Hallo Dolly! Luz vermelha e síncopes

ed. A.A.Bispo

Revista

BRASIL-EUROPA 157

Correspondência Euro-Brasileira©

 

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N° 157/8 (2015:5)





Hallo Dolly! Luz vermelha & síncopes
prostituição, música, dança, jogo e bebidas em regiões de
rush
Club Internacional de Porto Velho, barracões de seringais do Acre e dance halls no Alasca





 
The Rock. Ketchikan. Foto A.A.Bispo 2015
Na análise de processos culturais - como propugnada pela A.B.E. -, a atenção não deveria ser determinada por categorizações do objeto segundo esferas ou compartimentos culturais com as suas conotações de alto e baixo. (Veja)

Essa orientação possibilita o reconhecimento e o estudo de fatos, fenômenos e decorrências que ultrapassam delimitações convencionais e que foram em muitos casos insuficientemente considerados, silenciados ou menosprezados em áreas disciplinares institucionalizadas.

Esse foi o caso em especial da música e outras expressões da vida, das horas de trabalho e lazer de camadas mais modestas da sociedade que não encontraram por muitas décadas adequado lugar nos interesses dos estudos históricos e de folclore.

O desenvolvimento e a difusão nas últimas décadas dos Cultural Studies na sua concepção e prática na Inglaterra e, em geral, nos países anglofones, com o seu interesse pelos modos de vida e expressões de trabalhadores em contextos urbanos, desprivilegiados ou subalternos, contribuiram à percepção e à valorização como objeto de estudos de esferas sociais nos seus pressupostos, condicionamentos, modos de vida e outros aspectos de relevância para a análise de processos culturais.

Essa orientação de interesses, decorrendo concomitantemente com aquela dos estudos da mulher e dos Gender Studies em geral, traz ao espectro da pesquisa complexos temáticos que foram não apenas silenciados por problemas teóricos ou de visões seletivas da realidade, mas sim também por questões de reservas morais e de renome de pesquisadores, uma vez que implicam também na consideração de fatos e desenvolvimentos sentidos como pouco dignos de consideração.

O tradicionalismo que marcou por muitas décadas os estudos de folclore e mesmo os estreitos elos de pesquisadores com a religião e suas normas morais contribuiram a essa situação de exclusão.

Homens desacompanhados e uniões inconvencionais na História dos Descobrimentos

Já há muito, porém, constatou-se que os processos histórico-culturais desencadeados em regiões contactadas pelos europeus no decorrer dos Descobrimentos e desde então colonizadas não podem ser analisados sem uma especial atenção a questões que surgem como pouco dignas de consideração sob o ponto de vista de normas morais convencionais.

O fato de terem sido na sua grande maioria homens solteiros ou desacompanhados de suas mulheres que tomaram parte nos empreendimentos navais dos Descobrimentos, de exploração e de colonização não pode deixar de ser tematizado devido às suas consequências nas regiões alcançadas.

Essas consequências foram tratadas em geral no passado de modo eufemístico, idealizante e mesmo heroicizante como sendo à de uma tolerante abertura dos portugueses à miscigenação, como grande qualidade em especial da ação portuguesa no mundo. Estes, sem discriminações raciais levaram à formação de gerações que constituiram a base da população de países como Brasil e explicariam a decantada falta de discriminações raciais e a tolerância de suas sociedades.

Estudos de transformação de identidades e de processos culturais - entre outros daqueles relacionados com a problemática crioula (Veja) - não podem ser desenvolvidos adequadamente sem a tematização das relações sexuais não condizentes com a moral pregada pela Igreja e mantidas de forma não consistente pelos europeus e mesmo com as normas de outros povos.

Essas relações - um processo de miscigenação em escala mundial - não decorreram apenas de modo informal, espontâneo, mas também de forma dirigida. Tem-se, assim, notícias do envio de mulheres solteiras - também de prostitutas - de Portugal a regiões extra-européias, como à costa africana no século do Descobrimento. A fixação portuguesa e o surgimento de grupos sociais de identificação ocidental e cristã em diferentes regiões do Oriente apenas foram possíveis através de descendentes de uniões entre marujos, soldados e aventureiros portugueses desacompanhados e mulheres nativas.

Tem-se indícios ate mesmo que intercursos circunstanciais na chegada de homens europeus em portos após longas viagens de travessia foi em determinados casos não só tolerado como até mesmo conscientemente fomentados por motivos estratégicos de formação de grupos sociais de identificação ocidental e católica  em regiões em que Portugal não tinha condições por si de povoar.

Trata-se, assim, de um processo cultural que exige ser analisado sob diferentes aspectos, uma vez que também diz respeito à cultura cristã européia nas suas normas, contradições, inveracidades e hipocrisias.

Homens desacompanhados em viagens marítimas, de empreendimentos e aventuras

A necessidade de consideração de processos desencadeados pelas relações entre homens envolvidos no processo de expansão ocidental, mulheres nativas e mulheres vindas para regiões extra-européias não se restringe à época dos Descobrimentos.

Ela se revela em muitos outros empreendimentos conduzidos primordialmente por homens em geral desacompanhados, de devassa e exploração de terras e recursos, de estabelecimentos coloniais, de mineração ou outros e, em especial, em cidades portuárias. Esse complexo temático é de significado não apenas para estudos históricos, mas também para a compreensão e a análise de processos em andamento no presente.

O caso do „Club Internacional“ de Porto Velho, Rondônia: meretrizes, música e bebida

Vitor Hugo, no seu livro Desbravadores, de 1959 e que experimentou outras edições (2 vols, 2a. ed. 1991, Rio de Janeiro: Edição do Autor/Banco do Estado da Rondônia-BERON), descreveu com palavas criticas a vida em Porto Velho à época da construçãõ da Madeira-Mamoré:

„As cabanas de palha encobriam crimes, enquanto no Club Internacional mulheres e homens dançavam o fox aos compassos do jazz! Rubicundos inglêses vestidos de branco, a beber uísque; alemães ingênuos e sorridentes, sorvendo chops com avidez; francesitas de Marselha com admirável heroísmo profissional, sorrindo convidativas aos peões de botas e esporas. Mais: refugiados políticos da Bolívia e funcioná´rios de Manaus e Belém, aventureiros e seringueiros.- Uma multidão pedindo alegria!

Para aquela aglomeração promíscua na fala, nos trajes, nos gostos e nas raças, oriunda de todos os recantos da terra, formada de músicos e zabaneiras, comerciantes, médicos e engenheiros, juízes e promotores, falar em lei e em ordem pública, era coisa difí´cil, ainda que possível. (...)

O livro de ofícios policiais que se conserva na Prefeitura de Porto Velho, foi aberto a 9 de fevereiro de 1912 com dois têrmos de bom viver:  de duas meretrizes e dum desordeiro!“ (op.cit. II, 227).

Encontro no Acre, em 1993: música e dança em barracas de seringais

Em encontro levado a efeito na Casa da Cultura de Rio Branco, Acre, em 1993, Hélio Melo, artista de múltiplos talentos (Veja), trouxe à pauta das reflexões a questão do significado para os estudos culturais dos encontros de feriados e fins de semana em cabanas frequentadas por seringueiros ou, em outras regiões, por garimpeiros à procura de lazer e de relações sentimentais e sexuais.

Como êle próprio tematizou em pinturas, esses encontros e festas, acompanhadas por consumo de bebidas alcoólicas, representam ocasiões para jogos, música e dança.

Considerar muitas expressões musicais e de dança originadas ou difundidas em regiões pioneiras de expansão ou de extrativismo sem levar em conta o contexto de seu cultivo impede estudos mais diferenciados de suas expressões, sentidos e funções. Cria-se, assim, em parte devido a uma falsa moral ou a reservas moralizantes, visões inadequadas de gêneros, formas e estilos de música e dança.

Essa falsa moral levaria também, como tratado no encontro em Rio Branco, à desconsideração das mulheres envolvidas nas relações
incidentais ocorrentes nessas ocasiões, também daquelas que exercem a sua atuação com finalidades de ganho.

Tratar-se-ia aqui não apenas de uma unilateralidade injusta como de um silenciamento que surge como prejudicial à compreensão e à análise de processos.

Se o papel de mulheres de condução de vida não condizente com as normas da sociedade é considerado na História das Artes sobretudo devido à sua representação em obras da passagem do século XIX ao XX, lembrando-se aqui de Hennri de Toulouse-Lautrec (1864-1901) impõe-se considerá-lo de modo objetivo nos estudos de processos culturais.

É quase que impossível tratar da vida sócio-cultural de cidades em regiões pioneiras, de mineração ou portuárias sem a consideração de bares, cafés, cabarés e salões de baile considerados como de menor reputação, uma vez que foram em muitos casos também locais de prática musical e de dança, com as suas características próprias, com os seus tipos humanos e singularidades.

A consideração de meretrizes na história cultural no atual Alasca

É neste contexto que as cidades do Alasca oferecem exemplos de uma atitude menos rígida quanto ao silenciamento de fatos e decorrências, até mesmo valorizando-os como parte da memória e bens histórico-culturais a serviço do turismo.

Justamente num dos estados politicamente mais republicano-conservadores dos Estados Unidos, zonas e nomes relacionados com a prostituição no passado são resgatados e mesmo, como no exemplo de Ketchikan, apresentados como museus culturais ao ar livre, com encenações, apresentações de dança, música e pessoal fantasiado como prostitutas do passado.

Esse emprêgo de uma história marcado por meretrício para fins turístico-culturais não deixa de levantar questões, uma vez que os nomes e as vidas de mulheres que agora são usados para fins de fomento da economia, da cultura e da memória são daquelas que foram perseguidas, que tiveram que pagar „proteções“, e que por fim tiveram as suas atividades proibidas, abandonando as suas casas e retirando-se em anonimato ou clandestinidade.
Histórias trágicas de vida correm o risco de serem assim deturpadas em encenações idealizantes que acentuam aspectos alegres e o lúdico, vindo em parte de encontro a expectativas de visitantes à procura de divertimentos que, nos Estados Unidos, visitam Las Vegas.

Tratar-se-ia aqui de uma repetição de abusos e injustiças, de instrumentalização de nomes de infelizes do passado e, assim, de expressões de hipocrisia sob novo signo em Estado tão marcado por conservadorismo e politicamente por posições de direita preocupadas pela manutenção de normas morais?

Apesar de todas as dúvidas que se levantam e que clamam por tratamento mais aprofundado e diferenciado, a conservação de zonas de „luz vermelha“ e o emprêgo de nomes, fatos e bordéis para fins turítico-culturais no Alasca traz à luz tambem nomes de mulheres que, cheias de coragem e ousadia, à procura de meios de ganhar a vida e mesmo alcançar prosperidade, tiveram a coragem de realizar grandes viagens, de abandonar regiões de origem, de transferir-se para regiões pioneiras e afastadas e ali exercerem as suas atividades e criarem estabelecimentos enfrentando repúdios sociais, opressões e violências, e, apesar de suas profissões, manterem uma auto-consciência de orgulho e dignidade.

„Dolly Arthur“ - Thelma Dolly Copeland (1888-1975)

A história de vida de Thelma Dolly Copeland chama a atenção a um aspecto até hoje pouco considerado nos estudos de emigrações e imigrações: o da migração causada por situações problemáticas, familiares ou do meio de origem.

Atirando jovens a outros centros, onde, sem o controle social atuante na esfera de origem, em liberdade de condução de vida, de tomada de iniciativas e premidas por necessidades existenciais, biografias de meretrizes como Dolly Arthur registram caminhos de uma „queda“ em esferas menos respeitadas da sociedade, daquelas de estabelecimentos de jogo, bebidas, diversões e meretrício

Muitas dessas histórias de vida permaneceram silenciadas e cairam no esquecimento, de modo que aquela de Thelma Dolly Copeland surge como caso representativo de outros, assumindo um interesse mais amplo, que extrapola a sua pessoa e seu contexto.

Nascida em localidade próxima de McCall, Idaho, Thelma Dolly Copeland proveio de uma região interiorana, rural, de pouca população, marcada por montanhas e pela mineração.

O território era então cortado por homens que se dirigiam às regiões auríferas durante a corrida de ouro da Califórnia e, na segunda metade do século XIX, com a descoberta de ouro em Idaho, por migrantes que ali se estabeleceram.

Nasceu assim numa das regiões mais conservadoras dos Estados Unidos, uma tendência política que aparentemente contrastava com os modos de vida dos intrépidos aventureiros e mineiros que por ali passavam ou ali se estabeleceram.

Premida pela situação familiar de desavenças entre os seus pais, a jovem procurou, com apenas 13 anos, libertar-se e procurar novas possibilidades de vida em outras regiões promissoras, também estas marcadas por mais recentes vindas de migrantes e aventureiros à procura de enriquecimento e prosperidade.

Thelma Dolly rocurou ocupação como garçonete em bares e restaurantes em cidades como Spokane, Seattle e Vancouver, passando logo à prostituição.

No ano da eclosão da Primeira Guerra - 1914 -, atraída pelo corrida de ouro ao Alasca e pela fama de localidades como Juneau e Ketchikan como centros procurados por homens à procura de ouro, com dinheiro que ali gastavam, transferiu-se para essa região, estabeleceno-se por fim naquela última cidade, a maior aglomeração humana do Alasca.

Como salientado em textos que rememoram a sua pessoa e suas atividades, Thelma Dolly Copeland foi uma mulher de iniciativa e independente, atuando por si na prostituição, sem intermediários ou junto a outras mulheres. Surge, assim, como exemplo de intrepidez feminina correspondente àquela de homens sempre decantados como intrépidos à procura de prosperidade material.

Mantinha, da sua formação rural e conservadora, hábitos de abstinência - não fumava ou bebia - o que contrastava com o modo que ganhava a sua subsistência, do qual não se envergonhava, vendo-o como profissão de prestação de serviços.

Com os recursos que conseguiu economizar, sobretudo após uma apresentação no Black Mary‘s dance hall, cabaré de reputação duvidosa, comprou uma casa própria, em 1919. Grande parte do dinheiro que ganhava empregava-o em viagens e na manutenção de seus animais de estimação.


A Creek Street em Ketchikan - zona de luz vermelha como bem histórico-cultural e turístico

A casa de Dolly situava-se na Creek Street, uma via de estabelecimentos de „luz vermelha“ criada em 1903 pelo City Council de Ketchikan com o objetivo de afastar as prostitutas do centro da localidade, reunindo-as em zona mais afastada.

Nessa via, as mulheres viviam em pares ou sós. Thelma Dolly Copeland tornou-se a mais conhecida e influente mulher dessa zona por décadas, o que justifica ser lembrada até hoje nessa cidade do Alasca.


Ao lado de Thelma Baker e outras, Dolly Arthur atuava juntamente com mulheres que entraram na história apenas com os seus nomes de profissão, lascivos, de sentidos dúbios ou irônicos e divertidos, tais como „Black Mary“, „Dirty Neck Maxine“, „Frenchie“, „Prairie Chicken“ ou „Deep Water Mary“.

Esses nomes, em reclames iluminados nas vitrines e janelas dos estabelecimentos dessa via, serviam para atrair os fregueses e são hoje lembrados museu ao ar-livre da Creek Street e circunvizinhanças.

Também pontos de encontro e de aglomeração de homens que frequentavam esse bairro são hoje lembrados. Nos corredores, em varandas e terraços das construções de madeira sobre as encostas e águas aglomeravam-se os marinheiros e mineiros. Esses fregueses eram marinheiros e soldados que se encontravam de passagem vindos com navios militares e comerciais, garimpeiros que se dirigiam às regiões de minas, ou que delas vinham à cidade para a compra de mantimentos e artigos de trabalho ou nas suas horas livres e em dias feriados como o nacional americano de 4 de Julho, o dia da ode à liberdade. Os homens mais discretos ou cientes do seu estado de casados na terra natal procuravam casas menos expostas para as suas aventuras amorosas, situadas no assim chamado „Married Men‘s Trail“.

O Star dance hall na Creek Street como estabelecimento de divertimentos

Um dos principais pontos de aglomeração e de contatos era uma ponte junto ao Star dance hall, um estabelecimento de diversão, dança e música, cujo funcionamento era tolerado e
permitido a poder do pagamento de „proteções“. 

A casa foi comprada em 1917 por „Black Mary Thomas“, sucedida, a partir de 1924, por Thelma Baker. A sua primeira proprietária é lembrada na história oral pelas circunstâncias trágicas da sua morte, que teria ocorrido repentinamento enquanto contava o dinheiro ganho. Também a sua sucessora faleceu em circunstâncias trágicas no incêndio que destruiu a casa do Star dance hall, já então desativado, em 1972.

A prostituta que entrou na história como tendo sido a mais „infame“ foi Beatrice Greene, que, iniciando-se na profissão em 1947, foi a última da zona da Creek Street. Esta foi fechada em 1954, quando da proibição da prostituição, o que levou a que muitas mulheres deixassem a cidade. Beatrice Greene, ao contrário, passou a atuar clandestinamente, em contínuas tensões com a lei, atendendo particularmente a pedido dos „gentlemen callers“.

Em 1991, o Star dance hall foi restaurado, passando a servir como testemunho histórico-cultural para fins turísticos de Ketchikan.

Dança, música e consumo de drogas: o pianista „Blind Ernie“ e o „bad moonshine“

O estabelecimento dava possibilidades para que homens e mulheres travassem contato, oferecendo-se estas como parceiras de dança, antes que então se retirassem para um dos 12 quartos do Star dance hall.

As danças eram ao som de música ao vivo, tendo-se salientando o pianista chamado de „Blind Ernie“ Hyde. Este instrumentista, que surge como exemplo da atuação de cegos na música popular, conhecida da história dos Estados Unidos e também do Brasil, foi encontrado morto ao andar sem assistência nas ruas de Ketchikan, em 1922.

A causa de sua morte foi „bad moonshine“, bebida alcoólica extramamente forte, produzida clandestinamente. Tem-se como certo que o consumo de moonshine pode causar cegueira devido à mistura com o methanol derivado da distilação de álcool.

O pianista „Blind Ernie“ Hydes surge assim como tendo sido um alcoólatra ou consumidor de „moonshine“, tornando-se cego devido a seu consumo e morrendo intoxicado pela bebida má produzida de forma ilegal e doméstica. Esta poderia ter contido outros aditivos, tais como diluidores de tinta, álcool de motores ou outros fluidos. (Alaska State Library, Historical Collections, Bayers, Lloyd H., 1911, K.n.N. 1m 9/27/1922/2).

Diferenciações no estudo da mulher intrépida em épocas de rush

Também em Skagway, porto e ponto de partida e chegada da White-Pass and Yukon Railway (Veja) que levava os homens s aos locais de mineração, constata-se o cultivo da memória de dance halls do passado em apresentações de teatro, dança e música, sem, porém, tematizar-se de forma tão explícita a questão da prostituição da época do rush de Klondike.

O visitante dessas apresentações não são assim confrontados mais diretamente com a problematica da mulher que vinha só para regiões de homens sós atraídos pela possibilidade de encontro de ouro, podendo apreciar trajes, estilos, formas, rítmos, melodias e práticas de dança e música como se estes pudessem ter-se desenvolvido independentemente do contexto que possibilitou o seu desenvolvimento e mesmo origens, Surgem, sob esta perspectiva, inocuamente como expressões da história da cultura e da música popular, passíveis de apreciação mesmo por espectadores e ouvintes conservadores e defensores rigidos de normas morais.

Se em Ketchikan representa-se em estátua no monumento „The Rocks“ (Veja) a chegada da mulher que procurava meios de ganho com o corpo, em Skagway defronta-se com um busto memorial de uma mulher que é lembrada como exemplo de audácia, pelo fascinio que exerceu e pelo papel que desempenhou na sociedade: Molly Welsh (1872-1902).
Molly é descrita como tendo sido uma jovem independentze com vontade de girar pelo mundo e „amor de fronteiras“. Em 1890, com 18
anos, abandonou a sua casa, passando sete anos de sua vida em Butte, Montana. Tomando conhecimento das possibilidades que se abriam com a descoberta de ouro de Klondike, transferiu-se para o Alasca em 1897, onde atuou como garçonete. Passou a dedicar-se a atividades humanitárias da Union Church. Transferindo-se para o cimo do White Pass Trail, ali estabeleceu uma barraca para garimpeiros, logo passando a correr a fama de suas qualidades e fascínio femininos.

O romance de Molly Welsch iniciou-se com a sua escolha entre dois pretendentes, Jack Newman e Mike Barglett . Em 1900, casou-se com Mike Bartlett, em Dawson, vivenciando uma fase de prosperidade material que chegou ao fim com o alcoolismo do marido. Mudando-se provavelmente só para Seattle, mas seguida pelo marido, foi por ele assassinada. O outro de seus pretendentes do passado, Jack Newmann, mandou que se fizesse o busto em sua memória que hoje se encontra no parque de Skagway que leva o seu nome.

Consideração de nomes, expressões e processos no Brasil em paralelos internacionais

As mulheres audaciosas e empreendedoras, desafiantes de preceitos e mesmo de normas morais de fins do século XIX e primeiras décadas do XX lembradas e mesmo celebradas no Alasca, revelando similaridades com nomes e fatos conhecidos do Brasil, indicam a necessidade de consideração da problemática nas suas inserções em processos de dimensões supra-nacionais.

Guardadas as diferenças, o complexo de questões similares relacionado com a mulher independente, corajosa e ousada, desafiadora de normas da época tem sido, nos estudos músico-culturais brasileiros, tematizada em particular na consideração de Chiquinha Gonzaga (1847-1935). Entre os trabalhos que com maior atenção procuraram descrever o contexto social e cultural que elucidam a sua vida e obra marcada por conflitos com normas distingue-se a de Edinha Diniz (Chiquinha Gonzaga: Uma Historia de Vida, Rio de Janeiro: Codecri, 1984).

No Exterior, Chiquinha Gonzaga foi objeto de seminários e colóquios universitários realizados conjuntamente com o I.S.M.P.S.. Entre êles, salientou-se aquele dedicado às „dimensões européias da música de Portugal“, em 2002, levado a efeito pela A.B.E. em Colonia com o apoio a Embaixada de Portugal na Alemanha por ocasião da celebração da capital européía da cultura no Porto.

Nesse evento, considerou-se sobretudo as relações da musicista com o meio português, em particular a sua viagem a Portugal, em 1904. As discussões trouxeram à luz a necessidade de análises da sua vida e obra sob perspectivas mais amplas, o que fundamentou a sua consideração em cursos dedicados à História da Música Popular nas Américas e de estudos de gênero na Universidade de Bonn.

De ciclos de estudos da A.B.E.
sob a direção de
Antonio Alexandre Bispo

Todos os direitos reservados



Indicação bibliográfica para citações e referências:
Bispo, A.A.(Ed.).“ Hallo Dolly!  Luz vermelha & síncopes. Prostituição, música, dança, jogo e bebidas em regiões de rush. Club Internacional de Porto Velho, barracões de seringais do Acre e dance halls no Alasca“.
Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 157/8 (2015:05). http://revista.brasil-europa.eu/157/Hallo_Dolly_Luz_vermelha_e_sincopes.html


Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2015 by ISMPS e.V.
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501


Academia Brasil-Europa
Organização de Estudos de Processos Culturais em Relações Internacionais (ND 1968)
Instituto de Estudos da Cultura Musical do Espaço de Língua Portuguesa (ISMPS 1985)
reconhecido de utilidade pública na República Federal da Alemanha

Editor: Professor Dr. A.A. Bispo, Universität zu Köln
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Fotos A.A.Bispo, 2015 ©Arquivo A.B.E.