Doc. N° 2394
Prof. Dr. A. A. Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e curadoria científica © 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1999 by ISMPS e.V. © 2006 nova série by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados - ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501
116 - 2008/6
Estados Unidos-Israel-Brasil
68: Violino e relações culturais americano-israelitas no Brasil Isaac Stern e Alexander Zakin
Revendo 1968 na vida musical paulistana. Trabalhos da A.B.E. 2008 40 anos de fundação da sociedade Nova Difusão constituidora da Organização Brasil-Europa
O grande acontecimento na hístoria do violino em São Paulo, em 1968, foi a visita de Isaac Stern. Acompanhado ao piano por Alexander Zakin, o violinista americano de origem ucraniana ofereceu um dos mais prestigiados concertos da temporada da Sociedade de Cultura Artística daquele ano. A apresentação, de N° 912 da 56a Temporada da sociedade, teve lugar no Teatro Municipal de São Paulo, a 9 de agosto. O programa constou de obras de J. Brahms (Movimento de sonata; Sonata em sol maior op. 78); de B. Bartok (Rapsódia N° 1), de W.A.Mozart (Adagio em mi maior K. 261; Rondo em ré maior K. 373); de J. S. Bach (Sonata n° 3 em si maior); de Szymanowski ("A Fonte de Aretusa") e A. Copland (Hoedown). Isaac Stern, nasceu em Kriminiesz, no dia 21 de julho de 1920, foi levado porém desde o seu primeiro ano de vida aos Estados Unidos, para onde emigraram os seus pais. Iniciou-se musicalmente no piano, passando a seguir ao violino. Estudou no Conservatório de São Francisco com Robert Pollack e Louis Persinger. Com 15 anos apresentou-se com a Orquestra Sinfônica de São Francisco. Executou o Concerto para Violino N° 3 de Saint-Saens sob a direção de Willem Van den Berg. Com o seu professor, Naum Blinder, membro da orquestra, executou o concerto para dois violinos de Bach. No ano seguinte, 1937, com a mesma orquestra, apresentou o concerto para violino de Brahms, sob a direção de Pierre Montreux, um concerto que foi irradiado por todo os Estados Unidos. Seguiram-se concertos com várias outras orquestras, entre elas a de Los Angeles, Seattle, Portland, Minneapolis e Chicago.
Em 1937, ofereceu um concerto no Carnegie Hall, cujo sucesso fundamentou definitivamente o seu renome na América do Norte, tornando-se, já na década de 40, um dos mais prestigiados violinistas do globo. Seria, posteriormente diretor do Carnegie Hall, cargo que desempenhou durante 40 anos.
Já na sua juventude apresentou-se como solistas em concertos regidos por maestros de alto prestígio, entre eles o já citado Pierre Monteux e Otto Klemperer. Empreendeu intensas viagens artísticas pelos Estados Unidos e pelo Canadá, apresentando-se também em vários países de outros continentes. Atuou em ca. de 200 concertos anuais como solista de obras orquestrais e como recitalista.
Com o pianista Eugene Istomim e o violoncelista Leonard Rose, integrou um Trio de Câmara que se apresentou com grande sucesso, sobretudo nos Estados Unidos.
A série de países nos quais realizou concertos já era, na época, surpreendente: Austrália, Japão, Filipinas, Chinas (Hong-Kong), Índia (Calcutá, Bombay), Israel, além, naturalmente dos diferentes países europeus. Além de ser Presidente do Carnegie Hall, era membro do então recente National Endowment for the Arts. O programa do concerto em São Paulo salientava o papel desempenhado por Isaac Stern como personalidade de projeção internacional na vida musical e nos grandes festivais de todo o globo:
"Os mais qualificados festivais internacionais de música pedem permanentemente sua presença e assim figura anualmente entre os artistas convidados para manifestações artísticas tão relevantes como: Festival Casals de Porto Rico, Edimburgo, Veneza, Berkshire, Ravinia Part, etc.. Em suas tournées pelos principais centros universais da música Isaac Stern tem atuado em colaboração com célebres orquestras sinfônicas e com diretores tão prestigiosos como Sir Thomas Beechmam, George Szell, Antal Dorati, Dimitri Mitropoulos, Seerge Kussevitzky, Fritz Reiner, Leonard Bernstein, Eugene Ormandy, etc." Isaac Stern era expressamente considerado como a autoridade máxima da Fundação Cultural Americano-Israelita. No ano anterior, 1967, havia realizado um concerto com a Filarmônica de Israel durante a Guerra dos Seis Dias. O concerto teve lugar no monte Skopus de Jerusalem, e Stern executou um concerto para violino de Felix Mendelssohn-Bartholdy. O concerto foi regido por Leonard Bernstein. Não poderia ter havido internacionalmente maior demonstração dos elos do violinista com Israel e com a comunidade israelita internacional. Após alguns anos, em 1973, fundaria o Centro Musical de Jerusalem.
Alexander Zakin
Alexander Zakin, que acompanhava Stern nos seus concertos pelo mundo desde 1940, possuía profundas afinidades culturais com o violinista. Também êle era proveniente do antigo mundo russo. Filho de um violinista, nascera na Sibéria, na cidade de Tobolsk. Iniciou os seus estudos de piano no Conservatório de St. Petersburg. Transferindo-se para a Europa Ocidental, deu continuidade a seus estudos em Berlim, a partir de 1921. Na década de 20, realizara numerosos recitais em cidades da Europa Central. Com a subida ao poder de Hitler e devido à sua política antisemita, Zakin procurou abrigo em Luxemburgo, onde tornou-se professor de membros da família reinante. Foi também pianista da Radio Luxemburgo. Em 1940, transferiu-se para os Estados Unidos, fixando residência em Nova Iorque e dando início ao trabalho conjunto com Isaac Stern.
Significado da presença de Stern e Zakin no Brasil
A presença e a apresentação de Isaac Stern em São Paulo foram, sob muitos aspectos, de excepcional significado. Representava um acontecimento artístico-cultural de primeira grandeza para o público em geral e, em particular, para violinistas e estudantes do instrumento. Era realizado numa época em que se generalizava a consciência da necessidade de revalorização do instrumento e da formação de novas gerações de instrumentistas. A crítica ao quase monopólio do piano no ensino musical e na formação da juventude no Brasil não era recente. Na época, o labor de alguns professores, sobretudo de origem estrangeira e atuando em círculos marcados socialmente por descendentes de estrangeiros levava a revelação de jovens instrumentistas que abriam novas expectativas para o futuro. Também sob o ponto de vista do debate sobre a difusão cultural o concerto representou um marco de importância. A atualidade político-cultural de Isaac Stern após a sua recente apresentação na guerra de Israel tinha também uma dimensão simbólica. A atenção se dirigia às relações culturais e histórico-culturais entre os Estados Unidos e Israel e o concerto de Stern representava um evento de relevância também sob a perspectiva da difusão cultural no âmbito das relações Estados Unidos-Brasil. Assim se interpretava, por exemplo, a inclusão de uma obra de Aaron Copland como peça finalizadora do concerto em São Paulo. Também como de intenções simbólico-culturais surgia o fato de ser precedida por uma obra de Szymanowski. Aaron Copland era alvo de particular atenção em círculos dedicados à música contemporânea do Brasil de fins dos anos sessenta. Vindo de encontro a esse interesse, publicar-se-ia, no ano seguinte, em tradução de Lívio Dantas e introdução de Eleazar de Carvalho, o The New Music de Copland (A Nova Música, Rio de Janeiro: Record 1969). No seu texto introdutório, escrito em 1968, Eleazar de Carvalho lembrava dos seus elos com Copland: "A convivência de 20 anos com o autor de A Nova Música, em Tanglewood, onde ele dirigia o departamento de composição e eu o orquestral, substituindo Koussevitzky, desde 1951, me autoriza a admirar a sua simplicidade e honestidade como artista, alheio ao sucesso fácil, às concessões e à glória tonitruada pelas multidões que é, sem dúvida, a mais enganadora de todas as apoteoses, de base inconsistente, instável e momentânea." (op. cit. pág. 10)
Difusão cultural e pesquisa do patrimônio cultural israelita no Brasil
No âmbito da Nova Difusão, levantou-se a questão da necessidade de uma maior observação dos aspectos culturais americano-israelitas que diziam mais de perto ao Brasil. Nasceu, assim, a partir deste concerto de Isaac Stern, um projeto de levantamento da situação musical da colonia judaica de São Paulo, considerando-se os seus elos com Israel. Tinha-se contato com vários jovens da comunidade israelita que se dedicavam à música e que atuavam na vida musical brasileira e, em parte, eram destinados a transferir-se a Israel. Questões de identidade surgiam como prementes e levariam posteriormente a estudos específicos. Do ponto de vista histórico-cultural procurou-se estudar o papel desempenhado por círculos russos e judaico-russos na vida musical de São Paulo das primeiras décadas do século XX.
A.A.Bispo
Observação: o texto aqui publicado oferece apenas um relato suscinto de trabalhos. Não tendo o cunho de estudo ou ensaio, não inclui notas e citações bibliográficas. O seu escopo deve ser considerado no contexto geral deste número da revista. Pede-se ao leitor que se oriente segundo o índice desta edição (acesso acima).