Doc. N° 2080
Prof. Dr. A. A. Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e curadoria científica © 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1999 by ISMPS e.V. © 2006 nova série by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados - ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501
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Orientalismo e relações África/Brasil Deconstruções de construções do Oriente - crítica do Post-Colonial-Studies e o ultrapassar de fronteiras África do Norte - Atlântico - Mediterrâneo
As relações tragicamente conflitantes entre o mundo islâmico e o ocidental de identificação cristã dominam as atenções da atualidade, motivando e exigindo continuamente reflexões teóricas. O estudo do campo de tensões Oriente/Ocidente faz parte inalienável da tradição na qual se insere a Academia Brasil-Europa, representando aspecto fundamental do pensamento das entidades que a precederam. Nos trabalhos das últimas décadas, o tema tem sempre sido tratado sob diferentes perspectivas, por exemplo como assunto de pesquisas culturais na sessão de Paraty durante o Congresso de Estudos Euro-Brasileiros, em 2002, e, por último, em conferência no Centro Cultural São Paulo, em 2004. As reflexões concernentes ao tema, porém, sobretudo perante a gravidade dos acontecimentos da atualidade, exigem constantes revisões e reconsiderações críticas de abordagens. Por esse motivo, o tema Oriente/Ocidente foi tratado em várias sessões de debates sob a perspectiva dos aportes teóricos de autores do assim-chamado Pós-Colonialismo. Essas discussões serviram de preparação para uma viagem de estudos e contactos ao Norte da África, desta vez ao Marrocos, com a finalidade de dar prosseguimento, sob novas perspectivas, às observações in loco já realizadas no passado em contextos do Islamismo africano, por exemplo na Tunísia e no Egito. Como nos casos anteriores, as observações deveriam ser feitas sob pontos de vista de relevância para estudos de contextos euro-brasileiros. Desta vez, procurou-se dar atenção maior aos aspectos relacionados com a questão da integração de descendentes de antigos escravos provenientes da África não-islâmica na cultura norte-africana. No centro das preocupações estiveram mecanismos e expressões de mudança de identidades causada pela passagem ao islamismo e, assim, procedimentos inerentes à organização simbólica da cultura de cunho islâmico em comparação àquela da esfera cristã. O objetivo seria analisar possíveis pontos comuns no processo da expansão e no contacto com o Outro independentemente da identificação cristã ou maometana, abrindo assim eventuais caminhos teóricos para a superação de impasses. Outro aspecto de particular importância das observações in loco disse respeito à questão das fronteiras culturais e ao ultrapassar de fronteiras, temas de atualidade devido à imigração norte-africana à Europa. Essa problemática pareceu ser de relevância para os estudos euro-brasileiros, uma vez que as barreiras entre a esfera islâmica e a cristã, tanto na área do Mediterrâneo como naquela das ilhas atlânticas - de costas para o mundo maometano - determinam a perspectiva histórica e o espaço geográfico das considerações interculturais nos estudos relacionados com o Brasil. Uma possível superação dessas barreiras através de mudança de paradigmas promete novos caminhos para a análise do passado e para a cooperação intelectual no presente. As discussões dos aportes do Post-Colonial Studies partiu do Orientalism (1978) de Edward Said. Nesse estudo, o problema é colocado de forma diferenciada daquela que marcou no passado os debates a respeito do campo de forças Oriente/Ocidente, determinado pela atenção dada à tradição filosófica, teológica e simbólica relacionada com o Leste e o Oeste nas concepções e que leva à Antiguidade e à Idade Média. Agora, o centro de atenções é dirigido sobretudo ao Orientalismo como conceito de conotações negativas (ismo), como fenômeno relativamente recente dos últimos séculos e visto como meio de construção de um Oriente como o "Outro" a serviço de um projeto identificatório de países europeus no contexto do imperialismo sobretudo dos séculos XIX e XX. Orientalismo surge nessa perspectiva como expressão de um conjunto de convicções que se manifesta nos discursos de representação do Oriente em seu próprio nome, uma vez que teriam sido baseados em traduções e estudos calcados em traduções e em autores do Oriente. Segundo essa perspectiva, marcada pelo atenção a questões de poder e de discurso de M. Foucault, poder-se-ia dizer que a modificação da situação conflitante da atualidade exigiria esforços de deconstrução de um edifício de concepções e convicções. Os estudos euro-brasileiros poderiam aqui oferecer subsídios e abrir caminhos, uma vez que, como discutido em eventos anteriores, revelam em expressões culturais transmitidas pela tradiçao no Brasil a vigência de sistemas simbólicos e de concepções a eles inerentes provenientes de processos históricos anteriores àqueles da expansão imperial européia do século XIX. Eles exigem não apenas que se retroceda as reflexões para a época da expansão européia no período dos Descobrimentos; levam obrigatoriamente à consideração de um sistema de concepções e convicções já existente na Idade Média. As análises aqui desenvolvidas mostram a necessidade de um desenvolvimento maior e revisão crítica da argumentação de Said. O problema da construção do Outro com conotações negativas não seria apenas um fenômeno do Ocidente ou até mesmo recíproco, mas sim um problema inerente ao conjunto de concepções vigentes tanto no Cristianismo quanto no Islamismo e que atuaria segundo mecanismos similares de formação de identidades e de desvalorização do Homem externo ao respectivo sistema. Por essa razão, as observações in loco deveriam ser dirigidas às expressões culturais de descendentes de africanos de regiões não-islâmicas (negro-africanos) na cultura marroquina à luz da discussão atual e dos conhecimentos ganhos em análises de expressões culturais cultivadas sobretudo por descendentes de indígenas e africanos no Brasil. Os resultados dos trabalhos e das reflexões deverão ser publicados.
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