Doc. N° 2233
Prof. Dr. A. A. Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e curadoria científica © 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1999 by ISMPS e.V. © 2006 nova série by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados - ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501
108 - 2007/4
Tópicos multilaterais Alemanha-Brasil
Prioridade da Natureza na teoria histórico-genética da cultura e teoria da cultura de orientação ambiental: diferenças
Petersberg. Trabalhos da A.B.E. 2007
A.A.Bispo
Petersberg, Königswinter, perto de Bonn, Alemanha. Fotos ABE 2007 O Petersberg, uma das montanhas do Siebengebirge, na cidade de Königswinter, próximo a Bonn, antiga capital da Alemanha, é um local com privilegiadas características paisagísticas, oferecendo, a uma altura de 331 metros acima do nível do mar, uma ampla vista da região cortada pelo rio Reno. A história do Petersberg remonta a tempos imemoriais, e a pesquisa arqueológica encontrou materiais que indicam que a região já era habitada há 3500 anos a.C. e que os celtas ali edificaram fortificações ao redor do ano 100 a.C. Na primeira metade do século XII, um eremita, de nome Walter, ali se estabeleceu. Religiosos da comunidade dos capitulares Agostinhos o seguiram, construindo uma ermida e uma igreja de devoção mariana (1136), hoje não mais existente. A partir de 1189, os edifícios foram ocupados por monges cistercienses provindos da Abadia Himmerod. A igreja foi dedicada a São Pedro, determinando a designação do local. Em documento de 1312 já surge como igreja de romaria. Esse significado de local de peregrinação manteve-se através dos séculos. Atualmente, há na montanha uma capela barroca, construída em 1763 pelo abade do mosteiro de Heisterbach, ali próximo. No decorrer do século XIX, o local assumiu um significado mais secular e cultural, transformando-se num marco do romantismo. Adquirido por pariculares de tradicional família da região, que ali construíram uma residência, foi procurado por escritores e pensadores, tais como E.M. Arndt e A.W. Schlegel. Em fins do século, construiu-se ali um hotel em estilo historista, inaugurado em 1892. O renome internacional alcançado pelo Petersberg após a Segunda Guerra Mundial deu-se pelo fato de ali terem-se realizado conferências e encontros de alto significado histórico-político e diplomático. Foi sede da Alta Comissão dos Aliados, quando se discutiu o "trato de Petersberg", apresentado pelos comissários aliados ao Chanceler Konrad Adenauer. Nos anos 50 e 60, o govêrno alemão hospedou no hotel convidados e visitantes oficiais e, em 1978, adquiriu-o, transformando-o em "Casa de convidados dos órgãos constitucionais da República Federal da Alemanha." Ali se hospedaram vários chefes de estado e se realizaram várias conferências internacionais.
O Petersberg adquiriu, assim, uma imagem marcada por intuitos, díalogos e eventos voltados às relações internacionais e à compreensão entre as culturas.
Estudos euro-brasileiros e a Natureza nos estudos teórico-culturais
O Petersberg foi visitado várias vezes no âmbito das atividades da Academia Brasil-Europa e dos institutos a ela integrados. Foi procurado para troca de idéias e reflexões antes e durante a realização de projetos e eventos ou por ocasião de visitas de estudiosos brasileiros e portugueses à Europa. A posição sobranceira do edifício e de seus terraços, possibilitando uma ampla visão, foi sempre sentida como propícia à abertura dos pensamentos e perspectivas, ao estabelecimento de panoramas amplos, ao reconhecimento de linhas gerais dos assuntos tratados, à superação de particularismos ou de pontos de vista estreitos. Esse significado - não só metafórico - dos pontos elevados, dos cumes e das montanhas para novas aberturas do pensamento e revisões de posições e idéias foi particularmente tematizado em 2006 e 2007 (veja, a respeito, os relatos referentes ao tópico Harz-Caparaó e ao escrito "O Granito" de W. Goethe no número anterior desta revista).
Nesse sentido, procurou-se novamente o Petersberg para marcar as reflexões interculturais concernentes à prioridade da Natureza na teoria da cultura. Por um lado, partiu-se do ponto de vista que o estudo desse tema não pode ser realizado sob perspectivas exclusivamente nacionais, exigindo a consideração de colocações, propostas e resultados de exames e pesquisas de estudiosos dos diversos países e de diferentes rêdes de relacionamento científico-cultural.
A orientação intercultural deveria marcar os intuitos e os esforços de elucidação e estabelecimeno de teorias, evitando-se posicionamentos etnocêntricos - também eurocêntricos -, ainda que inconscientes, determinados pela própria formação e inserção cultural dos estudiosos.
De outro lado, partiu-se do ponto de vista de que a sensação experimentada nas alturas facilita psicologicamente a tomada de consciência da constante possibilidade de revisões de teorias com a elevação do ponto de observação e do nível de reflexão, evitando-se pretensões e convicções de descoberta definitiva de teorias esclarecedoras. Essa necessidade de procura constante de focalizações possivelmente mais adequadas de problemas e de formulações teóricas, de tomada de posições mais altas, que permitam visões mais amplas, e de aguçamento da auto-crítica de estudiosos por demais convencidos de suas proposições teóricas impõe-se de modo especial com relação ao complexo temático "prioridade da natureza e teoria da cultura". Aqui corre-se o perigo de que um uso inadequado ou reduzido de conceitos e termos, e um enfoque por demais condicionado por modos de pensar e perspectivas disciplinares e seu desenvolvimento histórico-social em determinados contextos das relações intelectuais e científicas contribuam ou fundamentem ações práticas de questionáveis conseqüências. Para a discussão desse problema escolheu-se uma obra recente que tematiza a prioridade da natureza na teoria da cultura, propondo uma teoria histórico-genética. Essa obra entende-se como contribuição a uma lógica processual na mudança cultural: Günter Dux. Historisch-genetische Theorie der Kultur. Instabile Welten. Zur prozessualen Logik im kulturellen Wandel. Weilerswist: Velbrück Wissenschaft, 2000. O autor, Professor de Sociologia na Universidade de Freiburg, vem contribuindo à reflexão teórica através de numerosos textos. Na sua argumentação, resultados de observações realizadas no Brasil - entre os Macu, na Amazônia - desempenham papel significativo. A A.B.E. propôs-se a encetar reflexões acerca dos vários aspectos do pensamento e das proposições do autor sob a perspectiva dos estudos teóricos em contextos interculturais e em função dos trabalhos já desenvolvidos no âmbito do seu projeto "Cultura e Natureza".
Alguns aspectos dessas reflexões são considerados sumariamente em relatos publicados nesta edição.
Observação: o texto aqui publicado oferece apenas um relato suscinto de trabalhos. Não tendo o cunho de estudo ou ensaio, não inclui notas e citações bibliográficas. O seu escopo deve ser considerado no contexto geral deste número da revista. Pede-se ao leitor que se oriente segundo o índice desta edição (acesso acima).