Doc. N° 2280
Prof. Dr. A. A. Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e curadoria científica © 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1999 by ISMPS e.V. © 2006 nova série by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados - ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501
111 - 2008/1
A Universidade de Coimbra e as Ciências Musicais
Maria do Amparo Carvas Monteiro [1]
D. João III. Universidade de Coimbra
Considerações gerais
O ensino oficial universitário da Música existe comprovadamente na universidade portuguesa desde 1323 e, possivelmente, desde a sua fundação. Com a transferência definitiva do Estudo Geral para Coimbra (1537), a Música foi leccionada desde 1544, a partir da reforma operada por D. João III, colhendo nas raízes do quadrivium medieval, bem como no culto da Capela Real e no quotidiano da Corte, o impulso necessário para se manter na nova estrutura universitária de Quinhentos e nela se mantém até à actualidade.[2] Em função dos novos tempos, houve que adaptar-se logo após a implantação da República, debatendo-se entre o reconhecimento do seu valor formativo e a rejeição da sua ligação à Capela da Universidade, enquanto a vetusta instituição que o acolhia passava a concorrer com as então recém-criadas Universidades de Lisboa e do Porto.[3] Em 1919,[4] foi oficializada a prática musical «dos orfeões académicos»[5] e a «investigação e estudo das canções nacionais» e sua adaptação ao ensino, circunstâncias que levaram a que a presença da Música se mantivesse na Universidade. A antiga cadeira de Música deu lugar à leccionação da cadeira de História da Música. Em 1930, foi aprovada a lei orgânica das Faculdades de Letras,[6] que, no seu artigo 41º atribuía ao professor da cadeira anexa de História da Música a direcção do Orfeão Académico da respectiva Universidade. Neste contexto está inserida a regência de Elias de Aguiar, até ao seu falecimento em 13 de Março de 1936, ficando então vago o lugar de professor da cadeira de História da Música. Porém, não sendo possível provê-lo de imediato, foi encontrada, ainda em 1936,[7] uma solução temporária que abrangeu a regência do Orfeon e da Tuna em simultâneo, por um maestro contratado pela Faculdade de Letras, mas que não leccionava a cadeira, embora fosse remunerado pela verba destinada ao docente. A leccionação foi retomada no ano lectivo de 1960-1961, permanecendo até 2001-2002, apenas com o intervalo correspondente ao ano lectivo de 1992-1993, durante o qual decorreu o concurso para provimento de novo assistente. Todavia os docentes que leccionaram após 1960, já não regeram o Orfeon nem a Tuna. A Universidade de Coimbra, através da sua Faculdade de Letras, alargou o ensino das Ciências Musicais, através da criação do Mestrado e do Doutoramento nesta especialidade, bem como da cadeira opcional de História da Música Portuguesa[8] (de existência efémera e inconsistente) e, mais recentemente, da Licenciatura em Estudos Artísticos.
A primeira licenciatura em Ciências Musicais em Portugal
A continuação do alargamento da rede de estabelecimentos do ensino superior ocorrida em 1973 veio trazer novos horizontes ao ensino da Música em Portugal, o qual era então quase exclusivamente ministrado nos Conservatórios de Música. O Decreto-Lei nº 402/73 de 11 de Agosto veio continuar aquele alargamento,[9] criando, entre outros estabelecimentos de ensino superior público, a Universidade Nova de Lisboa, a Universidade de Aveiro, a Universidade do Minho e o Instituto Universitário de Évora, mais tarde Universidade de Évora (art. 8º). Nestas instituições, a Música tem hoje um lugar de particular destaque. Para além daquelas quatro instituições universitárias, o mesmo Decreto-Lei criou também dez Institutos Politécnicos, entre os quais o de Coimbra, onde o ensino da Música assume crescente importância, sendo ministrada na sua Escola Superior de Educação desde 1988, a alunos de diversas licenciaturas, para além da Licenciatura de Professores do Ensino Básico - Variante de Educação Musical (modelo onde a formação específica para o 2º ciclo se efectuava a par com a formação de professor generalista do 1º ciclo), a qual veio a encerrar dando lugar, em 1997 (através da Portaria nº 158/97, de 4 de Março) a um curso específico na área das Ciências Musicais, licenciatura de Professores de Educação Musical do Ensino Básico (curso que oferece formação para os três ciclos do Ensino Básico, contrariamente ao modelo de Variante). Este curso, após aprovação da adequação em conformidade com o Processo de Bolonha do 1º Ciclo de estudos conducente ao grau de licenciado, passou a designar-se licenciatura em Música com a duração de seis semestres correspondentes a 180 créditos (ECTS) e entra em vigor no ano lectivo de 2007-2008. Coube, porém, à Universidade Nova de Lisboa ser pioneira no estudo das Ciências Musicais em Portugal. Neste contexto, sobressai a acção da Doutora Maria Augusta Alves Barbosa, a cujo empenho se deve a criação da licenciatura em Ciências Musicais na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas daquela universidade.[10] As habilitações de acesso e o plano de estudos da nova licenciatura foram aprovados pela Portaria nº 804/80 de 9 de Outubro. Assim, o acesso estava condicionado, cumulativamente aos seguintes requisitos: - 12º ano de escolaridade ou ano propedêutico; - aprovação num dos seguintes cursos dos Conservatórios ou legalmente equivalente:
Curso Geral de Piano; Curso de Órgão; Curso de Harpa ; Curso Geral de Violino; Curso de Violeta; Curso Geral de Violoncelo; Curso de Contrabaixo; Curso de Flauta e Oitavino; Curso de Oboé e Corne Inglês; Curso de Fagote e Contrafagote; Curso de Clarinete, Clarinete Baixo e Saxofone; Curso de Cornetim e Clarim de Pistões; Curso de Trompa e Saxe-Trompa; Curso de Trombone de Varas e Trombone de Pistões; Curso de Tuba; Curso Geral de Canto; Curso Geral de Composição
Por outro lado e para efeitos de acesso, poderiam ser conferidas equivalências a cursos estrangeiros de nível semelhante aos dos nossos Conservatórios, ou adicionados outros que estes viessem a criar. Além disso, a inscrição nas disciplinas de Grandes Correntes da História da Música I (Antiguidade, Idade Média e Renascimento), Paleografia Musical I (Notação Vocal) e História da Teoria Musical I, estava dependente da aprovação da disciplina de Latim do Curso Complementar dos Liceus ou equivalente. A licenciatura tinha então o seguinte plano de estudos, publicado em anexo àquela portaria:
Este plano curricular sofreu sucessivas alterações entre 1983 e 1985.[11] No ano seguinte, a licenciatura foi reestruturada através da Portaria nº 660/86, de 6 de Novembro, sendo aprovado um novo plano e regime de estudos. Como notas principais, sobressaem neste diploma o novo plano de estudos adequado às opções de Animação Musical, Musicologia e Pedagogia Musical em que a licenciatura passou a desdobrar-se nos 3º e 4º anos curriculares, bem como as condições de acesso ao curso, que, para além do preenchimento dos requisitos gerais legalmente previstos, compreendem a aprovação em exames de Acústica, Composição (Harmonia e Contraponto), Formação Auditiva, História da Música e Piano. A licenciatura foi novamente reestruturada pelo Despacho R/Sac./27/96, de 9 de Julho de 1996, publicado no Diário da República, nº 192, II Série, de 20 de Agosto de 1996. No ano imediato, foi publicado novo Regulamento desta licenciatura em Suplemento ao Diário da República nº 29, II Série, de 4 de Fevereiro de 1997,[12] modificado através da Rectificação nº 491/97, publicada no Diário da República nº 160, II Série, de 14 de Julho do mesmo ano. O Despacho nº 15 731/2002 (2ª Série), publicado no Diário da República nº 157, de 10 de Julho de 2002, que procedeu à reestruturação dos cursos de licenciatura leccionados na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa foi igualmente alterado com a adequação a Bolonha no ano 2006-07. Existe nesta Faculdade o curso de mestrado em Ciências Musicais, regulado pelo Despacho nº 16 021/99 (2ª Série), publicado no Diário da República nº 192 , II Série, de 18 de Agosto de 1999, que prevê três áreas de especialização Histórica, Etnomusicológica e Músico-Pedagógica.[13] No ano lectivo 2002-2004, abriu um mestrado em Artes Musicais, com as áreas de especialização de Interpretação instrumental (Domínio Instrumentos Ibéricos de Tecla) e de Composição. Na mesma Faculdade, o doutoramento em Ciências Musicais encontra-se previsto no Despacho R/Sac./7/94, de 25 de Fevereiro de 1994, publicado no Diário da República nº 56, II Série, de 8 de Março do mesmo ano,[14] (que enumera os diversos ramos, especialidades e disciplinas afins do grau de doutor que aquela confere), nas especialidades de Ciências Musicais-Históricas e Ciências Musicais-Etnomusicologia. A sua regulamentação foi efectuada através do Despacho nº 4579/97 (2ª Série), publicado no Diário da República nº 168, de 23 de Julho de 1997. É de referir que, no presente momento, todos os cursos (do 1º ao 3º ciclos de estudos) sofreram as reestruturações de acordo com Bolonha.
Os 1ºs. Cursos Internacionais de Música Portuguesa e a Universidade de Coimbra
Depois da experiência pioneira da Universidade Nova de Lisboa, o ensino da Música ao nível universitário vem atravessando um período de crescente desenvolvimento onde sobressaem, para além daquela escola, as Universidades de Aveiro e recentemente, de Évora. Em 1985, antecedendo a criação formal de qualquer curso de licenciatura ou de pós-graduação na área das Ciências Musicais, a Universidade de Coimbra, não ficando alheia à comemoração do Ano Europeu da Música que então decorria, manifestou o seu apoio, através do patrocínio dos 1.ºs Cursos Internacionais de Música Portuguesa que tiveram lugar nesta Universidade e no Palácio de S. Marcos, de 15 a 24 de Julho (curso A) e de 27 de Julho a 7 de Agosto desse ano (curso B), organizados e dirigidos por Gerhard Doderer.
Paralelamente aos cursos, com as modalidades vocal e instrumental, voltados para o estudo da música portuguesa dos séculos XVI a XIX, a iniciativa englobou diversas conferências, seminários e concertos no referido Palácio de S. Marcos, no Auditório da Reitoria, na Biblioteca Joanina e na Capela da Universidade, bem como uma exposição bibliográfica na Biblioteca Geral da Universidade que pôs em evidência o acervo de manuscritos musicais dos séculos XVI a XVIII nela existente.[15] O êxito do evento levou à realização dos 2.ºs Cursos Internacionais de Música Portuguesa, no ano imediato, de 21 de Julho a 2 de Agosto.
Mestrado em Ciências Musicais
No seguimento destes dois Cursos, ocorreu a criação de um curso de Mestrado em Ciências Musicais na Faculdade de Letras. Este veio permitir o alargamento da formação de licenciados na especialidade e de licenciados em outros ramos cumulativamente diplomados em estudos superiores em Música, possibilitando uma formação especializada, com vista a uma preparação para o exercício de cargos que requerem conhecimentos mais amplos em matéria de cultura musical: Universidades, Escolas Superiores de Educação com função educativa extensiva à formação dos professores dos ensinos infantil, básico e secundário , bibliotecas, arquivos e museus e outros. Por outro lado, este mestrado possibilitou, através da sua componente de investigação, o estudo e a divulgação de documentação relacionada com esta temática existente em bibliotecas e arquivos (designadamente na cidade de Coimbra), do património histórico-artístico-musical, da iconografia musical, bem como dos costumes e tradições musicais que devem ser estudados à luz da etnomusicologia. Tendo a Universidade Nova de Lisboa criado a primeira licenciatura na especialidade, foi porém a Universidade de Coimbra quem criou o primeiro mestrado. A atribuição do grau do mestre veio colmatar uma sentida necessidade de desenvolvimento da capacidade de investigação científica e do aprofundamento, em domínios mais restritos e especializados, dos conhecimentos adquiridos em estudos de licenciatura e de cursos superiores em Música. Assim, a Portaria nº 447/86 de 16 de Agosto de 1986, criou na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra o Curso de Mestrado em Ciências Musicais, com as áreas científicas de Música e Cultura em Portugal, Música Europeia, Latim Litúrgico Medieval e Paleografia Medieval, organizado pelo sistema de unidades de crédito e com a duração curricular de dois anos lectivos, seguidos do período de preparação da dissertação, que podia alongar-se por mais três anos. Aquela portaria regulou também as condições de acesso, os critérios de selecção e a sujeição a limitações quantitativas (numerus clausus), para além de outros aspectos gerais de funcionamento do mestrado. Salienta-se, no que respeita às condições de acesso, a obrigatoriedade da titularidade cumulativa das seguintes habilitações: a) Qualquer licenciatura obtida em universidades portuguesas, com a classificação mínima de catorze valores (ou, excepcionalmente, com adequada preparação científica curricularmente demonstrada, embora com classificação inferior a catorze valores). b) Um dos cursos regulados pelo Decreto nº 18.881, de 25 de Setembro de 1930:
Curso Superior de Canto; Curso de Órgão; Curso Superior de Piano; Curso de Harpa; Curso Superior de Violino; Curso de Violeta; Curso Superior de Violoncelo; Curso de Contrabaixo; Curso Superior de Composição Curso de Flauta de Oitavino; Curso de Oboé e Corne Inglês; Curso de Fagote e Contrafagote; Curso de Clarinete, Clarinete Baixo e Saxofone; Curso de Cornetim e Clarim de Pistões; Curso de Trompa e Saxe-Trompa; Curso de Trombone de Varas e Trombone; Curso de Tuba
A Portaria nº 622/87, de 18 de Julho, juntou à lista dos cursos regulados pelo Decreto nº 18.881, de 25 de Setembro de 1930, três cursos regulados pela Portaria nº 877/85, de 19 de Novembro: Canto Gregoriano, Direcção Coral e Órgão. A parte curricular do primeiro curso de Mestrado em Ciências Musicais decorreu nos anos lectivos de 1987-1989, e a do segundo curso, de 1989-1991. Referimos concretamente o segundo curso de Mestrado, pelo facto de ter sido dele que saíram os primeiros doze mestres em Ciências Musicais, na nossa Universidade e no país, nos meses de Novembro e Dezembro de 1992. Gerhard Doderer que, como dissemos, havia organizado e dirigido os 1ºs. Cursos Internacionais de Música Portuguesa, foi também o impulsor deste curso de Mestrado e seu coordenador até 1993. Cabem aqui palavras de reconhecimento aos professores catedráticos Maria Helena Rocha Pereira e Aníbal Pinto de Castro, da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, que se empenharam profundamente no processo da criação do novo Mestrado. A Portaria nº 447/86 de 16 de Agosto, alterada pela Portaria nº 622/87, de 18 de Julho sofreu nova alteração pelo despacho reitoral nº 39/96, publicado em 2 de Janeiro de 1997,[16] sendo esta a primeira grande reestruturação do mestrado. Dela se salientam a diminuição do grau de exigência das habilitações de acesso, a adição de um seminário preparatório da dissertação de mestrado e a redução da duração do curso. Com efeito, no que respeita às habilitações de acesso, a exigência adicional da titularidade de um dos cursos regulados pelo Decreto nº 18.881 de 25 de Setembro de 1930, foi substituída pela exigência de diploma de um curso complementar das Escolas de Música de Lisboa e do Porto (8º grau) ou de quaisquer outras escolas ou academias de música, de cariz privado ou cooperativo, cujos diplomas conclusivos o Ministério da Educação tenha reconhecido como sendo equivalentes aos das Escolas de Música de Lisboa ou do Porto.[17] O Despacho 39/96 acrescentou às quatro áreas científicas previstas na Portaria nº 622/87 (Música e Cultura em Portugal, Música Europeia, Latim Litúrgico Medieval e Paleografia Medieval) um «Seminário (preparatório da dissertação de mestrado)». O mesmo despacho, embora mantendo formalmente a duração normal do curso de dois anos lectivos, determinou que o segundo ano «será consagrado à elaboração da dissertação» (paralelamente à leccionação da área científica de Latim Litúrgico Medieval), colocando a elaboração da dissertação dentro dos dois referidos anos lectivos.[18] No início do ano 2000, a estrutura e funcionamento do mestrado foram novamente modificados. O Despacho Reitoral nº 3998/2000 (2ª série), de 3 de Janeiro de 2000, publicado no Diário da República nº 41, II Série, de 18 de Fevereiro do mesmo ano, repôs as quatro áreas científicas iniciais, passando o «Latim Litúrgico Medieval» a designar-se somente «Latim Litúrgico».[19] A duração normal do curso continuou formalmente mantida em dois anos lectivos. Porém, segundo aquele despacho, «o 2º ano será consagrado à elaboração da dissertação», dedicando-se apenas o 1º ano à leccionação da matéria das quatro áreas científicas[20] A partir de 1993, a coordenação do mestrado passou às mãos de Maria Augusta Alves Barbosa e, em 2002, para José Maria Pedrosa Cardoso,[21] vindo a ser encerrado. Para além dos três referidos coordenadores, leccionaram também neste mestrado: Maria José Azevedo Santos, Maria Helena da Cruz Coelho, José Geraldes Freire, Sebastião Tavares de Pinho, Carlos Manuel Ascenso André, Aires Rodeia Pereira, Maria de São José Soeiro e Luísa Cymbron. Em resultado deste mestrado, foram produzidas até ao ano de 2002, trinta dissertações, das quais treze apresentadas e defendidas em 1992 (doze do 2º Curso de Mestrado e uma do 1º Curso), uma em 1993, duas em 1994, três em 1996, duas em 1997 e uma em 1998, seis no ano de 2001, duas no 1º semestre do ano de 2002. Até 2005 contam-se mais doze novos mestres.
Doutoramento em Ciências Musicais
A Universidade de Coimbra, «sob proposta da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, e pela deliberação do Senado 5/97, de 8-1-97», deu continuidade aos estudos pós-graduados na área de Ciências Musicais, aprovando o conjunto de áreas e especialidades nas quais «confere o grau de Doutor em Letras».[22] Estas áreas e especialidades estão publicadas no Despacho 2/97, publicado no Diário da República, nº 53, II Série, de 4 de Março desse ano, onde figura a concessão do grau de doutor em Letras, na área de Ciências Musicais e nas especialidades de Ciências Musicais Históricas, Ciências Musicais Sistemáticas e Ciências Musicais Etnológicas.
A Licenciatura em Estudos Artísticos
A Universidade de Coimbra não possui, ainda hoje, uma licenciatura na área específica de Ciências Musicais. Todavia, o Despacho nº 18594/2002 (2ª Série) de 22 de Julho de 2002,[23] criou na Faculdade de Letras desta Universidade, a Licenciatura em Estudos Artísticos, com um tronco comum de quatro semestres, desdobrando-se a partir do 5º semestre, em três especializações: Música, Teatro e Cinema. Segundo aquele despacho, a «introdução da área dos Estudos Artísticos nos curricula da Universidade de Coimbra constitui uma velha aspiração, repetidamente manifestada, de [ ] grupos e de diversas entidades de relevo na vida cultural da cidade e da região».[24] O despacho regulou também as condições de acesso, os critérios de selecção, a sujeição a numerus clausus, a organização dos planos de estudos (o comum e o inerente a cada especialização), para além de aspectos gerais de funcionamento. Como pré-requisito para os candidatos à especialização em Música, era exigida, após a conclusão do tronco comum (1º e 2º anos), a apresentação de um certificado de um curso complementar de Música, ou a submissão a provas de aptidão de conhecimentos musicais equivalentes. O plano de estudo do tronco comum da licenciatura era o seguinte:
1º ano/1º semestre: Culturas Antigas; Metodologia do Trabalho Científico; Estética; Cultura Portuguesa; Oficina de Artes; Opção (a) 1º ano/2º semestre: Culturas Medievais; Tecnologias Audiovisuais nas Artes; Semiótica do Texto e da Imagem; Problemas de Interpretação; Sociologia do Espectáculo; Opção a) 2º ano/3º semestre: Culturas Modernas; História da Música I; História ao Teatro I; Fundamentos da Crítica; Oficina de Artes; Opção (a) a) Opções: livre escolha, de entre as oferecidas pela FLUC. 2º ano/4º semestre: Culturas Contemporâneas; História da Música II; História do Teatro II; História do Cinema; Programação e Gestão Culturais; Opção (a) a) Opções: livre escolha, de entre as oferecidas pela FLUC
Plano de estudo da especialização na área de Música:
3º ano/1º semestre: Correntes Musicais: da Pré-História ao Renascimento; Teoria e Análise Musical I; Etnomusicologia I escala universal; Contraponto e Leitura de Partituras; Latim I (b); Oficina das Artes III. 3º ano/2º semestre: Correntes Musicais: Barroco; Teoria e Análise Musical II; Sistemática Musical/Organologia; Etnomusicologia II Portugal; Harmonia e Leitura de Partituras; Latim II (b). 4º ano/1º semestre: Correntes Musicais: Classicismo e Romantismo; Teoria e Análise Musical III; Jazz e Música Urbana; Sociologia da Música; Oficina das Artes; Opção. (a) 4º ano/2º semestre: Correntes Musicais: Séc. XX e Actualidade; Teoria e Análise Musical IV; Informática Musical/Técnicas Editoriais; Seminário; Opção. (a) (a) Opções: livre escolha, de entre as oferecidas pela FLUC (b) Latim I tem precedência relativamente a Latim II.
Esta licenciatura tem por objectivo uma abordagem pluridisciplinar e integrada das artes (teatro, música e cinema), numa ampla perspectiva científica e cultural, embora sem visar uma formação de prática artística e de carácter profissionalizante.
Mestrado e Pós-Graduação em Estudos Artísticos
Em Setembro de 2006, a Faculdade de Letras abriu um Mestrado e Pós-Graduação em Estudos Artísticos, em não conformidade com o modelo de Bolonha, subordinado ao título Arte e Violência, com a duração de dois anos para o Mestrado e de apenas um ano para a Pós-Graduação.
Reformulação dos Estudos Artísticos na FLUC
Sob proposta da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, foi, pela deliberação do Senado nº 136/2006, de 6 de Novembro, aprovada a adequação do 1º ciclo de estudos (com duração de seis semestres) conducente ao grau de licenciado em Estudos Artísticos. A licenciatura (1º ciclo de estudos)[25] é constituída por 36 unidades curriculares, relativas a quatro áreas de especialização: Ciências Musicais, Estudos Cinematográficos, Estudos Performativos, Fotografia e Novos Media. A duração do 1º ciclo é de 6 semestres, correspondentes a 180 créditos (ECTS), com o seguinte plano de estudos:
1º ano/1º semestre: História das Artes (5 ECTS) Culturas Antigas (5 ECTS) Construção da Imagem Fílmica (5 ECTS) História da Fotografia (5 ECTS) Música Ocidental I (5 ECTS) História do Teatro e do Espectáculo I (5ECTS) 1º ano/2º semestre: Cultura Portuguesa (5 ECTS) História e Estética do Cinema I (5 ECTS) Introdução aos Novos Média (5 ECTS) Música Ocidental II (5 ECTS) História do Teatro e do Espectáculo II(5ECTS) Oficina de Artes I (5 ECTS) 2º ano/3º semestre: Culturas Contemporâneas (5 ECTS) Política e Programação Culturais (5 ECTS) História e Estética do Cinema II (5 ECTS) Arte e Televisão (5 ECTS) Música Portuguesa (5 ECTS) A Arte da Performance (5 ECTS) 2º ano/4º semestre: História e Estética do Cinema III (5 ECTS) Géneros Fotográficos (5 ECTS) Cultura Musical Auditiva (5 ECTS) Escolas e Métodos de Encenação (5 ECTS) Oficina de Artes II (5 ECTS) Opção transversal (5 ECTS) * * Escolhida de um conjunto de opções anualmente definido pela FLUC 3º ano/5º semestre: Estética (5 ECTS) Análise de Filmes (5 ECTS) Vídeo Arte (5 ECTS) Crítica Musical (5 ECTS) Análise do Espectáculo (5 ECTS) Opção livre (5 ECTS) 3º ano/6º semestre: Crítica Cinematográfica (5 ECTS) Arte e Multimédia (5 ECTS) Músicas Étnicas (5 ECTS) Crítica Teatral (5 ECTS) Oficina de Artes III (5 ECTS) Seminário (5 ECTS) * * A escolher entre: Ciências Musicais, Estudos Cinematográficos, Fotografia e Novos Média ou Estudos Teatrais
O Mestrado (2º ciclo) em Estudos Artísticos, com duração de quatro semestres correspondentes a 120 créditos (ECTS), permite a especialização em Ciências Musicais, Estudos Cinematográficos e Estudos Teatrais e está estruturado de forma a poder incluir a especialização numa das áreas acima referidas.[26] Assim, em cada semestre o aluno deve escolher as três unidades curriculares da área pretendida para especialização e duas opções livres, de acordo com o seguinte plano:
1º ano/1º e 2º semestres . Estética Musical . Teatro e Performance . Cinema e outras Artes . 3 unidades curriculares (a) . 4 unidades de opção livre (b) (a) constantes de um conjunto, no âmbito das Artes do Espectáculo, anualmente aprovado pelo Conselho Científico (b) leccionadas neste ou em outro curso de mestrado 2º ano/1º semestre . Seminário I . Dissertação/Projecto/Estágio 2º ano/2º semestre . Seminário II . Dissertação/Projecto/Estágio
É previsível que as vertentes de especialização em Ciências Musicais, Estudos Teatrais e Estudos Cinematográficos deverão ter início no ano lectivo 2007-2008. Em 2008-2009, deverão ser disponibilizadas as unidades curriculares da especialização em Fotografia e Novos Média.
Conclusão
Ao procurar responder a novos desafios, a Universidade de Coimbra de tradição multissecular no ensino da Música pretendeu ombrear com as suas congéneres preenchendo uma lacuna na área das Ciências Musicais ao nível universitário, sendo pioneira na criação de mestrado nessa área específica, em 1986. Viria a dispor de doutoramento em Ciências Musicais em1997 e da vertente de Música na licenciatura em Estudos Artísticos, em 2002. Concordando com o carácter meritório dos motivos que levaram à criação e posterior reestruturação desta licenciatura e a pretendida conjugação da formação mais especializada com uma formação de âmbito mais geral, num contexto de transversalidade disciplinar, há que aguardar que o futuro demonstre o grau de adequação às aspirações dos alunos e, em última análise, a sua conformidade às verdadeiras exigências e carências do mercado de trabalho. Coimbra conta hoje com licenciaturas específicas em várias artes e, entre elas, a Música, leccionadas noutras instituições de ensino superior, com continuada procura em cada ano lectivo. Parece, pois, desejável que a Universidade de Coimbra possa no futuro, a par de licenciaturas noutras artes, dispor de uma na área específica das Ciências Musicais (na qual poderão assentar aqueles graus, dando àquela um progressivo, coerente e consequente aprofundamento dos estudos), podendo mesmo interagir com outras licenciaturas ou áreas do Saber, atraindo alunos nacionais e estrangeiros que nela queiram consolidar competências e aprofundar conhecimentos na ciência e arte da música.
[1] Doutora em Letras, área de Ciências Musicais, especialidade Ciências Musicais Históricas. Docente da Escola Superior de Educação de Coimbra e da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Membro e investigadora do Centro Interuniversitário de Estudos Camonianos (CIEC) e da Akademie Brasil-Europa für Kulturund Wissenschaftswissenschaft, vinculada ao Institut für Studien der Musikkultur des Portugiesischen Sprachraums, Alemanha. [2] Para melhor esclarecimento desta matéria, vide Maria do Amparo Carvas Monteiro (Ciências Musicais), Da Música na Universidade de Coimbra (1537-2002), 16.06.2003. [3] Decreto com força de Lei de 22 de Março de 1911. [4] Artigo 10º da Lei nº 861, publicada em 27 de Agosto de 1919. [5] Esta regência oficializada em 1919 já havia sido praticada por docentes da cadeira de Música (António Simões Carvalho Barbas e Francisco Lopes Lima de Macedo) e por Elias Luís de Aguiar, que viria a leccionar a cadeira de História da Música, a partir do ano lectivo 1919-1920. [6] Aprovada pelo Decreto-Lei nº 18.003 de 25 de Fevereiro de 1930. [7] Decreto-Lei nº 27277 de 24 de Novembro de 1936. [8] Guia do Estudante 2001-2002. História, Coimbra, Publicação do Conselho Pedagógico/FLUC, p. 108-109. [9] Iniciado em 1911, com a criação das Universidades de Lisboa e do Porto, continuado no começo dos anos 30 com a criação da Universidade Técnica de Lisboa e nos anos 60 do século passado com a criação dos Estudos Gerais e depois Universidades de Luanda e Lourenço Marques, hoje Maputo. [10] Decreto nº 67/80 de 20 de Agosto. [11] Efectuadas pelas Portarias nº 809/83, de 3 de Agosto, nº 226/84 de 11 de Abril, nº 489/84 de 21 de Junho e nº 343/85 de 7 de Junho. [12] Despacho não numerado publicado no referido Suplemento ao Diário da República, nº 29, II Série, de 4 de Fevereiro de 1997, p. 1458-(63), 1458-(64) e 1458-(65). [13] Artigo 4º do referido Despacho nº 16 021/99 (2ª Série). [14] Inserido no 2º Suplemento do Diário da República nº 56, II Série, de 8 de Março de 1994, p. 2144-(96) e 2144-(97). [15] Teve intervenção nestes 1ºs Cursos um vasto conjunto de docentes, conferencistas e concertistas, entre os quais Gerhard Doderer, Salwa Castelo-Branco, Maria Augusta Barbosa, João de Freitas Branco, Manuel Morais, Joana Silva, Cremilde Rosado Fernandes, Manuel Carlos de Brito, Jorge Matta, José Augusto Alegria e João Pedro Oliveira. [16] Diário da República, nº 1, II Série, de 2 de Janeiro de 1997. [17] Nova redacção da alínea b) do nº 1 do art. 7º da Portaria nº 622/87, de 18 de Julho, operada pelo Despacho 39/96, publicado no Diário da República, nº 1, II Série, de 2 de Janeiro de 1997. [18] Nova redacção do art. 5º da Portaria nº 622/87, de 18 de Julho, dada pelo Despacho 39/96, publicado no Diário da República, nº 1, II Série, de 2 de Janeiro de 1997. [19] Nova redacção dada ao art. 4º da Portaria nº 622/87, de 18 de Julho, pelo Despacho nº 3998/2000, publicado no Diário da República, nº 41, II Série, de 18 de Fevereiro de 2000. [20] Nova redacção dada ao art. 5º da Portaria nº 622/87, de 18 de Julho, pelo Despacho nº 3998/2000, publicado no Diário da República, nº 41, II Série, de 18 de Fevereiro de 2000. [21] Por deliberação de 21 de Fevereiro de 2002, da Comissão Coordenadora do Conselho Científico da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. [22] Preâmbulo do Despacho 2/97, publicado no Diário da República, nº 53, II Série, de 4 de Março de 1997. [23] Publicado no Diário da República nº 193, II Série, de 22 de Agosto de 2002. [24] Vd. ponto 1.3) do referido Despacho nº 18.594/2002 (2ª Série), de 22 de Agosto. [25] Publicada através do Despacho nº 13417-AG/2007 (em Suplemento ao Diário da República, 2ª Série, Nº 122, de 27 de Junho de 2007. [26] A estrutura curricular e o plano de estudos do mestrado foram publicados em anexo ao Despacho nº 21186-L/2007, em anexo ao Diário da República, 2ª Série, Nº 176, de 12 de Setembro de 2007.