Solidariedade perante problemas ambientais
ed. A.A.Bispo

Revista

BRASIL-EUROPA 172

Correspondência Euro-Brasileira©

 
Bananal Puerto Limon. Foto A.A.Bispo 2017.Copyright

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Fotos A.A.Bispo 2018©Arquivo A.B.E.

 


N° 172/14 (2018:2)



Auto-consciência e transparência em solidariedade internacional
perante problemas ambientais
Questões de produção e comercialização agrícola no caso da banana de Costa Rica
na atualidade do interesse brasileiro por
Chiquita


 

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Bananal Puerto Limon. Foto A.A.Bispo 2017.Copyright
Nos estudos euro-brasileiros realizados no Caribe, em 2017, voltou-se a temas já tratados em estadias e trabalhos anteriores, dando continuidade a reflexões e focalizando problemas a partir de novas situações e novos questionamentos. Principal foco das atenções foi o da necessidade de análises de condicionamentos culturais perante os graves problemas ambientais do presente.

Entre os complexos temáticos retomados salientam-se aqueles referentes a paralelos quanto a desenvolvimentos agrícolas e comerciais na história de países da América Latina e do Caribe nas suas relações com a Europa.

Essa renovada atenção resulta da exigência da consideração de processos econômicos nos seus múltiplos aspectos numa ciência da cultura orientada segundo processualidades em contextos globais.

Para um continente marcado pela colonização, o uso de recursos naturais e os desenvolvimentos agrícolas adquirem nesse intento primordial significado.

Agricultura e conceitos de cultura

O próprio termo agricultura indica as suas relações com concepções de cultura, trazendo à consciência os elos etimológicos do conceito com aqueles de cultivo da terra, o que pode ser entendido também nas suas dimensões mais amplas e mesmo metafóricas de terra.

Essa lembrança - ainda que não mais correspondendo a compreensões recentes do termo - favorece o reconhecimento do significado de desenvolvimentos agrícolas na ocupação de territórios, na abertura de vias e organização de espaços, na sua população, na vida do homem, no estabelecimento de povoados e cidades, na política e no comércio e em muitos outros aspectos que são alvo de estudos e reflexões voltados a processos culturais.

Paralelos entre Costa Rica e Brasil quanto à agricultura - lembrando o café

Entre os países da esfera do Caribe e da América Central destaca-se a Costa Rica nessa atenção a paralelos resultantes de desenvolvimentos agrícolas com o Brasil. Ambos os países não são apenas marcados na sua história e atualidade pelo seu patrimônio natural, em particular pela exuberância de suas florestas, o que os aproxima nas suas imagens, mas sim também pelos principais produtos agrícolas para fins comerciais de exportação.

A consideração desses pressupostos naturais de desenvolvimentos e as transformações do meio ambiente através da ação do homem nas suas consequências na história e no presente impõe-se com particular intensidade no presente.

Ambos os países, assim marcados pelos seus bens de flora e fauna, o são também por paralelos quanto à ação do homem nesse meio, sobretudo pelo seu uso agrícola.

Tanto a Costa Rica como o Brasil são assim por exemplo associados com o café, ou melhor este com Costa Rica e o Brasil nas suas diferenciações no contexto dos países de produção cafeeira no globo.

A consideração da história do cultivo, dos procedimentos de seu beneficiamente e do uso do café na sua difusão global no decorrer dos séculos surge como necessária para a análise de desenvolvimentos relacionados com a economia do café no Brasil e cuja importância é evidenciada em grande número de publicações.

Problemas ambientais e sociais da agricultura: bananas para exportação

No centro das atenções das últimas décadas tem estado porém um outro produto que caracteriza Costa Rica como poucos outros: a banana.

A sua consideração nos debates voltados à América Latina na Europa foi motivada nas últimas décadas do século XX pelos problemas sociais resultantes das estruturas econômicas do seu cultivo e da sua comercialização, pelo papel predominante nela exercido pelo empreendedorismo norte-americano e pelas suas implicações políticas em desenvolvimentos não só de Costa Rica como de vários outros países do continente.

Esse debate, não isento de polêmicas, inscreveu-se também em processos político-culturais internacionais e, na Europa, marcou uma época das preocupações predominantes de esferas do pensamento e das ações.

Tendo como um de seus principais objetivos o esclarecimento de consumidores quanto às condições de trabalho nas plantações, procurou-se através de publicações e atividades várias influenciar mecanismos econômicos e contribuir a uma mudança de situações nos países de seu cultivo, em particulr na Costa Rica.

Essas acentuadas preocupações quanto a processos econômicos e político-sociais em relações internacionais relacionados com o cultivo e o comércio da banana constituem um aspecto significativo da história cultural mais recente, uma vez também que evidencim tendências do pensamento vigentes em determinados círculos da intelectualidade.

Essa atenção a aspectos questionáveis da produção, condições de trabalho, comercialização da banana nas suas inscrições em processos político-econômicos teve como um de seus efeitos o despertar maior de interesses pela América Latina e, em particular, para o produto.

Nos estudos relacionados com o Brasil, constatou-se então a necessidade de estudos mais pormenorizados, uma vez que, diferentemente do algodão, da cana de açúcar, do cacau, do café ou da borracha, a literatura tanto econômica quanto histórica e empírico-cultural pouca atenção a êle revelava.

Essa situação da pesquisa não correspondia à importância do cultivo da banana e de suas múltiplas implicações sociais e culturais, o que se manifesta sobretudo em várias regiões da costa brasileira. Este é o caso, por exemplo, da região do Cubatão ou do Vale da Ribeira em São Paulo.

„Viagens da banana“ no mundo e sentidos de sua imagem

A deficiência assim constatada motivou também o interesse para o caminho que levou à introdução do seu cultivo no Brasil e em outros países americanos, também sob esse aspecto menos considerado no âmbito dos estudos das „viagens de plantas“ no decorrer dos séculos.

O enfoque cultural levou ao reconhecimento de sentidos - desconhecidos e surpreendentes - relacionadas com a banana no sistema cultural de concepções e imagens de antiga proveniência. A revelação dessas associações e a consideração de seus efeitos em desenvolvimentos levaram a estudos em diferentes contextos, salientando-se aqueles na Costa Rica, país que como poucos oferece exemplo de valorização do fruto no seu significado histórico cultural e que o nobilitou em representações na sua principal casa de espetáculos, o teatro de ópera de sua capital. (Veja)

Nos estudos realizados e que teve um de seus pontos altos a consideração do teatro de S. José, procurou-se, entre outros aspectos, ganhar conhecimentos sobre a presença da banana em expressões culturais do século XIX.

Relembrando Le Bananier de Louis Moreau Gottschalk (1829-1869)

Significativo testemunho do interesse pelo fruto e por aqueles que trabalham nas plantagens é a composição Le Bananier (Op. 5), de Louis Moreau Gottschalk (1829-1869), pianista e compositor nascido em New Orleans e falecido no Rio de Janeiro, considerado no âmbito dos estudos euro-brasileiros em simpósio dedicado à atualização dos estudos transatlânticos e interamericanos levado a efeito em 1983 sob a direção do editor.

A composição, no contexto geral da obra de Gottschalk, foi considerada no seu significado para estudos culturais em relações internacionais em diálogos com Francisco Curt Lange (1903-1997), principal representante do pensamento interamericano e da pesquisa do pianista e compositor.

Considerou-se, então, que a composição, escrita na França ao redor de 1846 e parte das quatro Lousiana Creole pieces, designada como „Chanson négre“, adquire relevante interesse para uma musicologia de orientação cultural e, em geral, para estudos de processos culturais em relações internacionais.

Ela documenta, na figura do „bananeiro“ o interesse pela América em meados do século XIX, pela cultura crioula na Europa, e que se manifestou na popularidade alcançada pela composição. Foi dedicada ao pianista e compositor Alexandre Goria (1823-1860), cuja obra, sobretudo de música de salão, alcançou considerável difusão no século XIX, também no Brasil.

Como a composição - na qual é elaborado um tema de canção popular da Louisiana - indica, a atenção é dirigida a essa região dos Estados Unidos e à esfera cultural crioula na qual o próprio compositor se inseriu. Sendo nela reelaborado um tema de canção popular e sendo ela também designada como canção de negros, a composição adquira particular significado para estudos de processos culturais relacionados com a cultura criola e o criolismo, contribuindo às considerações dos diferentes sentidos e implicações do termo.

Caminhos à United Fruit Company - Chiquita International

Foi sob esse pano de fundo da atenção à plantação de bananas e àquele que trabalha nas plantagens da Louisiana nas suas relações com a esfera do Caribe e da América Central que procedeu-se a consideração da história de desenvolvimentos que levaram à atual situação do cultivo e da comercialização da banana que se tornou alvo de debates.

O início dessa fase de produção intensificada e do fomento do seu consumo nos Estados Unidos é marcado por elos entre o norte da América do Sul, o Caribe e os Estados Unidos.

Lembra-se, neste sentido, o papel desempenhado pelo navegante, capitão e comerciante Lorenzo Dow Baker (1840-1908) que, em viagem do Orinoco a Jamaica e à Filadélfia, levou consigo da Jamaica cachos de bananas que por êle foram vendidos, dando origem à idéia de comercialização mais ampla do produto.

Esses esforços de trazer bananas verdes que amadureceram à época de serem vendidas despertou a atenção de Elisha Hopkins (1827-1857), tornando-se assim possível o financiamento de uma firma em 1881, a L.D.Baker & Co.. Em 1885, com outros parceiros, fundou-se a Boston Fruit Company. Esta, por fim, deu lugar, em 1899, à United Fruit Company, conhecida desde 1990 como Chiquita Brands International.

Costa Rica oferece um exemplo de como a queda do preço do café, em fins do século XIX, levou ao desenvolvimento do cultivo de bananas na América Latina. Essa mudança evidenciada nas exportações foi registrada em obras geográficas da Europa, como o volume dedicado à América do Sul e Central organizado por Wilhelm Sievers (1860-1921), Professor da Universidade de Giessen, com a colaboração de vários outros estudiosos.

„Economicamente, Costa Rica, de 1840 até 1898, foi quase que exclusivamente uma terra de café, uma vez que ainda em 1898, as exportações que atingiram 23,9 milhões de marcos foram e 17,8 de café (74%) e apenas de 3,9 de bananas; desde então, porém, com a queda do preço do café em 1898, a exportação de café caiu em 1901 a menos de 50 por cento. Ao contrário, as bananas, plantadas desde 1880, experimentaram uma porcentagem cada vez maior nas exportações: em 1901 renderam 7,36 milhões de marcos, ou seja 30 por cento das exportações relativamente aos 16 por cento de 1898.“ (Wilhelm Sievers, Süd- und Mittelalmerika, Allgemeine Länderkunde, 2a. ed., Leipzig/Viena: Bibliographisches Institut 1903, 606)

Atualidade da atenção ao cultivo da banana em relações Brasil/Costa Rica

A atualidade de uma retomada da atenção ao cultivo da banana e à sua comercialização em relacões Brasil/Costa Rica decorre da ressonância internacional que, em 2014, causou o interesse de empresários brasileiros na aquisição da empresa norte-americana Chiquita. Esse interesse, manifestado em época em que planejava-se uma fusão desta com a empresa irlandesa Fyffes, teve repercussão internacional, sobretudo pelos seus efeitos na bolsa de Nova York, levando a uma subida de valor de ações da empresa norte-americana.

Essa fusão entre Chiquita e Fyffes -  com Fresh Del Monte e Dole Food as maiores do comércio de bananas do mundo, faria surgir uma empresa de extraordinárias dimensões e poder, assim como também de relevância no comércio de outros produtos, entre outros de melões de abacaxís. Com a fusão, Chiquita-Fyffes tornar-se ia o maior importador de melões dos EUA e o terceiro maior do mundo de abacaxís.

Para além desse significado econômico em contextos globais, esse desenvolvimento teria consequências para o consumo e a vida em muitos países, sendo assim de relevância para estudos culturais do quotidiano.

Com a proposta brasileira, delinou-se nova situação que passou a ser analisada e comentada pela imprensa internacional. A oferta parecia ser mais de interesse para os acionários de Chiquita, por outro, porém, a da fusão Chiquita-Fyffes estrategicamente mais favorável.

O Brasil, até então considerado antes no contexto das críticas sociais e políticas à Chiquita, mostrava-se agora em novo papel, revelando a potência de seus empresários na proposta de aquisição da companhia norte-americana.

Como considerado e divulgado na imprensa, essa potência era derivada do cultivo de um outro fruto, o da laranja. Nessa área, a produtora de frutos Cutrale, conhecida pela produção de suco de laranja, revelava-se como responsável de um terço do mercado mundial.

A proposta brasileira de aquisição de Chiquita estabelece uma nova situação nos debates críticos que desde anos marca a discussão referente às condições de produção e comercialização do produto nas suas relações com a situação de trabalho, humana e com desenvolvimentos políticos na América Latina.

O Brasil assumiria um papel nesse debate que até então tinha sido desempenhado pelos Estados Unidos e assim não isento de ressentimentos de natureza política da crítica a posições e atividades norte-americanas.

Nas observações feitas em 2017 em plantagens na Costa Rica, procurou-se detectar as implicações desse interesse por parte de empresários brasileiros na situação atual in loco.

Auto-consciência e transparência na consideração de problemas em Costa Rica

Bananal Puerto Limon. Foto A.A.Bispo 2017.Copyright

Uma atenção especial foi dada ao conteúdo de explicações transmitida a visitantes por informantes de origem e formação cultural marcadas por relações inter-étnicas e interculturais euro-costariquenses.

Constatou-se que, diferentemente de um peso dado à problemática política que caracterizou o debate na Europa há anos atrás, a atenção concentra-se hoje sobretudo em questões ambientais e das suas implicações para a vida dos trabalhadores.

Essa atitude procura revelar a consciência ambiental no país e corresponde aos esforços governamentais referentes a questões ecológicas e de marcar a imagem do país como um dos mais avançados nesse sentido da América Latina. Ela também manifesta a consciência de que é contraproducente camuflar problemas e processos ambientas questionáveis que o país enfrenta, uma vez que esses são do conhecimento geral e dizem respeito a desenvolvimentos globais. Essa atitude de transparência no apontamento dos problemas signaliza também uma solidariedade com intentos internacionais de defesa do planeta.

Entre os muitos aspectos considerados e apresentados aos observadores externos, salientou-se em primeiro lugar aquele derivado do uso de inseticidas nas plantações. Estes puderam observar em determinadas áreas os trabalhadores que, em curto espaço de tempo, percorrem as fileiras plantadas esborrifando o produto. Apresentando-se aos observadores, de situação elevada, um panorama da grande extensão das plantações, transmite-se a consciência do número extraordinariamente elevado de trabalhadores nessa tarefa.

Para além de questões ambientais como a dos efeitos para outros insetos e para a terra, salientam-se nessas elucidações as consequências para o homem resultantes desse uso intensivo de produtos químicos. Entre êles, lembrou-se da frequência de casos de infertilidade de homens e mulheres, além de outros problemas que os levam a abandonar o trabalho após alguns anos.


Um outro aspecto salientado foi aquele resultante do uso de invólucros para os cachos. Estes, nem todos recolhidos, caem em rios e são levados ao mar, e, pouco deteriorados, representam um risco para peixes e animais. Lembrou-se, em particular, de tartarugas que, engolindo-os, morrem asfixiadas.

Com essa menção às tartarugas, vem-se ao encontro nas explicações a outro aspecto particularmente importante dos esforços ambientais em Costa Rica.

Muitas áreas de suas costas, eram e são procuradas por tartarugas para a desova, mas a coleta de ovos e consumo da carne de tartaruga no passado levou à sua diminuição e mesmo ao risco de extinção de espécies. Essa problemática, que marca a atividade de parques e reservas, em particular no Tortuguero, (Veja) é assim relacionada, nas informações, com aquela da produção e comercialização industrial de bananas nas explanações.


De ciclos de estudos sob a direção de

Antonio Alexandre Bispo


Indicação bibliográfica para citações e referências:
Bispo, A.A. „ Auto-consciência e transparência em solidariedade internacional perante problemas ambientais. Questões de produção e comercialização agrícola no caso da banana de Costa Rica
na atualidade do interesse brasileiro por Chiquita“
. Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 172/14 (2018:2).http://revista.brasil-europa.eu/172/Bananas_de_Costa_Rica_e_Brasil.html


Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2017 by ISMPS e.V.
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501


Academia Brasil-Europa
Organização de Estudos de Processos Culturais em Relações Internacionais (ND 1968)
Instituto de Estudos da Cultura Musical do Espaço de Língua Portuguesa (ISMPS 1985)
reconhecido de utilidade pública na República Federal da Alemanha

Editor: Professor Dr. A.A. Bispo, Universität zu Köln
Direção gerencial: Dr. H. Hülskath, Akademisches Lehrkrankenhaus Bergisch-Gladbach
Corpo administrativo: V. Dreyer, P. Dreyer, M. Hafner, K. Jetz, Th. Nebois, L. Müller,
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