-culturais relacionados com Portugal e com o Brasil nas décadas que se seguiram á segunda Guerra. Esse debate marcou os preparativos para a introdução das Ciências Musicais na universidade portuguesa e para a fundação da Sociedade Brasileira de Musicologia em cooperação internacional na Universidade de Colonia, em meados da década de 1970. (Veja)

Para tratar mais diferenciadamente a problemática teórica constatada em „La Pasión Danzaria“, procedeu-se primeiramente a uma releitura atenta da obra de Labat, recapitulando aspectos dos estudos de fontes históricas missionárias em processos culturais no mundo extra-europeu levados a efeito no departamento de Etnomusicologia do instituto da organização pontifícia de música sacra em Colonia, Maria Laach e Roma entre 1977 e 2002.

A República Dominicana e sua capital oferecem condições excepcionais para essa recapitulação, uma vez que na própria designação do país e da cidade eterniza-se o nome do patrono da Ordem dos Pregadores. A exposição sobre o papel dos Dominicanos no século XVI no Alcázar de Colón em Santo Domingo ofereceu subsídios para essas reflexões. (Veja) A própria catedral de Santo Domingo, principal  monumento do país e da arquitetura religiosa das Américas representou o espaço ideal para o tratamento dos fundamentos marianos de concepções que guiaram procedimentos e expressões da antiga catequese. (Veja)

Paralelamente a essas reflexões históricas, considerou-se o papel desempenhado pelo merengue na representação e auto-imagem do país, do seu emprêgo em shows e da problemática do „folclore aplicado“ que vem sendo sempre discutida em outros contextos. Em diálogos com membros do Ballet Folklórico Nacional Dominicano tomou-se conhecimento do significado político-cultural do merengue e do seu significado na presença do país no Exterior. Neste contexto, considerou-se a realização de futuros encontros em cooperações com a A.B.E. no sentido de acompanhar essas apresentações com reflexões científico-culturais em relacionamentos com o Brasil. (Veja)

Veja outros artigos em continuidade nesta edição

De ciclo de estudos no Caribe em 2017
Antonio Alexandre Bispo


Indicação bibliográfica para citações e referências:
Bispo, A.A. „„Em defensa de la libertad de pensamiento y la verdad cientifica“. O escopo exemplar da Academia de Ciencias de la Republica Dominicana e a problemática das relações entre a pesquisa empírica e as fontes históricas discutida no âmbito dos estudos euro-brasileiros“
. Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 171/2(2018:1).http://revista.brasil-europa.eu/171/Academia_de_Ciencias_Republica_Dominicana.html




Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2017 by ISMPS e.V.
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501


Academia Brasil-Europa
Organização de Estudos de Processos Culturais em Relações Internacionais (ND 1968)
Instituto de Estudos da Cultura Musical do Espaço de Língua Portuguesa (ISMPS 1985)
reconhecido de utilidade pública na República Federal da Alemanha

Editor: Professor Dr. A.A. Bispo, Universität zu Köln
Direção gerencial: Dr. H. Hülskath, Akademisches Lehrkrankenhaus Bergisch-Gladbach
Corpo administrativo: V. Dreyer, P. Dreyer, M. Hafner, K. Jetz, Th. Nebois, L. Müller,
N. Carvalho, S. Hahne




 

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