Doc. N° 2379
Prof. Dr. A. A. Bispo, Dr. H. Hülskath (editores) e curadoria científica © 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1999 by ISMPS e.V. © 2006 nova série by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados - ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501
116 - 2008/6
Luxemburgo-Portugal-Brasil
Maria Anna do Carmo de Bragança (1861-1942), Grã-Duquesa do Luxemburgo
100 anos da regência de uma infanta portuguesa no Luxemburgo
Catedral de Luxemburgo. Fotos H. Hülskath. Trabalhos da A.B.E. 2008 Luxemburgo é um dos grandes centros da comunidade de língua portuguesa na Europa. Grande é sobretudo o número de portugueses ali residentes (ca. de 80.000). Emigrados de diferentes cidades Portugal, ali vivem emigrados e seus descendentes de Coimbra, Braga, Vila Real, Bragança, Viseu, Porto, Lisboa, Aveiro, Leiria, Braga e muitas outras cidades de Portugal. Associações e centros de vida social e cultural documentam essa presença, havendo ca. de 80 entidades registradas.
O crescente número de habitantes de ascendência portuguesa e de lusófonos em geral em Luxemburgo levanta a necessidade de estudos históricos e culturais mais aprofundados dos elos que prendem o Grão Ducado ao mundo de língua portuguesa. Esses vínculos são muito mais profundos do que se poderia aparentemente esperar. Dizem respeito não apenas a movimentos migratórios europeus das últimas décadas mas sim à própria história do país. Relacionam-se com o fato de que uma infanta portuguesa foi Grã-Duquesa de Luxemburgo, exercendo até mesmo a regência do país: Maria Anna do Carmo de Bragança. A sua história de vida insere-se porém em amplo contexto de relações internacionais nas quais o Brasil desempenhou papel decisivo.
Maria Anna do Carmo de Bragança
Maria Anna do Carmo de Bragança era filha de D. Miguel I de Portugal e de Adelaide de Rosenberg, princesa de Löwenstein-Wertheim-Rosenberg. O fato de ter nascido fora de Portugal foi devido ao exílio de seu pai. Inseriu-se assim na complexa problemática da orientação política de Portugal à época que se seguiu à Independência do Brasil e dos acontecimentos singulares que vinculou a história da ex-colonia à antiga metrópole. Não se pode esquecer que o proclamador da Independência do Brasil e o seu primeiro Imperador, Pedro I°, foi aquele que, após ter consumado e simbolizado a separação da ex-colonia da antiga metrópole, retornou a Portugal para combater o seu irmão, tornando-se posteriormente Pedro IV. Esse episódio, que marcou sobretudo a história portuguesa, representou uma epopéia que surge em visão retrospectiva como singular, até mesmo estranha, mas que determinou questões de sucessão e de tradição política que marcaram a história posterior de Portugal e dos relacionamentos entre as nações.
A imagem de D. Miguel surge na historiografia talvez por demais indiferenciadamente com conotações negativas. A sua orientação política inseria-se nos intuitos restauradores da ordem européia do sistema de Metternich originado no Congresso de Viena. Compreende-se, assim, que após a sua derrota a sua vida de exílio se dirigisse à esfera austríaca. A derrocada de D. Miguel não impediu, porém, que a sua linha exercesse influência nos desígnios europeus. Pelo contrário, poucos são os monarcas que tiveram descendentes em posições destacadas em vários países europeus como D. Miguel.
Portugal e o Catolicismo no Luxemburgo
No dia 21 de junho de 1893, no palácio Fischhorn, em Zell am See, Maria Anna casou-se com Wilhelm IV, príncipe herdeiro do Grão-Ducado de Luxemburgo. Wilhelm era filho de Adolfo I, chefe da Casa de Nassau-Weilburg. O sentido político-cultural excepcional dessa união residia no fato de se tratar de um consórcio entre uma representante de um catolicismo altamente conservador da família portuguesa de D. Miguel e de um vulto da família protestante por excelência do filho de Adolf I.
Pela Igreja, a união apenas tornou-se possível através de um acordo que estabeleceu que os descendentes do casal fossem educados segundo o Catolicismo. Foi, portanto, a infanta portuguesa a causa da orientação católica da família grão-ducal, o que também vinha de encontro à maioria da população. A relevância dessa orientação religiosa não pode ser suficientemente salientada no processo de diferenciação do país com relação aos Países Baixos.
A infanta portuguesa tornou-se Grã-Duquesa quando o seu marido subiu ao trono, após a morte do pai, em novembro de 1905. Por não terem filhos masculinos, mas várias filhas, chegou-se a modificar a lei de sucessão. Tendo o Grão-Duque adoecido, assumiu a regência do país no período terminal de sua vida, em novembro de 1908, exercendo essas funções até fevereiro de 1912. Após a sua morte, passou a servir como regente durante a minoridade de sua filha, a Grã-Duquesa Marie-Adélaide, de fevereiro a junho de 1912.
Durante a Segunda Guerra Mundial, a Grã-Duquesa Maria Anna transferiu-se com a sua família para os EUA, onde viria a falecer.
Assim como acontecera com os descendentes de D. Miguel, as filhas de D. Maria Anna vieram a ocupar situações de influência, sobretudo através de enlaces matrimoniais. Dela descendem a Grã-Duquesa Maria Adelaide, a Grã-Duquesa Carlota, a princesa Hilda (1897-1979), consorte do Príncipe Adolfo de Schwarzenberg, a princesa Antonieta (1899-1954), esposa de Rodolfo, príncipe herdeiro da Baviera, a princesa Isabel (1901-1950), esposa de Luís Filipe de Thurn und Taxis, a princesa Sofia (1902-1941), consorte de Ernesto da Saxônia, filho de Frederico Augusto III.
1978: 30 anos de Encontro Brasil-Luxemburgo na Catedral de Luxemburgo
Há 30 anos realizou-se um primeiro encontro em Luxemburgo e que se inseriu no âmbito dos intuitos reestruturadores da A.B.E. Sob a orientação do organista da Catedral de Luxemburgo, visitou-se a cripta catedralícia, onde se encontra o túmulo de D. Maria Anna de Portugal.
A Catedral de Nossa Senhora foi originariamente uma igreja de jesuítas, cuja pedra fundamental foi lançada em 1613. Sobretudo o portal do edifício manifesta a presença do espírito jesuítico, sendo emoldurado pelos grandes vultos da Companhia, entre eles Inácio de Loyola. Os portugueses ali residentes encontram aqui elos que os unem à história religiosa ibérica. Sob o ponto de vista religioso, a Catedral se destaca como centro de devoção de uma imagem considerada milagrosa de Nossa Senhora da Consolação, a padroeira da cidade e do país.
Foi elevada a catedral em 1870 pelo Papa Pio IX. Nos anos 30 do século XX, foi alvo de grandes transformações segundo planos do arquiteto Hubert Schumacher. Ampliou-se o edifício para além do Coro do século XVII, criando-se uma disposição espacial singular por oferecer uma abertura inesperada àquele que percorre o seu interior.
A igreja apresenta-se ao visitante com aspecto particularmente festivo e solene, e os estandartes e símbolos que ornam o espaço perante o altar-mor indicam o significado desse templo para a identidade nacional do país.
Na cripta da Catedral encontram-se os túmulos da família dos grão-duques: João, Rei da Boêmia (1296-1346); Elisabeth Michailowna Romanowa, Grã-Duquesa (1826-1845), Adolfo I (1817-1905), Wilhelm IV (1852-1912), Adelheid Marie de Anhalt-Dessau (1833-1916), Maria-Adelheid (1894-1924), Felix von Bourbon-Parma (1893-1970), Charlotte (1896-1985), Joséphine Charlotte da Bélgica (1927-2005) e Maria Anna de Portugal.
A.A.Bispo
Observação: o texto aqui publicado oferece apenas um relato suscinto de trabalhos. Não tendo o cunho de estudo ou ensaio, não inclui notas e citações bibliográficas. O seu escopo deve ser considerado no contexto geral deste número da revista. Pede-se ao leitor que se oriente segundo o índice desta edição (acesso acima).