Revista

BRASIL-EUROPA

Correspondência Euro-Brasileira©

 

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Colonias do Espirito Santo. Ernst Wagemann.

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Colonias do Espirito Santo. Ernst Wagemann.

Colonias do Espirito Santo. Ernst Wagemann.

Colonias do Espirito Santo. Ernst Wagemann.

Colonias do Espirito Santo. Ernst Wagemann.

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Fotos no texto: Casa da Cultura de Domingos Martins

A.A.Bispo.
©Arquivo A.B.E.









 

Revista Brasil-Europa - Correspondência Euro-Brasileira 143/6 (2013:3)
Professor Dr. A.A.Bispo, Universidade de Colonia e Conselho Científico
Direção administrativa: Dr. H. Hülskath

Organização de Estudos de Processos Culturais em Relações Internacionais (ND 1968)
- Academia Brasil-Europa  -
e institutos integrados

© 1989 by ISMPS e.V. © Internet-edição 1998 e anos seguintes © 2013 by ISMPS e.V. Todos os direitos reservados
ISSN 1866-203X - urn:nbn:de:0161-2008020501


Doc. N° 2996


ABE


Estudos empíricos de colonias alemãs no Espírito Santo
e a teoria da Demodinâmica na Economia Empírica de Conjunturas na Alemanha

A aclimatação do europeu nos trópicos e os Pomeranos no Brasil
100 anos da viagem do economista teuto-chileno Ernst Wagemann (1884-1956) ao Espírito Santo I


Ciclos de estudos "O Báltico e as relações Alemanha-Brasil". Após 5 anos de viagens de estudos ao Espírito Santo, Meklenburg-Pomerânia Ocidental e países bálticos. Ano Brasil/Alemanha 2013 da A.B.E. pelos 30 anos do primeiro simpósio de atualização dos estudos da imigração e colonização alemãs nas Américas

 
Domingos Martins. A.A.Bispo

A particular atenção concedida às relações Alemanha/Brasil nos trabalhos euro-brasileiros de 2013 justifica-se pela passagem dos 30 anos do primeiro simpósio internacional dedicado á atualização dos estudos da emigração alemã ao continente americano.


Esse evento de 1983 marcou o desenvolvimento de trabalhos posteriores que levaram à realização de viagens a regiões de colonização alemã do Espírito Santo e, a seguir, a Mecklenburg-Vorpommern e a países bálticos. A necessidade de estudos mais aprofundados quanto aos pressupostos culturais dos pomeranos na sua própria região de origem foi considerada durante visita à Casa de Cultura de Domingos Martins.


Casa da Cultura de Domingos Martins. Foto A.A.Bispo

Completados 5 anos dessas viagens de observações, contatos e estudos, pareceu ser oportuno retomá-los através da realização de novos ciclos de estudos no Norte da Alemanha e em países da esfera do Mar Báltico. (http://revista.brasil-europa.eu/143/Baltico-Brasil.html)


Um dos principais motivos que justificam essa iniciativa reside na passagem dos cem anos de um dos mais significativos empreendimentos científicos da história da pesquisa colonial referente ao Brasil: o da viagem de pesquisas do erudito economista e cientista social teuto-chileno Ernst Wagemann (1884-1956) ao Espírito Santo.


Ernst Wagemann
O significado da obra de Ernst Wagemann para os estudos relacionados com a emigração/imigração e colonização deriva não apenas dos dados que transmite a respeito da situação das colonias alemãs no Espírito Santo em anos imediatamente anteriores à Primeira Guerra Mundial. O interesse da sua obra é sobretudo teórico, pois testemunha correntes do pensamento voltado a questões coloniais e tropicais numa fase de apogeu do Colonialismo europeu do início do século XX.


Foi justamente esse significado da obra de Ernst Wagemann para a própria pesquisa no seu desenvolvimento histórico que levou a seu redescobrimento no simpósio de 1983.


A reconsideração de uma obra já esquecida enseriu-se nas preocupações da época pela revisão crítica e renovação de perspectivas nos estudos relacionados com a emigração/imigração e colonização perante as novas condições impostas pelo processo de integração européia e de aproximação dos países latino-americanos entre si.


Tomava-se consciência que esses estudos haviam sido até então por demais orientados segundo referenciais nacionais e bi-laterais, delimitados assim quanto à sua inserção em processos históricos mais amplos, pressuposto para o desenvolvimento dos estudos à luz da necessidade de reconsideração dos estudos de processos transatlânticos e interamericanos sob o signo dos novos impulsos integrativos. (Veja http://revista.brasil-europa.eu/141/Brasil-Alemanha-2013.html).


Já o fato de fronteiras nacionais terem-se modificado no decorrer da história traz à consciência o risco de projeção anacrônica de concepções do presente ao passado e, assim, a necessidade de consideração de fluxos emigratórios e iniciativas colonizadoras em contextuais mais amplos de ambos os lados do Atlântico e que necessitam ser mais diferenciadamente analisados.


Compreensões, justificativas e avaliações da emigração/imigração e de iniciativas coloniais passaram por transformações no decorrer do tempo, e análisa-las representa pré-condição para a consideração adequada de empreendimentos e processos desencadeados. A história das concepções relativas à emigração e colonização, e, em particular, do desenvolvimento da própria área de estudos coloniais e tropicais nos países europeus e das posições e razões por parte dos países receptores surge como pressuposto para procedimentos refletidos.


Cafezais do Espirito Santo. Foto A.A.Bispo

Chile e e Brasil nos estudos da colonização alemã - significado de Ernst Wagemann


Entre aqueles que mais salientaram a necessidade de considerações conjuntas da imigração, colonização e da presença de alemães nos diferentes países latino-americanos, em particular entre o Chile e o Brasil, destacou-se o Prof. Dr. Samuel Claro-Valdéz (1934-1994) da Universidade Católica de Santiago do Chile. Em diálogos voltados à intensificação da cooperação chileno-brasileira nos estudos culturais, salientou-se repetidamente o significado do Professor Dr. Ernst Wagemann.


Nascido no Chile (Chañarcillo) e posteriormente ali atuando após a Segunda Guerra como Professor universitário (1949-1956), Ernst Wagemann estabelece de forma exemplar pontes entre o Chile, a Alemanha e o Brasil no pensamento científico voltado a processos relacionados com a colonização e emigração alemã na América do Sul.


A relevância de Ernst Wagemann para a própria ciência resulta nesse contexto do fato de não ter sido primordialmente um comerciante, militar, publicista ou viajante que deixou descrições mais ou menos ocasionais, arbitrárias ou não suficientemente refletidas de regiões coloniais visitadas, mas sim um cientista que esteve no Brasil para o desenvolvimento planejado e fundamentado teoricamente de pesquisas em colonias alemãs.


A sua obra representa um documento do pensamento alemão relativo a questões de povoamento europeu de regiões tropicais. Considerar a sua obra relativa aos alemães e seus descendentes no Espírito Santo leva à consideração das bases teóricas de estudos e da política colonial do início do século XX e de áreas relacionadas da Medicina Tropical e Antropologia.


Revela, assim, o papel desempenhado pelo Brasil no desenvolvimento das reflexões nesse complexo de disciplinas afins, na história da política colonial e no desenvolvimento das Ciências Econômico-Sociais da Alemanha.


Ernst Wagemann e os Estudos Coloniais nos anos anteriores à Primeira Guerra


Tendo estudado em Göttingen, Berlin e Heidelberg, Ernst Wagemann obteve o título de Dr.phil em 1907. Nesse mesmo ano, Adolf Friedrich zu Mecklenburg (1873-1969) liderou a sua famosa expedição africana que levou à travessia do continente de Leste a Oeste e, em Heidelberg, Karl Alexander Wettstein (*1872) apresentou o seu trabalho de doutoramento sôbre vias de comunicação no desenvolvimento colonial em Santa Catarina. (Veja http://revista.brasil-europa.eu/143/Karl-Alexander-Wettstein.html)


Motivado pela atualidade da discussão de questões coloniais, e próximo, pelas suas origens e conhecimento de línguas, à problemática da colonização alemã nos países da América do Sul, Ernst Wagemann especializou-se em assuntos relacionados com questões coloniais, acompanhando a discussão respectiva em publicações e congressos na Alemanha, sobretudo como docente do Instituto Colonial de Hamburgo. Personalidade de particular influência nesses círculos era a do Duque Johann Albrecht zu Mecklenburg (1857-1920).


Se as regiões de imigração alemã nos Estados do Sul do Brasil já eram conhecidas através de várias publicações, inclusive de viajantes que também estabeleciam elos entre os alemães no Chile e no Brasil (http://revista.brasil-europa.eu/141/Chile-Alemanha-Brasil-Ernst-Hengstenberg.html), Ernst Wagemann escolheu uma região até então relativamente pouco considerada na Alemanha.


O seu projeto adquiriu assim um sentido pioneiro, sobretudo por representar um empreendimento de escopo científico, de viagem para fins de pesquisa empírica a regiões coloniais de então difícil acesso.


Se o trabalho de doutoramento de K. A. Wettstein sôbre Blumenau baseou-se em observações e experiências que o seu autor havia obtido como técnico de formação militar na região, ou seja, como elaboração de conhecimentos e materiais a posteriori, a obra de Ernst Wagemann representou uma viagem de quatro meses especificamente destinada a pesquisas fundamentadas em estudos prévios, vistas como necessárias ao desenvolvimento dos estudos coloniais, tropicais e sócio-políticos específicos.


A partir de 1914, com a sua agregação universitária (Habilitation), passou a pertencer à Friedrich-Wilhelms-Universität Berlin, a posterior Humboldt-Universität (Veja http://revista.brasil-europa.eu/140/Ideal-formativo.html).


O livro com os resultados dos estudos realizados entre os colonos alemães no Espírito Santo foi publicado em 1915 na série dedicada ao tema do assentamento de europeus nos trópicos da Sociedade de Política Social (Gesellschaft für Socialpolitik). Essa entidade, fundada em 1873, então presidida por Gustav Schmoller (1838-1917), procurava um caminho intermediário entre o liberalismo da Escola de Manchester e correntes revolucionárias do marxismo ( Ernst Wagemann, Die deutschen Kolonisten im brasilianischen Staate Espirito Santo,  Munique e Leipzig: Duncker & Humblot 1915 = Schriften des Vereins für Sozialpolitik 147: Die Ansiedelung von Europäern in den Tropen 5. Teil).


A questão da aclimatação de europeus nos trópicos


Na introdução a seu trabalho sobre os colonos alemães no Espírito Santo, Ernst Wagemann oferece um panorama geral da situação dos estudos coloniais e de áreas afins do início do século XX.


As suas explanações demonstram que a temática colonial não era exclusivamente alemã, mas internacional, desenvolvendo-se sobretudo a partir do conceito da aclimatação.


Como Ernst Wagemann salienta, o Institut Colonial Internacional, nas suas sessões em Haia, em 1909, em Braunschweig, em 1991, e em Bruxelas, em 1912, demonstrara que a questão da aclimatação longe estava ainda de ser solucionada.  (Bibliothèque coloniale internationale. Compte rendu 1909, 1911, 1912, Institut Colonial Internacional, Bruxelas). O mesmo registrara, em 1910, o Congresso Colonial Alemão.


Nesses congressos, nem mesmo chegara-se a uma opinião unânime quanto à colocação de problemas.


Partia-se, em geral, do princípio de que se deveria distinguir entre a
aclimatação de indivíduos e a aclimatação de raças.

Uma Comissão nomeada pelo Institut Colonial Internacional procurou primeiramente definir ambos os conceitos.

Sob aclimatação do indivíduo devia-se entender a possibilidade para um determinado indivíduo adaptar-se fisiologicamente às condições do novo meio por um tempo determinado, que poderia ser mesmo aquele de sua existência.

Sob aclimatação de raças, ao contrário, devia-se entender a adaptação ao clima de toda uma população, não somente durante a vida dos primeiros que chegaram, mas também de seus descendentes, conservando de geração em geração as qualidades distintivas de seus ascendentes, sem nenhuma mistura de sangue indígena. (Institut Colonial International, Compte Rendu, 1911, 348)

A questão de critérios para a definição da aclimatação

Uma completa aclimatação de raça apenas existiria no caso de uma população transportada para os trópicos e os seus descendentes se estes não demonstrassem transformação fisiológica ou psicológica causada pelas novas condições de vida.

Sob a influência de antropólogos, essa definição foi modificada, passando-se a entender sob aclimatação de raça a adaptação a um clima equatorial de maneira a produzir uma raça adaptada ao novo meio, modificada talvez um pouco no seu organismo, mas conservando as qualidades essenciais dos ascendentes, mantendo-se vital e prolífica.

Essa posição mais moderada foi aquela também defendida pelo Congresso Colonial Alemão de 1910. A aclimatação foi aqui definida como a adaptação de saúde física e mental não apenas dos primeiros imigrantes, mas sim também de sua descendência, de modo que as gerações se reproduzissem sem miscigenações.

Uma outra questão era aquela que indagava até que ponto a capacidade física não diminuída e a capacidade de trabalho seriam fatores ou sintomas da aclimatação. A Comissão chegou à conclusão: ou o clima representaria um obstáculo à colonização, e então esse obstáculo seria absoluto, ou o clima não representaria um obstáculo essencial, e então a possibilidade do povoamento por brancos levaria à capacidade de trabalho físico não diminuído no território colonizado.

Outros especialistas viam a aclimatação apenas completada se o europeu nos trópicos pudesse levar uma vida exatamente como na terra natal, ou seja, por exemplo, quando o pequeno agricultor estivesse em condições de trabalhar 10 a 12 horas diárias como na sua região de origem. Outros viam nessa concepção apenas uma contribuição teórica, contrária às exigências da prática.

Ernst Wagemann salienta que, se já quanto à colocação dos problemas havia discordância, também não havia acordo quanto às respostas.

Todos concordavam apenas quanto à possibilidade de aclimatação individual, podendo ser ela favorecida através de medidas higiênicas de modo a tornar menos riscante a estadia temporária de europeus nas colonias.

Quanto à questão da aclimatação de raças, não se chegara a nenhum consenso. A possibilidade de haver sucesso em terras altas tropicais era aceita pela maioria, outros, porém, negavam essa possibilidade postulando uma deterioração do sistema nervoso devido à ação dos raios do sol.

Não se tratou, nesses congressos, pormenorizadamente, da questão das possibilidades de aclimatação no interior de terras, no fundo de matas de terras tropicais (Tiefland). Em geral, essa questão era respondida negativamente.

Uma série de observações parecia levar à suposição que, sob certas circunstâncias, por exemplo em condições de clima insular como nas Antilhas, em Maurício ou Bourbon (La Reunion), poder-se-ia esperar resultados favoráveis quanto à aclimatação de europeus. Que o europeu mesmo em terras planas tropicais, com clima continental, pudesse aclimatizar-se a longo prazo, isso parecia indicar os sucessos colonizadores no norte da Queensland.

Questionamento de Ernst Wagemann e escopo de sua pesquisa no Espírito Santo

Como Ernst Wagemann salienta na sua introdução, a questão do assentamento de europeus nos trópicos permanecera insolucionada devido ao desconhecimento dos reais obstáculos à aclimatação.

Seriam apenas causas fisiológicas os únicos e decisivos fatores para o sucesso ou o insucesso da aclimatação? Seriam mudanças funcionais ou também orgânicas no corpo humano causadas pela constituição física e química da atmosfera, tais como umidade e calor, pela intensidade dos raios de sol ou determinadas doenças tropicais as razões últimas do sucesso ou insucesso da aclimatação?

Qual era o papel desempenhado pelas condições econômicas e sociais?

Assim, para Ernst Wagemann, embora já se tivesse feito uma investigação dos fatores fisiológicos da aclimatação - ainda que sem resultados definitivos -, o aspecto econômico-social do problema ainda não tinha sido considerado pormenorizadamente.

Quanto aos aspectos fisiológicos, destacavam-se duas perspectivas opostas. Os médicos coloniais viam como causa do insucesso da colonização européia no interior de terras tropicais a ocorrência de epidemias endêmicas. Outros cientistas, sobretudo os antropólogos, salientavam fatores climáticos, em particular a irradiação solar, vendo aqui o principal obstáculo para o povoamento branco de países tropicais.

Para Ernst Wagemann, se os médicos tropicais tivessem razão, então abriam-se boas perspectivas para a colonização tropical, considerando-se os progressos da medicina no combate às doenças tropicais. A perspectiva dos antropólogos, porém, era mais pessimista quanto à questão das possibilidades aclimatizadoras. Como ambas as posições não podiam ser comprovadas, tinha-se apenas a certeza que os brancos deviam contar com dificuldades na sua aclimatação tropical, não se sabendo se eram superáveis ou não.

Havia, sobretudo, insuficiente material empírico para conclusões. A viagem de Ernst Wagemann tinha como escopo justamente contribuir à superação dessa falha de conhecimentos. A sua pesquisa não se voltava, assim, tanto ao aspecto fisiológico, mas sim ao aspecto social-econômico da questão da aclimatação européia.

Significado das coloniais alemãs no Espírito Santo para estudos tropicais

As colonias alemãs no Espírito Santo surgiam como um objeto de estudos de especial interesse para a questão, pois abrangiam uma população de colonos de ca. 18000 pessoas e eram, assim, quanto ao número, a maior colonização alemã dos trópicos.

As colonias do Espírito Santo apresentavam já uma história de quase 70 anos, ali já crescendo a terceira geração de imigrantes, o que possibilitava constatar as características aclimatizadoras.

Um problema que se levantava dizia respeito à definição do tropical e, portanto, da adequação das colonias do Espírito Santo para estudos tropicais. As colonias situavam-se bastante distantes do Equador, ou seja abaixo do 20° de latitude, por assim dizer nos limites dos trópicos. Além do mais, situavam-se entre 400 a 800 metros acima do mar. Como, porém, pelo menos até uma altitude de ca. 600 metros a temperatura média anual era mais de 20° C, podia-se denominar o clima dessa região como sendo tropical segundo a definição do Institut Colonial Internacional. Tratava-se, assim, de uma definição dos trópicos a partir do fator climático.

Para Wagemann, considerando-se as diferenças de temperatura diárias e anuais, o clima regional devia antes ser considerado  em geral como subtropical; apenas uma pequena parte das colonias alemãs situava-se em regiões com clima claramente tropical de zonas baixas, e a essas cabia assim dirigir principalmente a atenção.


Fontes existentes para os estudos das colonias alemãs do Espírito Santo

Ernst Wagemann salienta que pouco pôde basea-se em publicações anteriores referentes ao Espírito Santo. O que tinha sido escrito dizia respeito em grande parte a aspectos gerais da história do Descobrimento, povoamento e desenvolvimento do Estado (p.e. H. Handelmann, Geschichte von Brasilien, Berlin 1860, 441 ss.; M. Lamberg, Brasilien, Land und Leute, Leipzig 1899, 213-232: Der Staat Espirito Santo); W. Sievers, Süd-und Mittelamerika, 3a. ed., Leipzig und Wien 1914; J. C. Wappäus, Handbuch der Geographie und Statistik des Kaiserreichs Brasilien, Leipzig 1871, 1711 ss.). Entretanto, no Instituto Colonial a que pertencia, assim como em outras bibliotecas alemãs, Wagemann pôde consultar algumas publicações mais específicas.


Uma fonte particularmente considerada por Wagemann foi a obra do diplomata suiço e viajante pesquisador Johann Jakob von Tschudi (Reisen durch Südamerika, Leipzig 1867, 3. vol, 1-82), cujo primeiro capítulo do terceiro volume representava o principal documento sobre a história da fundação dos povoamentos alemães no Espírito Santo.


A sua bibliografia inclui artigos publicados na revista da Sociedade de Geografia de Berlim (Ehrenreich, "Land und Leute am Rio Doce, Brasilien", Verhandlungen der Gesellschaft für Erdekunde zu Berlin 13, 1886, 94-105).


De particular significado foram textos evangélicos, em particular de pastores que atuaram nas colonias. A respeito dos usos e costumes dos colonos, Wagemann orientou-se por um livro específicamente dedicado à cultura evangélico-alemã em Espírito Santo de um relato de viagens recentemente publicado pelo pastor Hugo Wernicke (Deutsch-evangelisches Volkstum in Espírito Santo: Eine Reise zu deutschen Kaffeebauern in einem tropischen Staate Brasilien, Potsdam 1910). Divulgação maior alcançou um texto publicado em revista de ilustração popular, em 1912(C. L. Platz, "Die deutschen Kolonisten im tropischen Brasilien", Gartenlaube 34, 1912).


O conhecimento de textos escritos por pastores das colonias em revistas evangélicas foi possibilitado sobretudo nas visitas do autor às igrejas na própria colonia. Ali encontrou não apenas valiosas informações anotadas nos livros eclesiásticos, mas também pastores com vasta experiência e que havia escrito relatos em periódicos. ( H. Grimm, "Zur Geschichte der Pommerngemeinde Santa Leopoldina II, Jequitibá in Espirito Santo", Deutsch-Evangelisch im Auslande XII/1, 1912, 11 ss..; "Deutsche Tüchtigkeit und Not in Espirito Santo", Süd-und Mittelamerika VI/18 e 19, 1913; Urban, "Santa Izabel, die erste deutsche evangelische Gemeinde im Staate Espirito Santo, Brasilien", Gut Deutsch und Evangelisch allewege 1; Wellmann, "Aller Anfang ist schwer: Erinnerungen aus der ersten Zeit meines Urwaldlebens", Gut Deutsch und Evangelisch allewege 11).


Os pastores Zylmann em Jequitibá, já há muito no país, auxiliou-o de forma especial, a êle devendo o material par um capítulo do livro dedicado aos métodos de produção em empresas coloniais, tendo mesmo desenhado o mapa que é anexado à publicação.


Apoio recebeu Ernst Wagemann também do pastor Fischer de Santa Leopoldina, que colocou à disposição tabelas metereológicas que montava e que escrevera um texto publicado sobre as tentativas de criação de uma conferência pastoral e uma liga comunitária no Espírito Santo (Fischer, "Ansätze zur Bildung einer Pfarrkonferenz und eines Gemeindeverbandes in Espirito Santo in Mittel-Brasilien", Deutsch-Evangelisch im Auslande X/8, 1911, 289ss). Outros pastores que o auxiliaram nas pesquisas foram Schmidt (Campinho), Schulz (Califórnia) e Wrede (Santa Maria).


De autoridades oficiais, Wagemann recebeu tanto apoios do lado brasileiro, em particular do Presidente do Estado, particularmente simpatizante dos alemães, e da representação consular alemã em Vitória. Os seus trabalhos em Santa Leopoldina foram apoiados pela firma Franz Müller & Co. em Porto do Cachoeiro,
em especial por C. Müller.


Uma obra que inspirou e que forneceu informações e elementos interpretativos a Ernst Wagemann foi Canaã, a obra magna de J. P. da Graça Aranha (1868-1931), publicada em 1902. Tendo sido juiz de direito em Porto do Cachoeiro (Santa Leopoldina), o escritor e diplomata brasileiro considera nessa obra dados e observações da vida alemã nas colonias do Espírito Santo. Uma obra literária que utilizou-se de elementos resultantes da experiência da realidade tornou-se, assim, singularmente, fonte para um estudo de natureza científica. Wagemann considera o texto de Graça Aranha em particular no capítulo dedicado ao caráter da população de colonizadores e sua aclimatação, à qual inicia com a descrição de uma cena de Canaã (pág. 137 ss). (Veja http://revista.brasil-europa.eu/143/Carater-e-aclimatacao-de-europeus.html)


Consequências dos trabalhos no Espírito Santo para a Teoria Econômica alemã


Após o término da Guerra, Wagemann passou a ocupar cargos de influência, co-determinando correntes do pensamento econômico e social da República Alemã. Foi nomeado Professor extraordinário da Universidade de Berlim e a Conselheiro do Ministério do Estado Prussiano de Agricultura e do Ministério de Economia do Reich. A partir de 1923, presidiu o Serviço Estatístico.


Em 1925, fundou o Instituto de Pesquisa de Conjunturas, posteriormente Instituto Alemão de Pesquisa da Economia, passando a ser considerado como o fundador da Pesquisa Empírica de Conjunturas na Alemanha.


A sua reconhecida competência e o seu renome manifestaram-se no fato de ter apresentado, em 1932, um plano para o combate da crise econômica que, pelo seu significado, passou a ser conhecido pelo seu nome.


Em 1933, ano da subida ao poder dos Nacionalsocialistas, Ernst Wagemann foi forçado a abandonar o seu cargo no Serviço Estatístico.


Em visão retrospectiva, reconhece-se que a pesquisa de Ernst Wagemann no Espírito Santo não representou apenas uma aplicação de estudos e princípio teóricos discutidos na Alemanha nos anos anteriores à Primeira Guerra, mas sim um projeto que ofereceu subsídios para o desenvolvimento da Teoria Econômica em fase crítica da Alemanha.


A constatação que continuamente faz no seu texto sôbre os alemães do Espírito Santo relativamente às consequências da dispersão de colonias em grandes regiões e à distância entre elas podem ser consideradas em relação a acepções básicas de seu pensamento.


Tudo indica que foi com base no que vivenciou no Brasil que Wagemann passou a ver positivamente o aumento da densidade populacional em determinado território, considerando-a como favorável a um melhoramento endógeno da capacidade de uma população.


Com base no que observara nas comunidades alemãs do Espírito Santo compreende-se a sua convicção de que a necessidade de uma intensificação do comércio através de uma maior cooperação levaria a transformações econômicas e sociais em situações de maior densidade populacional, favorecendo positivamente a capacidade de uma população.


O impacto causado no autor pela dispersão e isolamento de grupos coloniais alemães no Espírito Santo parece ter contribuído a que Ernst Wagemann desenvolvesse uma teoria que surge nada menos como distinta daquela de Thomas Robert Malthus (1766-1834).


Considerando a influência de Malthus na história do pensamento científico e cultural - bastando aqui mencionar o nome de Charles Darwin (1809-1882) e a teoria da Evolução (http://www.revista.brasil-europa.eu/119/Tema-em-debate.html), pode-se avaliar as dimensões e consequências de conclusões de Wagemann para o pensamento e a prática econômica e político-social.


Um conceito de significado no edifício teórico de Ernst Wagemann é o da demodinâmica. Esse termo indica a concepção de que, na evolução sócio-cultural de uma população ocorreriam fases de supra-suficiência e insuficiência, de alternância de bem-estar e de necessidades.


Também como uma consequência das impressões recebidas no Espírito Santo pode-se compreender a sua convicção relativa à atomização étnica e à forma de comportamento de diferentes grupos populacionais em determinado território. Um aumento da densidade populacional levaria a que grupos que vivem isolados se fundam gradualmente num todo étnico.



Ciclo de estudos sob a direção de
Antonio Alexandre Bispo


Todos os direitos relativos a texto e imagens reservados. Reproduções apenas com a autorização explícita do editor.

Indicação bibliográfica para citações e referências:
Bispo, A.A. "Estudos empíricos de colonias alemãs no Espírito Santo e a teoria da Demodinâmica na Economia Empírica de Conjunturas na Alemanha". Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 143/6 (2013:3). http://revista.brasil-europa.eu/143/Aclimatacao-do-europeu-nos-tropicos.html