Doc. N° 2167
Prof. Dr. A. A. Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e curadoria científica © 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1999 by ISMPS e.V. © 2006 nova série by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados - ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501
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Simplicidade nobre e grandeza silenciosa Museu-Casa de Winckelmann Estudos de Winckelmann sob perspectiva intercultural Visita ao Museu Winckelmann, Stendal, da A.B.E.
Em ano de comemorações de J. W. von Goethe (1749-1832), motivadas pela passagem dos 175 anos de seu falecimento, surge como oportuno que os estudiosos da cultura dirijam a sua atenção também a Johann Joachim Winckelmann (1717-1768), nascido há 290 anos.
O próprio Goethe denominou o século XVIII de "Século Winckelmann" em título de uma edição de escritos do grande erudito (Winckelmann und sein Jahrhundert, 1806).
Nascido em Stendal, a 9 de dezembro de 1717, e assassinado em Trieste, em 8 de junho de 1768, Winckelmann recebeu os fundamentos de sua erudição clássica na sua cidade natal e durante a sua atividade como bibliotecário do conde Bünau, em Nöthnitz, próximo de Dresden, onde atuou entre 1748 e 1754. Na atmosfera católica e de influência cultural romana de Dresden, Winckelmann converteu-se ao catolicismo em 1754 e dirigiu-se à Roma com uma bolsa do rei da Saxônia. A carreira brilhante de Winckelmann em Roma deu-se sob a proteção de cardeais de conhecimentos e interesses culturais e artísticos. Em 1757/1758, foi bibliotecário do Cardeal-Secretário Archinto, e, a partir de 1758, do Cardeal Albani. Em 1763, tornou-se diretor das Antigüidades e scriptor da Biblioteca Vaticana. Nessas atividades, e com a liberdade que seus superiores lhe concediam, teve a oportunidade de realizar estudos pormenorizados dos monumentos e das obras de arte de várias cidades italianas, sobretudo em Roma, Florença e Nápoles.
A sua morte violenta, assassinado que foi em circunstâncias obscuras durante uma viagem, deu motivos a especulações várias e a tratamento em romances e novelas.
A edição completa de sua obra já foi encetada no século XIX, tendo-se publicado 8 volumes entre 1808-20, e 12 volumes e um volume com ilustrações, entre 1825 e 1829. Entre as suas principais obras, devem ser salientadas: Pensamentos sobre a imitação das obras gregas (1755); Missiva sobre as descobertas em Herculano (1762); Notas sobre a arte de construção do antigo templo de Girgenti na Sicília (1762); Novas notícias das mais recentes descobertas herculanas (1764) e Monumentos antigos inéditos, 2 vols. (1767). Na sua cidade natal, Stendal, a sua memória é mantida viva e cultuada, estando sempre presente em monumentos, no nome de instituições, em particular na do ginásio local, em edifícios de sua época, tal como a escola onde realizou os seus primeiros estudos e, sobretudo, na casa em que nasceu. Nesta, a sociedade que leva o seu nome, e que se dedica à edição científica de sua obra, mantém um museu especializado, fundado em 1955. Esse centro de estudos de Winckelmann, único no gênero, conserva primeiras edições e edições raras de suas publicações, manuscritos, retratos seus e de seus contemporâneos, gravuras da Itália de sua época, uma coleção de camafeus e de obras esculturais em cópias, de vasos e outros objetos representativos dos estudos da Antigüidade do século XVIII. Além da apresentação constante desses materiais, o museu promove eventos especiais, cursos, conferências e atividades de intenções pedagógicas.
O museu oferece subsídios fundamentais para estudos da personalidade e da obra de Winckelmann, também para a sua consideração sob perspectivas mais atualizadas das ciências culturais. Logo de entrada apresenta, por exemplo, móveis e artefatos que evocam o ofício de sapateiro no passado, sugerindo ao estudioso que não deve esquecer das origens modestas do grande pensador e dos possíveis elos do ideal clássico com anseios de ascenção intelectual e social. A seguir, o museu oferece uma coleção única de publicações originais e manuscritos referentes aos estudos da Antigüidade clássica à época da formação de Winckelmann. Essa documentação comprova de forma expressiva o extraordinário interesse pelos autores antigos e pela mitologia grega no Norte da Alemanha em fins do século XVII e início do XVIII, assim como a importância dada aos estudos clássicos nas escolas e ginásios locais.
As comemorações do corrente ano dão ensejo para que se tematize sobretudo o significado de Winckelmann para uma história da cultura e da ciência sob a perspectiva de relações internacionais e interculturais. O próprio Winckelmann foi um homem que, na sua existência, transpassou fronteiras culturais e confessionais, e, no seu trabalho e concepções, limites de tempo e épocas.
Cumpre, sobretudo, indagar o significado de Winckelmann sob a perspectiva da irradiação de seu pensamento fora das fronteiras européias e, sobretudo, de sua possível atualidade no debate teórico-cultural. Assim como no "Ano Mozart 2006" tematizou-se a questão da recepção e da presença do compositor nas várias partes do mundo, nos seus vários aspectos teórico-culturais, pareceu ser conveniente, no ano 2007, motivar debates relativos à projeção extra-européia do pensamento de Winckelmann e a produtividade de reflexões sobre a transcedência e a relevância dos impulsos que partem de sua obra. Nesse sentido, procurou-se retomar discussões encetadas em eventos anteriores da A.B.E., iniciadas já na primeira metade da década de 80. Entre êles, em 1991, tratou-se do Clássico e do Classicismo nos seus significados para os povos latinos do sul da Europa e de suas repercussões no continente americano.
Winckelmann foi e é freqüentemente apontado como o pai da Arqueologia clássica e mesmo da História da Arte como disciplina especializada. Entretanto, apesar de todo reconhecimento pelo seu significado histórico, tem-se criticado, já há muito, várias de suas posições e perspectivas, em particular àquelas relativas ao ideal clássico e à interpretação da Antigüidade grega. Sobretudo as suas convicções relativas à filosofia das artes, à estética e ao relacionamento entre conceitos de beleza, de natureza e de imitação foram apontadas como expressão de tradições de pensamento já superadas. Hoje, sob a perspectiva de uma reorientação culturológica das ciências humanas, também da história da arte, tais argumentos críticos de um passado recente necessitam eles próprios serem revistos. A reavalização da obra de Winckelmann sob novos paradigmas trazem de novo à consciência o papel extraordinário desse erudito para a história cultural e para o debate teórico.
Os debates deverão ter prosseguimento.
A.A.B.
Observação: o texto aqui publicado oferece apenas um relato suscinto de trabalhos. Não tendo o cunho de estudo ou ensaio, não inclui notas e citações bibliográficas. O seu escopo deve ser considerado no contexto geral deste número da revista. Pede-se ao leitor que se oriente segundo o índice desta edição (acesso acima).