A tragédia da extinção de espécies
ed. A.A.Bispo

Revista

BRASIL-EUROPA 173

Correspondência Euro-Brasileira©

 
Parque Nacional Kruger. Foto A.A.Bispo 2018. Copyright

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Fotos A.A.Bispo 2018©Arquivo A.B.E.

 


N° 173/21 (2018:3)




A tragédia da extinção de espécies no presente como problema cultural e civilizatório
De reservas de caça a parques nacionais no transpasse de limites e de fronteiras
nas suas relações com processos de ocupação e colonização
no exemplo do Parque Nacional Kruger na permeabilidade de suas divisas com Moçambique

Pelos 150 anos de James Stevenson-Hamilton (1867-1957) em 2017

 

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Parque Nacional Kruger. Foto A.A.Bispo 2018. Copyright

Relações e interações entre processos culturais e ambientais constituem escopo de primordial importância nos estudos referenciados segundo o Brasil que vem sendo desenvolvidos nas últimas décadas. (Veja)

No âmbito do programa Cultura/Natureza da A.B.E., esse intuito tem levado à visita de reservas e parques nacionais em países de vários continentes. A observação da situação e das tendências quanto a concepções e ações em diferentes contextos contribui a visões gerais e a reflexões abrangentes no debate de uma problemática que adquire na atualidade dimensões globais. Por último, realizaram-se estudos nesse sentido, em 2017, no Caribe e na América Central. (Veja)

A ultrapassagem de fronteiras nacionais e mesmo continentais impõe-se na análise dessas interações entre desenvolvimentos culturais do homem e o meio ambiente e para o desenvolvimento adequado das reflexões.

A aproximação teórica dos estudos visa porém o tratamento de dimensões ainda mais amplas de problemas considerados sob o binômio Cultura/Natureza,. A concepção condutora tem sido a de cultura como Direitos Humanos realizados e Deveres Humanos cumpridos, compreendidos estes porém no sentido amplo de uma ética de responsabilidade perante a natureza e outros seres viventes. (Veja)

Parque Nacional Kruger. Foto A.A.Bispo 2018. Copyright

Significado da África do Sul para estudos Cultura/Natureza: Parque Nacional Kruger

Parque Nacional Kruger. Foto A.A.Bispo 2018. Copyright
Sob esta perspectiva, a consideração dessa problemática ecológico-cultural no contexto da África do Sul adquire particular relevância, uma vez que nesse país tanto questões relativas a Direitos Humanos como também aquelas voltadas à proteção à natureza e sobretudo à vida animal marcam as preocupações no presente.

Entre as áreas de proteção a animais selvagens da África do Sul e mesmo do continente destaca-se o Parque Nacional Kruger. Esse parque, situado no nordeste do país, limita-se em uma de suas fronteiras com Moçambique, o que o torna particularmente relevante para estudos relacionados com o mundo de língua portuguesa.

Na sua extensão leste-oeste, tem uma largura de 54 quilômetros. A sua extraordinária área de ca. 20.000 quilômetros quadrados vai do rio Crocodile ao sul ao rio Limpopo no norte, na fronteira de Simbabwe. Nessa direção norte-sul, abrange ca. 350 quilômetros.

A consideração do Parque Nacional Kruger - assim como os seus problemas atuais - deve dar atenção a elos e interações com os países vizinhos, exigindo perspectivas multilaterais.

Parque Nacional Kruger. Foto A.A.Bispo 2018. Copyright

Ambivalências: barreiras de proteção, transpassagem de divisas e seus problemas

A ultrapassagem de fronteiras é resultado do próprio comportamento dos animais. Do lado sul-africano, estes migram no período da sêca em direção de áreas povoadas, o que exigiu, o levantamento de cercas, fechando-o relativamente a povoados e áreas rurais.

Essas medidas, tomadas em 1961, podem ser observadas nas delimitações entre a área protegida e aquelas sujeitas a crescentes urbanizações.

Essa expansão da ocupação, que se manifesta ocorrer de forma descontrolada quanto a qualidades de implantação e de construção, traz à consciência problemas que se colocam também em outras regiões do mundo - entre elas também no Brasil - relativamente ao confronto de frentes de expansão e áreas protegidas.

O cercamento do parque, ainda que pensado para protegê-lo, colocou barreiras à migração de animais. Para mitigar essas dificuldades, retiraram-se cercas em algumas áreas que, embora particulares, são de proteção, o que permite que os animais se desloquem para além dos limites do parque.

O levantamento e a retirada de cercas manifesta a ambivalência de procedimentos bem intencionados, uma vez que apresenta também aspectos negativos que se manifestam de forma premente na atualidade e que são lembrados por guias que trabalham no parque.

Esses problemas que se colocam no âmbito interno do país colocam-se de forma muito mais grave na sua parte leste, na fronteira com Moçambique. Também aqui, a intenção de permitir aos animais uma área maior de locomoção levou à retirada de cercas que ali foram implantadas em 1975 e que pretendiam unir o Parque Nacional Kruger com o Parque Nacional Limpopo de Moçambique, criando-se o Great Limpopo Transfrontier Park.

Esse processo teve continuidade em ultrapassagem de fronteiras em décadas mais recentes, em particular com a aglomeração de áreas protegidas de Moçambique (Limpopo) e de Simbabwe (Parque Nacional Gonarezhou). Se, porém, a região transfronteiriça de Simbabwe apresenta  uma situação estável e até mesmo desenvolvimentos favoráveis, aquela de Moçambique é marcada pelas graves incursões de caçadores ilegais.

Parque Nacional Kruger. Foto A.A.Bispo 2018. Copyright

Consequências negativas da supressão de barreiras na fronteira com Moçambique

O procedimento de retirada de barreiras e aquele, também bem intencionado, de se criar uma área extraordinariamente ampla transpassadora de fronteiras nacionais, tem consequências altamente negativas.

A idéia de ultrapassagem de fronteiras levou a uma vulnerabilidade da área protegida, acentuada esta com a abertura de passagens entre os dois países para a facilitação de visitas. Também do lado do Moçambique coloca-se o problema do confronto da área protegidas com aquela de uso agrícola e para moradia.

Procurou-se deslocar o habitat de vários animais selvagens de maior porte, o que nem sempre teve sucesso, de modo que a população animal do parque Limpopo continua restrita e ameaçada.

Como elucidado por funcionários do parque, é devido ao fato de não mais haver cercas nessa fronteira com Moçambique é que caçadores podem penetrar mais facilmente na área protegida e matar animais, causando danos irreparáveis.

Este é o caso sobretudo da cruel caça a rinocerontes para a obtenção de seu chifre, procurado e valorizado em países asiáticos por suas supostas qualidades, e que coloca em eminente perigo de extinção essa espécie.

Segundo as informações de guias do parque, são quase intransponíveis as dificuldades de impedimento dessas incursões de caçadores vindos de Moçambique. Com a retirada de cercas, a área, na sua enorme extensão, ficou vulnerável, não havendo guardas em número suficiente para controlá-la. Além do mais, caçadores que teriam sido soldados ou recebido formação militar em Moçambique saberiam como proceder em região silvestre e utilizar-se de armas.

Tratar-se-ia de um problema que precisaria ser considerado nas suas inserções em desenvolvimentos políticos e sociais de Moçambique das últimas décadas da sua conturbada história pós-colonial.

Em 2011, o govêrno procurou combater essa caça depredatória e sem sentido que leva à extinção dos rinocerontes por meios militares.

Nessas ações, uniram-se unidades do exército, da política e de um Regimento de Inteligência Táctica de Potschfstroom, assim como outras forças especiais militares com o apoio de helicópteros e aparelhos de observação noturna. As ações conseguiram levar à prisão muitos desses caçadores criminosos, foram porém acompanhadas por conflitos armados que levaram a ferimentos e mortes. Essa situação seria explicável pela aptidão no uso de armas pelos caçadores.

Desenvolvimento histórico de reserva de caça a parque nacional

O vir-a-ser histórico do parque insere-se em processos desencadeados na atual África do Sul e que foram marcados por movimentos de ocupação do território, de migrações internas, de colonização e de uma política confrontada com a exploração descontrolada da natureza.

A sua consideração exige assim uma aproximação de natureza histórico-cultural que elucide os desenvolvimentos que levaram à sua implantação em fins do século XIX, as concepções da época e suas transformações no decorrer das décadas.

É a partir desse desenvolvimento histórico que pode-se sitiuar adequadamente o estado do parque no presente, os seus problemas, os procedimentos e a política vigentes e visualizar possivelmente caminhos futuros.

A área protegida do atual parque remonta à criação, em 1898, da Sabie Game Reserve pelo então presidente Paul Kruger (1825-1904). Como essa denominação sugere, o escopo que levou a esse estabelecimento foi primordialmente o da proteção de animais selvagens sob a perspectiva da caça.

Somente no entre-guerras, em 1926, é que se constata uma fundamental mudança de concepções, o que se manifesta no seu reconhecimento como parque nacional e na sua redesignação que perpetua o nome de Paul Kruger.


Inserçoes em processos de ocupação e colonização - os pioneiros bures e o Transvaal

A iniciativa de criação da reserva Sabie foi resultado de movimentos ocupacionais e colonizadores do interior sul-africano do século XIX e que se inscrevem no contexto político-cultural das tensõers entre bures e ingleses.

Sobretudo devido à emancipação de escravos, que levou os agricultores bures a grandes perdas - embora as animosidades entre holandeses e ingleses fossem já de longa data - (Veja), esses migrantes vindos do Cabo e que procuravam regiões para a sua ação livre longe do controle inglês, atingiram também áreas próximas ao atual parque.

Ali se estabelecendo, desenvolveram uma intensa atividade de caça a animais silvestres. Esse procedimento levou a que a população animal nessa região fosse gravemente dizimada, chegando em alguns pontos ao desaparecimento de coletividades ao redor de 1889.

Nessa situação crítica, que colocava em risco a propria atividade de caça, o Parlamento sul-africano decidiu criar áreas de proteção em território de propriedade governamental onde, sendo proibida a caça, a população animalo pudesse se recuperar.

O conceito inicial, portanto, não foi o da proteção animal, mas sim o da preservação de animais a serem caçados.

Em 1894, criou-se a reserva Pongola na fronteira sul da atuação Swasilandia. Caçadores particulares e sociedades de caça requeriam porém a criação de uma reserva protegida a leste do Transvaal. Por fim, em 1898, criou-se a Sabie Game Reserve entre Sabie e o Rio Crocodile sob o govêrno de Paul Kruger, então presidente do Transvaal. Nele apenas se permitia a caça controlada.


Uma personalidade da história do protecionismo: James Stevenson-Hamilton

Apesar da denominação atual do parque, uma personalidade que se destaca na sua história foi James Stevenson-Hamilton, nomeado em 1902 para guarda do parque.

Embora o nome de Paul Kruger seja perpetuado e hoje ainda conhecido internacionalmente com a denominação do parque, a personalidade que merece ser sobretudo lembrada nas preocupações atuais relativas à revisão de atitudes do homem para com os outros seres viventes é a de James Stevenson-Hamilton.

Nascido em Dublin e falecido no Transvaal, a sua trajetória de vida é marcada por uma transformação de perspectivas que o levou da esfera militar àquela da proteção dos animais. Confrontado com a caça depredatória e ilegal, dedicou-se a seu combate. Vê-se sobretudo nesse seu empenho os fundamentos da riqueza da vida animal do atual parque.

A sua atuação no Sabie Game Reserve inscreve-se no período da história política que se seguiu à segunda Guerra dos Bures, em 1902. Como responsável pela vigilância do parque, primeiramente só, sem auxiliares, procurou fazer vigorar medidas que pouco tinham sido concretizadas desde a colocação da área sob proteção, proibindo, de início, a caça no território. Impediu a expansão da pecuária no território e também a procura de terras por parte de companhias de exploração de recursos minerais e de carvão.

Com exemplar coragem enfrentou a oposição de caçadores, de agricultores que procuravam terras, de empresas de mineração e de políticos que defendiam esses interesses.

Com exemplar coragem e determinação organizou um serviço de policiamento eficaz para fazer vigorar a proteção da natureza na área.

O Shingwedzi Game Reserve, criado em 1903, foi agregado ao Sabie e, com outras áreas, formou-se o Parque Nacional Kruger. Este foi aberto já no ano seguinte, em 1927.O interesse nacional e internacional pela vida animal da selva foi rapidamente despertado, passando o parque já em meados da década de 1930 a contar grande número de visitantes.

James Stevenson-Hamilton surge assim como personalidade que pode servir de modêlo na situação atual da trágica destruição do patrimônio natural em vários países do globo, exemplificando o quanto pode mover uma personalidade movida por forte convicção.

Foi, pelas suas qualidades de caráter e pelo seu empenho cognominado pelos nativos na língua Tsonga como Skukuza, com o significado do homem que é capaz de grandes mudanças e que tudo varre. Esse cognome foi perpetuado na denominação do Skukuza Camp que, em 1936 substituiu o de Sabie Bridge.


De ciclo de estudos sob a direção de

Antonio Alexandre Bispo


Indicação bibliográfica para citações e referências:
Bispo, A.A. „ A tragédia da extinção de espécies no presente como problema cultural e civilizatório.
De reservas de caça a parques nacionais no transpasse de limites e de fronteiras nas suas relações com processos de ocupação e colonização no exemplo do Parque Nacional Kruger na permeabilidade de suas divisas com Moçambique-“
. Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 173/21(2018:3).http://revista.brasil-europa.eu/173/Parque_Nacional_Kruger.html


Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2017 by ISMPS e.V.
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501


Academia Brasil-Europa
Organização de Estudos de Processos Culturais em Relações Internacionais (ND 1968)
Instituto de Estudos da Cultura Musical do Espaço de Língua Portuguesa (ISMPS 1985)
reconhecido de utilidade pública na República Federal da Alemanha

Editor: Professor Dr. A.A. Bispo, Universität zu Köln
Direção gerencial: Dr. H. Hülskath, Akademisches Lehrkrankenhaus Bergisch-Gladbach
Corpo administrativo: V. Dreyer, P. Dreyer, M. Hafner, K. Jetz, Th. Nebois, L. Müller,
N. Carvalho, S. Hahne